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quinta-feira, 16 de setembro de 2010

sábado, 24 de outubro de 2009

Não havia necessidade...

... de, num dia, ser motivo de primeira página em jornais, ao dizer que não recebera convite do Primeiro-Ministro para ser ministra (quando, há muito, se falava do seu nome para ocupar a pasta da Educação), e, no dia seguinte, o seu nome aparecer como titular da pasta da Educação, integrando o governo proposto pelo mesmo Primeiro-Ministro!

terça-feira, 1 de setembro de 2009

"C'est la guerre!..."

O Diário Económico de ontem publicou entrevista com Maria de Lurdes Rodrigues, Ministra da Educação, chamando para destaque na primeira página uma sua frase - "Paz com os professores vai sair muito cara ao país..."
Não li a entrevista. Espanta-me o mal-estar de Maria de Lurdes Rodrigues, sobretudo com os professores, e não me espanta menos que o jornal arranque para primeira página uma citação deste calibre. É uma citação infeliz, de resto, ainda para mais quando o ano escolar estava para começar (iniciou-se hoje). É uma saída infeliz porque demonstra o que foi o relacionamento com os professores produzido por esta equipa governativa, talvez mesmo o que foi o relacionamento com muitos sectores sociais - José Sócrates, na tomada de posse como Primeiro-Ministro, também abriu guerra com outros sectores, de resto... É pena que, em final de mandato e em início de ano escolar, Maria de Lurdes Rodrigues assuma as coisas desta forma.
Pela minha parte, que sou professor (e gosto de o ser), a minha paz não está à venda, em primeiro lugar. Em segundo lugar: sou a favor da avaliação de professores, mas não sou adepto de que um fim seja justificado por quaisquer meios. E, já agora, porque essa é a questão, seria bom que todos os partidos que se perfilam para a Assembleia da República dissessem, em concreto, o que pensam quanto à avaliação docente, sem se limitarem a dizer que este modelo não serve, porque a ideia que me tem saltado é a de que prometem suspender o que está, prometem novo modelo de avaliação, mas não dizem qual nem como funcionará...
Uma explicação quanto ao título deste postal: ao longo da 1ª Guerra Mundial, a expressão "c'est la guerre!..." era usada para justificar todas as ausências e todas as impossibilidades ocasionadas pela guerra; por arrastamento, passou a servir também para justificar aquilo que não tinha justificação imediata, mas que a guerra, que tinha costas largas, podia cobrir. Os portugueses que andaram pela Flandres ouviram, registaram e trouxeram. Obviamente, a guerra não devia justificar tudo. E a política também não...

sábado, 18 de julho de 2009

Avaliação de professores, OCDE e coisas vindas a público

Segundo o jornal Público, um relatório da OCDE tece vários comentários ao modelo de Avaliação de Desempenho Docente criado por este governo, considerado como "uma base sólida para futuros desenvolvimentos" a carecer de ajustamentos. E transcrevo do jornal:
«Em concreto, a OCDE constatou a necessidade de "aligeirar o modelo" ("em particular através da redução da frequência dos momentos de avaliação e da simplificação dos critérios e instrumentos"); de incluir uma componente externa na avaliação; e ainda de "estabelecer critérios e indicadores padronizados ao nível nacional", isto para "reforçar a equidade das avaliações dos professores em todas as escolas".
Os autores do relatório admitem que muitas das propostas feitas "levariam pelo menos dois anos para serem concretizáveis" e defendem que, para o Governo, "a tarefa mais premente é planear e calendarizar o processo de ajustamentos".
Sublinham, ainda, que "para uma reforma bem-sucedida é necessário o envolvimento e a motivação dos professores". "Uma avaliação de professores com consequências e a prestação de feedback, a reflexão e o desenvolvimento profissional subsequentes só acontecerão se os professores se sentirem motivados para fazerem o processo funcionar", escrevem os peritos, que consideram "essencial encontrar formas" de fazer com que os docentes "se identifiquem com os objectivos e os valores dos processos e práticas de avaliação".»

Entretanto, o Ministério da Educação entende que a designada versão “simplex” do modelo que criou deve continuar “por tempo indeterminado”. Mas, neste período indefinido, são elucidativas as palavras do Secretário de Estado que o Público reproduz: «Já Jorge Pedreira, secretário de Estado adjunto e da Educação, admitiu que no próximo ciclo de avaliação (os professores são avaliados a cada dois anos e só assim progridem na carreira), que se inicia em Setembro e se prolonga até 2012, pode começar com o modelo Simplex e terminar com outro.»
Estas coerências prometem. Fica-se sem perceber se, de facto, um dos erros que o Primeiro-Ministro admitiu ter existido nesta governação foi a forma como este modelo foi concebido, instalado e apresentado aos professores e à sociedade. Fica-se sem perceber se, de facto, as recomendações da OCDE são para valer ou não. Uma coisa se percebe: era necessário ter-se chegado até aqui, sobretudo depois de tanta gente ter dito o que a OCDE veio dizer? Foi. Infelizmente, porque o diálogo foi coisa que não existiu. Mas também parece que não houve aprendizagem nenhuma…

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Exames do Ensino Secundário: o rol dos "culpados"

«"Menos investimento, menos trabalho e menos estudo" do lado dos alunos, comentou a ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues,a propósito dos resultados no exame de Matemática A, realizado por 38.303 estudantes. A média dos alunos internos (os que frequentam as aulas todo o ano lectivo, que são a maioria) desceu de 14 para 11,7 e a percentagem de retenções mais do que duplicou (de sete para 15 por cento), o que, segundo a ministra, se deve à difusão, pela comunicação social, "da ideia de que os exames eram fáceis". Em conferência de imprensa, o secretário de Estado Valter Lemos alargou o leque de responsáveis, juntando a Sociedade Portuguesa de Matemática e "partidos e pessoas com responsabilidades políticas". "É um desincentivo ao estudo e ao trabalho", sublinhou.»
Público: 08.Julho.2009

