quarta-feira, 30 de setembro de 2009

David Mares é finalista mundial com um projecto que enaltece a cortiça

David Mares, arquitecto, anda nas bocas do mundo por ser um dos 10 finalistas em concurso sobre abrigos promovido pelo nova-iorquino Guggenheim sob a designação de “Shelter Competition”. Ecologia, inovação e enquadramento na paisagem eram necessários, concorrentes foram mais de 600 a partir de 68 países. Entre os finalistas, escolhidos pelos estudantes da Lloyd Wright School of Architecture, há projectos da Argentina, do Brasil, da Colômbia, dos Estados Unidos, das Filipinas, de Inglaterra e de Portugal.
O projecto de autor português, de David Mares, já reportado na imprensa escrita e na internet, tira partido da capacidade de isolamento da cortiça e tem como cenário o Vale de Barris, em Palmela, recebendo a designação de “CBS – Cork Block Shelter”.
O público pode votar num dos dez projectos até 10 de Outubro. O resultado será conhecido a 21 de Outubro, depois de um júri se pronunciar. Se quiser ver os projectos finalistas e votar, passe por aqui.
O projecto de Palmela surge apresentado no sítio do Guggenheim nos seguintes termos: “CBS is located at Vale dos Barris. It was designed to be an ecological and living block. In a microclimate that ranges from the dry heat to damp cold, the application of cork is a good way of thermally isolating the shelter and also providing acoustic insulation for study/sleep. The dynamic facade gives visual interaction when in living-studying mode; in rest-sleep mode it closes to provide privacy for its occupant.” Para o visitante, há ainda fotografias, de que aqui se reproduzem algumas.

Política caseira (92): Maria das Dores Meira (CDU) fala sobre o estádio no Vale da Rosa

O Setubalense: 30.Setembro.2009

Política caseira (91): Paulo Valdez (PSD) e a candidatura à Assembleia Municipal setubalense

O Setubalense: 30.Setembro.2009

Política caseira (90): Bloco de Esquerda e as freguesias de S. Maria e Anunciada

O Setubalense: 30.Setembro.2009

Política caseira (89): Mário Nogueira (MPT) e a campanha em Setúbal


O Setubalense: 30.Setembro.2009

Política caseira (88): Teresa Almeida (PS) apresentou programa de candidatura

O Setubalense: 30.Setembro.2009

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Sobre "Memórias entre um sorriso", de Fernando Guerreiro

