sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Elas aí estão, as faltas!

Ainda não vai há 3 horas que a notícia foi posta na edição online do Público: o novo estatuto do aluno foi aprovado por quem acha que tem sempre razão e por quem acha que tem a missão de refundar o país e a civilização. Facilitismo... é pouco! Um dia, as consequências hão-de cair-nos em cima. Só é pena que seja em cima de todos!
«Governo acusado de facilitismo - PS aprova novo Estatuto do Aluno sob críticas da oposição
O PS aprovou hoje, sozinho, em votação final global, o novo Estatuto do Aluno sob as duras críticas dos partidos da oposição, que acusaram a maioria socialista de facilitismo.Todas as bancadas da oposição, PSD, CDS-PP, PCP, Bloco de Esquerda e Partido Ecologista “Os Verdes”, uniram-se no voto e nas críticas ao Executivo por a lei não valorizar a assiduidade.
Os social-democratas e os democratas-cristãos pediram mesmo nova discussão em plenário do artigo 22.º, apresentando propostas alternativas, que foram "chumbadas" pelos deputados da maioria.
No início do mês, e perante as críticas generalizadas, de partidos e sindicatos, o PS apresentou a terceira proposta de alteração estipulando que se o aluno faltar sem justificação à referida prova fica retido, no caso do básico, ou excluído da frequência da disciplina, no caso do secundário, o que não estava previsto nas propostas anteriores.PSD e CDS-PP acusavam o Executivo de laxismo dado que, na proposta inicial, não se prever que o aluno ficasse retido ou fosse excluído por faltas.
O dever da assiduidade continua a ser posto em causa, afirmaram hoje no debate os deputados Emídio Guerreiro (PSD) e José Paulo Carvalho (CDS-PP).
O novo estatuto, disse Emídio Guerreiro, promove o facilistismo e tenta "resolver o problema do insucesso e do abandono escolar através de artifícios estatísticos".A bancada do PS, através da deputada Luísa Caré, anunciou a apresentação de declarações de voto sobre a lei.»

Máximas em mínimas (12)

Multidão
Uma multidão é sempre estúpida, torna-se ameaçadora, comprime cada vez mais (…). Uma multidão, o que é?, não é nada, indivíduos inofensivos se lhes falarmos olhos nos olhos. Mas todos juntos, quase colados uns aos outros, no odor dos corpos, da transpiração, dos hálitos, de rostos espantados, à espreita da mais leve palavra, certa ou errada, transforma-se em dinamite, numa máquina infernal, numa marmita fumegante prestes a explodir se alguém lhe tocar.
Philippe Claudel, Les âmes grises, 2003 (trad. port.: Almas Cinzentas, 2004)

Em greve...

... pelas razões apresentadas pela "Plataforma Sindical de Professores". E por outras, que com elas se ligam e dão lugar à indignação.
Não, não é fim-de-semana prolongado. Tenho estado a corrigir trabalhos dos alunos, não em qualquer paraíso de viagem, mas em casa. E mais: com uma das turmas com quem teria aula hoje combinei leccioná-la na 2ª feira. E mais ainda: não sou adepto das greves (até hoje, é a segunda vez que participo; a outra vez tem já muitos anos) e lamento que elas surjam encostadas aos fins-de-semana ou aos feriados!

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Amanhã


De pequenino se torce... o sucesso

No Diário de Notícias de hoje, Pedro Lomba faz crónica sobre o sucesso. Trago para aqui o final, porque contém um desafio: é que o sucesso... nem sempre é o que parece!
"(...) O sucesso não é condição suficiente para se ser uma "pessoa de sucesso". "As pessoas de sucesso" falam um código próprio, usam uma linguagem reconhecível, demonstram uma atitude. Para sermos reconhecidos como "pessoas de sucesso", precisamos de conviver com outras "pessoas de sucesso". A primeira decisão de uma "pessoa de sucesso" é livrar-se de todos os desgraçados à sua volta. Depois, "a pessoa de sucesso" fala abundantemente do seu sucesso, de como o merece e de como nada do que lhe aconteceu foi por acaso. E, muito importante, sempre que pode, "a pessoa de sucesso" escancara na cara dos outros esse estatuto. São um perigo estas "pessoas de sucesso". Uma má influência para as crianças que podem querer nos seus sonhos ser uma "pessoa de sucesso". Vivem em pose permanente. Desprezam quem presumem abaixo deles.
O psicanalista britânico Adam Philips escreveu uma vez, no seu estilo obscuro, que o "sucesso na terapia pode significar falhanço na universidade". O que acho que isto quer dizer é que as "pessoas de sucesso" numas áreas podem ser "pessoas de insucesso" noutras e que a sua satisfação, por isso, acaba por ser fútil e compensatória. E que estamos sempre tão perto do falhanço em tudo o que fazemos que devíamos pensar que o sucesso, por melhor que seja, não é bem o que parece."
E anda a gente a ouvir falar sobre sucesso todos os dias e a ser empurrada para o sucesso, como se isso fosse a coisa mais maravilhosa do mundo, como se todos tivéssemos que nos vergar ao dito deus!...

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Hoje, no "Correio de Setúbal"

Diário da Auto-Estima – 71
Maurício Costa – A Liga dos Amigos de Setúbal e Azeitão (LASA) vai promover, em 28 de Novembro e em 1 de Dezembro, uma homenagem a Maurício Costa, que, à data do seu falecimento, em 27 de Fevereiro de 2006, era o seu Presidente da Direcção, cerimónia que passa pela inclusão do nome do professor na toponímia de Setúbal e por um encontro em que será abordada a sua acção e em que não faltarão os testemunhos. Maurício Costa foi uma das primeiras pessoas que conheci quando vim viver para Setúbal e sempre me impressionou nele a sua actividade e a vontade férrea que demonstrava de fazer coisas inovadoras, de promover a cidade, de querer incentivar projectos que com essas duas qualidades se cruzassem. Estive com Maurício Costa em várias situações e estabelecemos uma relação de proximidade também cimentada nos alicerces que atrás mencionei. Sei que o seu feitio, mercê de muitas circunstâncias, nem sempre foi apreciado por todos. Mas não posso reter o apreço que por ele senti. Nunca ouvi da sua parte manifestações de resistência ou de reticências a ideias novas, antes pelo contrário, senti encorajamentos e apoios. Foi a imagem de um lutador e de um cidadão sempre aberto à inovação e permanentemente atento ao mundo, e à sua cidade em particular, que dele me ficou. É essa que quero preservar. É bom que a memória colectiva mantenha o seu nome, mesmo pelo que pode ser um sinal de exemplo para uma atitude de cidadania, que, nos tempos que correm, tem imensas marcas de frouxidão!
Baptista-Bastos – Sempre que leio um texto de Baptista-Bastos, seja literário ou jornalístico, três nomes de clássicos portugueses se me impõem de imediato: António Vieira, pela clareza dedutiva e pela lógica do raciocínio; Camilo, pela velocidade da acção e pela rapidez da percepção das histórias; Eça, pela atenção dada à imagem do outro, numa adjectivação que ora caricatura, ora aprofunda, ultrapassando o que é visível à comum das criaturas. Li os dois últimos livros de Baptista-Bastos – As bicicletas em Setembro e A bolsa da avó Palhaça – e confirmei esta minha ideia. Um e outro fazem percursos autobiográficos na Lisboa da infância do autor; um e outro se deleitam na memória e na afirmação da identidade; um e outro passam por questões que também são do homem do nosso tempo, como a intriga, a solidão, a morte, o sonho, a memória. Em ambos está presente o fascínio e o afecto pela palavra dita e pela palavra escrita, porque “as palavras comportam várias direcções e possuem o peso que cada um lhes deseja emprestar” (de As bicicletas em Setembro) e porque o conselho que a professora Odete, da escola primária, dava é de mestre: “Não tenham medo das palavras. As palavras gostam de quem lhes quer bem.” (de A bolsa da avó palhaça).
Aditamento em 27 de Novembro, às 18h48: Este texto não saiu no Correio de Setúbal de hoje por razões de espaço. Sairá numa próxima edição (na de sábado, suponho).

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Aprender contigo... na APPACDM (4)

Ser diferente é relativo

Falarei de um menino deficiente
De igual maneira que falarei de alguém
Cujo coração bate vivamente,
Como o da criança que encontrei…

A sua mão formatada apelava por ajuda.
Os seus traços expressivos, indecifráveis…
E o seu estrabismo bem notável…
Fizeram-me hesitar! Recuei!

Meu Deus! Como foi possível agir assim?!

Não, voltei a pensar:
Estendi a mão, abri os braços…
Respirei fundo e…
Como soube bem aquele abraço!
O efeito que o seu sorriso em mim provocou
Fez de si uma pessoa diferente!
Esta sim, era a verdadeira razão para ser diferente!

Foi contigo que aprendi.