domingo, 24 de maio de 2009

António Barreto faz o balanço de um ano lectivo da escola

Aplicadores
«A publicação, pelo Ministério da Educação, do Manual de Aplicadores não passou despercebida. Vários comentadores se referiram já a essa tão insigne peça de gestão escolar e de fino sentido pedagógico. Trata-se de um compêndio de regras que os professores devem aplicar nas salas onde se desenrolam as provas de aferição de Português e Matemática. Mais precisos e pormenorizados do que o manual de instruções de uma máquina de lavar a roupa. Mais rígidos do que o regimento de disciplina militar, estes manuais não são novidade. Podem consultar-se os dos últimos quatro anos. São essencialmente iguais e revelam a mesma paranóia controladora: a pretensão de regulamentar minuciosamente o que se diz e faz na sala durante as provas.
Alguns exemplos denotam a qualidade deste manual: "Não procure decorar as instruções ou interpretá-las, mas antes lê-las exactamente como lhe são apresentadas ao longo deste manual." "Continue a leitura em voz alta: Passo agora a ler os cuidados a terem ao longo da prova. (...) Estou a ser claro(a)? Querem fazer alguma pergunta?" "Leia em voz alta: Agora vou distribuir as provas. Deixem as provas com as capas para baixo, até que eu diga que as voltem." "Leia em voz alta: A primeira parte da prova termina quando encontrarem uma página a dizer PÁRA AQUI! Quando chegarem a esta página, não podem voltar a folha; durante a segunda parte, não podem responder a perguntas a que não responderam na primeira parte. Querem perguntar alguma coisa? Fui claro(a)?" Além destas preciosas recomendações, há dezenas de observações repetidas sobre os apara-lápis, as canetas, o papel de rascunho, as janelas e as portas da sala. Tal como um GPS ("Saia na saída"), o manual do aplicador não se esquece de recomendar ao professor que leia em voz alta: "Escrevam o vosso nome no espaço dedicado ao nome." Finalmente: "Mande sair os alunos, lendo em voz alta: Podem sair. Obrigado(a) pela vossa colaboração"!
A leitura destes manuais não deixa espaço para muitas conclusões. Talvez só duas. A primeira: os professores são atrasados mentais e incompetentes. Por isso deve o esclarecido ministério prever todos os passos, escrever o guião do que se diz, reduzir a zero quaisquer iniciativas dos professores, normalizar os procedimentos e evitar que profissionais tão incapazes tenham ideias. A segunda: a linha geral do ministério, a sua política e a sua estratégia estão inteiras e explícitas nestes manuais. Trata os professores como se fossem imaturos e aldrabões. Pretende reduzi-los a agentes automáticos. Não admite a autonomia. Abomina a iniciativa e a responsabilidade. Cria um clima de suspeição. Obriga os professores a comportarem-se como robôs.
A ser verdadeira a primeira hipótese, não se percebe por que razão aquelas pessoas são professores. Deveriam exercer outras profissões. Mesmo com cinco, dez ou 20 anos de experiência, estes professores são pessoas de baixa moral, de reduzidas capacidades intelectuais e de nula aptidão profissional. O ministério, que os contratou, é responsável por uma selecção desastrada. Não tem desculpa.
Se a segunda for verdade, o ministério revela a sua real natureza. Tem uma concepção centralizadora e dirigista da educação e da sociedade. Entende sem hesitação gerir directamente milhares de escolas. Considera os professores imbecis e simulados. Pretende que os professores sejam funcionários obedientes e destituídos de personalidade. Está disposto a tudo para estabelecer uma norma burocrática, mais ou menos "taylorista", mais ou menos militarizada, que dite os comportamentos dos docentes.
O ano lectivo chega ao fim. Ouvem-se gritos e suspiros. Do lado, do ministério, festeja-se a "vitória". Parece que, segundo Walter Lemos, 75 por cento dos professores cumpriram as directivas sobre a avaliação. Outras fontes oficiais dizem que foram 57. Ainda pelas bandas da 5 de Outubro, comemora-se o grande "êxito": as notas em Matemática e Português nunca foram tão boas. Do lado dos professores, celebra-se também a "vitória". Nunca se viram manifestações tão grandes. Nunca a mobilização dos professores foi tão impressionante como este ano. Cá fora, na vida e na sociedade, perguntamo-nos: "vitória" de quem? Sobre quê? Contra quem? Esta ideia de que a educação está em guerra e há lugar para vitórias entristece e desmoraliza. Chegou-se a um ponto em que já quase não interessa saber quem tem razão. Todos têm uma parte e todos têm falta de alguma. A situação criada é a de um desastre ecológico. Serão precisos anos ou décadas para reparar os estragos. Só uma nova geração poderá sentir-se em paz consigo, com os outros e com as escolas.
Olhemos para as imagens na televisão e nos jornais. Visitemos algumas escolas. Ouçamos os professores. Conversemos com os pais. Falemos com os estudantes. Toda a gente está cansada. A ministra e os dirigentes do ministério também. Os responsáveis governamentais já só têm uma ideia em mente: persistir, mesmo que seja no erro, e esperar sofridamente pelas eleições. Os professores procuram soluções para a desmoralização. Uns pedem a reforma ou tentam mudar de profissão. Outros solicitam transferência para novas escolas, na esperança de que uma mudança qualquer engane a angústia. Há muitos professores para quem o início de um dia de aulas é um momento de pura ansiedade. Foram milhares de horas perdidas em reuniões. Quilómetros de caminho para as manifestações. Dias passados a preencher formulários absurdos. Foram semanas ocupadas a ler directivas e despachos redigidos por déspotas loucos. Pais inquietos, mas sem meios de intervenção, lêem todos os dias notícias sobre as escolas transformadas em terrenos de batalha. Há alunos que ameaçam ou agridem os professores. E há docentes que batem em alunos. Como existem estudantes que gravam ou fotografam as aulas para poderem denunciar o que lá se passa. O ministério fez tudo o que podia para virar a opinião pública contra os professores. Os administradores regionais de Educação não distinguem as suas funções das dos informadores. As autarquias deixaram de se preocupar com as escolas dos seus munícipes porque são impotentes: não sabem e não têm meios. Todos estão exaustos. Todos sentem que o ano foi em grande parte perdido. Pior: todos sabem que a escola está, hoje, pior do que há um ano.»
António Barreto. "Retrato da Semana - Aplicadores". Público: 24.Maio.2009

