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quinta-feira, 25 de junho de 2009

Escola e partidos políticos: um bom desafio, na verdade! Sigam-no, por favor!

«1.A saga da maior manifestação de sempre que fora precedida dessa história interminável sobre a reforma do ensino foi interrompida por breves momentos por causa dos exames - eis o resumo do ano lectivo que agora finda. Chegados a Junho, finalmente falou-se de alunos, não porque tenham batido em professores ou sido espancados por colegas. E desta vez falou-se também de conteúdos e de testes sem nos estarmos a referir ao programa da Educação Sexual e aos testes à sida que o IPJ pretende efectuar nas escolas, com um voluntarismo que faz falta nas matemáticas.
O caso é tão raro que merece ser assinalado. E é assombroso o que se conclui desta espécie de movimento de rotação a que os exames obrigam as escolas. Por exemplo, na prova do 12.º Ano de Literatura Portuguesa existe um pequeno glossário que dá aos alunos significados para palavras que constam no texto. E, assim, para alunos de Literatura Portuguesa, com 17 ou mais anos, dão os seguintes significados: acabrunhado: desolado; calabouço: cela ou compartimento prisional num posto de polícia; logro: engano; se espojava: se rebolava no chão. Isto, que está ao nível do 4.º ano de escolaridade, infelizmente está longe de ser uma excepção.
Nestes exames, alguém anda a fazer batota e desta vez não são os alunos. O que se está a ensinar? É suposto que se exija cada vez menos? Para que serve o GAVE, o gabinete do Ministério da Educação que tem a seu cargo a realização destas provas?
O Ministério da Educação é uma gigantesca máquina de colocar e administrar pessoal. Os conteú-dos e as técnicas de ensino estão absolutamente relegados da discussão e daquilo em que se ocupam. Mas, tal como a Terra se movia, apesar de alguns serem obrigados a afirmar o contrário, também a escola existe para lá das lutas entre os funcionários da 5 de Outubro e os das escolas.
Parafraseando o glossário da prova, o que se avista é mais ou menos um logro. É urgente que, na próxima campanha eleitoral, os partidos deixem de fazer declarações de amor à escola e definam muito claramente o que pensam sobre os conteúdos, a credibilidade do sistema de avaliação dos alunos, se estão ou não dispostos a ponderar o cheque-ensino e claro que também o estatuto dos professores. Mas outro ano com os alunos a servirem de quorum para a conflitualidade entre o Ministério da Educação e os seus funcionários é que não.»
Helena Matos. "Palavras difíceis". Público: 25.Junho.2009 (destaques meus)

quinta-feira, 11 de junho de 2009

A publicidade e a propaganda não garantem um prazo de validade ilimitado e na política também há coisas efémeras

Começou a queda da casa de Sócrates
«João Cravinho deu o tiro de partida: "o efeito Sócrates só por si já não chega". E de Santarém chegaram-nos imagens de um primeiro-ministro que sabe que a corrida já começou. Nem sequer é a corrida ao seu lugar. O que sempre seria um combate aberto. É sim este desmarcar-se. As derrotas nunca são bonitas de se ver e são ainda mais penosas as derrotas de um líder que em vez de apoiantes tem dependentes.
O PS nunca apoiou Sócrates por aquilo que ele pensava ou defendia, mas sim porque ele lhes garantiu o poder. Sócrates não é para o PS um líder. Como diz Cravinho, Sócrates é um efeito. Um efeito que, valha a verdade, deu uma maioria absoluta ao PS. Mas, sem poder, Sócrates não tem qualquer préstimo para os socialistas - não tem o mundo internacional de Soares e dificilmente lhes pode trazer o prestígio da colocação numa agência internacional como aconteceu com Sampaio e Guterres. O PS está disposto a fechar os olhos a todos os equívocos de Sócrates enquanto existir poder. Assim que o poder se acabar, os socialistas serão os mais violentos nas críticas a tudo aquilo que até agora fizeram de conta que não viram. Sem poder, Sócrates é um embaraço. Por isso, ao primeiro sinal de que o efeito Sócrates se estava a extinguir, as cadeiras do Altis ficaram vazias.
Desconheço que explicações deram ao líder do PS para o desastre dessa noite os muito celebrados especialistas em marketing político que terá contratado e que lhe têm sabido encher os pavilhões dos comícios e escolher o enquadramento em que deve surgir. Mas que muito provavelmente contribuíram para acentuar o seu afastamento das bases do partido e sobretudo para o tornar cada vez mais dependente dessa mesma máquina de propaganda. Durante algum tempo resultou, mas progressivamente o primeiro-ministro foi ficando em delay com o país. Tal como numa novela mexicana, em que os movimentos dos lábios não coincidem com as frases que ouvimos, também o país em que vivemos não coincide com o país de que fala José Sócrates.
Esta captura do discurso político pelos especialistas do marketing levou a este desacerto entre o país real e o país do discurso governamental. Mas não só. Mais do que falar do país, dos seus problemas e discutir seriamente as soluções que propõe, José Sócrates passa de sessões de anúncio para sessões de anúncio, invariavelmente abrilhantadas com figurantes, e fala obsessivamente de notícias, jornalistas, directores de jornais... como se o seu mundo não fosse mais do que isso: ser um efeito. Mas agora que já se ouve que o "efeito Sócrates só por si já não chega" talvez seja o momento para que no Largo do Rato se passe para part time a agência de comunicação e se arranje tempo para ouvir os políticos.»
Helena Matos. "Começou a queda da casa de Sócrates". Público: 11.Junho.2009.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Saúde na escola?

