sábado, 22 de maio de 2010
Obrigado, São!
segunda-feira, 17 de maio de 2010
"Já não há dinheiro!"
domingo, 16 de maio de 2010
A propósito dos 60 anos sobre a escrita do "Diário", de Sebastião da Gama
sábado, 15 de maio de 2010
Duas histórias com professoras, sem proveito para a educação
terça-feira, 11 de maio de 2010
Bento XVI visto por Eduardo Lourenço
Um Papa alemão na tormenta
"... compreendamos, acima de tudo, que o Evangelho fala sempre da Igreja como de uma Igreja de pecadores, o que é justamente o seu rasgo específico" - cardeal Ratzinger in Deus Existe?
Que apenas meio século após o holocausto a Santa Igreja católica, apostólica e, sobretudo, romana, tenha eleito um papa de nacionalidade alemã, ainda espantou um mundo onde ninguém se espanta com coisa nenhuma. Muitos se escandalizaram, então, menos por considerações duvidosas, quase racistas, do que pelo perfil e reputação teológico-pastoral do novo eleito, o cardeal Ratzinger, com vinte anos de chefia à frente do dicastério, guardião da ortodoxia, da Propaganda Fide.
Quando se pensa que desde os tempos de Carlos V, até João Paulo II, só um Papa não fora italiano (Adriano VI), esta nova eleição de um "estrangeiro" era, já em si, uma surpresa e quase um milagre. A opinião católica e a do mundo tinham de lhe reservar um acolhimento e uma atenção à altura de uma tal surpresa.
Em breve o lado teutónico foi esquecido. Suave, delicado, grande intelectual, o novo Papa que sabia não poder contar com o efeito mediático de João Paulo II, nem fazer esquecer "o bom" Papa João XXIII, mau grado algumas intervenções no tabuleiro político, ou assim tido na óptica profana, que suscitaram reacções ofuscadas, conseguiu fazer esquecer que era alemão e tivera o magistério da disciplina e vigilância da Igreja. Duas encíclicas encontraram um eco atento nos meios intelectuais católicos e, para além deles, em gente que não esperaria dele textos teológico-proféticos, como os de alguns dos seus famosos predecessores. Tranquilamente, esse grande teólogo e filósofo, a par do movimento de ideias da sua pátria, relembrou na ordem da exegese, e em termos originais relativamente à tradição, a leitura da mensagem cristã como Amor, renovando-a na sua semântica, ao ter em conta os laços estruturais entre Eros e Agape. Sem audácias provocantes, um pouco na senda e como eco a um célebre ensaio de Anders Nygren, com esse título. O mesmo fará na revisitação e explicitação da doutrina social da Igreja, o que surpreendeu - dentro e fora dos meios católicos - gente que há muito o tinha catalogado - nessa matéria em particular, mas também nos domínios da ética e dos costumes - como um dos Papas mais conservadores, uma espécie de Pio IX redivivo. O que é totalmente inexacto.
E de súbito, como em simetria com a crise do Ocidente na ordem profana (economia, política e ética), sofrida pelo comum dos mortais como uma ameaça e um desafio ainda em curso ao tipo de civilização que é a nossa, abate-se sobre a Igreja uma espécie de vendaval ético-histórico, ampliado pelo mediatismo planetário, senão de todo inédito (antes pelo contrário), o mais apto para atingir a Igreja instituição e a feri-la, não no coração da sua mensagem, mas na imagem que a define e caracteriza a sua missão "exemplar".
Em nada, a título pessoal, Bento XVI tem a ver com esse escândalo, por ele mesmo descrito e sofrido como tal, mas foi sobre ele, sucessor de Pedro, que caiu o reflexo profano, mundano, desse fait-divers que não se parece com nenhum outro. É uma injustiça objectiva e ninguém o saberá melhor do que ele. A Igreja não é nenhuma barca angélica. Está no mundo e pertence ao mundo. Não existe para impedir o mundo de passar mas para santificar o mundo que passa. De resto, já tem no seu fundador o mais incontornável dos juízes.
