D. Manuel Martins, bispo emérito de Setúbal, nos seus 84 anos, tem entrevista publicada no Expresso de hoje, assinada por Joana Pereira Bastos e Valdemar Cruz. A crise social foi o pretexto para este encontro. E D. Manuel Martins manteve-se fiel ao seu pensamento e à sua prática de anos, quando era prelado na cidade sadina. Ficam alguns excertos.
Situação – “Agora estou convencido – oxalá não seja assim – de que estamos numa situação má, amanhã vamos estar numa situação pior e depois de amanhã vamos estar numa situação péssima.”
Governos de Sócrates – “Na minha opinião governaram mal, com falta de respeito por nós. Governaram pior Portugal do que se fosse uma quinta pessoal, porque se fosse uma quinta pessoal com certeza que a estimavam, que a tratavam bem, que a fariam render.”
Governo de Cavaco Silva – “Criou-se uma inconsciência social de irresponsabilidade. Era toda uma política económica irresponsável, que fomentava a distribuição de cartões de crédito.”
Costumes – “Isso dos brandos costumes são histórias. Temos boa gente, mas quando for preciso também deixamos de ser boa gente. Tenho muito medo disso.”
Esperança – “Quando foi a queda do Muro de Berlim acreditei que tinham finalmente acabado as guerras. Depois veio a dos Balcãs e já fiquei um bocadinho desiludido. Depois veio a União Europeia e eu acreditei que seria uma associação de iguais, em que os pequenos podiam valer tanto como os grandes, mas não é nada disso. Os países pobres, mesmo todos juntos, não são capazes de derrotar a vontade de um dos ricos – da Alemanha ou da França. É uma Europa esfrangalhada, desorientada, que é a dois e não a 27. Ao fim e ao cabo, fomos associar-nos para engordar mais aqueles cavalheiros e nos minimizarmos a nós. Queimaram-se os campos, as vinhas, destruíram-se as produções, acabou-se com as pescas. (…) Era apenas para se venderem os produtos deles.”
Campo – “Se ao menos fôssemos capazes de voltar ao campo, já não tínhamos fome. As crises às vezes são oportunidades… Se esta nos levasse novamente ao campo, não para ficar lá, mas para aproveitar as riquezas que nos dá, libertava-nos de muita importação.”
Assistência – “A Igreja faz festas muito bonitas e esquece-se de vir para o meio daqueles que sofrem. Tem acordado muito, mas as atitudes que tem tomado são mais no sentido da assistenciazinha, da caridadezinha. Tem de ir mais longe. Ela mesma tem que dar sinais.”
Sinais – “Devíamos ser capazes de vender esse ouro todo que anda ao pescoço dos santos nas procissões. Os cordões e os anéis que o povo quer ver pendurados nos santos, para que prestam? Podem prestar para um salteador, mas não para um santo. Porque não vendemos isso tudo, deixando só as coisas de valor histórico e artístico? A Igreja é um grande sinal do amor de Deus no mundo e deve reflectir o rosto materno de Deus.”
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