Estas crianças são diferentes,
Não pelo problema mental,
Mas pela coragem especial

De enfrentar insensível gente
Que humilha, despreza, goza
E fere a ferida mais difícil de sarar…
Gente que não faz isto é rara
E emocionalmente valiosa.

Para sempre no coração
Fica o incómodo arranhão
Feito por estas mentes
Que rasgam almas bruscamente
E que extinguem a auto-estima já pouco existente.

Mão-de-obra?
O rude ser humano mau e ignorante!

Tudo isto que aqui escrevi,
Foi de facto o que senti!
Tudo isto que aqui escrevi,
Foi contigo que aprendi!

Sinto-me na obrigação
De obedecer ao meu coração
E dizer-te: Obrigada!
Inês Figueiredo
Este poema obteve o 1º lugar na modalidade escolar no Concurso de Poesia promovido pela APPACDM de Setúbal deste ano. A autora é aluna na Escola Secundária de Palmela, na turma 8ºC. [foto: a partir de www.fiocruz.br]

Aprender contigo... na APPACDM (3)

Aprender Contigo

No calor da tua voz,
eu sinto o teu sorriso,
mas sei que no meu mundo
das flores primaveris
a abrir,
onde o brilho do teu olhar
é como o Sol,
aprender contigo
é uma luz
para me encontrar
com o teu carinho.
Segue o pulsar do teu coração
e nunca estarás sozinho.
Vais sentir
que ouves
o chilrear dos pássaros,
o canto das fontes,
os campos verdejantes
a serem varridos pelo vento.
E, no mais inebriante
dos sonos,
na maior pureza
das palavras,
eu vou aprender contigo.

Filomena Caixas Peixeiro
Este poema obteve o 2º lugar na modalidade escolar no Concurso de Poesia promovido pela APPACDM de Setúbal deste ano. A autora é aluna na Escola Secundária de Palmela, na turma 8ºB. [foto: a partir de www.fiocruz.br]

Aprender contigo... na APPACDM (2)

FANA

Vou tentando perceber,
Que mensagem queres passar
Todo o dia em meu redor
Todo o dia a pedinchar...


Fana, Fana!
Tu tás boa?
Fana , Fana!
Como tás?
Dá-me um bolo!
Fana, Fana
Ou então, o que me dás?

Vai-te embora, Vera Lúcia,
Que eu preciso trabalhar!
Não te dou bolo nenhum,
Ficas gorda,
Faz-te mal!

Mas de novo, lá vem ela...
Toda muito redondinha,
Ar brejeiro e olhar doce
Com seu jeito de menina
Que vontade de apertar
A bochecha coradinha.

Fana, Fana!
Não te zangues,
Fico triste, vou chorar!
Não te zangues, Fana, Fana!
Que eu só te quero abraçar!

E ao sentir tanta ternura
Já consigo perceber
A razão porque tu estás
Presente na minha vida.

Foi para me ensinares,
Ou foi para eu aprender
Que uma amizade “diferente”
Tem raízes tão profundas
Que unem a Fana à Vera
Como se fosse só uma!

Maria Fernanda Esteves

Como prometido em postal de sábado, publico o poema que ficou em primeiro lugar no concurso de poesia promovido pela APPACDM de Setúbal, sujeito ao tema "Aprender contigo". Para próximos postais, ficarão outros poemas... [foto: a partir de www.fiocruz.br]

domingo, 25 de novembro de 2007

Rostos (11)

D. João V (1689-1750), em trabalho de José Aurélio (1998),
em Alter (Coudelaria, que deve a sua fundação, em 1748, a este rei)

Um iluminismo doido?

No Público de hoje, há dois artigos de opinião que parece terem sido combinados quanto à temática, abordando o espaço de manobra que a todos cada vez menos resta quanto a decisões pessoais e este pendor regulamentador de tudo e de nada, como se o mundo (um outro mundo) estivesse a ser construído agora. Só que este outro mundo é lixiviado e oleado e não se compadece com as pessoas, antes se orienta por quem quer ser dono do mundo e para quem as pessoas são instrumentos da engrenagem. Decididamente, é a era do paradoxo da liberdade regulamentada ou do “despotismo iluminado” (como lhe chama Vasco Pulido Valente) ou de uma época em que… “eles estão doidos” (como diz António Barreto).
De “Eles estão doidos!”, de António Barreto, que inventaria situações de proibições comezinhas que nos vão entrando no curso da vida: “Quem não quer funcionar como uma empresa, quem não usa os computadores tão generosamente distribuídos pelo país, quem não aceita as receitas harmonizadas, quem recusa fornecer-se de produtos e matérias-primas industriais e quem não quer ser igual a toda a gente está condenado. Estes exércitos de liquidação são poderosíssimos: têm estado-maior em Bruxelas e regulam-se pelas directivas europeias elaboradas pelos mais qualificados cientistas do mundo (…). Tudo isto, como é evidente, para nosso bem. Para proteger a nossa saúde. Para modernizar a economia. Para apostar no futuro. Para estarmos na linha da frente. E não tenhamos dúvidas: um dia destes, as brigadas vêm, com estas regras, fiscalizar e ordenar as nossas casas. Para nosso bem, pois claro.”
De “O despotismo iluminado”, de Vasco Pulido Valente, que se insurge quanto a esta mania de todos terem que pensar igual: “No Portugal de 2007, (…) foi decidido o que devemos pensar sobre: multiculturalismo, sexualidade e moral sexual. O que devemos tolerar e o que não tolerar no próximo ou no comportamento do próximo. O que são ou não são políticas permissíveis para Portugal e para o mundo. E foi decidido o que um cidadão meritório come e bebe e que vícios a vontade geral lhe consente (o tabaco, não; a droga, conforme). Vivemos sob um despotismo iluminado, que não aceita a irregularidade, a dissidência, o direito de cada um à sua própria vida e ao uso irrestrito da sua própria cabeça. Ao pé disto, a pequena política doméstica não vale nada.”

Baptista-Bastos em Palmela

Uma sugestão para amanhã à noite: pelas 21h00, a Biblioteca Municipal de Palmela (Largo de S. João), vai promover um encontro com Baptista-Bastos, escritor e jornalista. Pretextos? A sua obra, claro, especialmente os dois títulos que saíram ao longo de 2007, o último dos quais na semana passada: As bicicletas em Setembro, o primeiro, e A bolsa da avó Palhaça, o mais recente. Nos encontros que a BMP tem promovido, há o hábito de os leitores conversarem com os autores...

sábado, 24 de novembro de 2007

Maurício Costa homenageado em Setúbal

A Liga dos Amigos de Setúbal e Azeitão (LASA) vai promover uma homenagem ao Professor Maurício Costa, que foi seu Presidente da Direcção, nos dias 28 de Novembro e 1 de Dezembro, com o seguinte programa:
28 de Novembro (Aniversário da LASA): 09h30 – Romagem ao cemitério da Nossa Senhora da Piedade (Setúbal) // 10h30 – Descerrar de placa de rua atribuída pela autarquia em homenagem ao Professor. // 16h00 – Inauguração da nova sede da LASA.
01 de Dezembro: 14h30 – Homenagem na Serra da Arrábida (miradouro da Serra do Arremula), com intervenção do Núcleo da Poesia da LASA // Deposição na serra da Arrábida de um ramo confeccionado com flores da Arrábida // Cerimónia de Plantação de uma espécie autóctone da serra. // 18h30 - ENCONTRO EVOCATIVO (Salão Nobre dos Paços do Concelho) - Projecção de filme/imagens da vida e obra do professor Maurício Costa // 1.ª intervenção: O HOMEM (Pessoal/Familiar/Amigos) // 2.ª Intervenção: O PROFESSOR // 3.ª Intervenção: O CIDADÃO – Associativismo, Ambiente, Património, Causas, Projecção de diapositivos/vídeo, Momento musical, Escrita de livro para edição “In memoriam”.
António Maurício Pinto da Costa nasceu em 20 de Outubro de 1931 na freguesia de Matriz, em Montemor-o-Novo. Filho de António Maurício da Costa Júnior e de Regina Gonçalves Pinto da Costa, cedo veio para Setúbal, cidade onde fez os estudos liceais e onde viria a fixar-se. Foi, aliás, a Setúbal que sempre ficou ligado, devendo-se o seu nascimento em terras de Montemor-o-Novo, assim como a sua mudança para Setúbal, à situação ocasional do emprego paterno como quadro da CP.
Em 1958, Maurício Costa, depois de um percurso em que conheceu José Hermano Saraiva, Fernando Catarino e Galopim de Carvalho, completava a licenciatura em Ciências Biológicas na Faculdade de Ciências de Lisboa, título que lhe garantiu a entrada no ensino como professor eventual, no então Liceu Nacional de Setúbal, aí ocupando o lugar entre os anos lectivos de 1958/59 e de 1962/63. Neste ano lectivo, em Dezembro, entrou no Liceu Pedro Nunes, em Lisboa, como estagiário, até final do ano lectivo seguinte, período em que foi professor de Marcelo Rebelo de Sousa. Voltou ao Liceu Nacional de Setúbal como professor agregado em 1964/65, aí leccionando até 1969/70, ano em que passou a professor efectivo.