O drama - humano, social, ético e simbólico -, com que a Igreja se viu e vê confrontada e a que o actual Papa teve de fazer frente com determinação e humildade possível, pertence justamente àquele domínio do "oculto", para não dizer do recalcado, que conferiram precisamente à mesma Igreja onde ela foi - e é ainda - a instância não apenas religiosa e ética condicionante e sancionante dos desvios ostensivos dessa ordem, um papel capital. Em termos simples, e antes da era Freud - curiosamente também em vias de contestação clamorosa - esses entorses à prática ética, subdeterminada pelo continente submerso ou visível daquilo que é tido como "pecado" numa perspectiva que, sendo religiosa, é mais do que isso, fez da Igreja durante séculos "o confessionário" colectivo diante de quem se exorcizavam os "pecados" do mundo, os dessa ordem e sobretudo e, ao mesmo tempo, a instância do perdão e da remissão.
Claro que hoje e, em particular, neste Ocidente descristianizado as coisas não se passam assim. Como a Igreja, os confessionários conhecem os efeitos dessa desertificação religiosa. A massa indiferente dos cidadãos até pode receber com alívio ou júbilo este percalço espectacular da velha Igreja, instituição impecável que perdoa os pecados do mundo, revestindo à força, e dolorosamente, o estatuto de "pecaminosa", ela que é, histórica e simbolicamente, a expressão sublimada da consciência da humanidade como pecadora e ao mesmo tempo instrumento da sua redenção.
Numa óptica assumidamente profana, tudo se passava (ou passa) como se a Igreja julgasse o mundo e o mundo não a pudesse julgar. Ainda - pelo menos para quem nasceu e foi educado no seio da Igreja e com referência aos seus valores míticos - ou mitificados - não se é facilmente indiferente e menos ainda cinicamente espectador de um drama tão doloroso como o que engloba ao mesmo tempo as vítimas dele e os que dela abusaram sendo os guardiões não apenas de uma fé, como da sua mera dignidade humana. Claro que esse "drama" é universal, porventura o terá sido sempre. Mas desse "drama", sem sujeito próprio, o que importa no contexto cultural do Ocidente em especial - e não só - é que uma instituição tão singular - e para muitos de nós referência única na luta pelo combate pela definição do destino espiritual e cultural da humanidade - como a Igreja esteja vivendo esse vexame e essa agonia com uma provação misteriosa. E quem sabe como uma revisitação e rasura futurante de clamorosas quedas históricas da sua vocação redentora que continuam como um espectro a ensombrar a mensagem de luz onde o Evengelho nasceu. Em visita a este velho país cristão, Bento XVI, no centro de um drama que tem exorcizado, não sem coragem, não terá aqui, como o poderia ter em outros espaços, nem comentários sarcásticos, nem exaltações perversas de quem contempla a barca de Pedro outrora em excesso triunfalista, num mau passo. Apenas votos para que essa barca passe para a outra margem de si mesma, como o Mestre a convidou.
Lisboa, 9 de Maio de 2010 - Eduardo Lourenço
Só é pena ter demorado 9 anos!
A notícia que transcrevo tem a assinatura da LUSA e está divulgada em vários sítios da net. Os únicos comentários merecidos têm a ver com o tempo que se demorou a ser feita justiça e com o teor das desculpabilizações apresentadas e feitas para constar. Bem podem argumentar com cumprimentos de prazos e com voltas e reviravoltas, mas não está certo que se espere tanto tempo, não é justo que se espere tanto tempo; quanto aos argumentos utilizados para explicar as reacções havidas, só provam que tudo vale para justificar o injustificável e que a sociedade é assim porque se pensa que pode ser assim, sem respeito. Ainda bem que a justiça foi no sentido em que foi, apesar de ter tardado!
Almada - Pai de aluna condenado a pagar 10 mil euros a professora por injúrias
O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a condenação do pai de uma aluna da Escola Secundária Anselmo de Andrade, em Almada, a pagar uma indemnização de 10 mil euros a uma professora, por injúrias.
