1. O Dia Mundial do Professor celebra-se em 5 de Outubro desde que a UNESCO resolveu associar esta comemoração à mesma data em que, em 1966, uma conferência intergovernamental, organizada conjuntamente pela UNESCO e pela OIT (Organização Internacional do Trabalho), aprovou uma “Recomendação” respeitante ao estatuto dos professores. A primeira vez que foi assinalada a data foi em 1993, em Genève, com a presença de Federico Mayor, alto responsável da UNESCO. Os professores são hoje 60 milhões em todo o mundo e a UNESCO reconhece que se trata de um grupo profissional fundamental sem o qual “não pode haver nem desenvolvimento durável, nem coesão social, nem paz”.
2. Na mensagem conjunta subscrita por várias entidades (UNESCO, OIT, PNUD, UNICEF e IE) para o Dia Mundial do Professor deste ano, a profissão é assim valorizada: “O sistema educativo deve atrair e fidelizar um pessoal docente bem formado, motivado e composto igualmente por homens e por mulheres; deve apoiar os professores nas aulas e ao longo da sua carreira. A desvalorização dos professores, a fragilidade das suas remunerações, a mediocridade das condições de ensino e aprendizagem e a falta de evolução na carreira ou de formação profissional são outras tantas causas de descontentamento que levaram muitos a abandonar a profissão, por vezes depois de poucos anos de serviço.” Mais adiante, são abordadas as políticas: “As decisões que levam a fazer face à falta de pessoal aumentando o tamanho das turmas, alargando a carga de trabalho dos professores – particularmente quando o apoio de que beneficiam é já insuficiente –, baixando o nível de entrada nas instituições de formação de professores, recrutando pessoas não ou pouco formadas ou à base de contratos que não lhes oferecem segurança no emprego, contribuem para desvalorizar ainda mais a profissão, deixando os professores fragilizados face às realidades da profissão, ou para os desmotivar.” A terminar, a mensagem acentua um desejo que é também uma esperança: “Reconhecendo o papel essencial que os professores desempenham, reafirmamos a que ponto é necessário continuar a trabalhar conjuntamente para melhor vencer os problemas e estar no caminho para que as modalidades de recrutamento, de formação e de apoio aos professores permitam dispor de um corpo docente motivado e capaz de contribuir para a realização do nosso objectivo comum: uma educação de qualidade para todos os jovens.”
3. A gente lê, em muitas coisas reconhece o nosso país (felizmente, noutras não) e, ao olhar para a paisagem, fica a angústia resultante da forma como a imagem dos professores tem sido tratada nos últimos anos, sobretudo pelos políticos, numa atitude de duvidoso respeito pela profissão, numa oposição em que se confrontam governantes e sindicalistas, mas pela qual os professores, na sua quase totalidade desligados de qualquer destas esferas enquanto poder, são tabelados por baixo, aparecendo uma imagem da sua “pretensa” deficiente formação científica (relembre-se o que se passou quanto à generalização da TLEBS), da sua “pretensa” deficiente formação profissional (relembre-se que se criou a ideia de que o professor pertence a uma classe de pouco trabalho), da sua “pretensa” deficiente função social (relembre-se que os resultados do insucesso escolar foram várias vezes catapultados para a responsabilidade do professor), da sua “pretensa” deficiente qualidade (relembre-se essa ideia peregrina que persegue os defensores dos “rankings”, como se um “ranking” fosse atestado de qualidade ou da sua falta; relembre-se o cuidado burocrático das grelhas para avaliação dos docentes, como se uma aula – qualquer aula – fosse uma subserviência a uma folha de papel). E é pena que assim tenha acontecido!