sábado, 23 de maio de 2009

Outro retrato de escola, hoje

A dor de ser professor
«A legislatura aproxima-se do termo. É digno de nota que a titular do Ministério da Educação (ME) a tenha cumprido do princípio ao fim. É tempo de balanço, que devia ser positivo. A escola está melhor? É um espaço de trabalho, respeito e disciplina? Os alunos aprendem mais? A sociedade revê-se na escola? Os pais sentem-se representados nela? E podem escolher a escola para os seus filhos? Os alunos mais pobres têm as mesmas oportunidades dos alunos mais favorecidos? A escola é um local seguro? Já nem se pergunta se os professores se sentem motivados e compensados, anímica e profissionalmente...
Os arautos da política ministerial argumentam com a extensão do ensino do Inglês ao primário, a expansão do ensino dito profissional, os cursos de educação e formação de adultos, a massificação do uso das tecnologias de informação por alunos e professores, as obras de beneficiação do parque escolar e o alargamento da escolaridade obrigatória até ao décimo segundo ano. Todos devíamos estar satisfeitos. E confiantes de que tais melhorias hão-de resultar num futuro próximo. Será assim? Basta visitar as escolas, indagar junto dos alunos ou sondar o cidadão comum para perceber que "as coisas não batem certo".
Bastos e infalíveis opinion makers apoiaram as investidas contra os professores, responsabilizando-os pelo desastre que tem sido o ensino nas últimas três décadas. Acusados de incompetentes, relapsos e faltosos, os docentes sofreram, às mãos da hierarquia e pela fúria social, a humilhação da culpa explícita, expressa não raro em agressões físicas protagonizadas por alunos e pais com escandalosa indiferença dos poderes, à excepção do senhor procurador-geral da República. Feridos e desamparados, restou a muitos e bons professores a fuga antecipada para a reforma, ficando a escola mais desguarnecida em qualidade e exemplo... Quanto tempo durarão as mazelas é difícil saber...
E algumas alterações introduzidas pelo ME causam espanto pelo atabalhoamento e pela inconsciência das consequências inevitáveis. Um exemplo: o sistema de avaliação de professores não só era inexequível,como era e é cruamente artificial e arbitrário. Outro exemplo: o estatuto do aluno estava tão mal redigido, e com normas tão absurdas, que foi penoso ver o ME empurrar para os professores a culpa da sua má aplicação! Outro exemplo: a divisão da carreira em professores e professores titulares, impedindo aqueles de desempenhar cargos de direcção, é tão extraordinária que, a ser taxativamente aplicada, deixaria algumas escolas sem conselhos executivos, pois alguns havia que não contavam com nenhum professor titular. De resto, entre os directores entretanto eleitos figuram os mesmos professores não-titulares, pois eram os que detinham a experiência requerida para se candidatar ao cargo. De que valeu então aquela divisão entre os professores?
Por que será que ninguém quer ver que a estrutura e as hierarquias intermédias do ME são dispensáveis e que a direcção das escolas deve responder segundo a lei, perante as inspecções e a comunidade que serve? Para quê grandes cadeias hierárquicas, com adjacências que ampliam o número de lugares que desviam do trabalho com alunos? E onde a responsabilização individual é uma miragem...
Mas o que dói é chegarem alunos ao ensino secundário incapazes de fazer operações numéricas básicas, de ler e escrever escorreitamente e de entender os professores, oralmente ou por escrito. Planos, estratégias, tecnologias, estímulos e apoios servem para quê? Quem são os responsáveis?»
José Batista da Ascenção. "A dor de ser professor". Público: 23.Maio.2009
(secção "Cartas ao Director")

Um retrato da escola, hoje

Delação na sala de aula
«Numa semana, os professores recebem um manual de instruções para conduzir as provas de aferição que os coloca uns furos abaixo da indigência mental; na outra, ficam a saber que uma aluna pode gravar clandestinamente o que se passa na sala de aula e usar o material ilegalmente obtido como prova de inaptidão para o exercício das suas funções. Depois de dois anos de uma terrível guerra de nervos iniciada com o estatuto e aprofundada pela avaliação, os professores, principalmente do ensino público, têm cada vez mais estímulos para a descrença e a desmotivação. Por muita razão que a ministra tenha em algumas das suas reformas, e tem-na, pelo menos, ao nível da urgência e do conceito de avaliação, a soma de grandes afrontas e de pequenos ataques de que têm sido alvo os docentes ameaça desfazer o que resta de empenho e sentido de serviço público na classe.
Por uma vez, era bom que o caso de Espinho pudesse ser visto de uma forma global e não se resumisse à análise dos devaneios de uma professora que, manifestamente, merece ser punida pelo que disse na aula ou pelo que aí insinuou sobre matérias do foro privado das suas alunas. Encerrado, e bem, este caso com um processo disciplinar, esperava-se que o Ministério da Educação se preocupasse com o outro lado da questão: o método usado pelas alunas e assumido pelas suas encarregadas de educação. Ora, que se saiba, não haverá ao nível da escola nem da direcção regional qualquer diligência, o mínimo gesto, a mínima palavra de censura pelo acto. O que, para os cidadãos e, principalmente, para os professores, quer apenas dizer uma coisa: que a espionagem clandestina do que se passa na aula, o recurso a tecnologias para instigar a delação é um método que não causa o mínimo arrepio à tutela.
Haverá certamente quem se apoie no nexo de causalidade para justificar o emprego de gravadores digitais ocultos nas mochilas. Afinal, os resultados estão à vista: sem as declarações gravadas, jamais alguém poderia acreditar que uma professora, aquela professora, fosse capaz de proferir tantos disparates e tantos insultos à dignidade dos alunos. Mas, resolvida a situação a favor dos pais revoltados e das alunas insultadas, o problema principal que agora se coloca tem a ver com o futuro. Doravante, o recurso a gravações clandestinas que não têm qualquer valor probatório em sede de processo na justiça ordinária (exigem autorização de um juiz), passa a ser legitimado nas salas de aula. Os momentos de descontracção, de diálogo franco e aberto, de proximidade entre professor e aluno estarão condenados a desaparecer das nossas escolas. Nenhum professor deixará de ter medo ao pensar no fantasma da gravação oculta sempre que arriscar sair da matéria oficial para fazer o que lhe compete: abrir horizontes aos seus alunos.
Pode parecer um cenário excessivo, mas o facto é que o episódio de Espinho é mais uma peça de um puzzle que gradual e paulatinamente vai corroendo o amor-próprio e a personalidade da docência. A menos que queiramos professores-funcionários, apenas autorizados a ditar sebentas ou a transmitir sumários, não se pode estar de acordo com as instruções do ministério que os transformam em aprendizes ou a legitimação por falta de censura de gravações ocultas nas salas de aula. Se não for pelo clima de intimidação e medo que pode gerar nos docentes, ao menos haja o bom senso de as condenar por estimularem os alunos a cultivar práticas pidescas. Querer resumir o incidente à condenação da professora é por isso um insulto a todos os que consideram a bufaria um daqueles vírus que a escola tem o dever de extirpar dos hábitos dos jovens.»
Manuel Carvalho. "Delação na sala de aula". Público: 23.Maio.2009.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Marcelo Rebelo de Sousa explica aos jovens o conflito na educação

