Desisto, de Philippe Claudel (Alfragide: Edições ASA, 2009), é uma narrativa curta, na primeira pessoa, de um técnico cujo trabalho é, num hospital, o anúncio às famílias da morte dos seus próximos, seguido do convencimento para que seja autorizada a doação de órgãos.
A história desenrola-se enquanto à sua frente está uma mulher que acaba de ser informada da morte de um parente. É um frente a frente de desvantagens, numa reflexão sobre a vida e a morte, sobre as vidas, sobre o ser humano hoje. O técnico regista a história e as reflexões para uma filha de cerca de dois anos, também já órfã de mãe. E a mistura dos dramas acaba por acontecer, assim como a revolta, que vai aumentando.
O que fica
1. “Hoje em dia, toda a gente evita chamar as coisas pelos nomes: um cego é um invisual, um animador de televisão um artista, os mortos em breve serão não-vivos.”
2. “Hoje em dia, as pessoas param para fruir do infortúnio dos outros, da visão dos cães gemendo nos derradeiros espasmos, dos corpos esfacelados entre as chapas das viaturas, mas prosseguem o seu caminho quando lhes dirigem súplicas. Não ouvem quando lhes gritam que parem e prestem auxílio.”
2. “Hoje em dia, as pessoas param para fruir do infortúnio dos outros, da visão dos cães gemendo nos derradeiros espasmos, dos corpos esfacelados entre as chapas das viaturas, mas prosseguem o seu caminho quando lhes dirigem súplicas. Não ouvem quando lhes gritam que parem e prestem auxílio.”
3. “Já não sabemos onde arrumar as guerras. Faltam-nos gavetas. A nossa memória é um abismo onde se acumulam muitos cadáveres. Transborda de corpos sem vida. Consumimo-los em genocídios inteiros à medida que os jornais no-los trazem, e depois misturamo-los, branqueamos tudo, amalgamamo-los, o que é bem mais eficaz do que a cal viva.”
4. “Nunca pensamos nos vivos com a intensidade que merecem e que só a morte consegue despontar dentro de nós. Não olhamos para os vivos.”
5. “Todos nós transportamos cruzes modernas, suportamos o insuportável num corpo destinado ao comércio, num corpo que já não nos pertence. Tudo o que não marca não existe. Os jovens empenham o cérebro e a alma num pequeno crocodilo verde, em três faixas pretas, numa vírgula horizontal: fora disso, não existem. Lacoste, Adidas e Nike tornaram-se a trindade de uma religião oca, cada dia mais cheia de santos e que condena os homens a mascarar-se de hambúrguer para ganhar a vida. Ganhar a vida, mas que vida?”
6. “Toda a gente tem a sua ética, todas as profissões, e mesmo as piores, sobretudo as piores. A moral morreu mas inventaram uma nova alma, a ética, mais volátil, evanescente, mais moderna e majestosa.”
5. “Todos nós transportamos cruzes modernas, suportamos o insuportável num corpo destinado ao comércio, num corpo que já não nos pertence. Tudo o que não marca não existe. Os jovens empenham o cérebro e a alma num pequeno crocodilo verde, em três faixas pretas, numa vírgula horizontal: fora disso, não existem. Lacoste, Adidas e Nike tornaram-se a trindade de uma religião oca, cada dia mais cheia de santos e que condena os homens a mascarar-se de hambúrguer para ganhar a vida. Ganhar a vida, mas que vida?”
6. “Toda a gente tem a sua ética, todas as profissões, e mesmo as piores, sobretudo as piores. A moral morreu mas inventaram uma nova alma, a ética, mais volátil, evanescente, mais moderna e majestosa.”
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