Ler Memórias entre um sorriso (Setúbal: ed. Autor, 2009), de Fernando Guerreiro, é um exercício de visita a um poeta, de entrada num mundo que se nos dá a revelar no seu presente e no seu passado, um franquear de portas pelos caminhos da memória, uma inscrição de um “eu” na história, na sua própria história, sempre a oscilar entre o que sente e o que foram os momentos com os outros. Não é por acaso que Fernando Guerreiro foi buscar para o título a palavra “memórias”! Na verdade, falar desta poesia fica incompleto se não se disser o quanto a memória por aqui foi trabalhando, o quanto ela se transformou num motor e numa fonte, recolectando os dias e os momentos, salvando o tempo.
Fernando Guerreiro, que assumiu no texto prefacial não ter o direito de submeter os amigos à prova de escreverem uma introdução para o seu livro, sabe que um diário ou as memórias são algo que constrói a fronteira da intimidade e do privado. Foi por isso que inaugurou o seu livro com um prefácio por si mesmo assinado, enquanto autor da obra, para dizer ao leitor que o objecto que lhe cai nas mãos está regado pelos afectos de uma vida, faz parte de “um Diário vivido e escrito em verso, sem retórica poética nem gramática cuidada”. Temos, pois, retratos dos dias de um “eu”, que podem ser lidos entre duas balizas: a da sinceridade, se acreditarmos que um diário é um depósito da autenticidade, ainda que mediada pela escrita, e a do artifício da escolha (nos textos seleccionados a partir de um período que desfila entre 1961 e 2008) e da forma (escolhendo o verso).
Mas estes poemas, além de terem essa marca do tempo, possuem também o desejo da inscrição, do partilhar instantes, sentidos e sentimentos com os outros, do fazer a história de um poeta, da recusa do esquecimento. A dado ponto do prefácio, há a confidência que alia a vida, a escrita e a publicação: “Ao chegar à minha idade e sem descendentes, olho para o espólio que juntei toda uma vida: os papéis que escrevinhei, as cartas que recebi, as dedicatórias que me escreveram, as honras com que me distinguiram, e surge-me uma pergunta angustiante que nunca tinha feito antes: quando eu partir, para onde irá tudo isto? Os livros, os quadros, as fotos, o Tempo e a traça se encarregarão de lhes dar destino. Mas aquilo que eu escrevi? Os Meus Afectos? Bolas!, ao fim e ao cabo são bocados do meu sentir, pedaços de mim, que, mal ou bem, com todos os meus defeitos e algumas possíveis qualidades, fui eu! É, pois, com este pensamento que deixo este livro a todos aqueles que o desejarem ler como prova incontestável de que existi.” Ora, o tal diário, a escrita, o livro ganham força porque atestam, porque comprovam que um “eu”, num determinado tempo e num não menos determinado lugar, existiu. A palavra escrita é, pois, o testemunho da existência, da vida. E tudo isto poderia ser uma verdade lapaliciana se não lhe associássemos, como temos de fazer, o facto de um autor se dizer e o pormenor de este autor ser também… actor! Duplamente actor, portanto: na profissão, porque representa, e como protagonista de uma vida, porque age.
Em cinco partes se apresenta dividido este livro, todas elas com título a preceito, insistindo na ideia do compromisso do poeta com a sua escrita e com a sua vida como objecto dessa escrita: “Folhas soltas de um diário” (a parte mais longa), “Gritos do meu silêncio”, “As marés do meu sentir”, “Pegadas do meu caminho” e “Foi pelo sonho que fui”.
Em todos estes títulos está nítida a presença do “eu”. Depois de se ter assinalado a marca da escrita diarística, vale a pena chamar a atenção para os títulos das duas partes seguintes, ambas manifestações do conflito que vai no poeta – o leitor ora é dominado pelo paradoxo entre os “gritos” e o “silêncio”, presente no título do segundo grupo de poemas (“Gritos do meu silêncio”), uns e outro impossíveis de conciliar e denotando uma veia lírica que canta as “coisas do coração”, o amor, os sentimentos, as dúvidas, a saudade, o que fica no interior do poeta, bem como é surpreendido por alguma sintonia ou identificação entre as “marés” e o “sentir”, constante no título do terceiro grupo (“As marés do meu sentir”), onde surge um conjunto de poemas que parte, muitas vezes, de circunstâncias ocasionais como um pombo no quintal, uma mosca incómoda, uma data, um momento de ironia, um beijo.
Se de conflito falei, entendido enquanto motor que suscita a acção, que desperta o “eu”, para as partes anteriores, creio que os dois últimos grupos de poemas são mais apaziguadores, levam o poeta mais ao encontro de marcas de identificação, venham elas do exterior ou tenham o “eu” como ponto de partida. A atenção dada ao papel do outro é sobremaneira visível na quarta parte (“Pegadas do meu caminho”), constituída por poemas sobre os amigos, sejam eles contemporâneos do poeta (e alguns têm acção bem conhecida no nosso meio e servem também para pontuar a tal dimensão autobiográfica deste livro, na medida em que são marcas de um tempo, de um lugar e também de uma vida) ou referências culturais que dominaram esse mesmo poeta, como são os casos de Bocage e de Sebastião da Gama, e um sobre a escola (por onde passam o afecto do apego – no uso do possessivo, “à minha escola” –, os professores e o tempo da infância, além de uma certa mística trazida pela memória da Escola Conde Ferreira, num tom que igualmente comprova o pendor memorialístico que Fernando Guerreiro quis imprimir neste livro).
Mas a vida, enquanto itinerário próprio, enquanto caminho assumido e construído pelo andar de um “eu”, surge forte no grupo de poemas que fecha a obra, intitulado “Foi pelo sonho que fui”, valendo recordar a resposta que esta afirmação pode ser ao convite deixado por Sebastião da Gama quando dizia “Pelo sonho é que vamos”, sendo também importante que neste conjunto vejamos aquilo que poderia ser um manifesto de vida, pois é nele que encontramos os poemas mais intensos do ponto de vista do retrato a legar, uma espécie de chave para desvendar todas as contradições de uma vida, com títulos em que a exposição do “eu” surge mais vincadamente explícita – “Liberdade em Sol Maior”, “Contabilidade”, “Autobiografia” e “Introspecção”.
Em torno dos poemas de Fernando Guerreiro ronda o amor, numa inconstância permanente e absoluta, ora sentido através do outro, ora acentuado no desejo, por vezes violento, outras vezes reduzido ao sexo, muitas vezes platónico, frequentemente causa de decepção, rondado pelo ciúme, deixando amargura, recalcamento, numa insegurança forçada porque “não há solução / para um coração quebrado”, porque o poeta se confessa farto de uma paixão que é “um ser e não ser”. Enquanto vamos passando pelos retratos – ou pelos momentos – que do amor nos falam nos poemas deste Memórias entre um sorriso, dificilmente não nos vem à memória aquele conclusivo e paradoxal terceto camoniano que irrompe depois de o poeta ter tentado definir o amor: “Mas como causar pode seu favor / Nos corações humanos amizade, / Se tão contrário a si é o mesmo Amor?”
A ironia suplanta muitas vezes a amargura e a resposta é dada, frequentemente, pela provocação, tom que surge evidente num texto como “Leilão”, em que o poeta anuncia pôr os seus sonhos à venda e, depois de fazer desfilar a variedade sonhadora, conclui num terceto: “Os meus sonhos estão à venda! / Vá, meus senhores! / Quem dá mais?” Esta marca provocatória, mesmo caprichosa, surge também dirigida a um “tu”, como em “Coisas do coração”: “Não quiseste quando eu queria, / Agora não quero eu…” Contundente provocação e não menos instigadora ironia ressalta também da definição de beijo num poema eivado de uma certa modernidade – depois de uma busca de definições sobre o beijo, que incluiu um passeio pela internet, o poeta conclui com a sua sapiente, defensiva e algo perversa opinião: “Eu, depois de tanto ouvir, / só tenho para dizer / com tantas explicações, / que o Beijo cá para mim / é forma de contrair / Gripes e Constipações!” O beijo serve, aliás, vários poemas, ainda que em registos diferentes – acentua, por exemplo, o amor e o início de uma relação (“Começámos com um beijo / o que eu chamo namorar”, no texto “História com princípio e fim”, temporizado por esse beijo e pelo final violento de uma bofetada, narrativa com o seu ingrediente de ironia no final – “E se aquele nosso começo / foi de forma apaixonada, / não foi menos engraçada / a bofetada do fim.”) Noutro passo, o beijo serve para despoletar os sentidos (“Quando me beijas gemendo / na tua sensualidade, / eu sinto que esses beijos / não acalmam meus desejos / nem me anulam a vontade.”, no poema “Indiferença”); num outro momento, o beijo é atirado “com a ponta dos dedos” para logo a seguir o poeta se interrogar sobre como terá ele sido recebido – e, uma vez mais, uma certo tom irónico conclui o raciocínio: “Se foi bem, / fico contente!... // Se foi mal, / olha… / Paciência!”
Pormenor bem significativo no campo dos afectos que neste livro perpassam é o olhar, seja o que irradia dos olhos do outro, seja o que decorre do gesto de contemplar através dos olhos próprios. É o poeta quem confessa esta fusão entre olhares, num fascínio mútuo – “Teu olhar não sei / o que é que ele tem, / uma coisa é certa: / ver-te sabe bem!” Noutro momento, deixa-se enredar na confusão suscitada no outro através do olhar – “Estou a ver como estranhaste / minha maneira de olhar”. Num outro texto, o olhar do poeta atinge um quase estado de encantamento, deixando-se levar pela imagem de um ser pouco preciso, quando regista: “Meus olhos seguindo o mover dos teus dedos / (…) / Meus olhos prendidos / ao mover dos teus lábios” Outra vez a sugestão camoniana do outro enquanto ser indefinível, em que se alicerça o amor platónico, sempre desejado e alimentado, mas nunca materializado. E, para que o poder que irradia de uns olhos fique completo, não podia faltar o fado ou a sorte, associado ao olhar, como acontece na “Balada dos olhos verdes”, estes definidos como “meu veneno, / minha razão de viver, / minha cura, / minha vida, / meu doce enleio de morrer. / (…) / Meu destino!”
Regressemos à questão autobiográfica, por ser essa a que abre e fecha o livro. O último grupo de poemas assume esse tom, mesmo porque um dos poemas se intitula “Autobiografia” e outro “Contabilidade”, títulos que se complementam porque uma escrita sobre o “eu”, sobre si próprio, é uma forma de registar o deve e o haver da vida. O último poema, não menos significativamente intitulado “Introspecção”, é uma despedida dos leitores e um quase pedido de desculpas – é que, no prefácio, Fernando Guerreiro recusara ser dominado pela “retórica poética” e, no final, o poeta, falando também de si, afirma a distância que está entre a Poesia (com P maiúsculo) e a sua obra – “Nós, os outros agraciados / por alguma habilidade, / apenas podemos dar / à Grande Mãe Poesia, / uns versos desentoados / que em infantil felicidade / nos dão uma certa alegria.” É este prazer de se dizer que comove também um actor. E, a este propósito, não será despiciendo assinalar outra marca autobiográfica que se intromete em vários poemas – a da representação e do prazer de ser actor, seja porque, numa conversação, se “divagou entre o Teatro / e o gosto de ser Poeta”, ou pela importância atribuída a uma mascarilha que esconde ao mesmo tempo que representa, ou porque as formas de disfarçar saltam aqui e ali, ou porque, como partilha no poema “Autobiografia”: “O Teatro e a Poesia / abriram de par em par / portas da minha Verdade”. Poderíamos ainda pensar que, mesmo apesar de tudo isto, o Fernando Guerreiro autor se distanciava do poeta a que deu forma no livro… esforço inútil, porque, mesmo no poema, o seu nome fica registado, prova de que este trajecto é mesmo autobiográfico, seja pelas memórias, seja pelo diário, seja pelos retratos. E a demonstração disso ressalta num poema como “A arte de representar”, onde, bem próximo do fim, o poeta exclama: “Ah! Fernando, meu estupor! / Quando perdes a mania / de em tudo querer ser actor?!”
Estes textos valem bem a leitura pelo retrato traçado e pela identidade que se apresenta, pelas amizades que cauciona, pelo uso da ironia com relativa parcimónia, pela obliquidade do amor e da paixão… e pelo sorriso com que a nossa leitura é, por vezes, surpreendida.
(texto lido na apresentação do livro, em Setúbal, em 21 de Setembro)