Três jovens, leitores da Forum Estudante em idade de ensino secundário, entrevistaram Marcelo Rebelo de Sousa, trabalho que teve publicação na revista de Fevereiro. A conversa abordou temas como a juventude, o estudo, a política, as Associações de Estudantes, os professores e também facetas do entrevistado. No final, os jovens entrevistadores testemunharam sobre o seu interlocutor nos seus dotes de comunicação, humor e clareza, vertentes que alunos da minha escola puderam testemunhar há cerca de um ano, quando Marcelo Rebelo de Sousa aqui esteve para falar da Europa, numa sessão que acabou por ser também sobre a vida, sobre a política, sobre o futuro, com muita pedagogia, ensinamentos e recomendações para o público. E os jovens estudantes da minha escola, população do ensino secundário, encantaram-se também com o discurso e com as recomendações feitas.
A revista está por aí disponível. A entrevista apela à responsabilidade social que os jovens também têm. E, como não podia deixar de ser, a educação foi também tema, mesmo pela origem dos entrevistadores... Quando Maria da Cunha, estudante do 12º ano do Colégio São João de Brito, perguntou qual a avaliação do papel da Ministra da Educação relativamente aos professores e aos alunos, a resposta de Marcelo Rebelo de Sousa foi: «O caso da Ministra da Educação foi um pouco surpreendente. Era uma pessoa desconhecida, não vinha do universo político, portanto uma pessoa com competência técnica interessada em resolver problemas urgentes do ensino em Portugal. A Ministra prometeu muito, avançou com algumas boas ideias. O pior é que ao lado dessas boas ideias se instalou, desde o início, uma ideia muito errada de tentar conquistar a opinião pública à custa do ataque aos professores, o que é uma coisa muito sedutora, mas muito perigosa. As pessoas aderiram, porque andavam sempre à procura de um bode expiatório e o 'bode expiatório' dos professores foi boa ideia, porque não podiam ser os pais (apesar de, em muitos casos, cada vez menos ligarem aos filhos), nem podiam ser os alunos (apesar de, nalguns casos, eles estudarem cada vez menos). A ideia de serem os professores repetida à saciedade, dramatizada e exagerada com manifesta injustiça teve várias consequências, sendo a primeira delas afastar os professores, colocando-os praticamente desde o início contra a Ministra. Os próprios pais começaram a cair em si e a achar a explicação de que a culpa era dos professores uma explicação muito simplista e que às tantas deixou de justificar tudo o que se faz e o que se deixa de fazer. O que é facto é que os alunos também se sentiram muito desmotivados pelo clima de guerrilha que se instalou nas escolas, porque a partir de certa altura o confronto não foi apenas com os professores, foi com os alunos e com uma parte dos encarregados de educação.»
Estas consequências de que fala Marcelo Rebelo de Sousa não passaram ainda, como se sabe. E teria sido importante, desde sempre, um pensamento como o que, hoje, a propósito de negociações com os enfermeiros e com os médicos, a Ministra da Saúde expressou: é que o ambiente de guerrilha não é bom para o exercício de uma profissão. Nem para o progresso do país, claro.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Uma adivinha de Santana Castilho e sua reflexão sobre a resposta

