Hoje, 13 de Junho, é dia
comemorativo: do nascimento de Fernando Pessoa (1888), poeta maior; do
nascimento da pintora Helena Vieira da Silva (1908); da morte de Santo António
de Lisboa (1231). Uma trilogia de peso na cultura portuguesa, claro!
Fernando Pessoa (campanha "Abre Portugal", da Coca-Cola)
Maria Helena Vieira da Silva, Le Désastre ou La Guerre (1942)
"Sermão de Santo António às Sardinhas" (2017) (via FB)
Mas deixo o destaque em nome do jesuíta
António Vieira, por ter sido neste dia de 1654 que, no Maranhão, proferiu o
célebre Sermão de Santo António aos
Peixes, uma peça de retórica que contém muito mais do que aquilo que parece
- sobre a condição humana, sobre o bem e o mal, ainda que uma reflexão centralizada
na crítica ao comportamento dos colonos do Brasil. E o pretexto é o
comportamento dos peixes, com as suas vantagens e os seus desprimores, uma
autêntica alegoria sobre o que é isto de interagirmos, de estarmos, de sermos.
Deixo três excertos, a merecerem
reflexão ainda hoje, como se poderá ver pelo teor.
COMER OS OUTROS - “Cuidais que só os Tapuias se comem uns aos
outros? Muito maior açougue é o de cá, muito mais se comem os Brancos. Vedes
vós todo aquele bulir, vedes todo aquele andar, vedes aquele concorrer às
praças e cruzar as ruas; vedes aquele subir e descer as calçadas, vedes aquele
entrar e sair sem quietação nem sossego? Pois tudo aquilo é andarem buscando os
homens como hão de comer e como se hão de comer. Morreu algum deles, vereis
logo tantos sobre o miserável a despedaçá-lo e comê-lo. Comem-no os herdeiros,
comem-no os testamenteiros, comem-no os legatários, comem-no os acredores;
comem-no os oficiais dos órfãos e os dos defuntos e ausentes; come-o o médico,
que o curou ou ajudou a morrer; come-o o sangrador que lhe tirou o sangue;
come-o a mesma mulher que de má vontade lhe dá para a mortalha o lençol mais
velho da casa; come-o o que lhe abre a
cova, o que lhe tange os sinos, e os que, cantando, o levam a enterrar; enfim,
ainda o pobre defunto o não comeu a terra, e já o tem comido toda a terra. Já
se os homens se comeram somente depois de mortos, parece que era menos horror e
menos matéria de sentimento. (...) Vede um homem desses que andam perseguidos
de pleitos ou acusados de crimes, e olhai quantos os estão comendo. Come-o o
meirinho, come-o o carcereiro, come-o o escrivão, come-o o solicitador, come-o
o advogado, come-o o inquiridor, come-o a testemunha, come-o o julgador, e
ainda não está sentenciado, já está comido. São piores os homens que os corvos.
O triste que foi à forca, não o comem os corvos senão depois de executado e
morto; e o que anda em juízo, ainda não está executado nem sentenciado, e já
está comido.”
PEQUENOS E GRANDES - “Os pequenos são o pão quotidiano dos grandes;
e, assim como o pão se come com tudo, assim com tudo e em tudo são comidos os
miseráveis pequenos, não tendo nem fazendo ofício em que os não carreguem, em
que os não multem, em que os não defraudem, em que os não comam, traguem e
devorem.”
VAIDADE - “A vaidade entre os vícios é o pescador mais astuto e que mais facilmente engana os homens. E que faz a vaidade? Põe por isco na ponta desses piques, desses chuços e dessas espadas dois retalhos de pano, ou branco, que se chama hábito de Malta, ou verde, que se chama de Avis, ou vermelho, que se chama de Cristo e de Santiago; e os homens, por chegarem a passar esse retalho de pano ao peito, não reparam em tragar e engolir o ferro. E depois que sucede? O que engoliu o ferro, ou ali, ou noutra ocasião ficou morto; e os mesmos retalhos de pano tornaram outra vez ao anzol para pescar outros.”
VAIDADE - “A vaidade entre os vícios é o pescador mais astuto e que mais facilmente engana os homens. E que faz a vaidade? Põe por isco na ponta desses piques, desses chuços e dessas espadas dois retalhos de pano, ou branco, que se chama hábito de Malta, ou verde, que se chama de Avis, ou vermelho, que se chama de Cristo e de Santiago; e os homens, por chegarem a passar esse retalho de pano ao peito, não reparam em tragar e engolir o ferro. E depois que sucede? O que engoliu o ferro, ou ali, ou noutra ocasião ficou morto; e os mesmos retalhos de pano tornaram outra vez ao anzol para pescar outros.”
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