No Público de ontem, sob o título "Lições europeias", escreveu Rui Ramos: «Para a "Europa", as "crises" são quase sempre boas, e a "aproximação aos cidadãos" quase sempre má. (...) O que faz correr a "Europa"? Os eurocépticos gostam de a imaginar como uma conspiração federalista, com morada em Bruxelas; os eurófilos preferem confundi-la com o idealismo de povos ansiosos por despir as casacas nacionais. Não é nem uma coisa nem outra. A UE e os seus tratados não são obra da "Europa", da sua Comissão ou do seu Parlamento, mas dos Estados soberanos do continente. A babel dos tratados, com as suas dezenas de protocolos e declarações em anexo, reflecte esse enorme bazar em que cada Estado tenta candidatar-se ao máximo de recursos económicos e de influência política. A UE é apenas outro meio de os Estados europeus continuarem as guerras do passado.
Perante o vil facto, as boas almas pedem que os cidadãos de cada Estado sejam convidados a participar directamente no "processo". É uma ilusão piedosa, porque a UE não é nem poderá ser uma democracia. As democracias não assentam apenas na possibilidade de votar, mas também no sentimento de pertença a uma comunidade histórica - como, na Europa, são as nações, mas não é a UE. A UE é uma organização de Estados donde se pode entrar e sair e onde se negoceia segundo determinadas regras - as que existem em cada momento.
Se nos últimos tempos houve a impressão contrária, não foi por qualquer pressão federalista, mas porque assim conveio às classes políticas do continente. Para se pouparem a debates difíceis, muitos governos tenderam a atribuir à UE a responsabilidade de algumas opções polémicas. Foi assim, em nome da "Europa", que em Portugal se equilibrou as contas públicas, como se fosse uma imposição externa. Como contrapartida, fingiu-se que esta UE, que supostamente ditava a vida de cada povo, estava a caminho de se tornar qualquer coisa de grandioso, transparente e representativo (um Estado democrático com a sua "constituição"), para cuja inauguração onze governos convidaram as populações. Estas, onde puderam, aproveitaram o convite para estragar a festa. Mas este é um problema da UE só na medida em que começa por ser um problema dos Estados membros. A UE não é a sua causa nem a sua solução.»
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