O tema que Le Magazine Littéraire escolheu para a sua edição de Setembro – “60 ans de romans sur le nazisme” – impõe-se pela importância que a literatura continua a dar ao fenómeno nazi, haja em vista a publicação recente em França de uma obra como Bienveillantes (2006), de Jonathan Littel, afinal uma motivação para as reflexões que a revista divulga. Por outro lado, como justifica Jean-Louis Hue, no editorial, “la littérature a partie liée avec le mal, avec toutes les catégories du mal” e “la part maudite de la condition humaine qui hante l’écrivain n’a pas de limites”. Nesta paisagem dos “60 ans de romans sur le nazisme”, é considerado como marco inaugural a edição de La Peste (1947), de Camus, referência que perpassa por muitas das reflexões.
Entre as entrevistas publicadas neste dossier, Norman Mailer fala do seu livro The castle in the forest (2007), versão romanceada da concepção e infância de Hitler, personalidade que surgiu para a História “choisi et recruté par le Diable”, homem de fragilidades, mas com génio político. Mailer não desiste desta ideia ao longo da entrevista, para fundamentar a sua opção de pretender dizer que o demónio cerca os homens e se cruza com eles em muitas situações, ao ponto de concluir a conversa com uma pergunta: “si l’on croit en Jésus fils de Dieu, alors pourquoi pas à Hitler fils du Diable?”
A ideia da monstruosidade do nazismo perpassa ainda pela entrevista a Daniel Mendelsohn (autor de The Lost, 2006, trajecto de busca sobre familiares exterminados na Polónia), para quem o importante do nazismo “c’est que ces crimes, ces atrocités, ont été commis, en général, pas par ceux qui étaient déjà des ‘monstres’, mais par des hommes qui ont toujours semblé normaux et se comportaient comme tels: ils avaient des familles, ils allaient à l’église, se voyaient comme des gens ordinaires”. Isto é: as monstruosidades foram cometidas por homens vulgares.
No campo da literatura e a propósito do que se passou nos campos de concentração, Yves Stalloni lembra que três tipos de narrativas sobre os campos nazis têm tido eco, constituindo outras tantas maneiras de relacionar a literatura com a verdade: a escrita testemunhal (que pode padecer de um tom hiperbólico), o testemunho tornado narrativa (eivado de marcas literárias, mas resultando da vivência concentracionária) e a escrita ficcional (ainda que notando a diferença entre a produzida por deportados que preferiram cobrir o seu testemunho com a capa da ficção e a de escritores que recorreram a testemunhos e a documentos). O autor defende a “estetização” dos dramas e dos conflitos, porque essa prática, “loin d’en effacer le souvenir, pourrait bien être la meilleure manière de le réchauffer”.
A perspectiva da literatura alemã sobre este mesmo fenómeno também merece referência pela análise de Lionel Richard – para uma primeira geração de escritores, o sentimento da culpa era o forte (“le poids de la faute et la nécessité de s’en libérer sont principalement les moteurs de l’écriture”); a geração seguinte será a que vai levar os filhos a pôr os pais em causa; finalmente, uma terceira geração, distante de relações com as décadas de 30 e 40, vê nos episódios nazis não mais do que “un réservoir de sujets appelés, semblablement aux autres, à nourrir leur imagination et à devenir littérature”.
Entre as entrevistas publicadas neste dossier, Norman Mailer fala do seu livro The castle in the forest (2007), versão romanceada da concepção e infância de Hitler, personalidade que surgiu para a História “choisi et recruté par le Diable”, homem de fragilidades, mas com génio político. Mailer não desiste desta ideia ao longo da entrevista, para fundamentar a sua opção de pretender dizer que o demónio cerca os homens e se cruza com eles em muitas situações, ao ponto de concluir a conversa com uma pergunta: “si l’on croit en Jésus fils de Dieu, alors pourquoi pas à Hitler fils du Diable?”
A ideia da monstruosidade do nazismo perpassa ainda pela entrevista a Daniel Mendelsohn (autor de The Lost, 2006, trajecto de busca sobre familiares exterminados na Polónia), para quem o importante do nazismo “c’est que ces crimes, ces atrocités, ont été commis, en général, pas par ceux qui étaient déjà des ‘monstres’, mais par des hommes qui ont toujours semblé normaux et se comportaient comme tels: ils avaient des familles, ils allaient à l’église, se voyaient comme des gens ordinaires”. Isto é: as monstruosidades foram cometidas por homens vulgares.
No campo da literatura e a propósito do que se passou nos campos de concentração, Yves Stalloni lembra que três tipos de narrativas sobre os campos nazis têm tido eco, constituindo outras tantas maneiras de relacionar a literatura com a verdade: a escrita testemunhal (que pode padecer de um tom hiperbólico), o testemunho tornado narrativa (eivado de marcas literárias, mas resultando da vivência concentracionária) e a escrita ficcional (ainda que notando a diferença entre a produzida por deportados que preferiram cobrir o seu testemunho com a capa da ficção e a de escritores que recorreram a testemunhos e a documentos). O autor defende a “estetização” dos dramas e dos conflitos, porque essa prática, “loin d’en effacer le souvenir, pourrait bien être la meilleure manière de le réchauffer”.
A perspectiva da literatura alemã sobre este mesmo fenómeno também merece referência pela análise de Lionel Richard – para uma primeira geração de escritores, o sentimento da culpa era o forte (“le poids de la faute et la nécessité de s’en libérer sont principalement les moteurs de l’écriture”); a geração seguinte será a que vai levar os filhos a pôr os pais em causa; finalmente, uma terceira geração, distante de relações com as décadas de 30 e 40, vê nos episódios nazis não mais do que “un réservoir de sujets appelés, semblablement aux autres, à nourrir leur imagination et à devenir littérature”.
O leitor deste dossier poderá encontrar outras reflexões sobre as abordagens que a literatura fez do “mal nazi”, assim como apreciações dos títulos romanescos mais recentes que nele fizeram incursão.
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