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Rostos (130)

"Caridade romana", por Bernardino Ludovice (1737), em Lisboa, no Jardim Botânico Tropical

A estátua, representando uma jovem (Pero) a amamentar o pai (Cimon), alude a uma lenda relatada por Valerio Massimo (15, aC-35, dC) na obra Factorum et dictorum memorabilium libri (Factos e ditos memoráveis), que fala sobre vícios e virtudes. A caridade é exaltada nesta lenda, em que Pero salva a vida de seu pai, Cimon, a morrer na prisão, amamentando-o durante as visitas que lhe fazia. Na base que sustenta esta escultura, há uma citação de Valerio Massimo. O episódio tem merecido a atenção de muitos artistas, podendo-se lembrar Francesco Primaticcio (com um quadro sobre o mesmo tema no Louvre) e Rubens (com obra do mesmo título no Rijksmuseum).

As verdades, o humor e o tempo da escola

Diário da Auto-Estima – 104
Verdade – Os partidos andaram a decidir quem falava verdade e quem a não praticava, com alguns políticos entretidos a apelidar os outros de “mentirosos” ou a avivar memórias. Melhor fora que tivessem insistido na clareza das suas propostas para o governo do país; melhor fora que as tivessem justificado e que não deixassem meias verdades a fustigarem-nos! Uma dessas meias verdades é a da possibilidade de formação de governo por coligações a seguir às eleições, cenário que tem feito as delícias das (in)decisões e tem mostrado apetites gulosos…
Humor – O que mais valorizei nesta campanha eleitoral foi o programa de humor dos “Gato Fedorento”, por ter sido o tempo em que os convidados se tornaram mais evidentes nas suas características – no teatro, na inteligência, na humanidade, no sentido de humor, na obsessão, no jogo de palavras, na comunicação… e também no contrário de tudo isto. Desfiz algumas dúvidas…
Escola – Está de volta. Espero bem que o ano lectivo não tenha a agitação do ano que passou, que não se volte a estar perante um quadro em que o ambiente de escola se paute pelo desagradável, com alguns políticos e comentadores a humilharem a escola que eles próprios construíram e frequentaram (não os tendo impedido de chegar onde chegaram…). Espero que a escola seja superior a todos quantos a tenta(ra)m desestabilizar.
Esta crónica deveria ter saído no Sem Mais Jornal de hoje.

