Paulo
Morais, autor de Da corrupção à crise
(Gradiva, 2013), fundador da Associação da Transparência e Integridade, vice-presidente
da Câmara Municipal do Porto na equipa de Rui Rio, é entrevistado na “Revista”
do Expresso de ontem (nº 2117, pp.
46-52). Uma entrevista a ler, que explica muitos dos mistérios com que vamos
sendo brindados no quotidiano. Uma entrevista a ler, porque temos de saber.
Deixo alguns excertos.
A sedução como corrupção – “Um político
não se pode deixar contaminar, ou cair na sedução do croquete. Há a corrupção
material, comprar pessoas, e há uma corrupção aparentemente menos grave mas
gravíssima, que é a da sedução. Convites para jantar, fins de semana, quinzenas
de férias, bilhetes, etc.”
Dominar o líder – “Os poderosos ou
eliminam o líder ou dominam o líder. Foi o que aconteceu com Passos Coelho, que
entrou relativamente solto.”
Dos mercenários – “Os que andam com a
mão na massa, na sujidade, os mercenários, são 10 ou 15%. Mas são 15% que mexem
em 90% do Orçamento. São pessoas que se sentem seduzidas pela função, vereadores,
deputados, etc. Pelas borlas. Pelas facilidades e empregos.”
Corrupção em Portugal a aumentar – “A
corrupção em Portugal está a subir. Nos indicadores internacionais, entre 2000
e 2010, passámos de 23º para 33º. Somos o país que mais caiu na transparência
no mundo. O que mais regrediu. (…) Se a corrupção diminuir o país melhora.”
Partidos e (des)emprego – “No litoral,
ou nas áreas metropolitanas, estar ligado a um partido é garantia de emprego.
Nos pequenos municípios, no interior, não estar ligado é garantia para o
desemprego.”
Da justiça – “Na justiça, para notificar
um cidadão para prestar declarações, em vez de se fazer um telefonema manda-se
uma carta registada assinada por um procurador a fazer de escrivão e vai um
polícia fazer de carteiro. Kafkiano. Medieval. Justiça agressiva, medieval. A
justiça é gongórica, muita pompa e circunstância. Togas e becas, frases
bombásticas, e o tecto a cair da sala.”
As pontes sobre o Tejo, em Lisboa – “Expropriação,
já, da ponte Vasco da Gama. Não é um negócio, é uma mentira. (…) Percebi ao fim
de não sei quantos anos que os privados entraram com pouco mais de 20% do valor
da ponte. E ficaram não só com aquela ponte como com a outra e com as
travessias do Tejo.”
Resgate, qual resgate? – “Da troika
prefiro nem falar. Devíamos ter tido uma intervenção externa se tivéssemos tido
de facto um resgate. Mas não tivemos um resgate, tivemos uma intervenção para
garantir que o Estado português continuava a pagar os empréstimos à banca. Um
resgate é outra coisa. Existem resgates nas empresas, os chamados acordos de
credores. Processos de reestruturação da dívida em que se isola a exploração do
problema da dívida. Isto é um resgate. (…) Quando a primeira das despesas a
efectuar é dívida, isto não é um resgate, é um sequestro. Não vale a pena
dizermos que não vamos pagar, o que faz sentido é fazer um resgate a sério.
Reestruturar a dívida.”
Gastar acima das possibilidades – “A
história de que os portugueses andaram a gastar acima das suas possibilidades é
o maior embuste. São as três maiores mentiras. Essa é uma, outra é de que não
há alternativa à austeridade. E a terceira é a mania dos desvios, cada governo
que vem diz que havia um desvio do governo anterior. (…) Na Administração
Pública não pode haver desvios, as pessoas não têm a noção disto mas a despesa
pública carece de orçamentação. (…) Dizer que há desvios é brincar com as
pessoas.”
BPN e Alves dos Reis – “O caso BPN está
para este regime como o caso Alves dos Reis para a I República. (…) Se houver
uma investigação competente, conseguem identificar toda a gente. E confiscar os
bens.”
Da censura e da intervenção social – “Acho
que podemos criar uma forte censura social para dar a volta. Em Itália, durante
a operação Mãos Limpas, os políticos entravam nos restaurantes e as pessoas
atiravam-lhes moedas. O meu maior combate é contra o medo.”
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