Data de 22 de Outubro deste ano uma carta que Domingos Cardoso, professor aposentado de Ílhavo, escreveu, dirigida ao Presidente da República e divulgada através de “mail” e da blogosfera (por exemplo, em quarta república), também já aqui referida e a que o Expresso de sábado deu destaque, não tanto ao conteúdo da missiva, mas sobretudo às razões que levaram o signatário a tal atitude. Conta o jornal que o professor de Ílhavo recebeu entretanto muitas mensagens confirmativas do retrato que traçou na carta ao Presidente. E conta ainda o Expresso: “A carta chegou a Belém e está a ser analisada. A Casa Civil garante que será dada uma resposta, como habitualmente acontece às muitas cartas desta natureza que chegam à Presidência. Em caso de necessidade de informações adicionais, Belém pode mesmo solicitar esclarecimentos aos Ministérios envolvidos para tentar resolver os problemas ou obter mais dados, antes de enviar uma resposta ao queixoso.”
Ora, as situações de que se queixa Domingos Cardoso são um somatório de muitas de que há conhecimento na prática das escolas, só que frequentemente silenciadas, seja porque, nos casos mais felizes, os problemas de desrespeito são resolvidos de imediato (ainda bem!), seja porque a maior parte desse tipo de atitudes de falta de respeito não entra no rol da violência que conta para a estatística e muitos docentes nem as relatam. Aliás, o tom de amenização com que, recentemente, foi divulgado que o número de ocorrências de violência diminuiu no interior das escolas parece confirmar o que disse.
Será interessante ver que tipo de resposta vai ser dada a esta carta do professor ilhavense. Veremos se a divulgação vai ser semelhante… Mas, para já, vale a pena perceber-se que muitas das “exigências” que Domingos Cardoso sugeriu estão relacionadas com a violência que, hoje, Alice Vieira, no Jornal de Notícias , considerou como “perigosa porque mais subtil, mais pela calada, mais insidiosa”, em texto que aqui reproduzo. É que essa pode não ser quantificável, mas não pode ser banalizada nem aceite como normal!
Ora, as situações de que se queixa Domingos Cardoso são um somatório de muitas de que há conhecimento na prática das escolas, só que frequentemente silenciadas, seja porque, nos casos mais felizes, os problemas de desrespeito são resolvidos de imediato (ainda bem!), seja porque a maior parte desse tipo de atitudes de falta de respeito não entra no rol da violência que conta para a estatística e muitos docentes nem as relatam. Aliás, o tom de amenização com que, recentemente, foi divulgado que o número de ocorrências de violência diminuiu no interior das escolas parece confirmar o que disse.
Será interessante ver que tipo de resposta vai ser dada a esta carta do professor ilhavense. Veremos se a divulgação vai ser semelhante… Mas, para já, vale a pena perceber-se que muitas das “exigências” que Domingos Cardoso sugeriu estão relacionadas com a violência que, hoje, Alice Vieira, no Jornal de Notícias , considerou como “perigosa porque mais subtil, mais pela calada, mais insidiosa”, em texto que aqui reproduzo. É que essa pode não ser quantificável, mas não pode ser banalizada nem aceite como normal!
Violência nas escolas, por Alice Vieira
Li num jornal que a senhora ministra da Educação está contente. E, quando os nossos governantes estão contentes, é como se um sol raiasse nas nossas vidas.
E está contente porque, segundo afirmou, a violência nas escolas portuguesas, afinal, não existe.
Ao que parece, andamos todos numa de paz e amor, lá fora é que as coisas tomam proporções assustadoras, os nossos brandos costumes continuam a vingar nos corredores de todas as EB, 2/3, ou como é que as escolas se chamam agora. Tenho muita pena de que os nossos governantes só entrem nas escolas quando previamente se fazem anunciar, com todas as televisões atrás, para que o momento fique na História. É claro que, assim, obrigada, também eu, anda ali tudo alinhado que dá gosto ver, porque o respeitinho pelo Poder é coisa que cai sempre bem no coração de quem nos governa, e que as pessoas gostam de ver em qualquer telejornal.
Mas bastaria a senhora ministra entrar incógnita em qualquer escola deste país para ver como a realidade é bem diferente daquela que lhe pintaram ou que os estudos (adorava saber como se fazem alguns dos estudos com que diariamente se enchem as páginas dos jornais) proclamam. É claro que não falo daquela violência bruta e directa, estilo filme americano, com tiros, naifadas e o mais que houver.
