Depois de, ontem, o Público ter feito longa peça sobre os "chumbos" e de se ter lido que o Secretário de Estado Valter Lemos disse ser "um facto real que os países que não têm repetência, ou que têm taxas baixas, apresentam também melhores resultados escolares medidos em termos de aprendizagem", quando poderia ter dito o contrário, ou seja, que "os países que apresentam melhores resultados escolares medidos em termos de aprendizagem não têm repetência ou têm-na em taxas baixas"; depois de se ter entendido que há uma corrente que pretende impedir as reprovações como forma de as estatísticas pró-sucesso serem mais benevolentes (convindo lembrar que, se os governantes quiserem, podem acabar com o insucesso escolar, bastando não permitir os "chumbos", ainda que não acabem - porque isso não podem fazer! - com o insucesso no plano dos conhecimentos); depois de se ter percebido que os professores voltam a ser responsabilizados pela grande quantidade de reprovações; depois de sabermos que o Presidente da República voltou a chamar a atenção para a necessidade de bom relacionamento entre o Ministério da Educação e quem trabalha nessa área, especialmente os professores, e também para o facto de que a Matemática (como outra qualquer disciplina, acrescento) não se aprende brincando... vale a pena ler o artigo "O mundo perfeito" que Francisco José Viegas assina no Jornal de Notícias de hoje e de onde extraio o seguinte passo:
"Os pais sabem, às vezes tardiamente, os bons professores sabem, por muitos anos de experiência, que 'facilitar as coisas' pode mostrar um mundo perfeito. Mas o mundo perfeito não existe. Eu entendo bem os pedagogos visionários e utópicos, que prevêem que com divertimento e tolerância tudo se arranja e o mundo ficará melhor. Mas não fica. Não vai ser. Pensamos que basta dar o exemplo, ler, ouvir música, usarmos computadores, sermos tolerantes - e generosos, educados, prestáveis, interessados. Com isso o mundo seria melhor. Mas não basta, infelizmente não basta. Com isso, os adolescentes das escolas seriam pessoas melhores, não usariam aquela gramática de grunhos, não faltariam às aulas, não desdenhariam dos professores que se esforçam e lhes ensinam a diferença entre o culto e o inculto, o cru e o cozido, o bem e o mal. O mundo seria perfeito. As famílias seriam honradas, pacíficas, passeariam ao domingo, fariam piqueniques, todos ajudariam a arrumar a cozinha e dormiriam a horas. Os nossos filhos leriam Dickens e Eça - ou, na pior das hipóteses, arrumariam os livros nas estantes. Interessar-se-iam por ciência e por política. Eu bem os entendo - mas não basta. É muitas vezes necessário ser cruel, usar a autoridade quando não se quer, dizer 'não'quando até poderíamos dizer 'sim', pensar no que significa, de facto, a palavra exigência. A vida não é fácil. Não nos basta sermos o que somos. É preciso pensarmos nisso - que a vida não é fácil e que aprender exige esforço. A democracia, que transformou as escolas em 'estabelecimentos de ensino', como se fossem 'lojas do cidadão', tem de resolver esse problema. Para ver se a escola volta a ser escola."
2 comentários:
Pois é. Andamos nós a dizer isto desde que começámos a «dar aulas» e ninguém nos ouve. E para a nossa ministra, isto deve estar escrito em servo-croata!
Belíssimo artigo. Não poderia estar mais de acordo.
Abraço
Enviar um comentário