Foi colocado no Liceu Nacional de Portimão no ano lectivo de 1970/71, mas, em Outubro de 1970, foi nomeado Director da Escola Preparatória de Bocage, em Setúbal, estabelecimento de ensino que dirigiu até 1974. Entretanto, o seu vínculo ao ensino tinha passado de Portimão para o Liceu Nacional do Barreiro no ano lectivo de 1971/72, aí tendo leccionado em 1974/75. No ano lectivo seguinte (1975/76), regressou ao Liceu Nacional de Setúbal (Escola Secundária de Bocage desde 1980/81), onde leccionou até à aposentação, em 1 de Novembro de 1993.
Enquanto professor, para além da actividade lectiva (em que foi paladino da experimentação), exerceu funções como Director de Instalações, Delegado de Disciplina, Orientador de Estágio, Director de Escola e no âmbito da Formação de Professores. Foi co-autor dos programas da disciplina de Biologia de 10º e de 12º ano que entraram em vigor a partir de 1982/83. Foi ainda na condição de professor que assumiu a assessoria da educação da Governadora Civil de Setúbal Irene Aleixo, que exerceu funções no Conselho Nacional do SINDEP (Sindicato Democrático dos Professores) e que integrou a equipa inicial do Pólo Universitário de Setúbal da Dinensino (criado no ano lectivo de 1990/91).
Ligado ao movimento associativo (Associação de Solidariedade Social dos Professores, Centro de Estudos Bocageanos, Misericórdia de Setúbal, Liga dos Amigos do Jardim Botânico), fez parte dos órgãos sociais de várias instituições e interveio em várias estruturas locais (Direcção do Clube Setubalense e da Liga dos Amigos de Setúbal e Azeitão, órgãos locais do Partido Social-Democrata, Assembleia-Geral da Sociedade Musical Capricho Setubalense e do POLIS de Setúbal, membro da Comissão de Acompanhamento da Secil). Nos últimos anos, com intervenções na comunicação social regional e nacional, o seu nome esteve ligado a acções de carácter local como a conservação do geo-monumento da Pedra Furada, a criação do “Concurso Literário Manuel Maria Barbosa du Bocage” (em 1999, no âmbito das acções da LASA), a tomada de posição de cidadãos contra a co-incineração no Outão (desde 2000, data em que integrou o movimento “Cidadãos pela Arrábida”) ou a recuperação do Convento de Jesus (2005, ano em que foi um dos co-promotores de um abaixo-assinado que recolheu oito mil assinaturas e foi entregue na Assembleia da República).
Maurício Costa faleceu em 27 de Fevereiro de 2006, pouco tempo depois de lhe ter sido detectada doença grave e numa altura em que, com mais insistência, recomeçou a ser falada a hipótese de co-incineração no Outão. Em 8 de Março seguinte, em sessão pública da Câmara Municipal de Setúbal, foi aprovado voto de pesar pela morte de Maurício Costa, considerado “personalidade constantemente mobilizadora de vontades na defesa dos interesses do concelho de Setúbal” e “detentor de uma sólida cultura participativa”.
[foto: "sítio" da LASA]

Aprender contigo... na APPACDM (1)

A APPACDM (Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental) de Setúbal acabou de atribuir os prémios do concurso de poesia que, desde há 12 anos, promove. No ano passado, por esta altura, editou o volume Um olhar diferente – 10 Anos de poesia (1996-2005), que reúne os poemas premiados e os que obtiveram menção honrosa ao longo dessa década. Ainda no ano passado, a delegação de Setúbal decidiu criar também a modalidade de poesia destinada a estudantes das escolas dos concelhos de Setúbal e de Palmela, iniciativa que teve a sua segunda edição neste ano.
Até hoje, assisti a várias das sessões de entrega de prémios da APPACDM nesta iniciativa e sempre me emocionou a alegria, a jovialidade, o sorriso, a vivacidade, com que os jovens (e adultos) utentes da APPACDM se envolvem nesta actividade, quer como elementos de uma assistência participativa, quer (sobretudo) como autores de textos que nos apresentam uma visão do mundo e da vida perfeitamente ajustados.
Até há dois anos, o tema dos concursos de poesia era exactamente… “um olhar diferente” (de onde vem, de resto, o título da antologia que referi). Daí para cá, o tema é “aprender contigo”, algo que nos coloca na necessidade, na vertigem de olhar o outro, de sentir o outro.
Os poemas premiados assim o demonstraram, quer os que foram apresentados pelos adultos, quer os originários das comunidades escolares. Pedi alguns dos textos premiados e divulgá-los-ei aqui logo que os tenha. Para já, deixo os nomes dos dois primeiros contemplados de cada modalidade: na área escolar, foram Inês Sampaio Figueiredo (1º lugar) e Filomena Marilda Peixeiro (2º lugar), ambas da Escola Secundária de Palmela; na modalidade geral, Maria Fernanda Esteves (1º lugar) e Antonieta Carrilho Vilhena (2º lugar).
Resta dizer que, em cada ano, na sessão de entrega dos prémios, é homenageado um poeta ligado a Setúbal e há participação musical. Na edição que hoje se realizou, o contemplado foi António Maria Eusébio (1820-1911), conhecido por "Calafate" ou "Cantador de Setúbal", evocado pelo seu bisneto, Rogério Peres Claro, que anunciou o terceiro volume da obra completa do bisavô para o início de 2008 [tarefa necessária, de resto, uma vez que os dois anteriores volumes datam de 1985 (Lisboa: Ulmeiro) e ficou sempre a promessa da restante obra a publicar]. A parte musical esteve a cargo de alunos violinistas do Conservatório Regional de Setúbal, acompanhados ao piano pelo professor António Laertes.

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

O sucesso faz-se caminhando... mas os caminhos são muitos

No início da semana, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, a Ministra da Educação interveio na abertura da conferência sobre o sucesso e o insucesso escolar, tendo passado em revista a estrutura do ensino nos séculos XIX e XX e fazendo assentar o futuro do sistema educativo sobre três vectores: a abertura da escola ao exterior (“tem de se construir com os agentes que representam historicamente o «local» e o «exterior» – com as autarquias e as associações locais da sociedade civil, bem como com as associações de pais”); uma maior autonomia e responsabilização das escolas e dos seus profissionais (“às escolas passa-se a exigir que funcionem como organizações, respondendo por objectivos, pelo cumprimento de um serviço público: um serviço público de educação que garanta o acesso universal e maximize a possibilidade de todos os alunos atingirem níveis elevados de sucesso escolar”); a diversidade e a qualidade das competências (“a somar às competências mais tradicionais ou básicas, como a comunicação na língua materna e em línguas estrangeiras, ou o domínio da matemática e das ciências, exigem-se hoje competências no uso das novas tecnologias da informação bem como um crescente número de saberes mais transversais, sociais e cívicos, de espírito de iniciativa, de sensibilidade e de expressão culturais”).
Todo o discurso da Ministra da Educação foi canalizado para sustentar o que apresentou como conclusão: que o Governo a que pertence está no caminho de promover todas essas exigências, dando como exemplos “os processos de transferência de competências para as escolas e para as autarquias, a celebração de contratos de autonomia com as escolas na sequência da sua avaliação externa, bem como o desenvolvimento de metodologias de acção política baseadas nas parcerias com os pais, as autarquias e as escolas; (…) a alteração de importantes instrumentos de gestão como o estatuto da carreira docente e o estatuto do aluno, bem como a racionalização da rede escolar e a criação do Conselho de Escolas; (…) a introdução do ensino do inglês e das actividades de enriquecimento curricular no primeiro ciclo no âmbito do processo de construção de uma escola a tempo inteiro, bem como o lançamento de programas especiais como sejam o plano de acção para a matemática e o plano nacional de leitura, para além da generalização de instrumentos externos de avaliação como as provas de aferição; (…) a diversificação das ofertas educativas no secundário, o lançamento do Programa Novas Oportunidades e o reforço da acção social escolar.
No Correio da Educação divulgado hoje na net, mas com data de 26 de Novembro, José Matias Alves, visando contribuir para a mesma promoção do sucesso na / da escola, propõe outros vectores, a saber: “a revalorização social e familiar (e empresarial) do saber e do trabalho escolar”, “o reconhecimento e a valorização dos professores, actores e autores indispensáveis em qualquer cenário de qualificação das jovens gerações”, “a autonomia, a contratualização, a responsabilização colectiva (e só depois individual) ao nível das organizações escolares” e, finalmente, “a abertura da escola à sociedade”, ressalvando, quanto a esta última, que também “importa sublinhar a proposição inversa”, uma coisa que não é apenas um pormenor e que se afigura determinante, em muitos casos.
Por certo, as duas visões revelam uma leitura da Escola e da política educativa. Procure cada um encontrar os pontos de contacto ou as divergências, assim como o que sustenta cada discurso…