Política caseira (87): Jorge Santana (PSD) entre os idosos

O Setubalense: 25.Setembro.2009

Política caseira (86): A candidatura socialista para S. Julião

O Setubalense: 25.Setembro.2009

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

A cor do dinheiro

A senhora fazia desfilar moedas em cima do balcão, na procura da importância certa. A vista já não lhe permitia distinguir os 10 cêntimos dos 20 cêntimos ou os 5 cêntimos dos 2 cêntimos...
- E a forma também não... São parecidas, mal se nota a diferença... - explicou, de cima da sua provecta idade.
A rapariga, ao balcão, ofereceu-se, no seu jovem olhar de águia e de experiência, para contar as moedas.
- Ah, faça-me então esse favor! Estas moedas não foram feitas para os velhos... - justificava a cliente.
- Pois, a senhora tem razão. Muitos se queixam do mesmo... Estas moedas, de tão parecidas que são, deviam ter cores diferentes para cada um dos valores, não era? Não rendia mais, mas sempre ajudava a fazer as contas, não era? - alvitrava a jovem por entre um sorriso.
- Como a menina tem razão! Até o dinheiro era mais bonito... Vê-se logo que é uma jovem! - elogiou a idosa, enquanto a importância era acertada em cima do balcão.
Depois, despediu-se e foi povoar o seu dia.

Política caseira (85): Jorge Santana (PSD) em Azeitão

O Setubalense: 23.Setembro.2009

Política caseira (84): Maria das Dores Meira (CDU) foi ao mercado

O Setubalense: 23.Setembro.2009

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Política caseira (83): Quando a política vira politiquice...

O Setubalense: 21.Setembro.2009
Ora aqui está como a campanha eleitoral nacional a que temos assistido tem as suas influências ao nível local. Isto é: assistimos a uma campanha eleitoral em que o importante não são as propostas a apresentar para o futuro mas os factos que se criam por dá-cá-aquela-palha.
Sempre embirrei (questão de feitio) com aquela prática de, numa sessão pública de Câmara (por exemplo), quando chegada a altura de uma votação, um vereador fingir que sai para não votar este ou aquele projecto, ficando a cena registada em acta. Sempre me pareceu hipocrisia uma história destas ou compromisso mal assumido. Cheguei a assistir a situações em que a personagem não saía da sala, mas dizia que era isso que fazia e... a reunião seguia, todos aceitando que a falada saída não era fictícia mas era real. Gargalhadas, claro!
Mas uma reunião pública de Câmara ser interrompida nos termos em que foi aquela a que a notícia faz referência... francamente! Tudo tresanda a brincadeira política e a jogo com o momento histórico que se vive. Lamentavelmente! Não é para cenas destas que os cidadãos dão os votos. Não é para atitudes como esta que eu assumo o meu papel de eleitor. Factos como este, que aconteceu na última sessão pública da Câmara de Setúbal, não convidam à participação cidadã, mas ao alheamento. A razão não vence por caminhos destes.

domingo, 20 de setembro de 2009

Clássicos no "Expresso"

O semanário Expresso iniciou ontem uma colecção de seis livros intitulada "Clássicos da Humanidade", títulos inicialmente publicados pela Sá da Costa ao longo da década de 30, com sucessivas reedições até há bem pouco tempo, em que foi mantida a versão do texto mas houve a colaboração de novos ilustradores.
Trata-se de adaptações de obras clássicas feitas por escritores de nomeada como Aquilino Ribeiro, João de Barros ou António Sérgio, visando o público juvenil ou com dificuldade em aceder aos textos clássicos. Os objectivos destas obras estão, de resto, bem expressos no título que foi aposto à adaptação do poema épico de Camões, que esteve a cargo de João de Barros - Os Lusíadas contados às crianças e lembrados ao povo.
A colecção promovida pelo Expresso abriu com a adaptação feita por Aquilino Ribeiro da obra de Fernão Mendes Pinto, Peregrinação, e vai prosseguir com mais cinco títulos, a sairem semanalmente (Os Lusíadas, Viagens de Gulliver, A Odisseia, História Trágico-Marítima e A Eneida). Obviamente, pela qualidade das adaptações, pelas referências que estas obras constituem e pela necessidade de saber, recomendei aos meus alunos que convencessem os pais a adquiri-las (a Peregrinação, saída neste Sábado, foi oferecida e as obras seguintes terão o custo de 1,00 € a adicionar ao preço do jornal, factor a considerar, uma vez que o custo total da colecção será de 5,00 €, enquanto, se fossem adquiridos os mesmos títulos na edição normal, o custo dos seis livros ascenderia a cerca de 70,00 €...). Os livros têm um formato um pouco mais pequeno do que os correspondentes que estão a correr no circuito livreiro. Pena é, no entanto, que tenham sido omitidas as ilustrações, ainda por cima com a agravante de, na capa, constar a informação "Ilustrações de André Letria"! De facto, nesta edição, do ilustrador é apenas o desenho da capa, uma vez que os outros desenhos, que acompanham a edição normal, foram suprimidos... Claro que para a leitura é o texto o mais importante, mas não pode ser menosprezado o papel que a ilustração tem nas edições destinadas ao público juvenil, muitas vezes pelo esclarecimento adicional, pela recriação ou pela estética...