Helena Matos, no artigo "Lista de assuntos a discutir com paixão" saído no Público de hoje, sugere quatro temas para discussão, habituados que andamos a acaloradas discussões, apesar do frio, sobre assuntos da maior importância, correndo mesmo o risco de cairmos no rol dos "obscuros" se nesta discussão não participarmos... Humor, eu sei, que brinca com esta herança dualista de termos que ser uma coisa ou outra, isto é... progressistas ou reaccionários! Onde e há quanto tempo a gente já ouviu isto?
Que podemos então discutir, discutir, discutir? Segundo Helena Matos, o casamento entre pessoas do mesmo sexo, os direitos dos animais, a educação sexual nas escolas e a eutanásia. Tudo, tudinho, temas de suma importância para uma visão pessoal da vida, já sabemos.
Vou deixar três deles para essa discussão a vir ou que já vai andando por aí. Vou chamar para aqui, transcrevendo, aquilo que Helena Matos diz sobre a educação sexual nas escolas, uma coisa que deveria passar por cuidados mais evidentes na área da saúde, por exemplo, na educação para a saúde, com técnicos nas escolas para resposta. Recordo-me de, numa das escolas em que estudei e onde fiz o meu ensino secundário, haver o gabinete médico e de, de vez em quando, haver lá um técnico, provavelmente médico (não lembro bem), para responder ou aconselhar; recordo-me também de uma escola inaugurada há poucos anos, construída de raiz segundo um projecto que contemplava um gabinete médico, cujo Presidente da Comissão Instaladora da altura se teve que impor por ter recebido indicações no sentido de ocupar aquele gabinete para um outro fim, algo parecido com espaço de arrumações... A questão é que a saúde na escola - chamem-lhe educação para a saúde ou saúde escolar ou outra coisa qualquer - não tem sido muito contemplada, apesar de todos os problemas que esta civilização, por que também somos responsáveis, tem criado à saúde.
Vem isto a propósito do comentário de Helena Matos sobre educação sexual nas escolas, que faz todo o sentido e que, por essa razão, aqui reproduzo.
«(...) Os professores efectivos reformam-se em catadupa; começam-se reformas curriculares como a da Língua Portuguesa que ninguém sabe em quê e onde pára; a violência banalizou-se e chama-se agora a polícia para impor a crianças aquele mínimo de ordem que os professores e funcionários já não conseguem, não podem e também desistiram de tentar que exista nos estabelecimentos escolares; as alterações ao estatuto dos professores levaram a uma situação de bloqueio... mas nós, portugueses, se esta lista-propaganda funcionar, vamos discutir nos próximos meses, graças aos bons ofícios da JS, algo de tão importante e crucial quanto a educação sexual nas escolas. E como o que tem de ser tem muita força e a propaganda ainda mais força tem, será importante começarmos por perceber o que se entende por educação sexual nas escolas. Até agora tem vigorado nesta área uma perspectiva muito "Ciências da Natureza/funcionamento do corpo humano" que não satisfaz a JS e sobretudo aqueles que, através desta temática, pretendem fazer proselitismo ideológico nas escolas, tanto mais que se prevê que estes conteúdos passem a ser ministrados por membros de organizações não-governamentais que certamente da Opus Dei à Maçonaria se farão representar. Como é óbvio, não cabe no espírito libertador da JS que os cidadãos tenham outras opiniões sobre aquilo que realmente precisam na escola. Por exemplo, que achem que a Educação Sexual é um dos vários assuntos que os alunos poderiam ver abordados de forma muito mais eficaz por técnicos nos infelizmente desactivados gabinetes médicos das escolas. A população adolescente, que já não vai ao pediatra e ainda não vai ao médico de família, acaba por ter pouco acompanhamento clínico. Seria excelente integrar na rotina das escolas gabinetes com técnicos de saúde - e não activistas de ONG regra geral tão activos quanto incultos - onde os alunos, além de informações sobre planeamento familiar, doenças sexualmente transmissíveis e outras questões da sexualidade, pudessem também ser acompanhados de modo a detectarem-se distúrbios alimentares, problemas de crescimento, má audição ou os casos de abusos e maus tratos. Claro que nada disto em termos de propaganda rende o material telegénico de um Dia da Educação Sexual por período, como propõe a JS, mas como são os contribuintes que vão pagar tanto activismo, terá a JS de aceitar que alguns de nós tenhamos dificuldades em passar cheques em branco. (...)»

