No
suplemento “Ípsilon” que acompanhou o Público de 14 de Dezembro, Mario Vargas
Llosa é entrevistado (páginas 14-16) a propósito do seu mais recente livro
traduzido para português – A civilização
do espectáculo. Por essa conversa do Nobel da Literatura peruano (2010) com
António Rodrigues perpassam ideias que nos deviam abalar, abordando temas tão
importantes como a cultura e a política, a democracia e a crise que nos cerca.
E andam todos ligados… Deixo alguns excertos.
Literatura e civilização – «(…) A
literatura cumpriu uma função nevrálgica na evolução da humanidade. É difícil
prová-lo, porque a literatura opera de forma muito subjectiva na intimidade das
pessoas, mas eu acho que a fantasia, a sensibilidade, o espírito crítico
desenvolveram-se extraordinariamente graças às fábulas, às lendas, aos mitos e,
logo, aos continuadores desses géneros que são a poesia, o romance. O mundo é
mais livre, mais crítico devido ao desassossego em relação ao mundo real,
atiçado por esse olhar crítico perante o mundo que é a literatura. A cultura,
em geral, e a literatura, em particular, estão sempre a expor-nos às ideias da
perfeição, da beleza, da coerência, de uma ordem que não existe no mundo real;
nesse sentido, têm servido como o motor do progresso da civilização. Pode ser
uma ideia romântica, mas não acho que seja desmerecida pela realidade. (…)»
Banalização da cultura – «(…) O valor das
coisas é fixado por certos padrões culturais, estéticos, e é isso que hoje está
muito ameaçado pela banalização da cultura. Há um factor que tem a ver com a
educação, no sentido mais amplo da palavra – não só com o professor e a escola,
também com a família, com a imprensa, com a informação que chega aos cidadãos,
tudo isso marca uma certa orientação na maneira como se formam os cidadãos. E é
a formação que hoje está muito estragada pela decadência de uma cultura que
procura apenas entreter, divertir, muito mais do que preocupar, formar. Uma
cultura que responde pela existência hoje de uma prática de avestruz: não ver,
não entender. (…)»
Tempo das crises – «(…) São as ideias
que fazem funcionar uma sociedade e que estão por trás das instituições,
incluindo as instituições económicas. Acho que esta crise terrível, cívica,
moral, por trás da grande crise financeira e económica que vive o Ocidente
deriva, em parte, da crise da cultura. (…)»
Cultura e democracia – «(…) Por que
razão a democracia se deteriorou tanto? Porque não há fé, não há confiança nas
instituições democráticas; há um grande desprezo pela política, por se
acreditar que é corrupta, medíocre. Ora, isso não é um problema social, é um
problema cultural. A cultura não é só a arte, a literatura, a cultura é a vida
inteira de uma sociedade – não está apenas na espuma, mas nas raízes da
problemática social. (…)»
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