domingo, 30 de novembro de 2008

"O Natal que eu quero", por Daniel Sampaio (mais uma opinião sobre professores)

Ninguém me pediu opinião, eu sei. Na escola é costume não ligar muito ao que pensam os alunos. Mas eu gramo a escola, gosto dos meus amigos e há uma data de professores que até são fixes.Ando no 8.º, tenho bué de disciplinas, algumas não dá para entender. Estudo acompanhado para um gajo de 14 anos? Formação Cívica? Não percebo bem, é uma coisa de 90 minutos por semana em que o stôr, que é o director de turma (nós dizemos DT), está sempre a mandar vir, a dizer para nos portarmos bem. Da Matemática não me apetece falar, o stôr tem pouca pachorra para tirar dúvidas. História é um bocado seca e percebo mal o livro, faço confusão porque não contam a vida dos reis como o meu avô me explicava, por isso estudo para os testes e depois esqueço tudo.Não, não pensem que venho aqui criticar a escola, já disse que gosto de lá andar. O problema é que aquilo anda mesmo esquisito, podem crer. Já o ano passado os stôres andavam às turras com a ministra e apareciam nas aulas chateados, um gajo mandava uma boca e levava logo um sermão, às vezes diziam mesmo para nos queixarmos à ministra, como se chibar fosse coisa que desse jeito. Mas este ano está bem pior: falamos com os professores nos intervalos, "olá, stôr!" e eles andam mesmo tristes, a minha stôra de Inglês, que eu curto bué, diz que está "desmotivada" e que está farta de grelhas de avaliação e de pensar em objectivos. Eu de grelhas não percebo nada e, quanto aos objectivos, os meus são divertir-me uma beca e passar o ano, não quero mesmo ficar para trás porque os meus pais dão-me nas orelhas e fico sem os meus amigos, que é uma das coisas porreiras que a escola tem.Por isso peço a todos que se entendam. Ver os professores aos berros na rua é uma coisa que eu compreendo, têm todo o direito porque nós às vezes também andamos, o problema é que assim ainda há menos gente a preocupar-se connosco. Os nossos pais não têm tempo, andam sempre a trabalhar e ficam descansados porque estamos na escola a aprender e a lutar pelo nosso futuro, mas agora a coisa está preta, os nossos stôres estão cansados, o que é mau para nós: quem nos ajuda quando estamos aflitos? Eu sempre contei com um ou dois dos meus stôres, o ano passado quando me achava um monstro (cheio de borbulhas e a sentir que as miúdas não olhavam para mim) foi a stôra de Português que me chamou no fim da aula e conversou comigo, bastou ela ouvir com atenção e dizer que compreendia o que eu sentia para me sentir muito melhor. E quando o Tavares disse que se ia matar porque a rapariga com quem andava foi vista a curtir com um gajo qualquer, foi o nosso DT que falou com ele e lhe arranjou uma consulta no psicólogo.Não percebo nada da guerra dos professores, só sei que deve ser justa porque eles esforçam-se muito, já pensaram no que é aturar a malta, sobretudo alguns que só querem fazer porcaria, põem-se aos berros nas aulas e não obedecem, às vezes até palavrões dizem para os stôres? Muitos de nós querem aprender, mas o barulho é grande e há muita confusão, há lá gajos, repetentes e isso, que só lá estão porque são obrigados, depois há outros que são de fora e não percebem bem português, outros ainda têm problemas em casa e passam mal, a Vanessa que tem um pai alcoólico e que chora quase todos os dias ainda por cima foi empurrada na aula por um colega que só lá está a armar confusão... o DT disse que nós devíamos ser responsáveis e que tínhamos de acabar com isso, mas eu acho que a ministra devia era dar força aos professores para serem melhores, o meu pai diz que ela às vezes está certa mas eu não concordo, se vejo todos, mesmo todos os stôres da minha escola contra ela devem ter razão, os professores às vezes erram mas são importantes para nós, precisamos de estudar para ver se nos livramos do desemprego, isso é que é verdade!Por isso espalhem este mail, façam forward para quem quiserem. Digam aos que mandam para terminarem com as discussões que já estamos fartos e como na minha escola somos todos contra isso dos ovos (uma estupidez), digam à ministra e aos sindicatos que já chega! Façam uma escola melhor, ajudem os professores a resolver todos os problemas das aulas (ninguém pode fazer isso em vez dos stôres) e arranjem maneira de nós aprendermos mais, para ver se percebemos melhor o mundo e nos safamos, o que está a ser difícil.
Quem quiser dê opinião, o meu mail é brunovanderley@gmail.com, sou do 8.º E da Escola Básica 2/3 do Lá Vai Um.
Daniel Sampaio. "O Natal que eu quero". Público (revista "Pública"), 30.Novembro.2008.