Era, mas já não é. O que é?
Era necessário observar aulas de professores avaliados, mas já não é. Só a pedido, para quem aspire a ser muito bom ou excelente. Era necessário observar três aulas, mas já não é. Duas chegam, a pedido. Era o coordenador que avaliava os colegas de departamento, mas já não é. Agora pode vir alguém de fora, rigor científico protegido. Era muito importante cumprir objectivos previamente definidos, mas já não é. Os resultados escolares e as taxas de abandono deixaram de contar. Era necessário fazer reuniões entre avaliadores e avaliados, mas já não é. Basta que estejam de acordo. Era um processo para todos, mas já não é. Ficam de fora os contratados para determinadas áreas tecnológicas e artísticas, não pertencentes aos grupos de recrutamento, e os que se reformarão até 2011. Tudo somado, uns belos milhares. Era preciso desdobrar um monte de fichas numa montanha de parâmetros para chegar a uma avalanche de itens, mas já não é. Caiu o número quê bê. O que é? A saga da avaliação do desempenho no seu melhor, a política a descer ao charco. A juventude socialista foi para a porta das escolas doutrinar os alunos com manifestos apelativos. Nos jornais, os de distribuição gratuita incluídos, em prática antes nunca vista, publicam-se anúncios, pagos com o dinheiro dos nossos impostos, para arregimentar o pagode. Os endereços electrónicos dos professores, facultados para outros fins, protegidos pela ética da protecção de dados, ora mandada às malvas, são usados pelo Ministério da Educação, para manipular e pressionar. A remuneração complementar dos futuros directores das escolas, os peões que a visão napoleónica de Sócrates começa a colocar no terreno, subiu quase 50 por cento. Aos saltimbancos da profissão acenou-se com um generoso aumento de vagas para o próximo concurso. O que é? A investida do Governo para dividir e desmobilizar os professores, no sentido de esvaziar a greve marcada para 19 de Janeiro.
Já aqui escrevi que a avaliação é um epifenómeno menor de uma política desastrosa para a qualidade da educação. Neste conflito, já perdeu o país. Já perderam os alunos. Já perdeu o Governo, o primeiro-ministro e a ministra da Educação. Podem agora perder os professores se não perceberem, como classe com responsabilidade social particular, que é a dignidade deles e a qualidade da escola pública que estão em jogo. Talvez possamos ser indulgentes para com os pobres que vendem o voto por electrodomésticos distribuídos porta a porta. Mas não esperem os professores indulgência se cederem às primeiras facilidades e aceitarem sinecuras sem princípios. Um grupo de professores convidou-me há dias para partilhar com eles a minha visão sobre o actual momento político. No debate que se seguiu evidenciaram-se sinais preocupantes, narrados por quem está no terreno. Há quem tenha assumido documentalmente a recusa a ser avaliado e tenha entregue, sob sigilo, os objectivos requeridos pelo processo? Tem expressão relevante o grupo dos que, sob pretexto de não serem ultrapassados por oportunistas, deixam cair compromissos pessoais anteriores e engrossam a onda daqueles que dizem que a simplificação consumada mudou o cenário? Estas perguntas foram feitas aos presentes por um dos participantes. As respostas que ouvi deixaram-me perplexo. Várias perguntas que me foram dirigidas versavam questões sobre o efeito que o conflito tem produzido na opinião pública. Respondi recordando processos de outras classes profissionais. Naturalmente que comecei pelos médicos, cuja recente ameaça de greve, terrível para o julgamento público, chegou para meter na gaveta a ideia peregrina de lhes aumentar desumanamente o tempo de trabalho, ainda por cima sem qualquer compensação remuneratória. E falei também dos juízes e dos militares. Naquele grupo, todos estivemos de acordo sobre a necessidade de pôr princípios e dignidade à frente da opinião pública, nem sempre esclarecida, tantas vezes envenenada. Não sei se aquele grupo é representativo do que sente a classe.
Santana Castilho. "Era, mas já não é. O que é?". Público: 24.Dezembro.2008

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

"Sopa de pedra", por Manuel António Pina

«Nos anos de chumbo da Guerra Fria, a propaganda ocidental comparava a economia soviética a um comboio parado dentro do qual, para que quem estivesse de fora acreditasse que a coisa estava em movimento, os passageiros, sob a batuta do PCUS, se iam inclinando ritmadamente para a frente e para trás. Passa-se algo parecido com o famoso modelo de avaliação que o ME desencantou, pronto a vestir, no Chile e importou com a louvável intenção de "chilenizar" a escola portuguesa.
Tendo-se os custos da coisa, principalmente os políticos, descontrolado, neste momento, a ministra já não quer saber do modelo para nada, só estando preocupada, ela e o Governo, que quem estejade fora acredite que a "reforma" vingou. Depois de todas as simplificações, alterações, excepções e derrogações em matérias que ainda no dia anterior eram "essenciais", agora são os professores que se reformarem até 2011 que já não "têm direito" a ser avaliados. O modelo de avaliação da ministra tornou-se numa sopa de pedra ao contrário. Vai-lhe tirando, um a um, todos os ingredientes e condimentos, desde que fique, ao menos, a pedra.
»
Manuel António Pina. "Sopa de pedra". Jornal de Notícias. 19.Dezembro.2008.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Alguém esperava outra coisa?

A reunião entre o Ministério da Educação e a Plataforma Sindical dos Professores resultou em… nada! Alguém esperava outra coisa? Já se sabia que o resultado iria ser este, depois de, para uma reunião com “agenda aberta”, cada um dos parceiros partir mais como contendor, tendo anunciado que não fazia cedências, do que como interessado na negociação… Alguém esperava outra coisa, afinal?
A avaliação de desempenho é assunto que já mostrou o que vale: por um lado, pela dificuldade de ser discutida entre os actuais parceiros; por outro, pela ideia peregrina de que ela contribuirá para o sucesso, sem que se lhe adivinhe uma ponta de preocupação formativa; por outro ainda, pela transformação deste processo numa luta política, imposta por políticos, que, eles mesmos, não têm práticas de avaliação (bastará ver-se a confusão em torno das faltas na célebre sessão da Assembleia da República da semana passada!); finalmente, porque, provavelmente, tem que haver sempre a dicotomia entre os “bons” e os “maus”, como se está a ver neste processo, dependendo uns e outros das paixões dos adeptos. A sério: alguém esperava outra coisa desta reunião que houve na tarde de hoje?
Lamento tudo isto. Sobretudo por duas razões: porque os argumentos de parte a parte já cansam e não me convencem; porque a política está a invadir a escola. E todos saem a perder. Lamento tudo isto. Não só por uma questão de respeito (pelas profissões, pelos cargos, pelas instituições, pelas pessoas). Também por uma questão de coerência e de cidadania.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