Máximas em mínimas (11)

Emoções
As coisas perdem-se com o tempo, mas as emoções, essas, subsistem. O que conservamos de um lugar são as emoções que esse lugar em nós despertou, e os lugares que recordamos estão cheios da maior de todas as emoções perdidas: a da juventude.” (costumava dizer a personagem Jesuína)
Baptista-Bastos, As bicicletas em Setembro (2007)

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Parabéns a Pedro Tamen

Pedro Tamen (n. 1934) ganhou o Prémio de Poesia Luís Miguel Nava para livros publicados em 2006 graças ao título Analogia e dedos (Lisboa: Oceanos, 2006), conjunto de 35 poemas por onde perpassam evocações de figuras que podem constituir a mitologia do poeta, numa escrita eivada de ironia, com o jogo das palavras e das sonoridades. De lá se transcreve o poema "Bocage", pelo cruzamento das leituras e pelas afinidades geográficas:

Bocage

Já não sou. Já não serei
se fui. Agora à cova
além dos ossos e caroços
muito mais descerá.
O verso, o riso, o vinho,
a mão ladina sobre a carne morna,
tantas coisas sentidas, ressentidas,
intenções, bolandas, entreactos,
entradas por saídas, choros finos:
muito mais descerá.


Não sou, é certo, e não serei,
mas no descer de tudo
já nem fui.

4 dicas + 1 para o professor ideal

No Público de ontem, houve reportagem sobre os professores recentemente premiados pelo Ministério da Educação, momento interessante porquanto a educação foi encarada positivamente, relatando coisas interessantes que estes - como muitos outros - professores fazem. A completar o ramalhete das prosas, inteiramente justificadas (quer pelo evento, quer pela necessidade de a auto-estima da escola portuguesa e dos professores carecer de um retrato diferente daquele que, cheio de cargas negativas, tem sido trnsmitido), um texto intitulado "Como ser o professor ideal", assinado pela jornalista Isabel Leiria, recolhe pistas que são tentativas de definição do ideal nesta profissão docente. Ei-las, com a respectiva autoria:
- Isabel Rocha, Escola Superior de Educação de Leiria: "Um professor não se pode acomodar. Tem de investir no seu conhecimento e sentir sempre alguma insatisfação com o seu trabalho. No final do dia, não basta pensar se deu toda a matéria. É preciso ver o que os alunos aprenderam."
- Lucília Salgado, Escola Superior de Educação de Coimbra: "Um bom professor é aquele que em todas as situações, das mais adversas às mais facilitadas, consegue envolver-se na aprendizagem dos alunos." O problema, diz, é que há toda uma "pedagogia burocrática" que dificulta o que deveria ser uma tarefa basilar. "O professor tem de dar o programa, ninguém lhe diz que tem de ensinar. Há muitos que chegam à escola, sumariam as matérias, cumprem as regras e não se envolvem na aprendizagem. Se há estudantes que têm problemas, continua-se a dar o programa na mesma, como se estivessem todos no mesmo nível. Há um discurso instalado que diz que se os alunos não aprendem é porque a culpa vem de trás. O bom professor é aquele que contraria isto, muitas vezes à revelia dos colegas e da administração da escola."
- Daniel Sampaio, presidente do júri do Prémio Nacional de Professores: ao professor de hoje exige-se mais do que "instruir". "Tem de servir de exemplo, fomentar o reconhecimento do outro, lutar contra a discriminação, ajudar a compreender o mundo. Tem de trabalhar com alunos e em equipa com outros professores."
- Joaquim Azevedo, Universidade Católica do Porto: "A sociedade e os governantes não podem desautorizá-los [aos professores] todos os dias e tomar os que não cumprem como a norma da profissão. Quatro professores receberam um prémio especial." Falta, diz, "apoiar muito mais e melhor" quem faz bem e penalizar "quem não se dedica e brinca com a profissão".
Acrescento mais uma, de Sebastião da Gama, registada no seu Diário, em 12 de Janeiro de 1949, no seu segundo dia de estágio, citando uma conversa tida com os alunos: "Não sou, junto de vós, mais do que um camarada um bocadinho mais velho. Sei coisas que vocês não sabem, do mesmo modo que vocês sabem coisas que eu não sei ou já me esqueci. Estou aqui para ensinar umas e aprender outras. Ensinar, não: falar delas. Aqui e no pátio e na rua e no vapor e no comboio e no jardim e onde quer que nos encontremos."

Rankings para o futuro

O Público de ontem, só visto agora, traz várias referências à educação. Interessante é ler, para ser tido em muita conta no futuro, o artigo de Joaquim Azevedo sobre os "Rankings 2008", orientado para um outro trabalho por parte do Ministério da Educação no fornecimento de números a propósito das escolas e do sucesso dos alunos, em vez de ser apenas a entrega de números à imprensa para cada qual fazer o "ranking" que mais lhe aprouver. E os princípios de que Joaquim Azevedo parte são fortes e nascem dos arrazoados que se têm apregoado. Eis, então, os cinco princípios para daqui a um ano:
"1) Está a aumentar rapidamente o caudal de efeitos perversos que resultam sobretudo da confusão gerada entre avaliação de resultados de exames e avaliação da qualidade das escolas (...);
2) A erosão que estes rankings estão a provocar sobre a avaliação (ou as representações) da qualidade das escolas públicas estatais em nada interessa à melhoria da educação no nosso país;
3) É possível (...) melhorar a informação à população acerca da qualidade da rede pública de escolas, estatais e privadas, em nome da transparência e da melhoria do desempenho das escolas;
4) A administração educacional (...) pode e deve melhorar muito a informação que é disponibilizada;
5) A informação que interessaria facultar a todos os cidadãos (...) deveria repousar no valor acrescentado de cada escola, ou seja, no valor que cada escola acrescenta aos alunos, entre o momento em que os recebe e o momento em que finalizam os seus cursos."
Depois, é apresentada a sugestão do quadro mais consentâneo com os pretextos de que a análise partiu. Bom seria que esta hipótese de trabalho fosse tida em conta!

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Felizmente, nem sempre é assim...

Pois. Felizmente, nem sempre é assim. Para bem dos alunos, dos pais e encarregados de educação e... dos professores! O documento, que me foi enviado por leitora, vale o que vale. É uma imagem, claro. Mas revela uma situação que existe. Ainda há poucos meses ouvia um programa numa estação de rádio em que dois supostos entendidos discutiam sobre os trabalhos de casa, argumentando que deveria haver greve aos trabalhos de casa e que grande parte dos trabalhos de casa eram "burros", que revelavam a "burrice" de alguns professores... É a consequência do eduquês na sua versão mais acabada, independentemente da formação académica, do estatuto social e do papel na educação que cada um tem. Sem mais comentários, aí fica o documento.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

O ensino como prioridade

Que tipo de prioridade (tem) representa(do) o ensino na política portuguesa? Este é o tema de André Freire num texto dividido em duas partes, cuja primeira saiu na edição do Público de hoje, intitulado “Prioridades Políticas”. Os dados com que o articulista trabalha são os de 1995 e os de 2004, nos ensinos básico e secundário e superior. E conclusões? Para já:
a) “Em 2004, o nosso país apresentava um nível de gastos médios por aluno inferior à média da OCDE quer no primário e secundário, quer no superior. Mais, exceptuando a Grécia, o nosso país gastava menos por aluno do que qualquer um dos países apresentados”;
b) “as diferenças são sobretudo gritantes no superior: em Portugal o gasto médio por aluno (ajustado ao nível de vida de cada país) é de 7741 dólares anuais, na Suécia é de 16.218 (um pouco mais do dobro) e nos EUA é de 22.476 (cerca de três vezes mais)”;
c) “Em termos dos gastos medidos em termos de percentagem da riqueza nacional (PIB), o caso muda de figura. No primário e secundário, quer em 1995, quer em 2004, os nossos gastos estão perfeitamente na média da OCDE, embora abaixo dos escandinavos ou dos EUA. Porém, no superior a situação é bastante diferente: os gastos portugueses face ao PIB estão significativamente abaixo da média da OCDE. Face aos escandinavos e aos americanos as diferenças são ainda bastante maiores”;
d) “em qualquer nível de ensino, mas sobretudo no superior, quando comparamos os gastos de 1995 (valor base: igual a 100) com os de 2004, verificamos que a média dos países da OCDE aumentou mais os seus gastos em educação do que Portugal”.

