“1 de Janeiro de 1908 – Está uma tarde linda, azul, morna, diáfana. Converso na Livraria Ferreira com o Fialho, quando entra esbaforido e pálido o pintor Artur de Melo, que conheço do Porto, e diz num espanto, ainda transtornado:
– Acabam de matar agora o rei!
– O quê?!
– Eu vi, ouvi os tiros, deitei a fugir…
Fecham-se à pressa os taipais das lojas. Uma mulher do povo exclama:
– Mataram agora o rei. Vi os que o mataram. Eram três. Dois lá estão estendidos. Passou um agora por mim, a rasto, com a cabeça despedaçada!...
(…) E, pela narração do Melo, do Armando Navarro e de outros que assistiram, reconstituo assim a tragédia: (…)
– Eu estava a quatro passos – confirma o pintor Melo. – Um homem subiu às traseiras do carro, olhou o rei cara a cara e deu-lhe um tiro de revólver. Vi um fumozinho branco sair-lhe do pescoço. O rei voltou-se e, cem anos que eu viva, nunca mais me esquece a expressão de espanto daquela máscara. Disse uma palavra que não percebi bem…
– Ao primeiro tiro – continua o Navarro – a cabeça do rei descaiu para a frente, ao segundo tombou para o lado. (…)”
– Acabam de matar agora o rei!
– O quê?!
– Eu vi, ouvi os tiros, deitei a fugir…
Fecham-se à pressa os taipais das lojas. Uma mulher do povo exclama:
– Mataram agora o rei. Vi os que o mataram. Eram três. Dois lá estão estendidos. Passou um agora por mim, a rasto, com a cabeça despedaçada!...
(…) E, pela narração do Melo, do Armando Navarro e de outros que assistiram, reconstituo assim a tragédia: (…)
– Eu estava a quatro passos – confirma o pintor Melo. – Um homem subiu às traseiras do carro, olhou o rei cara a cara e deu-lhe um tiro de revólver. Vi um fumozinho branco sair-lhe do pescoço. O rei voltou-se e, cem anos que eu viva, nunca mais me esquece a expressão de espanto daquela máscara. Disse uma palavra que não percebi bem…
– Ao primeiro tiro – continua o Navarro – a cabeça do rei descaiu para a frente, ao segundo tombou para o lado. (…)”
Raul Brandão, Memórias – I (1919)
[foto: a partir de Almanaque Republicano]
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