O "depois" da greve de professores visto por José Manuel Fernandes

«(...) O que é essencial para os professores (e escrevemos professores e não sindicatos, pois aquilo a que assistimos ultrapassou muito a capacidade de mobilização dos sindicatos, foi algo que veio do fundo da alma de dezenas de milhares de docentes que nunca imaginaram ir a uma manifestação ou fazer uma greve)? Que se perceba que este modelo de avaliação é impraticável, burocrático e gerador de injustiças e que se reabra o debate sobre um Estatuto da Carreira Docente e a bizarra criação da figura do "professor titular". O que é essencial para o ministério? Que exista um sistema de avaliação mais rigoroso do que o antes existente (apesar de não ser verdade repetir que os professores não eram avaliados quando o problema estava nas debilidades do sistema de avaliação e de carreiras). Onde é que ontem se viram sinais de que pode haver uma luz ao fundo do túnel? Quando Mário Nogueira se recusou a reafirmar, na RTPN, que não haveria negociações sem a suspensão imediata do processo de avaliação e quando, minutos depois, Jorge Pedreira disse que o ministério não aceitava desistir do "processo da avaliação", não tendo repetido a fórmula habitual, que insistiu sempre "neste modelo de avaliação".
E onde é que, aqui, podiam e deviam entrar todos os que se interessam pelo problema da qualidade do nosso ensino - e também devia entrar a oposição? Onde é que deviam entrar os que no passado foram demasiado passivos e agora são os principais protagonistas, os professores que não têm de se rever obrigatoriamente nos sindicatos existentes? Num processo que demonstrasse, do lado dos professores, e que revelasse, do lado dos outros protagonistas, que há uma genuína vontade de melhorar o sistema que temos. Para as escolas, esta é uma oportunidade para ganharem mais autonomia. Para os pais, o momento em que devem mostrar mais interesse. Para a oposição, a oportunidade que não está apenas do lado do contra. Para os outros agentes, que têm propostas e querem ser ouvidos - mesmo quando defendem soluções radicalmente diferentes.
Os responsáveis do ministério, a não ser que estejam definitivamente autistas, só podem ter percebido que, com este modelo e à força, fazem mal às escolas e se desgastam politicamente. Aos professores, agora unidos na recusa do que era realmente um modelo disparatado, não deve meter medo reivindicarem mais autonomia e mais responsabilidade, mesmo sabendo que depois podem voltar a dividir-se sobre a melhor solução. E a oposição deve correr o risco de fazer propostas que não se destinem a agradar a todos, mas procurem ser melhores, mais coerentes e mais realistas do que as deste ministério.
É isto muito difícil? É, mas não é impossível. Até porque não implica abdicar das ideias próprias, apenas respeitar as daqueles com quem se debate e negoceia. No limite, apenas exige humildade para ouvir e a convicção de que é pela argumentação, e não pela força, que as melhores ideias se impõem.»
José Manuel Fernandes. "Professores e Governo: negociar implica respeitar". Público. 04.12.2008.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Os professores e o ME vistos por José Manuel Silva

O Governo está completamente equivocado na forma como está a gerir o conflito com os docentes. Na verdade, o entendimento necessário não é com os sindicatos, mas com os professores. Bem pode o presidente da FENPROF acentuar que são os sindicatos que representam os professores, é verdade, mas só representam alguns e já há muito tempo que a dinâmica de rejeição das políticas e da atitude do ME para com toda a classe ultrapassa largamente a acção dos sindicatos.
Se o Governo quer pacificar o campo educativo, e só admito que o faça pelo diálogo, tem de perceber que o obstáculo não são os sindicatos nem os professores, mas a própria equipa do ME. Se o Primeiro Ministro quiser ser parte da solução e não do problema tem de demitir rapidamente a equipa que dirige o ME, por uma razão simples e que é do domínio das teorias da liderança e se fundamenta nos princípios da inteligência emocional.
Quebrou-se totalmente o vínculo emocional que liga os professores ao Ministério e o que devia ser ressonância (Goleman et al, 2003) tornou-se dissonância, o que impede qualquer entendimento ou colaboração. As emoções tóxicas tornaram-se dominantes e inviabilizam o restabelecimento da confiança e do diálogo.
Tal como na Saúde Correia de Campos percebeu isso e o Primeiro Ministro também, é forçoso que no conflito da Educação se entenda que não há saída para o problema sem mudança de caras e de procedimentos. Os professores perderam, há muito, a confiança em quem supostamente os devia liderar, e quando os líderes perdem a confiança dos liderados, deixam de o ser.
Espero, sinceramente, que não se caia na tentação de fazer da anunciada greve do dia 3 uma forma de tentar partir a espinha ao movimento de contestação docente, e que haja a iniciativa política suficiente para encontrar uma solução que resolva o problema de fundo e não qualquer cosmética de ocasião.
José Manuel Silva. "O conflito na educação visto pelo prisma da liderança e da inteligência", in Campo lavrado.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Santana Castilho e as faltas (in)justificadas dos alunos

«(...) Depois de afirmar que seria uma vergonha suspender a aplicação do modelo de avaliação do desempenho, reclamada por 120.000 professores, a ministra da Educação não teve problemas em ceder a duas cestas de ovos e suspender o que a Assembleia da República, bem ou mal, determinou em lei. E como lhe é habitual, lançando mais umas pazadas de ignominiosa lama sobre os professores. Com efeito, quem leia o seu dominical despacho conclui que os professores foram umas bestas iletradas ao transpor, mal, para os regulamentos internos, o espírito da lei. Mas não foram. A ministra da Educação é que teve o topete de mandar às malvas o que a Assembleia da República determinou na Lei 3/2008, de 18 de Janeiro. Com efeito, diz o número 2 do artigo 22.º dessa lei que, "(...) sempre que um aluno, independentemente da natureza das faltas (sublinhado meu) (...)", atinja um determinado número de ausências, variável conforme o nível e o ciclo de ensino, "(...) deve realizar (...) uma prova de recuperação, na disciplina ou disciplinas em que ultrapassou aquele limite, competindo ao conselho pedagógico fixar os termos dessa realização (...)" E diz mais a lei que venho a citar que "quando o aluno não obtém aprovação na prova (...) o conselho de turma pondera a justificação ou injustificação das faltas dadas (...) podendo determinar (...) a retenção do aluno inserido no âmbito da escolaridade obrigatória ou a frequentar o ensino básico, a qual consiste na sua manutenção, no ano lectivo seguinte, no mesmo ano de escolaridade que frequenta ... ou a exclusão do aluno que se encontre fora da escolaridade obrigatória, a qual consiste na impossibilidade de esse aluno frequentar, até final do ano lectivo em curso, a disciplina ou disciplinas em relação às quais não obteve aprovação na referida prova (...)" (sublinhados meus). Assim sendo, o despacho da ministra da Educação, fixando doutrina contrária ao que acabo de citar, facilitando tudo e banindo uma vez mais o chumbo, é uma nódoa a que as escolas não devem obediência. É uma manipulação grosseira da lei e uma interpretação abusiva e desrespeitadora da Assembleia da República, independentemente da concordância ou discordância que a mesma nos suscite. A ministra e o seu séquito de burocratas de serviço sabem bem que o que acabo de escrever é indesmentível. E por isso é bem grave a demagogia com que cederam aos alunos e à incivilidade dos ovos. (...)»
Santana Castilho. "Um cadáver político". Público, 26.Nov.2008.

sábado, 22 de novembro de 2008

Professores no "Expresso" (3): Henrique Monteiro

Henrique Monteiro. "Variações sobre a guerra da avaliação". Expresso, 22.Nov.2008.

