A revista “Única”, que integra o Expresso, teve como tema da edição de hoje “Voltar”, entrando também na área da educação, em que seis personalidades portuguesas foram convidadas a um regresso à escola onde estudaram para falarem desse tempo, o que as levou a, inevitavelmente, considerações sobre o presente. Aqui deixo alguns excertos, que tocam em algumas das questões que estão (ou deviam estar) em discussão no presente.
Rita Ferro, escritora, estudante no Colégio das Escravas do Sagrado Coração de Jesus: “Considero os programas actuais autistas relativamente ao perfil do aluno do terceiro milénio, mais sensorial e imediatista, mais áudio-visual do que leitor, menos estimulado em casa. Exauridos e falidos, os pais só querem que os filhos passem de ano. (…) Tolerância zero à indisciplina, com penalizações inflexíveis a incidir sobre as notas, as propinas, a própria frequência. Tolerância zero à interferência histérica e abusiva dos pais na sobreprotecção dos meninos. E maior crivo na contratação dos professores. Um povo deseducado e culturalmente desfavorecido sem segurança para interferir na política, é uma crucifixão cartológica.”
Medina Carreira, advogado e ex-ministro, estudante nos Pupilos do Exército: “Não há melhor avaliação do que quando um estudante está pressionado como se estivesse na vida. Negar estas exigências da vida é de gente tola.”
Nuno Crato, professor universitário, estudante no Liceu Pedro Nunes: “Havia os maus e os bons [professores]. Mas em todos transparecia respeito pelo conhecimento e pela cultura. Talvez o que mais me tenha marcado foi esse espírito geral de gosto pelo conhecimento e gosto pela racionalidade. (…) É necessário instituir seriedade na avaliação dos estudantes (…) e é preciso maior seriedade na formação científica dos futuros professores.”
António Câmara, professor universitário, estudante no Liceu Pedro Nunes: “Tanto no secundário como na universidade, ainda não se percebeu a importância da criatividade. O ensino em Portugal é convergente e raramente divergente. (…) A internet mudou e baralhou tudo. E começa a ter consequências no ensino. A linguagem vídeo, por exemplo, é absolutamente crucial e ainda não chegou devidamente ao sistema de ensino. Os professores precisam de adaptar-se. Tem de haver disciplinas e cadeiras muito mais abertas. A nossa taxa de insucesso escolar é em primeiro lugar o insucesso do sistema de ensino.”
Eduardo Marçal Grilo, administrador e ex-ministro, estudante no Liceu Nun’Álvares: “As escolas precisam de lideranças fortes. Não impondo modelos, mas no sentido organizativo e de objectivos de cada escola. Faz sentido que haja um condutor da escola. (…) Importante é saber quem são os alunos, de cada escola, de cada região. Só desta forma se combate o insucesso escolar: aluno a aluno. (…) Têm de ser definidas metas, patamares de conhecimento. Esses patamares têm de integrar a escola e a família, que hoje em dia se demite da educação dos filhos.”
Irene Fulsner Pimentel, historiadora, estudante no Charles LePierre: “O problema não está na reprovação, está no insucesso escolar. E a discussão deve centrar-se aqui. (…) Eu sou de esquerda, toda a gente sabe. Mas a esquerda teve algumas culpas no nosso sistema educativo. Houve uma altura em que se passou a achar que a educação devia ser uma coisa lúdica. Sou muito a favor da avaliação. Dos professores e dos alunos. A escolha criteriosa dos professores seria um bom começo.”
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