«(…) Se o PS (ou o PSD, o que parece menos provável) ganhar as próximas eleições sem maioria absoluta, é melhor que se coliguem para formar um Governo sólido, semelhante, por exemplo, ao que hoje governa a Alemanha, do que tentar acordos necessariamente oportunistas com partidos como o CDS de Paulo Portas ou o BE de Louçã (isto se nenhum dos novos partidos eleger um grupo parlamentar).
Porquê? Por três razões.
A primeira é que o tempo não está para brincadeiras. Tal como em 1983 só uma grande coligação conseguiu impor as políticas mais impopulares, mas necessárias, que o país conheceu, em 2009 é bem provável que a crise, um défice galopante e uma dívida fora de controlo voltem a exigir a reunião dos dois maiores partidos. A segunda é que a nossa cultura política e o desenho das nossas instituições dão-se mal com maiorias absolutas de um só partido. O cavaquismo final e o socratismo actual mostram como é fácil abusar do poder num regime onde o sistema de pesos e contrapesos é frágil, onde os grupos parlamentares são ordenanças do chefe do partido e onde a sociedade civil é fraca. O resultado é a crispação e a ostracização das minorias, duas receitas para o desastre em tempo de crise.
A terceira e última razão, porque convém não ser hipócrita: o país, sobretudo nas autarquias e em muitas empresas públicas (e privadas) é já uma coutada do Bloco Central. Ou, se preferirmos, do seu lado mais sombrio, o da protecção de interesses particulares. Quem fica com a pele eriçada ao ouvir falar das negociatas desse Bloco Central devia perceber que hoje não se está muito melhor do que em 1983-1985, só que há menos escrutínio público.
Em princípio, são melhores os sistemas políticos que permitem escolher entre alternativas antagónicas - mas esses sistemas são maioritários e os deputados tendem a responder directamente a quem os elege, não a quem escolheu o seu lugar na lista. Em sistemas proporcionais, a melhor forma de obter consensos alargados e impedir a sofreguidão pelo poder dos partidos maioritários é negociar coligações. Até, em circunstâncias de excepção, "grandes coligações".
É pena que em Portugal isto não se discuta sem tabus e com a necessária seriedade.»
José Manuel Fernandes. “O sistema político não foi feito para maiorias de um só partido”.
Público: 28.Abr.2009.
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