Viana: moradores do «Coutinho» esgrimem trabalho académico

O trabalho académico a que a notícia se refere, e a que já aqui aludi, foi publicado pelo bissemanário vianense A Aurora do Lima, em separata, na edição de 17 de Outubro.

domingo, 18 de novembro de 2007

Duas histórias de elogio fácil ou o espírito e a graça de Manoel de Oliveira e de Luiz Pacheco

Relata o Da Literatura, hoje, a seguinte história passada com Manuel de Oliveira: «Há cerca de um ano, ouvi contar um significativo episódio, que, si non è vero, è bene trovato. Manoel de Oliveira deslocara­‑se a Paris, para que Dominique de Villepin, ainda primeiro­‑ministro francês, lhe outorgasse um determinado título honorífico. Na cerimónia, estava presente José Sócrates, já primeiro­‑ministro português, que, ao saudar o cineasta, não terá conseguido ir além da fórmula que a sua inteligência e a sua sensibilidade lhe recomendaram: "Está com muito bom aspecto". De imediato, Oliveira terá retorquido: "O senhor também"».
Há poucos anos, quando Luiz Pacheco esteve a viver em Setúbal pela última vez, uma história semelhante se passou com ele (afiançou-mo o próprio) num dos primeiros dias dessa sua estada por aqui, quando almoçava num restaurante com um amigo. A dada altura, uma figura local, que estava também no repasto numa mesa vizinha, viu-o e dirigiu-se-lhe, dizendo: "É o sr. Luiz Pacheco? Já tinha ouvido dizer que estava a viver cá por Setúbal... Gosto muito da sua obra, já a li toda..." Então, a pachecal figura (imagino-o) soltou a resposta imediata: "Ah, sim? Eu também já a li toda e há coisas de que não gosto..."
Fotos: Manoel de Oliveira visto por Pedro Ferreira (a partir de www.dokument-festival.cz) e Luiz Pacheco fotografado em Julho de 2005.

Rostos (10)

Cristo, igreja matriz do Crato

sábado, 17 de novembro de 2007

Ainda o Prémio Nacional de Professores

Depois dos desafios lançados por Daniel Sampaio quanto ao relacionamento a haver com os professores, aquando da atribuição do Prémio Nacional dos Professores (ver postal de 15 de Novembro), vale a pena ler a crónica que José Matias Alves deixa no Correio da Educação desta semana (ASA Editores, nº 314) , justamente sobre o prémio de que os professores precisam e de que reproduzo excerto, que, obviamente, subscrevo:
«(...) Que prémios desejam os professores? Qual o melhor prémio em termos profissionais? E a resposta é simples: o melhor prémio é aquele que faz melhorar os processos e os resultados educativos. O respeito e a consideração; a promoção da autoridade docente e da autoestima; o reconhecimento público (individual, colectivo e organizacional), a valorização social da actividade, a atractividade social, a distinção pelo trabalho não meramente individual, o estímulo e a motivação são os ingredientes de um prémio maior que a maioria dos professores (certamente desejam e) merecem. É este o inevitável caminho que tem de ser seguido. E quanto mais tarde, pior. Porque os professores são um bem de primeira necessidade. E isto não é uma “massagem corporativa”. É uma evidência clara. (...)»
Estas questões são tanto mais importantes quanto continuam a aparecer sinais evidentes da desconsideração e desrespeito pelo acto docente, tal como noticia o Expresso de hoje, que, quanto às agressões a professores, diz: «reveladores são os dados da linha SOSProfessor que, apenas em 43 dias de aulas, já recebeu 35 denúncias de agressões de alunos e encarregados de educação contra docentes. Só no 1º ciclo, houve 7 casos de agressão física de alunos contra professores. As ofensas corporais totalizaram 15 casos.»

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

O Português, entre os Estados Unidos e Timor

O Diário de Notícias de hoje conta que “o ensino do português como segunda língua nos EUA foi tomado como exemplo por George W. Bush para a forma como o Congresso desbarata o dinheiro dos contribuintes”, informando que, estando Bush a discursar no estado de Indiana, disse: “Alguns dos projectos esbanjadores incluem um museu das prisões, uma escola de vela de ensino a bordo de um catamarã, e um programa de 'português como segunda língua'. O Congresso deve aos contribuintes esforços melhores. E por isso hoje, na Sala Oval, vetei esta proposta de lei”. Em causa estava a proposta de um congressista para a atribuição de uma verba ao Rhode Island College para um Programa de Estudos Lusófonos.
Ora, esta posição do senhor Bush não é para admirar, depois de tantos exemplos caricatos de que tem sido protagonista. A verdade é que existe mais de um milhão de portugueses nos Estados Unidos; a verdade é que Portugal tem dado jeito ao senhor Bush em diversos momentos; a verdade é que a língua portuguesa é uma das mais faladas no mundo, sustenta uma história cultural grande e parece ganhar mais influência; a verdade é que, geograficamente, o senhor Bush está muito próximo de países de línguas latinas, aí incluindo o português; a verdade é que o senhor Bush… tem um respeito que se circunscreve ao umbigo.
Mais destemidos somos nós, que investimos no ensino do inglês logo desde os primeiros anos de estudo. Obviamente, não por respeito para com o senhor Bush, mas por respeito para com nós próprios e por respeitarmos a necessidade de comunicação com o outro, vectores que ao senhor Bush dizem… nada.
Mais corajosos e inteligentes são os timorenses, porque, mesmo lá no canto onde estão, com o Pacífico a separá-los da América e meio mundo a distanciá-los de Portugal, respeitam a sua história e, como refere o Público de hoje, estão apostados no “enraizamento” da língua portuguesa, citando o presidente Ramos-Horta, ainda que isso possa demorar o tempo de duas gerações. A distância entre as duas atitudes tem razões históricas, eu sei; mas também tem respeito pelas identidades e pelo outro. Para Bush, é mais interessante o campo de batalha; para Ramos-Horta, mais importante é o “enraizamento” (belas conotações) do seu país!

CEB homenageia Rogério Chora - Sugestão

Rogério Chora é pintor, nascido em Setúbal em 1941, na freguesia da Anunciada. A sua obra tem sido um constante passeio pelas tonalidades e pela luz que o Sado reflecte sobre a cidade, sobre a serra ("da Arrábida chamada") e sobre as gentes da terra de Bocage. Disso têm dado conta as muitas exposições em que já participou, assim como a vontade que muita gente tem de contemplar os seus quadros por conterem uma forma luminosa de ver o mundo.
Ora, amanhã, pelas 17 horas, o Centro de Estudos Bocageanos (CEB) vai homenagear Rogério Chora numa sessão, com entrada livre, que terá lugar na Biblioteca Municipal de Setúbal. Serve de sugestão e serve de convite!
Reprodução de três obras de Rogério Chora: "Fontainhas" e "Pescadores cosendo redes" [a partir do catálogo Rogério Chora - Serigrafias e litografias (Setúbal: Câmara Municipal de Setúbal, 1999)] e "Bocage" (exposto na Casa de Bocage, em Setúbal)

5 quadras do poeta Aleixo,no dia em que passam 58 anos sobre a sua morte

Vós que lá do vosso império
prometeis um mundo novo,
calai-vos, que pode o povo
qu'rer um mundo novo a sério.

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Que importa perder a vida
em luta contra a traição,
se a Razão, mesmo vencida,
não deixa de ser Razão?

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Engraxadores sem caixa
há aos centos na cidade,
que só usam da tal graxa
que envenena a sociedade.

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Há muitos que são alguém,
mas no mundo onde alguém são
nunca seriam ninguém
se alguém não lhes desse a mão!

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Contigo em contradição
pode estar um grande amigo;
duvida mais dos que estão
sempre de acordo contigo.

in Este livro que vos deixo [foto: António Aleixo, em Loulé]

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Intervalo (1)

Um amigo enviou-me esta brincadeira matemática, que partilho. É necessário uma calculadora para a operação, que se faz em oito passos:
1- Digite os 3 primeiros algarismos do seu telefone (não considere o indicativo 91, 93, 96, 21,...); 2- Multiplique por 80.
3- Some 1.
4- Multiplique por 250.
5- Some com os 4 últimos algarismos do mesmo telefone.
6- Some com os 4 últimos algarismos do mesmo telefone de novo.
7- Diminua 250.
8- Divida por 2.
Reconhece o resultado?

Rostos (9)

Café Majestic, Porto

A RTP já não quer Rodrigues dos Santos?

