Éramos
cerca de meia centena no salão da Casa da Cultura, em Setúbal, na noite de ontem,
para ver o primeiro livro de publicação póstuma de Manuel Medeiros, de concepção gráfica devida a José Teófilo Duarte. Estávamos
lá para saborear as palavras de A noite
enlouqueceu o silêncio (Setúbal: Muito cá de casa / DDLX, 2013), um grupo
de 23 poemas, que Viriato Soromenho-Marques brilhantemente apresentou, num
percurso pelo papel da poesia e do pensamento, numa via em que a poesia de
Resendes Ventura (pseudónimo de Manuel Medeiros) se revelou na sua totalidade
de poeta-filósofo, em economia e precisão de palavras.
Houve
ainda os poemas lidos por Eduardo Dias e Graziela Dias e o testemunho da Fátima
Medeiros, que seleccionou os poemas. E que boa escolha fez! E como sentimos
ainda o dizer do Manuel Medeiros, sibilando por entre os versos, cosendo e
descosendo palavras e ideias, num tão seu jeito de pensar e de levar a pensar,
de ler o mundo e de escrever a vida. Foi também uma insistência na lembrança,
essa “longa estrada”, que nos deixou num poema assim chamado, do tamanho de
sete reduzidos versos que nos apontam o caminho da memória e que reproduzo:
Muito
longa
longa
estrada
muito
longa estrada
a longa
estrada
em minha
frente.
Longa
muito
longa!
1 comentário:
AO LIVREIRO VELHO, MANUEL MEDEIROS, AÇOREANO DE SETÚBAL
NÃO ESCREVES MAIS EM LADO ALGUM
A CANETA ENVELHECEU E O PAPEL ARDEU NAS TUAS MÃOS
COM CHAMA DE OIRO E CINZAS DE CRISTAL
AGORA AS VOZES DAS COISAS QUE DEIXASTE
SÃO LEMBRANÇAS AS QUE AMASTE MAIS
SÃO A TERNURA O AMOR A LIBERDADE
A ESPOSA OS AMIGOS OS AÇORES DE SAL
A DILUIÇÃO EM NADA NA MEMÓRIA
PORQUE JÁ FOSTE E NÓS NÃO AINDA
CONTINUAMOS SENTADOS NA PRAIA
COM O MAR REVOLTO À ESPERA
DAS AREIAS DOIRADAS
E BARCOS QUE TE LEVAM NADA DE NÓS
AGORA SEMPRE MAIS PÓ HUMANO JÁ
DANIEL NOBRE MENDES
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