Os factos remontam a 7 de Março de 2001, quando, numa reunião naquela escola, o encarregado de educação apelidou a professora de História da Arte e Oficina de Artes de "mentirosa", "bandalho", "aberração para o ensino" e "incompetente".
A reunião fora solicitada pelo encarregado de educação, alegadamente para obter esclarecimentos acerca das muitas faltas da professora. Num trimestre, a docente faltara onze vezes por ter fracturado uma perna.
Além daqueles insultos, o pai acusou ainda a professora de falta de profissionalismo, de "mandar bocas" à filha, de terminar as aulas "10 minutos antes do toque e pedir aos alunos para dizerem aos funcionários que estavam a sair de um teste" e de na véspera dos testes dizer aos alunos "ipsis verbis" a matéria que iria sair. Aconselhou ainda a professora a procurar tratamento psiquiátrico "urgente".
A professora, com 20 anos de profissão, pôs uma queixa-crime em tribunal, acabando o encarregado de educação por ser condenado pelo crime de injúria agravada. A docente avançou também com uma acção cível, pedindo uma indemnização de quase 19 mil euros por danos patrimoniais e de 15 mil por danos não patrimoniais.
O tribunal decidiu fixar a indemnização em 10 mil euros, mas o arguido recorreu, alegando que as expressões foram proferidas por "um pai preocupado e protector", num contexto de "nervosismo e tensão". Alegou ainda que "não era previsível que as suas palavras desencadeassem um processo contínuo de sofrimento, stress e tristeza além do sentimento de desvalorização pessoal e da dignidade e reputação" da professora. Defendeu igualmente que as consequências das suas palavras para a professora "devem mais ser consideradas como incómodos ou contrariedades do que verdadeiros danos".
Mas o tribunal manteve a condenação ao pagamento de 10 mil euros, considerando que a professora, face às "graves ofensas" de que foi alvo, ficou afectada na sua dignidade e reputação, o que lhe veio a causar um "rol de enfermidades", dele resultando "um quadro clínico de acidente vascular cerebral, acompanhado de síndrome depressivo grave, com oclusão da vista esquerda, com risco de cegueira". O STJ considera mesmo que a indemnização de 10 mil euros "é um nada", já que "a dor de alma é, sem receios de exageros, incomensurável". 11.05.2010 - 15:48 Por Lusa
Propostas para a Noite dos Museus
segunda-feira, 10 de maio de 2010
A visita de Bento XVI vista por Marcelo Rebelo de Sousa
Não valerão a pena mais comentários sobre a visita papal que, dentro de dias, vai ocorrer no nosso país. O que mais tem impressionado têm sido os fundamentalismos, que se têm colado a toda a situação por que a Igreja tem estado a passar. A questão da tolerância de ponto veio enaltecer mais as críticas, quando todos sabemos que qualquer que fosse a composição política do governo a decisão iria no mesmo sentido... Entretanto, vai havendo umas histórias, como a da Ministra da Educação dizer que o encerramento das escolas no dia 13 dependerá de decisão das direcções das Escolas... Nenhuma novidade, porque, teoricamente, o mesmo é válido para todos os outros serviços do Estado; só que era escusado transferir as despesas dessa decisão para as direcções das Escolas quando todos sabemos o que, na prática, significa uma tolerância de ponto, independentemente de concordarmos ou não com ela.
Só hoje li a edição de sábado do Jornal i, que publicou uma entrevista com Marcelo Rebelo de Sousa, assinada por Maria João Avillez. Naturalmente, a vida política e as tensões do momento entraram na conversa, mas quero aqui destacar o que o entrevistado disse e considerou sobre Bento XVI, por me parecer oportuno. A entrevista pode ser lida na íntegra aqui, mas transcrevo essa última parte, que respeita à visita papal e a algumas vias de transição que se abrem à Igreja.