O nome do jornalista José Rodrigues dos Santos tem sido, talvez, mais falado por causa de uma entrevista que, em Outubro, concedeu ao Público do que por qualquer um dos vários livros que até hoje publicou. É que, antes de ser autor de alguns "best-sellers", Rodrigues dos Santos foi conhecido pelo grande público graças à sua intervenção televisiva e ao ritmo próprio que imprimiu ao jornalismo televisivo. Nessa altura, Rodrigues dos Santos contribuiu para as fidelizações do público à televisão estatal. Agora, por uma entrevista em que criticou actuações internas, teve inquérito e foi-lhe instaurado processo disciplinar que, ao que o Público de hoje informa, vai num crescendo de extremar posições por parte da RTP, uma vez que "a administração da RTP deu indicações aos responsáveis pela condução jurídica do processo interno contra o jornalista José Rodrigues dos Santos para que o pivô do Telejornal seja demitido custe o que custar". Se isto é verdade, temos um processo disciplinar já com decisão prévia... Mas a notícia do Público faz constar também alguns pormenores que parecem surreais: afinal, parece que é chamada para a alegada intenção de despedimento a falta de passagem de Rodrigues dos Santos por controlos de entrada e saída do edifício - "Na nota de culpa, Rodrigues dos Santos é acusado de ter falhado um dos dois controlos de entradas e saídas no edifício (um de controlo biométrico e outro electrónico, que faz parte do recente controlo de entradas e saídas da RTP) e de ausências temporárias em Setembro e Outubro, que, segundo outros trabalhadores da empresa, serviram para ir almoçar, ir ao dentista e fazer pesquisa para trabalhos e que constituem uma prática normal na empresa entre trabalhadores e directores. O PÚBLICO apurou que José Rodrigues dos Santos está há três semanas a trabalhar sem folgar (o jornalista esteve em reportagem no Curdistão), e na quinta-feira passada terá feito 20 horas seguidas de trabalho. José Rodrigues dos Santos é acusado de ter falhado dois controlos de entradas nas instalações da RTP." Será que tudo isto vai dar mais ingredientes para uma saga romanesca de um próximo título de Rodrigues dos Santos? Sim, porque o romance autobiográfico também pode ser um género a explorar pelo jornalista... e seria interessante ver que papel acabaria reservado a todos os intervenientes nesta bola de neve um pouco escura. A avaliar pelo jeito que Rodrigues dos Santos tem para a caricatura [na foto, o seu auto-retrato a acompanhar uma dedicatória em livro, gesto com que costuma brindar os leitores], o quadro que dali saísse prometeria... Mas sou eu a imaginar!

Prémio Nacional de Professores - "um novo relacionamento"?

Da entrega do Prémio Nacional de Professores, ocorrido na terça-feira, não vi nem ouvi mais do que aquilo que os media passaram. Fiquei curioso e quis procurar os discursos da sessão. Consegui o da Ministra da Educação no “Portal do Governo” e uma coisa foi dita com acerto: quando a memória colectiva refere nomes de alguns professores que se tornaram conhecidos, há sempre a condicionante de esses nomes terem sido primeiramente conhecidos por outra acção que não a professoral, citando a Ministra os casos de Vergílio Ferreira, Lídia Jorge e Rómulo de Carvalho, entre outros. Bem podia ter citado o de Sebastião da Gama também, porque começou por ser conhecido como poeta, mas ficou também conhecido pelo facto de ter sido professor, haja em vista a experiência relatada no seu Diário e alguns (poucos) estudos que ao seu percurso de pedagogo se têm dedicado. Finalizou o discurso da Ministra com a apresentação de Daniel Sampaio, dizendo que iria ser uma intervenção sobre “as funções do professor na escola de hoje”. Procurei o discurso de Daniel Sampaio, mas não o consegui encontrar. Limito-me, por isso, àquilo que ouvi nos media e que li nos jornais (incluindo algumas versões on line).
Parece que foi logo no início da sua intervenção que o conhecido médico, que presidiu ao júri deste prémio, disse: "Gostaria que a atribuição deste Prémio marcasse um novo relacionamento entre o Governo e os professores". Estava então dado o mote para o “professor na escola de hoje”. O discurso terá sido crítico, a avaliar pelos excertos que passaram para o grande público. Um outro aspecto apresentado por Sampaio relacionou-se com a autonomia das escolas, perguntando: “Se o Ministério quer autonomia, então por que razão legisla tanto?” E, como consequência: “Os professores perdem tempo de mais a estudar despachos e portarias, o que seria mais bem gasto se fosse a pensar a sua actividade."
Ora acontece que estas duas linhas – a da excessiva legislação, não deixando à escola espaço nem tempo para se pensar e para se afirmar, e a da burocratização da profissão do professor, cada vez mais metido nos corredores dos papéis, dos impressos e das grelhas – são questões que já há muito têm encontrado eco nas críticas dos professores e das escolas. Apenas as estruturas não têm dado valor a estas observações. Mas, pelos vistos, também não pretendem passar a dar, a avaliar pelas reacções dos governantes – o único que comentou foi o Secretário de Estado Valter Lemos, dizendo: "Ficou claro que o professor Daniel Sampaio se referia a um mal-estar do ponto de vista geral e não a um mal-estar destes ou daqueles docentes. É um mal-estar docente internacional que também existe em Portugal." Não percebo onde está esta clareza, a acreditar no que a imprensa noticiou. Será que o voto de um “novo relacionamento entre o Governo e os professores” (como alvitrou Sampaio) encontra raízes num “mal-estar docente internacional que também existe em Portugal” (como quis sustentar o Secretário de Estado)? Chego a ter dúvidas sobre a relação do comentário com o discurso comentado… Na verdade, a margem que fica para os agentes da educação reflectirem sobre as suas práticas e para as melhorarem ou corrigirem é tendencialmente nula, fenómeno talvez (mal) explicado pela sereia da globalização ou por outro qualquer mito destes com que nos confrontamos nos tempos que correm.

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Hoje, no "Correio de Setúbal"

DIÁRIO DA AUTO-ESTIMA – 70
Escola I – A Escola tem andado nas bocas do mundo, um pouco como consequência da conjugação da publicação dos “rankings”, da aprovação do “Estatuto do Aluno” e da avaliação de professores. Se este último aspecto tem sido centrado quase exclusivamente nas discussões entre docentes, já os outros dois têm tomado tempo e reflexão a variadíssimos intervenientes. O que mais aflige no meio de tudo o que tem sido dito é o facto de a Escola estar a ser vista apenas como um conjunto de números, fáceis de trabalhar estatisticamente e podendo essas análises servir interesses plurais e diversos, ficando-se muitas vezes a pensar que é esquecido o aspecto mais importante da Escola: é que lá estão pessoas, todas a trabalhar no âmbito da formação e dos valores humanistas, devendo haver regras claras quanto aos deveres e direitos de cada um, não podendo a Escola dar o exemplo da prevaricação. Nos tempos da globalização (desejada umas vezes, imposta a martelo e com cantos de sereia noutras ocasiões), seria útil que a Escola fosse um espaço de respiração, de humanismo, de formação, de aprendizagem, de cidadania, algo bem diferente daquilo para que parece estarem sempre a tentar empurrá-la.
Escola II – O abandono e a disciplina escolar e o caso dos “repetentes” andam também em discussão na vizinha Espanha e o jornal El País deixou a pergunta na sua versão on-line: “Cómo resolverías la situación de deterioro escolar y el aumento de repetidores?” Entre 2 e 11 de Novembro, houve 78 respostas, sendo insignificante a quantidade de respostas que preferiu opinar sobre outras coisas que não o objecto da pergunta. Talvez a discussão de lá não tenha grandes diferenças relativamente à de cá: a autoridade para os professores, a reorganização do sistema educativo, a responsabilização dos pais, a educação, a educação, a educação e também algum humor à mistura. Ficam algumas respostas a merecer o nosso olhar: “um pouco de mão dura e autoridade do professor e uma grande colaboração dos pais”, “educando primeiramente os pais”, “educando os jovens na filosofia do esforço, para que olhem como os seus pais lutam duramente nada lhes sendo oferecido e para que pensem que vale a pena trabalhar para ter cultura e trabalho”, “mais autoridade dos professores e fazer os pais responsáveis subsidiários dos actos dos filhos menores”, “impondo disciplina, disciplina e mais disciplina escolar e pedindo responsabilidades aos pais indisciplinados e a todos os que não respeitem o professorado”, “começando por reduzir o número de alunos por turma e não construindo guetos”, “ensinando às crianças o sentido da responsabilidade, convencendo os pais de que têm que educar os seus filhos, baixando o número de alunos por turma”, “com menos férias, dias livres, passeios e actividades extracurriculares e mais estudo e trabalho”, “estudar é cumprir um dever, que sempre tem esforço, e aprender divertindo-se é uma tonteria, embora quem estude acabe por apreciar o que faz e se sinta bem”, “não deixando as crianças à sua conta, compensando com prendas a falta de convivência”, “à maneira espanhola, isto é, diminuindo o nível necessário para ter aprovação em cada disciplina e deixando passar todos os alunos para o ano seguinte”, “com mais atenção em casa, mais respeito pelos professores, menos dinheiro, automóveis, motas, roupas de marca, em suma, os jovens devem saber o que custam as coisas para as valorizarem” e “despolitizando o ensino”.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Rostos (8)

Memorial em honra de Deocleciano Monteiro (conhecido por "Duque", 1902-1996), barqueiro e salvador de muitas vidas no Douro (o primeiro salvamento em que participou sucedeu quando tinha 11 anos, resgatando duas vidas), inaugurado em Março de 1995 - Porto, Ribeira

Porque se muorre ua lhéngua?