sábado, 19 de setembro de 2009

A propósito de "Bocage", de Romeu Correia

Na sua extensa bibliografia, Romeu Correia, autor que cultivou o conto, a biografia, o romance e o teatro, não deixou de se preocupar com Bocage, tornando-o tema e personagem central de uma peça constituída por um prólogo e duas partes, usando como título o nome do poeta (Lisboa: Editora Ulisseia, 1965). Bocage é, de resto, personalidade que, ao longo dos tempos, se tem prestado a ser personagem de inúmeras ficções, de biografias e de outros textos dramáticos – lembro, de repente, obras mais recentes, na área do teatro, como Bocage, de José Sinde Filipe (Lisboa: Prelo, 1974), Bocage, Ele Mesmo!, de Fernando Cardoso (Lisboa: Portugalmundo, 1999) e Bocage e as ninfas, de Fernando Gomes (produção do Teatro Animação de Setúbal, em 2005, sem texto publicado).
A obra de Romeu Correia, aparecida quando passava o segundo centenário sobre o nascimento de Bocage, mantém ainda hoje um vigor moderno, seja pela leitura que apresenta da obra e do percurso bocagiano, seja pela estrutura da peça, com muitas intromissões do autor no que poderiam ser recomendações de encenação, seja pela vontade de levar uma época e um país para dentro de um palco. Nesta peça representa-se também o teatro, com figuras da arte dramática como Arlequim, Pierrot, o Histrião, os Saltimbancos ou as Máscaras (sugerindo o papel do coro), numa espécie de “espectáculo de feira”, uma “representação dentro de outra representação”, como o pretendeu o autor.
Se, como subtítulo, Bocage foi apresentado como uma “crónica dramática e grotesca”, não foi para facilitar o entendimento ou a leitura, antes terá sido para destacar, mais do que a imagem que do poeta ficou, o percurso que ele teve e as circunstâncias que o fizeram. Na verdade, a anteceder a lista de personagens que entram em cena, a abrir a obra, ficou a observação: “Esta é a crónica dramática e grotesca de uma época, centralizada na figura singular do poeta maldito que foi Bocage. Inconstante e volúvel como o momento histórico que testemunhou, o poeta, entrando na Lenda como um incorrigível trocista e desfrutador de prazeres, confunde-se com a agonia do próprio século, o XVIII, – e os anseios anónimos, a irreverência e o escárnio de um mundo novo que nasce…”
A história começa com a evocação de uma anedota protagonizada por um Bocage mítico, lembrada por “uma voz”, ainda com o pano descido, ao mesmo tempo que no palco se vai delineando a personagem José Pedro da Silva (das Luminárias), amigo e protector do poeta, e conclui com a morte do mesmo Bocage, associada a uma encenação que o projecta para a memória, tal como é acentuado na didascália que orienta a encenação: “Súbito, mil mãos caem sobre o leito, rasgam o lençol e trucidam o morto, dividindo-o entre si, como relíquia. Este com um pé, aquele com um braço, aqueloutro com a cabeça, etc., e somem-se, felizes, no horizonte.”
Pela história passam momentos vários da vida e do tempo do poeta sadino – a viagem à Índia, o balão de Lunardi, a boémia, o café “Nicola”, a tertúlia, a censura, a prisão, a reeducação no mosteiro, as relações de amizade (Morgado de Assentis, Bingre, Santos Silva, os padres do mosteiro) e de desavença (Pina Manique, José Agostinho de Macedo) –, num trajecto em que a sua figura se vai impondo para, depois, começar a declinar, ao mesmo tempo que o ambiente vai ficando impregnado da poesia bocagiana.
O que vai zelando pela (boa) memória de Bocage é a presença em cena de uma figura como a de José Pedro. No início da peça, em tempo localizado na Lisboa de meados do século XIX, é ele quem se insurge contra o Bocage das anedotas e das pilhérias – “Não dêem ouvidos! É falso! Tudo o que dizem do sr. Manuel Maria são mentiras! As anedotas, as indecências… são quase todas inventadas!...” Esta indignação vivida em palco acentua a reacção ao anúncio de um cego que apregoava “as anedotas do Bocage… e mais versos deste grande brejeiro!...” No final, é o mesmo José Pedro quem anda a vender os versos de Bocage para o ajudar, apregoando os folhetos, num paralelo (de sinal contrário) com o cego do início da história: “Para o grande poeta Bocage! Ajudem o grande Bocage! (…) Socorram Bocage! Bocage está muito mal!... Os últimos versos do grande poeta Bocage!...”
A intenção desta peça passa, pois, por corrigir um pouco a memória que de Bocage se fez. Argumentava o Histrião, ao falar sobre o teatro, que “um homem sobre as tábuas dum palco é rei, é tudo o que ele sonha ser (…), é imperador, sendo um pobre de Cristo”, talvez um pouco como foi o trajecto de Bocage no palco da vida, apresentado como valor seguro e superior – “Os mecenas matam a fome aos poetas, mas não lhes dão talento”, diz uma personagem (a 6ª Máscara) a dada altura, tentando aliviar o juízo de ingratidão que de Bocage estava ser dado.
Esta peça de Romeu Correia só teve estreia em palco cinco anos depois da sua publicação, em iniciativa do Grupo de Teatro do Instituto Comercial do Porto, no Teatro Sá da Bandeira. Em 1978, mereceu nova edição em livro (Lisboa: Ed. Maria da Fonte). Pouco mais de quatro décadas volvidas sobre o seu nascimento, este Bocage bem merecia a reedição, assim como justificava a sua apresentação no sítio que mais vida lhe daria – o palco.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Investigações à solta