Falo de uma violência muito mais perigosa porque mais subtil, mais pela calada, mais insidiosa.
Uma violência mais "normal".
E não há nada pior do que a normalização, do que a banalização da violência.
Violência é não saberem viver em comunidade, é o safanão, o pontapé e a bofetada como resposta habitual, o palavrão (dos pesados…) como linguagem única, a ameaça constante, o nenhum interesse pelo que se passa dentro da sala, a provocação gratuita ("bata-me, vá lá, não me diga que não é capaz de me bater? Ai que medinho que eu tenho de si…", isto ouvi eu de um aluno quando a pobre da professora apenas lhe perguntou por que tinha chegado tarde…)
Violência é a demissão dos pais do seu papel de educadores - e depois queixam-se nas reuniões de que "os professores não ensinam nada".
Porque, evidentemente, a culpa de tudo é sempre dos professores - que não ensinam, que não trabalham, que não sabem nada, que fazem greves, qualquer dia - querem lá ver? - até fumam…
Os seus filhos são todos uns anjos de asas brancas e uns génios incompreendidos.
Cada vez os pais têm menos tempo para os filhos e, por isso, cada vez mais os filhos são educados pelos colegas e pela televisão (pelos jogos, pelos filmes, etc.). Não têm regras, não conhecem limites, simples palavras como "obrigada", "desculpe", "se faz favor" são-lhes mais estranhas do que um discurso em Chinês - e há quem chame a isto liberdade.
Mas a isto chama-se violência. Aquela que não conta para os estudos "científicos", mas aquela da qual um dia, de repente, rompe a violência a sério.
E então em estilo filme americano.Com tiros, naifadas e o mais que houver.
E está contente porque, segundo afirmou, a violência nas escolas portuguesas, afinal, não existe.
Ao que parece, andamos todos numa de paz e amor, lá fora é que as coisas tomam proporções assustadoras, os nossos brandos costumes continuam a vingar nos corredores de todas as EB, 2/3, ou como é que as escolas se chamam agora. Tenho muita pena de que os nossos governantes só entrem nas escolas quando previamente se fazem anunciar, com todas as televisões atrás, para que o momento fique na História. É claro que, assim, obrigada, também eu, anda ali tudo alinhado que dá gosto ver, porque o respeitinho pelo Poder é coisa que cai sempre bem no coração de quem nos governa, e que as pessoas gostam de ver em qualquer telejornal.
Mas bastaria a senhora ministra entrar incógnita em qualquer escola deste país para ver como a realidade é bem diferente daquela que lhe pintaram ou que os estudos (adorava saber como se fazem alguns dos estudos com que diariamente se enchem as páginas dos jornais) proclamam. É claro que não falo daquela violência bruta e directa, estilo filme americano, com tiros, naifadas e o mais que houver.
Falo de uma violência muito mais perigosa porque mais subtil, mais pela calada, mais insidiosa.
Uma violência mais "normal".
E não há nada pior do que a normalização, do que a banalização da violência.
Violência é não saberem viver em comunidade, é o safanão, o pontapé e a bofetada como resposta habitual, o palavrão (dos pesados…) como linguagem única, a ameaça constante, o nenhum interesse pelo que se passa dentro da sala, a provocação gratuita ("bata-me, vá lá, não me diga que não é capaz de me bater? Ai que medinho que eu tenho de si…", isto ouvi eu de um aluno quando a pobre da professora apenas lhe perguntou por que tinha chegado tarde…)
Violência é a demissão dos pais do seu papel de educadores - e depois queixam-se nas reuniões de que "os professores não ensinam nada".
Porque, evidentemente, a culpa de tudo é sempre dos professores - que não ensinam, que não trabalham, que não sabem nada, que fazem greves, qualquer dia - querem lá ver? - até fumam…
Os seus filhos são todos uns anjos de asas brancas e uns génios incompreendidos.
Cada vez os pais têm menos tempo para os filhos e, por isso, cada vez mais os filhos são educados pelos colegas e pela televisão (pelos jogos, pelos filmes, etc.). Não têm regras, não conhecem limites, simples palavras como "obrigada", "desculpe", "se faz favor" são-lhes mais estranhas do que um discurso em Chinês - e há quem chame a isto liberdade.
Mas a isto chama-se violência. Aquela que não conta para os estudos "científicos", mas aquela da qual um dia, de repente, rompe a violência a sério.
E então em estilo filme americano.Com tiros, naifadas e o mais que houver.
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