No Público de hoje, Amadeu Ferreira responde à pergunta deste título, que, aliás, é o do seu artigo: “Todo l que ye houmano se muorre. Se nun fur hoije, será manhana. Culas lhénguas las cousas pássan-se de la mesma maneira, i l mirandés nun será eiceçon. (…) Ben todo esto al perpósito de eiqui hai ua ou dues sumanas ls jornales habéren falado dun studo adonde se dezie que l mirandés se staba a morrer, yá que era cada beç menos falado nas famílias i cada beç menos ansinado puls pais als sous filhos. (…) Que l mirandés ten deficuldades yá l dixo José Lheite de Vasconcellos na fin de seclo XIX i António Mourinho a meio de l seclo XX i até deixórun testos screbidos para que un die, quando se morrira, alguien podira saber cumo era. (…) Ua pessona muorre-se al son de las leis de natureza. Quando ua lhéngua se muorre esse nun depende de leis de la natureza, mas dua decison - de miles deilhas -, de las pessonas que la fálan i de las anstituiçones que ténen la oubrigaçon de la defender. (…) L mirandés (…) ten bida suberciente para que las anstituiçones repunsables fágan tamien aqueilho que ye l sou deber. Quei dezir? L Menistério de la Cultura ten ua buona parte de la faca i de l queiso na mano, mas nada faç i la Senhora Menistra sabe de todo l que ye neçairo fazer; l Menistério de la Eiducaçon parece fazer de cuonta que l ansino de l mirandés stá bien, l que nun ye berdade, deixando-lo na mano de la DREN, que ten de probar que nun stá chena de einemigos de l ansino de l mirandés. Apuis de l stado central, las cámaras i juntas: la cámara de Miranda algo ten feito, mas ten de fazer muito mais ne l que ye eissencial; la cámara de Bumioso manten-se nun bergonhoso siléncio; i las juntas de fraguesie ciento ua faç algue cousa. (…) La lhéngua mirandesa puode bibir por muitos i muitos anhos. Ye nesso an que acradito i por esso tamien fago.
Quando Pessoa emprestou voz a Bernardo Soares (no Livro do Desassossego) para escrever algo como “Minha pátria é a língua portuguesa” estava a fazê-lo no contexto do seu tempo. No entanto, a frase ficou como máxima e tem servido para garantir a importância cultural e identitária do português enquanto língua. Assim, o fim de uma língua pode corresponder ao fim de uma pátria, à morte. Foi, de resto, o que aconteceu com a língua leonesa, hoje visível no mirandês, falado no nordeste português, na zona de Miranda do Douro, relíquia de uma língua que desapareceu porque o poder político a isso levou, sujeitando as comunidades falantes do leonês ao domínio do castelhano. O testemunho de Amadeu Ferreira, em prol da vida do mirandês, é um alerta para a preservação da identidade.

domingo, 11 de novembro de 2007

No dia de hoje, há 89 anos, a guerra acabou às 11 da manhã


Monumentos aos portugueses mortos na 1ª Grande Guerra - Coimbra e Lagos
"Paris, 11 de Novembro - Esta manhã, às onze e meia, tiros longínquos de canhão, gritos nas ruas, janelas que se abrem. O dia está coberto, mas não chove e não faz frio. Pelos Campos Elíseos, de que vejo uma nesga, passam à desfilada pesados camiões, carregados de soldados americanos que agitam grandes bandeiras. Das janelas da ambulância do Astória, as enfermeiras dão palmas, acenam com os lenços. É o armistício que foi assinado, é o fim da guerra, é a paz? Minha mulher chega de fora, diz que as janelas – espectáculo nunca visto em Paris – estão cheias de gente, sobretudo mulheres, que se interrogam, palram, olham para o céu, olham para a rua, dão palmas, dão gritos de alegria. (…) Depois do almoço saí a ver Paris neste grande dia. Os Campos Elíseos começavam a tornar-se multicores, como se uma súbita primavera os cobrisse subitamente de flores. As bandeiras e pavilhões surgiam das janelas, surgiam do solo. Já grandes magotes de populares desciam festivamente ao centro da cidade. (…) Enquanto desço aos Campos Elíseos vou verificando se a nossa bandeira aparece. Sim! Lá estão algumas, mas essas mesmas fomos nós, com o nosso esforço incompreendido e recompensado com a ingratidão, que lá as arvorámos. (…) Na Praça da Concórdia, dcetive-me um momento à beira de um passeio a fixar na minha memória a visão do espectáculo maravilhoso de um povo que subitamente cai de um terrível pesadelo e encara com os clarões da mais deslumbrante realidade. Sobre um oceano de cabeças, os canhões tomados aos alemães levantavam para o céu as suas goelas negras. Na boca de uma peça de 110, um rapazito alcandorado a grande altura agitava uma bandeira. Todos os veículos de Paris pareciam ter sido tomados de assalto. Automóveis, fiacres, camiões, carroças levavam gente nos tejadilhos e pendurada nos estribos. (…) À porta do Ministério da Marinha, um homem velho não oculta a sua comoção, deixa correr duas grossas lágrimas pela face enrugada. (…) Pela rua do Faubourg Saint Honoré passa uma Vanda de canadianos que pára em frente da embaixada inglesa. Junta-se aí um povoléu enorme que aclama os hinos aliados. Uma enfermeira é levantada ao colo e por um instante vejo-a de pé, sobre a multidão, envolta numa bandeira, a fronte coroada de flores, cantando. Uma mulher ao meu lado, limpando as lágrimas, exclama: Oh! Que c’est beau! Oh! Que c’est beau! (…)
Quem assim escreveu há 89 anos foi João Chagas (cf. Diário - IV. Lisboa: Edições Rolim, 1987), um "guerrista" convicto, assistindo em Paris ao que foi o Dia do Armistício, que pôs fim à Primeira Grande Guerra. O documento do Armistício foi assinado às 5 da manhã numa carruagem de comboio na floresta de Compiègne. A guerra tinha que acabar no prazo de 6 horas, isto é, às 11 horas do dia 11 do 11º mês de 1918. A Grande Guerra vivia matando e destruindo desde o Verão de 1914, tendo sido a primeira que, pelas suas proporções, adquiriu o estatuto de "mundial". Formas de destruição fortes nesta guerra foram as trincheiras, os gases e... os tanques, constituindo estes uma novidade. Pelo(s) caminho(s) do combate, ficaram cerca de 8 milhões de mortos, 22 milhões de feridos e 2 milhões de desaparecidos. No que respeita a Portugal, que entrou na guerra em duas frentes - em África (Angola e Moçambique) e na Europa (Flandres) -, houve 7200 mortos, 13750 feridos e 12300 desaparecidos.
Nas fotos inferiores: Recriação museológica de cenários da1ª Grande Guerra - Museu do Brinquedo (Sintra) e Museu de Cera (Fátima)

Máximas em mínimas (10)

Ofício de Poeta
"O ofício de poeta, ofício que não se aprende, consiste em colocar os objectos do mundo visível, tornados invisíveis pela força do hábito, numa posição insólita capaz de perturbar o olhar da alma e de lhe conferir uma carga trágica. É algo que tem a ver com o desejo de comprometer a realidade, de a apanhar em falso, de a encher subitamente de luz e de a obrigar a confessar o que está por detrás dela."
Jean Cocteau, La mort et les statues (1946)

Rostos (7)

Painel de azulejos, Casa da Música (Sala VIP), Porto

Vasco Pulido Valente e o Museu Salazar

No Público de hoje, Vasco Pulido Valente escreve sobre "A casa de Santa Comba Dão", pensando sobre a criação do Museu Salazar que tem gerado controvérsia entre a autarquia local, que o quer instituir, e a esquerda, que fomentou um abaixo-assinado, contestando a sua criação, recentemente entregue na Assembleia da República. Diz VPV: «Santa Comba Dão quer agora fazer "um museu" da casa de Salazar. O que se compreende muito bem. Tanto quanto sei, só a casa de Salazar pode atrair a Santa Comba Dão um ocasional turista; e o "museu" fica por uns potes de cal e uma limpeza. Com sorte, o café da terra, se existir, ganha algum dinheiro e aparece um espertalhão a vender "relíquias". Tudo isto é inofensivo e um pouco patético. Mas bastou para provocar a indignação da velha esquerda pliocénica, que nem sempre se distinguiu pelo ardor democrático. Um abaixo-assinado, entregue solenemente na Assembleia da República, pede que se proíba o "museu", como se o "museu" fosse uma espécie de reabilitação de Salazar e o salazarismo ameaçasse ressurgir do Vimieiro a um euro e meio por bilhete. Não ocorre a ninguém que de Santa Comba Dão nunca virá um culto de Salazar como o culto (aliás, ridículo) de Mussolini em Predappio. Ao neo-salazarismo faltam as forças que provocaram e criaram o salazarismo (…). Salazar é um homem do passado remoto. De um passado irreconhecível. O negócio de Santa Comba Dão com a casa do homem é irrelevante para a cultura política do regime. E talvez não seja para Santa Comba Dão. Os censores da consciência nacional deviam, de preferência, olhar para eles.»