O caso do dia foi a investigação (?) feita e divulgada hoje pelo Diário de Notícias à maneira como chegou a jornalistas do Público a história das possíveis escutas ou vigilâncias na Presidência da República. A gente ouve e não acredita. Tudo isto parece a história da pescadinha de rabo na boca, a acabar por se comer a si própria...
As ligações intensas entre a política e o jornalismo já não são novidade, claro. Agora, foram comprovadas com os números: em Portugal, apenas um terço da informação publicada na imprensa resulta de investigação dos respectivos media; o restante deriva da máquina montada por assessores, informação institucional, gabinetes de imprensa, etc. Ou seja: a gente vai sendo informada à medida e sobre o que alguém quer que sejamos informados.
Com o caso de hoje, inebria-se a investigação. Ainda não sabemos se por boas ou por más razões. Mas não deixa de ser paradoxal que sejam os jornalistas a estar no centro do caso. Ou, se preferirmos, é o jornalismo que se tem feito que está, de certa forma, a ser questionado. O que vai restar?

Política caseira (82): CDU de Setúbal em campanha

O Setubalense: 18.Setembro.2009

Política caseira (81): Teresa Almeida (PS) vira-se para a juventude e socialistas apresentam candidatos a Juntas

O Setubalense: 18.Setembro.2009

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Rostos (129)

Monumento às Feiras Novas e ao Folclore, de Salvador Vieira, em Ponte de Lima (colaboração de Quaresma Rosa)

terça-feira, 15 de setembro de 2009

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Bocage à vista (69) no seu mês - 3ª série

Bocage visto por António Carneiro (1917)

O que quer dizer a palavra "novo" quando se refere a um outro governo? É sublime o poder da língua!...

A notícia é do Diário Digital e diz:
«Sócrates recusa interpretação que mudará todos os ministros - O secretário-geral do PS frisou hoje que um Governo saído de um acto eleitoral é sempre novo, inclusivamente com um novo primeiro-ministro, e recusou a interpretação de que, se vencer as eleições, mudará todos os ministros.
À chegada à freguesia de Arronches, o secretário-geral do PS foi confrontado pelos jornalistas com declarações que proferira na véspera, após o debate com a presidente do PSD, Manuela Ferreira Leite, na SIC, segundo as quais mudaria todos os membros do actual executivo se voltar a formar Governo.
Sócrates, no entanto, rejeitou essa interpretação e falou directamente aos jornalistas: "vocês sabem o que quis dizer".
»
Bem queria parecer que aquela saída no frente-a-frente da SIC (novo Governo, novos ministros) era uma mensagem codificada! Mas nem todos tinham a chave do código, afinal! É que o Correio da Manhã de ontem trazia para título de primeira página algo como "Sócrates despede Ministros no debate". Será que houve esquecimento no fornecimento da "chave"?

domingo, 13 de setembro de 2009

Bocage à vista (68) no seu mês - 3ª série

Bocage, em painel de azulejo, na Escola Básica 2, 3 de Bocage, em Setúbal

Depois do frente-a-frente tão esperado...

O frente-a-frente que a SIC transmitiu na noite de ontem entre Manuela Ferreira Leite e José Sócrates confirmou dos dois políticos a ideia que já havia deles. Não trouxe, portanto, nada de novo. Mas serviu para lembrar as diferenças. E, agora, com a campanha eleitoral a começar hoje, não sei se haverá algo a transmitir aos eleitores que eles não saibam já.
O estilo de Ferreira Leite poderá ser austero, mas não é alterável; o de Sócrates poderá ser alegadamente moderno, mas tem tido tantas alterações (e é tão frágil no plano das convicções) que resta saber em que é que se deve acreditar. Não me comove esta faceta de serenidade que Sócrates tem estado a apresentar ao país depois dos resultados das eleições europeias, marcados que estamos pelo feitio que o próprio apresentou ao longo do mandato. Bem podem as assessorias e as técnicas da comunicação levar Sócrates a dar uma diferente imagem, mas à superfície vem sempre o que é genuíno. Ontem, quis substituir a jornalista e interrogar Ferreira Leite sobre as portagens, chegando a dizer que ia ele mesmo responder à pergunta em vez de Ferreira Leite, táctica de menosprezo e de ataque imediato ao adversário. Ontem, também, Sócrates quis dar a entender que era o PSD que estava a ser julgado; não era de julgamento que se tratava; mas, se fosse, o objecto lógico do julgamento seria a política socialista deste mandato. Ontem, também, quis pôr em causa os critérios que levaram à escolha de João Jardim para candidato a deputado (e valeria a pena questionar sobre a cobertura que o PSD dá a Alberto João Jardim), mas as premissas estavam erradas. E, finalmente, a equipa ministerial, no caso de Sócrates ganhar, já sabe uma coisa: não será reconduzida (assim o deixou esclarecido quando disse que o novo governo terá novos ministros). O único a continuar no Governo, no caso de o PS vencer, será então Sócrates, ele mesmo. Vá lá saber-se o porquê desta insistência…

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Bocage à vista (66) no seu mês - 3ª série

Bocage, na frente de uma nota de 100$00 (maqueta de João de Sousa Araújo)

Entre Dezembro de 1980 e Outubro de 1987, o Banco de Portugal emitiu a Chapa 8 das notas de 100$00 (equivalente aos 0,50 € de agora), em cuja frente se reproduzia a figura de Bocage que nos foi legada no quadro de Henrique José da Silva. O verso desta nota era ocupado por uma gravura com "o Rossio nos princípios do século XIX", aquele Rossio que Bocage terá conhecido. A nota teve maqueta de João de Sousa Araújo, foi impressa em Inglaterra (Bradbury, Wilkinson & Co, Ltd) e foi retirada de circulação em finais de Maio de 1990.