4. Na última edição da revista “Única” saída no Expresso (29 de Setembro), a secção “Uma pequena grande ideia” estava a cargo de Nuno Crato, que falou sobre os professores. E o texto termina desta maneira: “Recorda [Nuno Crato] os tímidos elogios e manifestações de carinho e agradecimento dos jovens que passaram pelas suas aulas. São aqueles que já não são alunos e que passam pelo Instituto por uma razão qualquer e que batem à porta do meu gabinete para dizer um simples olá, ou outros que me cumprimentam na rua. Sabe bem.” Os alunos, eles mesmos, reconhecem o valor dos professores, mesmo que seja tardiamente. E já todos tivemos sensações como esta que Nuno Crato regista: nas cartas que nos enviaram quando saíram da escola; nas mensagens que nos dirigiram, às vezes timidamente, a agradecer as aprendizagens e os exemplos do passado; nos encontros em serviços, em empresas, na rua, com a surpresa por parte do ex-aluno e do ex-professor; nas recordações que chamam para as conversas depois de muitos anos…
5. Levado nesta onda, recordo vários dos meus professores que me levaram a ficar-lhes grato por nos termos cruzado, porque com eles aprendi a ser o que era e a ser o que sou: Maria Delfina Campos Gomes (da escola primária, em Alvarães), João Felgueiras (mestre de Latim, jesuíta, que, em finais de 1969, partiu para Timor), António Morujão, Manuel Gomes, Manuel Faria e Abílio Queirós (jesuítas, que, em Cernache, me levaram pelas veredas da Geografia, da História, da Matemática e do Português), Maria Luísa (que me iniciou na língua francesa), Joel Canhão (com quem aprendi os primeiros andamentos e leituras de música) e Álvaro Marques (do Liceu de Viana do Castelo, que nos suscitou as primeiras discussões de aprendizagem democrática). Depois, no ensino superior, vários outros se impuseram no relacionamento, no respeito e na proximidade – Mário Dionísio, Ana Mafalda Leite, José Manuel Feio, Urbano Tavares Rodrigues, Fátima Freitas Morna, Maria Lucília Gonçalves Pires, David Mourão-Ferreira e António Vilhena (todos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, tendo depois fomentado a amizade com alguns deles, especialmente com o António Vilhena, que, posteriormente, vim encontrar na Secundária de Bocage, em Setúbal) e, finalmente, porque mais recente, Clara Rocha (da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa). Enquanto professor, tenho-me esforçado por ter um pouco de cada um deles, naquilo em que os admirei (e admiro). Todos me ajudaram a poder dizer, na peugada de Sebastião da Gama, quando acabou de ler o livro do pedagogo Radice: “vi mais agudamente a beleza e a responsabilidade de ser Professor, quis ser Professor mais que nunca” (Diário, 20 de Abril de 1949).
6. Todos os pontos anteriores são fundamentais para me entender enquanto professor, aluno que já fui (e continuo), nunca desligado da escola desde que nela entrei aos 5 anos. Todas estas ideias e memorações me perpassam neste Dia Mundial do Professor em que acho que contra o pessimismo que nos tenta engolir deve vingar o optimismo do que é o acto de educar e de ensinar. “Para ser professor, também é preciso ter as mãos purificadas. (…) O aluno acredita em nós e não deve acreditar em vão. Impõe-se-nos que mereçamos, com a nossa, a pureza dos nossos alunos; que a nossa alimente a deles, a mantenha. Sejamos a lição em pessoa – que é isso mais importante e eficaz que sermos o papel onde a lição está escrita.” Outra vez Sebastião da Gama (Diário, 30 de Março de 1949), porque sim!
2. Na mensagem conjunta subscrita por várias entidades (UNESCO, OIT, PNUD, UNICEF e IE) para o Dia Mundial do Professor deste ano, a profissão é assim valorizada: “O sistema educativo deve atrair e fidelizar um pessoal docente bem formado, motivado e composto igualmente por homens e por mulheres; deve apoiar os professores nas aulas e ao longo da sua carreira. A desvalorização dos professores, a fragilidade das suas remunerações, a mediocridade das condições de ensino e aprendizagem e a falta de evolução na carreira ou de formação profissional são outras tantas causas de descontentamento que levaram muitos a abandonar a profissão, por vezes depois de poucos anos de serviço.” Mais adiante, são abordadas as políticas: “As decisões que levam a fazer face à falta de pessoal aumentando o tamanho das turmas, alargando a carga de trabalho dos professores – particularmente quando o apoio de que beneficiam é já insuficiente –, baixando o nível de entrada nas instituições de formação de professores, recrutando pessoas não ou pouco formadas ou à base de contratos que não lhes oferecem segurança no emprego, contribuem para desvalorizar ainda mais a profissão, deixando os professores fragilizados face às realidades da profissão, ou para os desmotivar.” A terminar, a mensagem acentua um desejo que é também uma esperança: “Reconhecendo o papel essencial que os professores desempenham, reafirmamos a que ponto é necessário continuar a trabalhar conjuntamente para melhor vencer os problemas e estar no caminho para que as modalidades de recrutamento, de formação e de apoio aos professores permitam dispor de um corpo docente motivado e capaz de contribuir para a realização do nosso objectivo comum: uma educação de qualidade para todos os jovens.”