sábado, 10 de novembro de 2007

Pacheco Pereira e o Museu Salazar

No Público de hoje, José Pacheco Pereira escreve "Uma história de dois museus", tomando como objecto o Museu do Neo-Realismo, em Vila Franca de Xira, e o pensado e controverso Museu Salazar, em Santa Comba Dão. Eis o final da reflexão de Pacheco Pereira: "O Museu Salazar desejado em Santa Comba Dão é uma má política de valorização da autarquia, que ganhava muito mais em preservar esses bens e a casa de Salazar e tentar integrá-los num tratamento histórico e científico distanciado. Ou será que a autarquia se pensa a si própria no "espírito" de pobreza do seu homenageado? Quererá o mesmo país pobre e rural, atrasado e limpinho, com altas taxas de analfabetismo e de mortalidade infantil e toneladas de ouro no Banco de Portugal, que Salazar preferia aos riscos da revolução social que significava a industrialização e o "progresso"? Seguirá o senhor presidente da câmara o exemplo austero de Salazar e porá uma mantinha nos seus joelhos e dos vereadores para poupar à autarquia umas despesas suplementares desnecessárias? Que mal tem a mantinha se o dinheiro poupado dá para um fontanário? Se Santa Comba Dão se pretende valorizar como terra de futuro pelo culto de Salazar, dá de si uma péssima imagem, como daria a sua congénere de Vila Franca de Xira se se ficasse pela nostalgia dos meninos dos esteiros e dos trolhas de Pomar. Pensem nisso."
[foto: casa de Salazar em Vimieiro (Santa Comba Dão)]

A Revolução Russa na "História"

Em Setembro, quando chegava ao 100º número da sua 3ª série, a revista História assumiu uma interrupção que poderia ser tempo de mudança para modernização. Houve artigos de opinião contra um fim possível e petição na net a propósito. Mas a História respira e a prova está com o número especial agora saído, sujeito ao tema “Revolução Soviética – 70 anos que mudaram o mundo”, que repesca alguns artigos já publicados sobre o assunto em números anteriores, acompanhados de novas luzes sobre este acontecimento que abalou a história e que se fundamentou numa utopia – “a de que a liberdade (as liberdades…) só faziam sentido se fossem estendidas a todos os homens”, como refere Luís Farinha na abertura –, ainda que a tenha contraditado em muitas situações e momentos. Neste número temático da História, há a colaboração de Valério Arcary (“Lenine ou Kornilov?”), Raquel Varela (“História da Revolução Russa de Leon Trotsky”), António Louça (“Um bolchevismo alemão?”), João Madeira (“O PCP e a validade universal da experiência soviética” e “O XX Congresso do PCUS – Um terramoto controlado”), Pedro Ferreira (“Entre o terror e a esperança”), Cristina Portella (“Da mulher emancipada à mãe heróica”), Luís Farinha (“Antifascismo – A política unitária de entre-guerras”, entrevista com Arsénio Nunes, e “Nós combatemos o XX Congresso”, entrevista com Francisco Martins Rodrigues), Carlos Zacarias Sena Júnior (“Frentes populares”), Jorge Filipe de Almeida (“A implosão da URSS: O duelo entre Gorbatchov e Ieltsin”), Fernando Martins (“A queda do império”), Carlos Taibo (“Um balanço final da URSS”), António Ventura (“Diários e memórias da Revolução – Alguns viajantes portugueses na Rússia Soviética – 1922-1929”) e Lauro António (“A revolução de 1917 e o cinema”). De permeio, há ainda tábuas cronológicas “A Revolução Soviética e a Bolchevização da Europa” (1861-1921), “Sob o signo de Estaline” (1917-1957) e “A morte de um gigante” (1959-1991), elas mesmas a possibilitarem uma leitura da história.

Wikipédia: ser enciclopedista

Há dias, conversávamos na Sala de Professores sobre a estratégia que muitos alunos seguem para os seus trabalhos de consulta à Wikipédia - impressão do(s) artigo(s), acção de corte e cola e entrega ao professor. Havia quem mostrasse alguma indignação quanto a este processo e à forma pouco criteriosa como os artigos que circulam na net, e na Wikipédia, são, frequentemente, feitos. Por essa mesma altura, tinha conversado com os meus alunos sobre isso, recomendando-lhes que consultassem a Wikipédia (deveriam procurar informação sobre Almeida Garrett) como primeiro passo de trabalho, mas aconselhando-os também a confrontarem os dados aí recolhidos com outras fontes, como uma “história da literatura”, uma outra enciclopédia, outros sítios da net ou um “dicionário de autores”. O problema não está na utilização da Wikipédia (ou de qualquer outra enciclopédia), antes reside no confronto da informação recolhida, numa leitura crítica, mesmo porque as enciclopédias mais clássicas cometem também erros – um exemplo: uma enciclopédia publicada em Portugal há poucos anos inseria dois verbetes sobre Carolina Michaelis de Vasconcelos, um no volume 13, entrado como “Michaelis de Vasconcelos”, outro no volume 20, entrado como “Vasconcelos”; no primeiro caso, o texto não ia além da meia dúzia de linhas e era dito que ela casou com Leite de Vasconcelos, o que é falso, enquanto no segundo, que ocupava mais de uma coluna, era dito, correctamente, que ela foi casada com Joaquim de Vasconcelos; a questão não foi corrigida e houve várias tiragens com o mesmo erro (apetece perguntar quem e quando se corrige um erro de enciclopédia?)
A questão do uso da Wikipédia está candente, porque vários estudos têm sido publicados sobre o fenómeno, haja em vista a recente edição do estudo La Révolution Wikipédia – Les encyclopedies vont-elles mourir?, de Béatrice Roman-Amat e de Delphine Soulas. O título é apelativo. Não li a obra, mas o número de Novembro da revista L’Histoire chama o assunto para capa (“Wikipédia est-elle fiable?”) e traz uma apresentação do livro.
E começam as autoras: “C’est ce qui s’appelle une ascension fulgurante. Moins de sept ans après sa création en 2001, plus personne ne peut ignorer l’encyclopédie en ligne Wikipédia (de wiki, «vite» en hawaïen). Presque 50 millions de visiteurs par mois aux États-Unis; 9 millions en France, soit près d’un internaute sur trois. Les raisons de ce succès? Le nombre impressionnant de notices mises à la disposition du public, et ce, gratuitement.” E os números continuam: a Wikipédia é publicada em 253 línguas e, fazendo jus à autoria em colaboração por parte dos cibernautas, em França, só o artigo sobre Napoleão foi redigido por 260 pessoas e o que aborda Pétain teve 400 participações. Decididamente, esta ideia da enciclopédia livre na colaboração e na distribuição, que pode ser melhorada a toda a hora, pegou.
No entanto, as autoras apontam duas desvantagens: por vezes, os artigos longos, a resvalarem para fora do contexto que interessa, neles entrando a informação importante, mas também a anedótica e o “fait-divers”; por outro lado, os erros, resultem eles das leituras tendenciosas ou das falhas de informação. A neutralidade e a melhoria constante parecem ser intenções e propósitos dos editores e, se não existe uma comissão de leitura, é, pelo menos, pedido aos colaboradores que mencionem as fontes, forma de atestar a fiabilidade dos artigos e das informações. Mesmo assim, houve necessidade de ser atribuído a alguns textos o estatuto de “artigo de qualidade” – de tal forma a expressão entrou na modernidade como sinal de garantia –, designação que resulta de um conjunto de características verificáveis no texto como “estilo correcto, artigo completo, argumentação, neutralidade e conteúdo que não se altera de forma significativa de um momento para o outro”.
É para a escola que vai o último aviso do texto: é que, em França, como cá, “l’encyclopédie en ligne est déjà omniprésente dans le monde de l’éducation. Tous les professeurs le savent: c’est aujourd’hui le premier réflexe des élèves en quête de documentation”. Mas as autoras alertam para o facto de competir aos professores não deixarem que a Wikipédia se torne na “fonte documental única e pretensamente neutra”, sobretudo recorrendo a exercícios em que sejam valorizados o rigor, o confronto documental e o espírito crítico.
Em jeito de aconselhamento, em caixa, surgem três “mandamentos” para lidar com a Wikipédia, sugeridos por Olivier Loubes, professor em Toulouse: “1) Wikipédia existe mais n’est pas un prophète: ses articles tu confronteras avec d’autres sources; 2) Wikipédia existe mais les voies du savoir sont infinies: comme un portail d’accès tu t’en serviras; 3) Wikipédia existe mais au début était le verbe: un article d’encyclopédie tu t’exerceras à écrire.”
[fotos: capa de L'Histoire (Nov 2007), www.zisch.ch e www.abc.net.au]