Política caseira (76): Teresa Almeida (PS) quer ligação com o Sado

O Setubalense: 11.Setembro.2009

Política caseira (75): PSD na freguesia de Gâmbia, Pontes e Alto da Guerra

O Setubalense: 11.Setembro.2009

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Bocage à vista (65) no seu mês - 3ª série

Bocage, em pastelaria na Moita (colaboração de Quaresma Rosa)

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Bocage à vista (63) no seu mês - 3ª série

Bocage, por Charles Legrand (meados do século XIX)

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

A verdade é colorida?

É curioso que sejam os partidos políticos, em campanha eleitoral, a vir reclamar a verdade. Não porque a isso não tenham direito, mas porque quem a devia exigir eram os cidadãos que têm sido governados e legislados por esses mesmos partidos políticos. A gente ouve e espanta-se: à direita e à esquerda, é erguida a bandeira da verdade; à direita e à esquerda, a mesma verdade nem sempre é mostrada. O próprio José Sócrates, Secretário-Geral do Partido Socialista e Primeiro-Ministro, respondendo ao slogan sobre a verdade dos sociais-democratas, afirmou recentemente que ninguém tem a patente ou o exclusivo da verdade e, há dias, interrogado sobre o caso TVI-Moura Guedes, dava a entender que era necessário que as pessoas acreditassem nele, que não tivera nada a ver com a decisão vivida no canal televisivo... E damos por nós com os partidos políticos na discussão de uma questão filosófica como o é a da verdade... depois de, em sessões parlamentares, termos ouvido discursos em que uns apelidavam outros de "mentirosos" ou, de forma mais politicamente correcta ou mais metafórica (mas nem por isso menos directa), criticando o outro porque "estava a fugir à verdade" ou porque o que o outro dizia não era verdade!
Não ignoramos que a ética na política deveria constituir acção de formação obrigatória (e contínua) para quem nela está. Talvez desssa forma não andassem todos a reclamar a verdade, uma verdade que, afinal, continua a ser pintada com as cores de quem a exige... E quanto mais o cidadão ouve mais fica a pensar que a verdade é necessária, mas que a verdade é outra coisa, que não tem cor, que é transparente. No fundo, talvez o sr. Gilson tivesse razão quando disse: "não é difícil encontrar a verdade; o difícil é, uma vez encontrada, não fugir dela"... No entanto, é pena que assim seja!

Bocage à vista (62) no seu mês - 3ª série


Capa do dvd do filme Bocage - O triunfo do amor, de 1997, realizado por Djalma Limongi Batista, interpretado por nomes como Victor Wagner (Bocage), Viétia Zangrandi (Manteigui), Majô de Castro (Alzira), Francisco Farinelli (Josino) e Eugénia Melo e Castro (Liberdade), entre outros.

Política caseira (72): MRPP e MPT perfilam-se também para a Câmara de Setúbal

O Setubalense: 07.Setembro.2009.

domingo, 6 de setembro de 2009

Bocage à vista (61) no seu mês - 3ª série

Bocage, desenhado por Roberto Nobre (Revista Turismo, nº 59, Agosto-Setembro.1944)