3. A gente lê, em muitas coisas reconhece o nosso país (felizmente, noutras não) e, ao olhar para a paisagem, fica a angústia resultante da forma como a imagem dos professores tem sido tratada nos últimos anos, sobretudo pelos políticos, numa atitude de duvidoso respeito pela profissão, numa oposição em que se confrontam governantes e sindicalistas, mas pela qual os professores, na sua quase totalidade desligados de qualquer destas esferas enquanto poder, são tabelados por baixo, aparecendo uma imagem da sua “pretensa” deficiente formação científica (relembre-se o que se passou quanto à generalização da TLEBS), da sua “pretensa” deficiente formação profissional (relembre-se que se criou a ideia de que o professor pertence a uma classe de pouco trabalho), da sua “pretensa” deficiente função social (relembre-se que os resultados do insucesso escolar foram várias vezes catapultados para a responsabilidade do professor), da sua “pretensa” deficiente qualidade (relembre-se essa ideia peregrina que persegue os defensores dos “rankings”, como se um “ranking” fosse atestado de qualidade ou da sua falta; relembre-se o cuidado burocrático das grelhas para avaliação dos docentes, como se uma aula – qualquer aula – fosse uma subserviência a uma folha de papel). E é pena que assim tenha acontecido!
4. Na última edição da revista “Única” saída no Expresso (29 de Setembro), a secção “Uma pequena grande ideia” estava a cargo de Nuno Crato, que falou sobre os professores. E o texto termina desta maneira: “Recorda [Nuno Crato] os tímidos elogios e manifestações de carinho e agradecimento dos jovens que passaram pelas suas aulas. São aqueles que já não são alunos e que passam pelo Instituto por uma razão qualquer e que batem à porta do meu gabinete para dizer um simples olá, ou outros que me cumprimentam na rua. Sabe bem.” Os alunos, eles mesmos, reconhecem o valor dos professores, mesmo que seja tardiamente. E já todos tivemos sensações como esta que Nuno Crato regista: nas cartas que nos enviaram quando saíram da escola; nas mensagens que nos dirigiram, às vezes timidamente, a agradecer as aprendizagens e os exemplos do passado; nos encontros em serviços, em empresas, na rua, com a surpresa por parte do ex-aluno e do ex-professor; nas recordações que chamam para as conversas depois de muitos anos…
5. Levado nesta onda, recordo vários dos meus professores que me levaram a ficar-lhes grato por nos termos cruzado, porque com eles aprendi a ser o que era e a ser o que sou: Maria Delfina Campos Gomes (da escola primária, em Alvarães), João Felgueiras (mestre de Latim, jesuíta, que, em finais de 1969, partiu para Timor), António Morujão, Manuel Gomes, Manuel Faria e Abílio Queirós (jesuítas, que, em Cernache, me levaram pelas veredas da Geografia, da História, da Matemática e do Português), Maria Luísa (que me iniciou na língua francesa), Joel Canhão (com quem aprendi os primeiros andamentos e leituras de música) e Álvaro Marques (do Liceu de Viana do Castelo, que nos suscitou as primeiras discussões de aprendizagem democrática). Depois, no ensino superior, vários outros se impuseram no relacionamento, no respeito e na proximidade – Mário Dionísio, Ana Mafalda Leite, José Manuel Feio, Urbano Tavares Rodrigues, Fátima Freitas Morna, Maria Lucília Gonçalves Pires, David Mourão-Ferreira e António Vilhena (todos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, tendo depois fomentado a amizade com alguns deles, especialmente com o António Vilhena, que, posteriormente, vim encontrar na Secundária de Bocage, em Setúbal) e, finalmente, porque mais recente, Clara Rocha (da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa). Enquanto professor, tenho-me esforçado por ter um pouco de cada um deles, naquilo em que os admirei (e admiro). Todos me ajudaram a poder dizer, na peugada de Sebastião da Gama, quando acabou de ler o livro do pedagogo Radice: “vi mais agudamente a beleza e a responsabilidade de ser Professor, quis ser Professor mais que nunca” (Diário, 20 de Abril de 1949).
6. Todos os pontos anteriores são fundamentais para me entender enquanto professor, aluno que já fui (e continuo), nunca desligado da escola desde que nela entrei aos 5 anos. Todas estas ideias e memorações me perpassam neste Dia Mundial do Professor em que acho que contra o pessimismo que nos tenta engolir deve vingar o optimismo do que é o acto de educar e de ensinar. “Para ser professor, também é preciso ter as mãos purificadas. (…) O aluno acredita em nós e não deve acreditar em vão. Impõe-se-nos que mereçamos, com a nossa, a pureza dos nossos alunos; que a nossa alimente a deles, a mantenha. Sejamos a lição em pessoa – que é isso mais importante e eficaz que sermos o papel onde a lição está escrita.” Outra vez Sebastião da Gama (Diário, 30 de Março de 1949), porque sim!
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