Professores no "Expresso" (2): António Pinto Leite

António Pinto Leite. "A sorte da Ministra". Expresso, 22.Nov.2008.

domingo, 16 de novembro de 2008

Manuel Alegre em entrevista no "Diário de Notícias" de hoje

DÉFICES DE IDEIAS - «(…) Não acho que haja uma situação de asfixia. Temos eleições livres, estamos aqui a falar livremente, os partidos da oposição podem falar... Se calhar também há um défice de oposição, há com certeza um défice de oposição e um défice de alternativas. De tal maneira que às vezes parece que eu é que estou a fazer a oposição! Mas sempre houve vozes críticas dentro do PS. (…)»
DIÁLOGO - «(…) Estou disponível para facilitar o diálogo e o encontro entre pessoas de diferentes quadrantes, para pensar em políticas, políticas públicas, políticas alternativas, para reflectirem sobre novos rumos e sobre um novo paradigma. (…)»
ESQUERDA - «(…) Neste momento, a esquerda está muito debilitada. Pergunto mesmo, onde é que está a esquerda como solução política? (…)»
JUVENTUDE E PARTIDOS - «(…) Os quadros novos, as novas elites, seguem outros caminhos, não vão querer meter-se em partidos políticos muito fechados em si mesmos, com muita mediocridade lá dentro e, sobretudo, muito afunilados. Não quer dizer que não se interessem pela vida pública. Tenho filhos, conheço amigos dos meus filhos, muita gente nova. Na minha campanha tive esse privilégio de ter muita gente nova, gente que me dizia que era a primeira vez que abraçava uma causa. Mas não estão para suportar essa coisa de estar num partido, sujeitos a um presidente de federação que funciona com um cacique. Não estão para isso, vão à vida deles! Isto não é bom para a democracia.»
MAIORIAS - «(…) As maiorias absolutas num país como o nosso são propícias ao aparecimento de certos tiques. (…)»
MINISTRA DA EDUCAÇÃO - «(…) Irritei-me com a ministra da Educação e ele ficou um bocado nervoso com as coisas que eu disse, embora também tenha acrescentado que eu tinha o direito a ter a minha opinião. Respondi que gostaria que me dessem boas razões para não ter tantas razões de crítica. (…)»
NOVOS NA POLÍTICA - «(…) As pessoas também têm de aprender que a política se faz com rupturas, se faz com risco, se faz com ousadia! É uma coisa que me preocupa na nova geração: aqueles que vêm das juventudes são muito programados, são muito prudentes, fazem contas a tudo. (…)»
O QUE NOS CARACTERIZA - «(…) É necessário investir também no sector produtivo e nos seus núcleos mais competitivos: Investir na agricultura, em bens agrícolas, porque temos de diminuir a dependência do exterior e garantir a soberania nacional! Acabou-se com a agricultura, acabou-se com as pescas e acabaram-se com as indústrias tradicionais em Portugal como consequência da nossa entrada na União Europeia (UE). A questão da agricultura foi mal pensada, mal resolvida, mal negociada. E a das pescas também! Teve não só consequências económicas, mas também sociais e culturais. A agricultura e as pescas fazem parte da nossa própria identidade e da nossa soberania. Portanto, o investimento na agricultura é importante, porque a terra é a principal riqueza, a terra nunca se desvaloriza, e nós estamos entalados entre a Espanha e o mar... Tudo, neste momento, é muito volátil, tudo, neste momento, é muito incerto, não é? Somos uma velhíssima nação que foi pensada por grandes homens em momentos decisivos e através dos séculos e temos de saber garantir a nossa autonomia. Porque o facto de estarmos na UE - e sou partidário de estarmos na UE porque devemos estar na vanguarda e no centro das decisões - não significa uma dissolução nacional. (…)»
PARTIDO COMUNISTA - «(…) O PCP, basta ler as suas teses, tal como está não me parece que queira aliança nenhuma ou que esteja nessa disposição. Aliás, nunca a quis, e foi um dos males da nossa democracia em 74/75. (…)»
PARTIDO SOCIALISTA - «(…) O partido neste momento é uma máquina eleitoral, é uma máquina de poder. Deixou de ter uma vida própria e uma vida autónoma, a direcção do partido é o Governo. (…)»
PARTIDOS E CIDADÃOS - «(…) Os partidos afunilaram muito a sua vida, e há um divórcio hoje, não só aqui, muito grande entre a vida política partidária e a sociedade e os cidadãos. (…)»

