José Carlos Ary dos Santos, conhecido na poesia pelos seus dois últimos apelidos, faria hoje 71 anos (Lisboa, 1936-18.01.1984). Filho de Carlos Ary dos Santos (n. 1905) e de Maria Bárbara de Miranda e Castro Pereira da Silva (1899-1950), foi por parte da mãe que o poeta teve ligações a Vila Nogueira de Azeitão. Aqui, nascera a mãe e estava estabelecida a família já desde longa data: o avô materno, José Barbosa Pereira da Silva (1868-1932), e o bisavô e trisavô, ambos com o nome de José Pereira da Silva e ambos tendo sido provedores da Misericórdia azeitonense. Também a bisavó Maria Joaquina Morais Barbosa de Oliveira era natural de São Lourenço de Azeitão, freguesia de onde era natural seu pai (e trisavô de Ary dos Santos), Joaquim Pedro Gomes de Oliveira.
É este último nome que nos permite contar uma história do cruzamento de amizade de um antepassado de Ary dos Santos com Bocage. Com efeito, Gomes de Oliveira era casado com Carlota Emília Morais Barbosa (1803-1849), senhora que faleceu em Azeitão e cujo pai, tetravô de Ary dos Santos, era Tomé Barbosa de Figueiredo de Almeida Cardoso (1755-1820), nascido na América do Sul, de pai para ali emigrado oriundo do Minho (Paredes de Coura). Foi este Tomé Barbosa, a trabalhar na Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros, em Lisboa, que se tornou, em dada fase, não só amigo, mas também protector de Bocage, havendo mesmo um soneto que o poeta sadino compôs em sua honra – “Dos tórridos sertões, pejados de ouro…” (cf. Bocage. Obra Completa – Sonetos. Org.: Daniel Pires. Edições Caixotim, 2004, pg. 275).
Ary dos Santos deixaria também na sua obra uma aguarela bocagiana quando considerou o poeta sadino um seu “irmão”, poema já evocado num postal aqui editado.
Desde que publicou A liturgia do sangue, em 1963, Ary dos Santos foi autor de Tempo da lenda das amendoeiras (1964), Adereços, Endereços (1965), Insofrimento in sofrimento (1969), Fotos-grafias (1970), Resumo (1972), As portas que Abril abriu (1975), O sangue das palavras (1978) e VIII sonetos (1984). Poemas seus foram cantados por Amália Rodrigues, Carlos do Carmo, Fernando Tordo, Paulo de Carvalho, Simone de Oliveira e Tonicha, entre outros intérpretes.
Musicado por Paulo de Carvalho e cantado por Carlos do Carmo, aqui se deixa a palavra de “Os Putos”, poema de Ary dos Santos de 1978:
Uma bola de pano, num charco
Um sorriso traquina, um chuto
Na ladeira a correr, um arco
E o céu no olhar, de um puto
Uma fisga que atira, a esperança
Um pardal de calções, astuto
E a força de ser, criança
Contra a força dum “chui”, que é bruto
Parecem bandos de pardais, à solta
Os putos, os putos
São como índios, capitães da malta
Os putos, os putos
Mas quando a tarde cai, vai-se a revolta
Sentam-se ao colo do pai
É a ternura que volta
E ouvem-no falar do homem novo
São os putos deste povo
A aprenderem a ser homens
As caricas brilhando, na mão
A vontade que salta, ao eixo
E um puto que diz, que não
Se a “porrada” vier, não deixo
Um berlinde abafado, na escola
Um pião na algibeira, sem cor
E um puto que pede, esmola
Porque a fome lhe abafa, a dor
É este último nome que nos permite contar uma história do cruzamento de amizade de um antepassado de Ary dos Santos com Bocage. Com efeito, Gomes de Oliveira era casado com Carlota Emília Morais Barbosa (1803-1849), senhora que faleceu em Azeitão e cujo pai, tetravô de Ary dos Santos, era Tomé Barbosa de Figueiredo de Almeida Cardoso (1755-1820), nascido na América do Sul, de pai para ali emigrado oriundo do Minho (Paredes de Coura). Foi este Tomé Barbosa, a trabalhar na Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros, em Lisboa, que se tornou, em dada fase, não só amigo, mas também protector de Bocage, havendo mesmo um soneto que o poeta sadino compôs em sua honra – “Dos tórridos sertões, pejados de ouro…” (cf. Bocage. Obra Completa – Sonetos. Org.: Daniel Pires. Edições Caixotim, 2004, pg. 275).
Ary dos Santos deixaria também na sua obra uma aguarela bocagiana quando considerou o poeta sadino um seu “irmão”, poema já evocado num postal aqui editado.
Desde que publicou A liturgia do sangue, em 1963, Ary dos Santos foi autor de Tempo da lenda das amendoeiras (1964), Adereços, Endereços (1965), Insofrimento in sofrimento (1969), Fotos-grafias (1970), Resumo (1972), As portas que Abril abriu (1975), O sangue das palavras (1978) e VIII sonetos (1984). Poemas seus foram cantados por Amália Rodrigues, Carlos do Carmo, Fernando Tordo, Paulo de Carvalho, Simone de Oliveira e Tonicha, entre outros intérpretes.
Musicado por Paulo de Carvalho e cantado por Carlos do Carmo, aqui se deixa a palavra de “Os Putos”, poema de Ary dos Santos de 1978:
Uma bola de pano, num charco
Um sorriso traquina, um chuto
Na ladeira a correr, um arco
E o céu no olhar, de um puto
Uma fisga que atira, a esperança
Um pardal de calções, astuto
E a força de ser, criança
Contra a força dum “chui”, que é bruto
Parecem bandos de pardais, à solta
Os putos, os putos
São como índios, capitães da malta
Os putos, os putos
Mas quando a tarde cai, vai-se a revolta
Sentam-se ao colo do pai
É a ternura que volta
E ouvem-no falar do homem novo
São os putos deste povo
A aprenderem a ser homens
As caricas brilhando, na mão
A vontade que salta, ao eixo
E um puto que diz, que não
Se a “porrada” vier, não deixo
Um berlinde abafado, na escola
Um pião na algibeira, sem cor
E um puto que pede, esmola
Porque a fome lhe abafa, a dor
[foto a partir de: Ary dos Santos. As palavras das cantigas. 2ª ed. Lisboa: Edições Avante, 1993]
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