A "Colecção de Clássicos da Literatura Portuguesa contados às crianças" (Vila Nova de Famalicão: Quasi Edições), que acompanhou o semanário Sol ao longo de doze semanas, chegou hoje ao fim, com a adaptação de Os fidalgos da Casa Mourisca, de Júlio Dinis, versão a cargo de Francisco José Viegas, ilustrada por Helena Simas.
O que é de valorizar nesta adaptação é a simplicidade da narrativa e da escrita, o que nem sempre aconteceu nos outros títulos da colecção. É, aliás, o narrador quem, no início, dá o mote para essa simplicidade, revelando que esta história não é mais complexa do que as outras que se contam - "Em todas as histórias há uma história de amor. E em todas elas há heróis."
O amor é, então, uma tónica; os heróis são outra constante. e assim se conquista o público infantil, habituado à presença dos heróis e também conhecedor de que é costume haver encontros em que amor manda.
Depois, são as coordenadas essenciais desta narrativa, logo a justificar o título e a dar a notação temporal: "Esta história aconteceu há mais de cem anos, quase há duzentos, com uma família que outrora fora rica e que, com o tempo, foi empobrecendo até se encontrar perto da ruína. Essa antiga família de fidalgos vivia numa velha casa que, por ser construída como os velhos castelos mouros, inspirada nos antigos palácios encantados que existiam mesmo antes de Portugal ter nascido, era conhecida por Casa Mourisca." A associar às marcas já apontadas, há neste início os elementos necessários ao encantamento, ao fascínio, ao maravilhoso - os "palácios encantados" entrelaçados com os "velhos castelos mouros".
Está criado o cenário espacial e temporal para a história que congrega personagens como D. Luís, tomé da Póvoa, Jorge e Berta. Apesar de haver referências a outras personagens (Maurício, Frei Januário, LUísa, Beatriz e Gabriela), o protagonismo está reservado, quase em exclusivo, àqueles, numa operação de simplificação narrativa, em que não falta quem ajude o herói ou quem se lhe oponha...
Ao longo da história, há ainda sítio para aprendizagens e transmissão de valores: a dignificação pelo trabalho - "havia do outro lado da colina uma outra propriedade que seguia um rumo muito diferente: a herdade de Tomé da Póvoa e da sua mulher Luísa, um modelo para todos, em que se trabalhava desde cedo e onde as colheitas animavam todo o vale, cheio das cores dos seus pomares e dos ruídos alegres dos quintais onde tudo crescia e nada faltava" - e a primazia da excelência da personalidade - "mais importante do que Berta ser rica ou ter nascido numa família nobre, era o seu carácter, a sua doçura, a sua bondade".
No final, dois sinais de sucesso e de paz: o amor conseguido entre Jorge e Berta (vencendo todos os obstáculos, nomeadamente os sociais) e o regresso da Casa Mourisca ao "seu antigo esplendor".
Francisco José Viegas conseguiu, nesta adaptação, manter o essencial dos linhas comuns das narrativas de Júlio Dinis: na caracterização das personagens, na força das figuras femininas, na valorização do trabalho, na questão social, no traçar dos costumes.
Escrever sobre esta adaptação pode ser ainda pretexto para lembrar uma outra publicação destinada ao mesmo público sobre Júlio Dinis, recentemente aparecida: o nº 8 da revista Na crista da onda (2ª série, Outono.2006), editada pelo Instituto Português do Livro e das Bibliotecas, que apresenta, à semelhança dos outros números, um pequeno roteiro biográfico dinisiano, uma resenha das principais obras e uma cronologia contemporânea do autor.
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