Passam hoje 62 anos sobre o dia em que Sebastião da Gama iniciou o seu Diário, obra publicada postumamente, em 1958, com o acompanhamento de Hernâni Cidade, que foi professor de Sebastião da Gama. Por absoluta coincidência, hoje mesmo entreguei na editora as primeiras provas revistas da nova edição do Diário, que chegará ao público na segunda quinzena de Fevereiro. Absoluta coincidência de datas ou coisas que o destino tece…
Depois de treze edições, num percurso que veio até 2005 (até à 11ª, de 1999, a cargo da Ática; as duas últimas, de 2003 e de 2005, com a chancela da Sebenta Editora / Edições Arrábida), o Diário de Sebastião da Gama vai entrar numa nova fase, já que, pela primeira vez, vai ser publicado na íntegra, tal como o seu autor e protagonista o redigiu, além de ser uma edição anotada.
O Diário, de Sebastião da Gama, tem alimentado muitas mentes e tem contribuído para a pedagogia, ainda que não tanto como poderia, pois a sua leitura e o seu estudo deveriam ser obrigatórios para quem à educação se quisesse dedicar, independentemente da função que aí desempenhasse.
A história da sua edição não tem sido absolutamente inócua: logo em 1958, quando saiu a primeira edição, os critérios seguidos pelo organizador levaram a que muitas páginas – sobretudo aquelas que transcrevem e comentam trabalhos de alunos – fossem suprimidas e a pequenas alterações no texto e lapsos de transcrição, princípios que se mantiveram ao longo de todas as edições subsequentes. A partir de 2003, foram acrescidas algumas páginas à obra (das tais que tinham sido suprimidas), mas outras ficaram de fora por razões editoriais, ao mesmo tempo que eram mantidos (e acrescentados) os lapsos de transcrição e as alterações que já vinham desde 1958. Um exemplo? Na entrada de 24 de Janeiro de 1949, tem sido publicada a frase “E um belo dia acontece que lêem ‘A Moleirinha’ com os olhos deslumbrados e torcem o nariz a um mau poeta.” No entanto, no original de Sebastião da Gama, sempre esteve escrita a frase “E um belo dia acontece que lêem ‘A Moleirinha’ com os olhos deslumbrados e torcem o nariz ao Silva Tavares.” Outro? O nome do psicólogo estónio Köhler, que Sebastião da Gama referiu na entrada de 14 de Janeiro de 1950, sempre tem aparecido registado como “Roehles”.
Obviamente, poder-se-á considerar que essas transcrições não afectam o essencial da mensagem de Sebastião da Gama. E é verdade, da mesma forma que é verdade que o trabalho feito pelos anteriores editores foi o responsável pelo conhecimento que há desta obra. No entanto, o Diário de Sebastião da Gama é ele mesmo o repositório de uma cultura vasta, de uma informação actualizada, de um espírito crítico (e autocrítico) acentuado, que serão tanto mais visíveis quanto exista maior rigor na transcrição do seu escrito. Mais: as transcrições que Sebastião da Gama fazia para o seu Diário dos textos dos seus alunos obedeciam ao princípio de lhes dar voz, de prolongar o convívio e a troca de ideias do professor com os discípulos, pelo que dele são parte absolutamente inseparável.
A nova edição do Diário, que estará disponível no final de Fevereiro, é feita a partir do original manuscrito do próprio Sebastião da Gama e inaugura a colecção das “Obras Completas” do poeta da Arrábida, projecto que foi abraçado pela Editorial Presença.
[foto: página inaugural do Diário, de 11 de Janeiro de 1949]
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