5 comentários:

Mimos disse...

Em nome de todos os professores que se sentem injustiçados com a política da educação deste governo, obrigada! Sou professora, gosto do que faço, gosto muito dos meus alunos (felizmente, tenho a sorte de quase todos serem educados, apesar de muitos me porem a cabeça em água por serem tão faladores) e sinto-me indignada por, entre outras coisas, ser prejudicada por ir a uma consulta ou a um funeral, entre muitas outras aberrações que querem impor-nos. Ainda há pessoas que nos compreendem e que não acham que todos os males do mundo resultam da incompetência e da malandrice dos professores, como a Senhora Ministra quer fazer transparecer.

Anónimo disse...

De facto, este texto reflecte tudo aquilo que a escola é actualmente. Os professores estão cansados, desmotivados, desiludidos com o rumo que o ensino tomou. De "ensinadores", passaram a conselheiros,pscicólogos, confidentes, assistentes sociais, enfermeiros e até a sacos de boxe! Como se não bastasse, são desautorizados, humilhados e constantemente criticados pelo ministério que tem tetado, a todo o custo, denegrir a sua imagem junto da opinião pública. Quem escolheu esta carreira por vocação (ver coração)...hélas...tem de continuar por obrigação.

Anónimo disse...

sou professora de ed. especial e trabalho com alunos com autismo, não é propriamente a minha opinião que envio mas a de um dos meus alunos,
Se eu fosse…
Se eu fosse, por um dia, um professor iria tentar perceber como é possível cativar os alunos de forma a que dessem todo o seu potencial e me dessem a conhecer tudo o que os faz felizes.
Natal é sempre que sentimos vontade de ser solidários com quantos nos rodeiam e precisam da nossa ajuda. Não pode resumir-se a um só dia tudo o que deve ser preponderante mas relações humanas.
Acho que a função de um professor é das mais importantes na construção da pessoa como ser social e dinamizador de uma sociedade justa e capaz de ver em todos alguma característica importante para enriquecer o estado actual da indiferença em que vivemos.
Aproveitei esta época e esta sugestão para puder apelar á sensibilidade de todos para aceitar a dor em que vivo e o quanto preciso de todos vocês para ser mais feliz, é natal.
Acabei

uf! disse...

Pois eu não gostei. Considero o texto ofensivo para os professores e para os alunos.
Considero o texto demagógico, a querer armar em engraçado.
Considero que o autor dá uma no cravo outra na... ditadura.
É uma mistura muito grande de areia atirada para os olhos. Talvez haja um ou outro professor que responda de forma menos simpática por estar mal disposto com a ministra, mas isso não é norma nem modelo!!!
Sei que os professores acabam por desempenhar o papel de pai,mãe, assistente social, confessor, psicólogo, mas não aceito que esse deva ser um modelo -a não ser que lhes dêem preparação para tal - e tempo no horário.
Não aceito que se insinue que os professores incitam os jovens contra a ministra nem que os incitem a chibar....(o que esperará Daniel Sampaio da ministra, ao passar subliminarmente esta sua teoria?)
ETC!

uf! disse...

gostava que espreitassem aqui e dessem a vossa opinião... estarei eu sozinha nesta crítica?!