domingo, 6 de janeiro de 2008

Memória: Luiz Pacheco (1925-2008)

Morreu Luiz Pacheco. Um inconformista, um crítico, um perfeccionista da escrita, um homem livre, um escritor, um rebelde. Todos estes morreram com ele. “A verdade, as verdadinhas mesmo pequeninas, custam a dizer para não se tornarem brutais.”, assim escreveu numa crónica que O Independente depois reuniu no livro Figuras, Figurantes e Figurões (Lisboa: “O Independente”, 2004). Fica a sua escrita, a sua obra editorial, a lembrança na memória. Tenho saudades do Luiz Pacheco e das conversas que não tinham tempo.
Fomos apresentados há anos por um amigo comum, em Setúbal – o Miguel de Castro, nome literário de Jasmim Silva. Conversámos sobre literatura, sobre Setúbal, sobre pulhices e sobre venturas da vida. Muito sobre livros, logo tecendo críticas certeiras e agudas ao que de mais recente tinha sido publicado por portugueses. Nos vários encontros que tivemos, emprestou-me alguns livros (os últimos dos quais lhe devolvi no último encontro que tivemos, no lar no Príncipe Real, em Lisboa, nos idos de 2005). Vendeu-me também alguns e fez-me assinante das suas edições. E ofereceu-me um, na altura novidade de um autor português, lido e rabiscado por ele que estava desagradado com aquela escrita.
Várias vezes o Pacheco me surpreendeu. Mas houve uma que não esquecerei: aí por Outubro de 1998, uma senhora da Galeria Santiago (que então existia em Palmela) contactou-me, dizendo que ia promover o lançamento do livro Prazo de Validade, do Luiz Pacheco, dali a dias e que o autor, o “senhor Pacheco”, lhe dissera para me contactar para ser eu a fazer as despesas da apresentação do livro. Não percebi a razão da escolha. Fui ter com ele. Cortou-me logo cerce os argumentos. “Ó pá, só há um gajo para falar sobre o livro, és tu…” Continuei sem perceber o porquê, mas aceitei. Foi deferência dele, claro. Publiquei depois o texto na revista Sol XXI (Carcavelos, nº 29/30/31, Jun/Set/Dez.1999, pp. 161-162).
O último encontro que tivemos foi então no lar ali ao Príncipe Real, estava para sair o Diário Remendado. Foi uma tarde de conversa longa. Mal via, tinha uma memória apuradíssima, fazia viver o sentido agudo da sua forma de ver as coisas e o mundo. Continuava irónico e livre. Admirei sempre a sua frontalidade, ainda que nem sempre concordando. Tenho feito da sua obra objecto de algumas ofertas. Vou continuar a fazer dela objecto das minhas leituras.
[foto: Luiz Pacheco, em 29 de Julho de 2005]

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