João Lobo Antunes e António Barreto, no "Público" de hoje

1) Entrevista a João Lobo Antunes por Graça Franco e José Manuel Fernandes
RESPEITO PELOS PROFESSORES - «(…) Se entendo que é um princípio fundamental o respeito por qualquer profissão, o respeito pelos professores é ainda mais importante, pois o futuro do país depende da educação dos seus cidadãos. Por isso estranho que, seis meses depois, regresse a mesma retórica de extremismo. Cada um fica no absoluto da sua verdade, sem aceitar os argumentos contrários, com culpas repartidas, e não sei como se vai sair daqui. (…)»
FELICIDADE E INSATISFAÇÃO - «(…) Como médico, recebo muitos professores no meu consultório, conheço muitos professores, e nos últimos meses ainda não vi um feliz. Isso é altamente preocupante. As pessoas não estão satisfeitas, sentem-se muito limitadas no que fazem, até na capacidade de preparar as aulas, sentem-se encerradas numa "gaiola de ferro" burocrática. Encontro professores que, por doença, ficaram limitados, que são excelentes professores mas a quem dizem que ou trabalham de uma determinada maneira ou não podem entrar na escola. (…)»
REALIZAÇÃO PROFISSIONAL - «(…) Quando não há realização profissional, quando os professores não se sentem bem com o que estão a ter de fazer, nunca poderão dar o seu melhor à escola e aos alunos. Isto é uma verdade auto-evidente. (…)»
ESTATUTO DO ALUNO - «(…) Eu li o Estatuto do Aluno e aquilo é absolutamente mirabolante. Até o português que utiliza é de uma complexidade artificial, é o "eduquês" oficial, pelo que quando vejo aquela escrita desconfio do pensamento que a gerou, de como essas pessoas entendem a Educação. Ora, a Educação serve fundamentalmente para dar instrumentos de felicidade às pessoas. Ora, a felicidade não é gratuita, tem de ser construída. A escola não serve para manter alunos felizes. Já o Presidente Wilson, dos Estados Unidos, que antes era reitor da Universidade de Princeton, dizia que a preocupação de que os meninos têm de ser felizes na escola não faz sentido. (…)»
2) António Barreto, “Os três poderes”
GUERRA POLÍTICA À CUSTA DA ESCOLA - «(…) Nos actuais termos, a guerra das escolas não tem saída. Mesmo que esta ministra consiga, pela lei da força, uma qualquer vantagem, terá, a prazo, uma grande derrota. Os professores, de futuro, não farão o que ela hoje pretende. Aliás, muitos já o não fazem. O próximo ministro da educação, até do mesmo partido, terá necessidade de alterar muita coisa e procurar um novo pacto. Se for de outro partido, a primeira coisa que fará será alterar este quadro legal e as práticas que são hoje impostas. Nas próximas eleições, poderá ver-se na campanha e nos respectivos programas: todos, com excepção do PS, vão sugerir a revogação das actuais leis e os mais imaginativos acabarão por propor um novo sistema de avaliação. O próprio PS fará uns "ajustamentos"...
Não se trata apenas de teimosia. Muito menos da força da razão. Há muito mais do que isso. A começar pela ideia de imagem, um dos maiores venenos da política contemporânea. Não se pode perder a face. Não se desiste. Não se devem reconhecer erros maiores. Não é bem visto recuar. A insistência, mesmo no erro, é sinal de carácter. Estes são alguns dos sentimentos que passam pela cabeça dos governantes e dos dirigentes dos sindicatos. (…)»
TRÊS PODERES - «(…) Está em curso uma luta entre três poderes. Luta verdadeira, de cujo resultado vai depender o futuro da educação e da escola. Quais são esses poderes? Em primeiro lugar, o do ministério (ou do Governo), em tentativa de reforço e consolidação. Segundo, o dos professores, em queda. Terceiro, o da escola, largamente fictício. O Governo quer centralizar ainda mais o sistema educativo, deseja reafirmar o seu poder sobre a escola e sobre os professores e pretende uniformizar regras e critérios. Procura manter as autarquias sob a sua alçada e transformar os professores em verdadeiro regimento fabril ou militar. Entende que, obedientes, as escolas e os professores darão melhor contributo para as suas estatísticas. De passagem, tem outros objectivos, eventualmente mais nobres: poupar dinheiro e obrigar os professores a trabalhar mais. (…)»
AVALIAÇÃO E DIGNIDADE – «(…) A ministra tem algumas razões. Mais trabalho, por parte de alguns que folgam. Um qualquer princípio de avaliação. Poupar recursos e dinheiro. E impedir que todos os professores tenham sempre as classificações de muito bom e excelente, pragas conhecidas em toda a função pública. Mas o Inferno está no pormenor. Como sempre. Os jornais já publicaram mil pormenores sobre o sistema de avaliação, dos formulários às regras e procedimentos. O escárnio é constante. A ministra queixa-se de que o seu sábio sistema foi ridicularizado! É verdade. Mas não merece menos do que isso. Além de absurdo e inútil, este exercício parece uma punição, a fazer lembrar os castigos infligidos, por praxe sádica ou despotismo, nas forças armadas de muitos países. Não é só este sistema que está errado: é o princípio mesmo de uma avaliação centralizada, de âmbito nacional e uniforme.
A avaliação ministerial, burocrática, formal e pseudocientífica é um enorme erro. A grande tradição centralista, integrada e unificada da educação pública em Portugal é responsável pela mediocridade de resultados e pelo desperdício de enormes recursos financeiros vertidos, desde há trinta anos, por cima do sistema, sem resultados proporcionais. É essa tradição que é responsável pela ausência de espírito comunitário nas nossas escolas. Pelo desdém que as autarquias dedicam às escolas. Pela apatia e impotência dos pais. Pelo facto de tantos professores desistirem do orgulho nas suas carreiras e do brio no exercício da sua profissão. É provável que muitos não queiram trabalhar quanto devem ou que tenham outros interesses. Como em todas as profissões. Mas o seu sentimento de dignidade ferida parece genuíno. E é compreensível. (…)»
AUTONOMIA E AUTORIDADE DA ESCOLA - «(…) São quase misteriosas as razões pelas quais não se permite que sejam as escolas, os seus directores e os seus conselhos de direcção, ajudados pela comunidade e pelos pais, a avaliar a escola no seu conjunto. E não se deixam os responsáveis das escolas observar e avaliar o desempenho profissional dos docentes. A República, o Estado Novo, a democracia, o socialismo e o comunismo coligam-se facilmente para manter a escola sob o punho do ministério, cuja proverbial incompetência é uma das raras constantes na história do século XX. Entre o ministério e o sindicato, parece haver terra queimada, campo de batalha. Não terão percebido os professores, desta vez, que a autoridade do ministério é o pior que lhes pode acontecer? Apetece dizer que chegou a hora de sair deste impasse, de quebrar a tenaz dos dois fanatismos. Uma visão optimista levar-nos-ia a pensar que, finalmente, os professores perceberam que a autoridade da escola pode ser a solução. (…)»