«(...) Vem aí o Papa, o que não o deixa indiferente. Que reflexão lhe suscita esta visita? É uma grande oportunidade para uma palavra de esperança numa Europa sem norte e desesperançada e num país com pouco norte e muitos desesperançados. Em segundo lugar, é importante que o Papa dê uma palavra de solidariedade à igreja portuguesa. Tem tido um papel de que se não fala, mas sem o qual não seria possível em muitos aspectos aguentar a crise social do país. É a Igreja que ampara muitas das IPSS no domínio da educação, da saúde, da solidariedade social. Quem faz esse trabalho, das crianças aos mais velhos, é uma rede de instituições de inspiração cristã. O comum das pessoas dá esse amparo como adquirido, confundindo-o com o Estado, mas justamente como nem sempre o Estado o pode fazer - e vai poder cada vez menos - quem está presente é a Igreja. Há ainda o facto de a visita ocorrer num momento em que o Papa e a Igreja são objecto de um conjunto de críticas - aqui e no mundo. Umas devido ao estilo de Bento XVI, outras ao caso da pedofilia.
Quer parar numas e noutras? A comunicação social, que gostava particularmente de João Paulo II, gostou sempre menos de Bento XVI. Sucede porém que o Papa é atacado por ter cão e por não ter e insuspeitamente o digo: como católico acho que o Papa é escolhido pelo Espírito Santo e que vale a sua escolha e não a minha. Isto dito, teria preferido que o Espírito Santo tivesse escolhido outro. Mas antes mesmo da questão da pedofilia já se dizia que era um homem primitivo, reaccionário. Queria recorrer ao catolicismo irracional - quando é a racionalidade em pessoa. Por outro lado acusam-no de ser demasiado frio, racional, sem capacidade para entender as pessoas e sem criar empatia com elas. Atacava-se por ele ser anticonciliar quando foi determinante a sua acção no Concílio Vaticano II; atacava-se por ser "direitista" porque terminou com alguns movimentos omitindo que acabou com outros, com essa conotação mas que mereciam ser extintos. Sendo conservador em questões de princípio e da disciplina interna da Igreja, é geralmente omitido que numa das últimas encíclicas atacou o capitalismo internacional, a crise financeira, sublinhando nela a culpa dos banqueiros, defendeu a reforma das Nações Unidas, uma nova ordem económica internacional, manteve as posições em relação à Palestina. E então, de repente, ai que afinal era progressista...
E no outro caso? O santo padre pediu desculpa na sua carta às vítimas irlandesas, recebeu outras vítimas em Malta. Já várias vezes pediu desculpa, aceitou a culpa, aceitou que há uma responsabilidade que não é só religiosa... Mas de cada vez que diz qualquer coisa que devia ser "lida" como um reconhecimento do que é inaceitável no comportamento da Igreja, caem-lhe em cima dizendo " é preciso muito mais"!
Falou de João Paulo II. Os seus desafios não são os mesmos de hoje... Não. O Papa anterior enfrentou um grande desafio - que venceu. Eram os marxismos, que estavam na moda quando ele chegou ao Vaticano, nos anos 70, podendo assistir à implosão da União Soviética e dos marxismos. O desafio deste Papa é muito mais difícil: o ressurgir dos racionalismos iluministas de há mais de um século, para os quais a razão explica tudo. Mas ao mesmo tempo que explica tudo, porque a razão é individual, também é relativista: não há valores absolutos. O Papa assumiu o combate a esses racionalismos relativistas, o que é lógico na óptica de quem entende que há valores absolutos, mas isso tornou-o "incompreensível", por um lado, e "inaceitável" por outro. Repare que até a comparação com João Paulo II é injusta: João Paulo II era relativamente novo quando foi eleito, o que não ocorreu com o seu sucessor. A minha leitura é que este Papa é obviamente de transição: a transição entre João Paulo II e o primeiro Papa não europeu.
América Latina? ... e se Deus quiser Brasil. E mais: vou dizer-lhe uma coisa que por enquanto, poucos sabem: o actual Papa trabalhou para não ser Papa. Ele mais o arcebispo de Paris e um cardeal muito próximo, o austríaco Schönborn. Trabalharam muito para que fosse eleito um Papa não europeu. Justamente não houve eco dos cardeais europeus, particularmente dos italianos, para quem isso seria uma ruptura demasiado brutal. O que é inevitável é que depois de Bento XVI surja um Papa da nova cristandade.»