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Como o prémio de Cristiano Ronaldo nos faz lembrar a "escola inclusiva"...

Há dias, houve grande regozijo generalizado com o facto de Cristiano Ronaldo ter sido eleito o melhor jogador de futebol do mundo. E não se pode dizer que o motivo não justifique tal regozijo! Podemos mesmo acrescentar, em nome da lusofonia e do que une os falantes da língua portuguesa, que o regozijo deveria ainda ter sido maior porque a melhor jogadora de futebol do mundo, Marta, comunica também na nossa língua. E Pélé, outro falante de português (apesar de ter discursado em inglês) e jogador famoso, entrou também na equipa de palco na cerimónia de entrega dos galardões. A lusofonia tem, assim, razões para se sentir bem. Nós temos razões para sentir orgulho, pois, sem que isso signifique criação de mitos. Por outro lado, esta situação, que despoleta em muitos jovens a vontade de imitar Cristiano Ronaldo (conhecemos estas tendências de imitação associadas a desejo de sucesso e de possibilidade de se ser herói), pode merecer uma série de leituras, talvez todas úteis, talvez todas para nos provocarem o pensar. É o caso da opinião de Helena Matos, saída no Público de hoje – a gente lê e não pode ficar indiferente. O prémio atribuído a Cristiano Ronaldo não nos pode causar apenas orgulho e alegria; também tem que nos fazer pensar. Reproduzo desse texto a parte final, muito válida pela ligação à ideia da “escola inclusiva”…
«(…) O falhanço de todas as incensadas políticas em favor de uma "escola inclusiva", "que promova a igualdade", "que não seja para ricos"... não só criou assimetrias sociais tremendas como, por grotesca ironia, converteu os filhos dos pobres no bode expiatório do falhanço ideológico e profissional daqueles que construíram confortáveis carreiras na política e na administração sob o lema do combate à pobreza e à discriminação. Que em qualquer actividade uns são melhores do que os outros é algo que o próprio Ronaldo mostra à exaustão, mas que a nossa escola dita inclusiva demorou a assumir (sendo certo que no dia em que tal assumiu adoptou como doutrina a tese de que os filhos dos pobres nivelam por baixo). Desgraçadamente, não só este determinismo social se instituiu na escola portuguesa - e recordo que nem sempre assim foi - como vemos banalizar-se também um discurso igualmente vexatório para os mais pobres quando se associam baixos rendimentos e desemprego com aumento da criminalidade. Confrontado com um problema de violência nas escolas, o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Noronha de Nascimento, explicou o fenómeno acusando os desempregados ou quiçá os seus filhos: "Se há gente a mais no litoral, se não há emprego, se fecha a indústria, o que é que a gente nova vai fazer? Estamos a falar de gente nova, porque não são as pessoas de 50 ou 60 anos que estão a criar problemas. O que vão fazer as pessoas que estão a começar a vida? (...) A escola é um reflexo disto". E o próprio procurador-geral da República, Pinto Monteiro, entendeu por bem avisar-nos de que o desemprego e a exclusão social podem motivar neste ano de 2009 uma verdadeira "explosão de violência".
Por outras palavras, caso Ronaldo não tivesse optado pelo futebol, e a fazer fé nas profecias sociológicas vigentes, não só teria deixado a escola cumprindo o que dele se esperava - ou seja, nada - como os seus baixos rendimentos levariam a que também, segundo as mesmas doutrinas, pudesse vir a integrar os números da delinquência violenta, aquela que se estima venha a aumentar por causa da crise e do desemprego.
Numa sociedade que passa a vida a vasculhar sinais de discriminação, não encontro nada mais discriminatório do que estas teses aparentemente consensuais da nossa Justiça e Educação. Tal como também não consegui encontrar até agora qualquer notícia sobre assaltantes e outros criminosos mais ou menos violentos que se tenham dedicado a essas práticas por terem ficado desempregados.
Ao contrário do que se gosta de acreditar, os pobres raramente se revoltam. O mais que se consegue é que ocupem o seu lugar mais ou menos folclórico em revoltas que outros, mais abonados, lideram e arquitectam. Quanto a dizer em Portugal, no ano de 2009, que a criminalidade nasce da pobreza parece-me um óbvio insulto àqueles que todos os dias saem de casa para receberem ordenados baixíssimos e terem uma vida muito mais massacrada pelo Estado com taxas, contribuições, multas e demais imposições do que aqueles seus vizinhos que se dedicam ao crime.
Por tudo isso, honra seja feita ao mundo do futebol e doutras modalidades desportivas que, ao contrário da Escola e da Justiça, manda os fatalismos sociológicos às malvas e faz milhares de miúdos acreditar que podem ser os melhores do mundo. E sobretudo que não se chega ao topo por passagem administrativa e muita caridadezinha.
»
Helena Matos. “E se o Ronaldo não jogasse futebol?”. Público: 15.01.2009.