"A Ministra", de Miguel Real

“A personagem de A Ministra só existe no plano da ficção. Transfigurá-la da ficção para a realidade e alojá-la em tal ou tal pessoa é um exercício permitido pela imaginação. Porém, esse exercício, de que só leitor será responsável, nada acrescenta à ficção. A intenção do autor foi – exclusivamente – a de desenhar ficcionalmente, como tipo literário geral, uma mulher feia, triste e de existência infeliz, e, por isso, autoritária e severa, antes de mais consigo própria, uma mulher que nunca conheceu o amor.”
Esta não é a primeira advertência que aparece em A Ministra, de Miguel Real (Matosinhos: Quid Novi, 2009), mas é elementar: a eventual colagem da história a uma personalidade conhecida na vida política portuguesa recente tem responsabilidade declinada no leitor. A alicerçar esta explicação, já antes fora dito que este é o terceiro título de uma tetralogia de novelas dedicadas à mulher, em que a personagem é caracterizada como “mulher maquiavélica, calculista, feia e má, que reduz a realidade ao cálculo dos seus interesses.”
Queiramos ou não, a chegada da ministra, ou da mulher que vai fazer correr esta história, está já marcada por este retrato previamente traçado. A narrativa, na primeira pessoa, acontece nas vésperas do Natal, depois de um telefonema que a narradora, e também protagonista, reconhece ter sido perturbador – “veio alterar radicalmente a minha vida, força-me a expor-me publicamente”. No entanto, decalcando observação do filho, “não fosse este telefonema salvador e este Natal seria o mais triste da minha vida”, comenta a narradora.
E o leitor vai conhecendo a história de uma mulher que, de infância sofrida, subiu na vida, não olhando a meios. Professora universitária, depois de ter leccionado no ensino secundário durante dois anos, tentou ultrapassar tudo e todos para construir uma carreira, se bem que confesse ter consciência do contributo quase nulo que prestou: “Nunca possuí uma ideia original, nem nunca dei uma aula original, saco as ideias de relatórios europeus e, trabalhando as estatísticas, apresento-as como próprias”. A questão das estatísticas, dos números trabalhados, vai, de resto, ser afirmação muito presente na história, pormenor que acompanhará a personagem até final, de forma quase obsessiva – a dois passos de dar a resposta definitiva ao convite que lhe fora formulado para ser ministra, pensa: “saiba eu conquistar o povo estúpido para o meu lado, manipular números com argúcia já sei, terei agora de aprender a manipular multidões”.
Nesta narrativa, um quase total monólogo, a personagem dá-se a conhecer pelos seus actos, mas também pelo retrato que de si mesmo traça: “sei de onde me vem este meu feitio desconfiado, casmurro e autoritário (…), foi algo que nasceu comigo, este génio teimoso e intolerante, esta necessidade de ser superior aos outros, de os manipular e humilhar”. Bem perto do final, o retrato surge cada vez mais cru e a ameaçar o que pode vir a ser a prática futura da personagem, evidenciando as intenções que a animam – “Farei agora com quem me convidou para o novo cargo o que fiz então com o meu ex-marido, tornar-me-ei, como pessoa, necessária e insubstituível e precioso o meu trabalho, de modo que todos vejam e sintam que possuo tanta vontade e saber que posso substituir com proveito aquele que ora me convida, como aconteceu com o meu ex-marido, quem sabe se não será este o meu destino nos próximos cinco, dez anos, substituir aquele que me convidou, tomando-lhe o lugar”. Encenação total, pensada, amadurecida, em dois dias de recordação do passado (o tempo que dura a história) e de ânsia na resposta a dar, em que a personagem se (re)conhece e se representa: “Aproxima-se do espelho e encena o telefonema que fará no dia seguinte: ‘Sim, senhor Primeiro-Ministro, muito me honra o convite de V. Exa. A seu lado, sob as suas ordens, terei o privilégio de ser Ministra da Educação.’”
O que a personagem não sabia, porque isso lhe escapou durante toda a história, era que do outro lado (do telefone e das decisões) havia também outra personagem com o seu feitio e com o seu trajecto. Páginas antes, esta mulher observara sobre quem a convidou, no caso o Primeiro-Ministro: “não foi o saber nem o mérito que o puseram naquele alto lugar, bem pelo contrário, é o Chico Esperto da turma, foi a sorte, o acaso, o seu antecessor mostrara-se tão trapalhão que todos quiseram ver-se livre dele, elegendo um janota para o seu lugar, que se agarrou a duas ou três palavras de ordem e as cumpre com um grau de obstinação autoritária semelhante ao meu”. Este retrato, que termina com a aproximação das duas personagens – a que convidou e a que foi convidada – decide também o fim da história. E a obstinada candidata a ministra sofre o desfecho mais violento, com os motivos mais fúteis (mas eficazes no quadro social traçado), que lhe podia acontecer e que não esperava. E o romance fecha-se.
A Ministra é um bom exercício. De escrita, em primeiro lugar, em que uma personagem ocupa o palco do livro sozinha, na totalidade da história, num discurso na primeira pessoa, a mostrar o fel que a constrói e a consome, num percurso de construção de personagem até ao limite. De crítica, num tempo em que nem sempre são claros os valores de uma sociedade e em que a perversidade se (tra)veste da mais eficaz competência. De imaginação, não porque seja mais importante colar esta ou outra personagem a esta ou outra figura, mas porque denuncia o tom gratuito de muito discurso com que vamos convivendo. De reflexão, porque, em paralelo, existem também os poemas que abrem e fecham o livro, ambos de Alexandre O’Neill, ambos sobre o medo, a provarem que os anti-heróis são, muitas vezes, os que determinam as histórias, por mais maquiavelismo que exista.

sábado, 5 de setembro de 2009

Bocage à vista (60) no seu mês - 3ª série

Barco com paixão bocagiana, em Setúbal [colaboração de Quaresma Rosa]

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Setúbal não atribui medalhas no seu feriado por se estar em período eleitoral

A Câmara de Setúbal deciciu não atribuir medalhas de mérito no dia 15 de Setembro (feriado municipal) por se estar em período de campanha eleitoral, conforme noticiou O Setubalense de hoje, argumentando que já o mesmo aconteceu há quatro anos.
Recordo-me do que sucedeu no ano passado, em que três cidadãos viram rejeitada tal atribuição em sessão pública de Câmara, acto nada simpático uma vez que nenhum dos cidadãos tinha pedido condecoração. A questão é: ou o executivo autárquico se entende quanto ao mérito ou não, ou há figuras e colectividades com mérito assinalável no concelho ou não há. Favores, isso não!
É, aliás, por causa dos "favores" envolvidos em muita medalha que o próprio mérito anda, depois, de rastos, levando muitas pessoas e entidades a pensar que... medalhas assim, não!
Ora, a decisão da Câmara setubalense para este ano não faz sentido. Melhor: demonstra que a lógica do mérito não é clara. Se houve cidadãos ou instituições meritórias no concelho, o que tem isso a ver com a campanha eleitoral autárquica?
Percebo que seja difícil "arranjar" uma lista de cidadãos ou de instituições com actividades de mérito todos os anos, sobretudo quando ela é longa. Percebo. Mas fico decepcionado com esta dependência do reconhecimento do mérito do facto de haver ou não haver eleições... Ou será que, em ano de eleições, os únicos a terem direito a ver o mérito reconhecido (ou não) são os autarcas?
Seria bom que os vários elementos do executivo camarário se entendessem quanto a esta questão. Caso contrário, o mérito, que devia ser considerado, passa a ser muito negativo...

Bocage à vista (59) no seu mês - 3ª série

Farmácia "Bocagiana", em Setúbal