terça-feira, 29 de junho de 2010

Rostos (144) - Nos 110 anos de Saint-Exupéry

O Pequeno Príncipe a a raposa, em aguarela de Saint-Exupéry (em Le Petit Prince)

Antoine de Saint-Exupéry nasceu em Lyon há 110 anos. Com 44 anos, no último dia de Julho, desapareceu num voo ao largo de Marselha, desde aí se construindo uma história sobre a origem do acidente (alvejado pelos inimigos, suicídio ou falha?). Paralelamente, ficou a sua obra, sobretudo esse fascínio que é Le Petit Prince, que teve direito a desenhos do autor e tem deliciado gerações, num caminho de leitura para todas as idades. A história d’O Principezinho (assim conhecido na versão portuguesa, em traduções devidas a Alice Gomes, Joana Morais Varela, Manuel Alberto ou Margarida Osório Gonçalves) teve a sua primeira edição em 1943, nos Estados Unidos, correspondendo a um pedido de um conto de Natal que os editores tinham feito a Saint-Exupéry, enquanto a edição francesa só apareceu em 1946, dois anos depois do desaparecimento do seu autor.
Episódios como o da raposa ou o da rosa têm arrebatado os leitores e são, talvez, os mais conhecidos. Mas a história é um prodígio de simplicidade, em que, como escreveu Jean Montenot, o saber do Pequeno Príncipe é “un savoir du coeur qui ne se donne qu’à ceux qui peuvent l’entendre” e cuja filosofia, “si philosophie du conte il y a, consiste moins à donner une réponse à l’éternelle question du sens de l’existence qu’à montrer l’urgence qu’il y a à s’en inquiéter” (in Lire, hors-serie nº 9, 2009).
O fascínio desta história tocou, por exemplo, Orson Welles, que, ainda em 1943, comprou os direitos para adaptar a obra ao cinema, projecto que só não teve sequência porque Welles e Walt Disney não se entenderam: é que Welles precisava de Disney para a animação, mas a conversa, apesar do entusiasmo e do brilhantismo de Welles, não chegou a bom termo. Conta Barbara Leaming, biógrafa de Welles, que Disney abandonou a reunião sob o pretexto de uma chamada telefónica, confidenciando depois a um dos presentes: “Aqui não há lugar para dois génios!”

Previsões (fáceis) do jogo de hoje

O sítio do Le Monde atribui um título interessante à notícia sobre o jogo do Mundial de Futebol de hoje: “Espanha-Portugal, a festa dos vizinhos”. No entanto, o texto alusivo a este encontro luso-espanhol termina com algo que contraria o tom festivo do título: “O choque da Península Ibérica entre as segunda e terceira nações da classificação FIFA anuncia-se quente.” O que justifica esta pressão é aquilo que, a dada altura, o articulista diz: em causa está o facto de ambas as selecções pretenderem "integrar o círculo fechado das oito melhores equipas do mundo e responder às imensas esperanças nelas colocadas." Pelo meio, vai ficando a classificação de Cristiano Ronaldo neste Mundial como “enigmático” e como “desconhecido”...

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Maria do Carmo Vieira, "O Ensino do Português"

O volume inaugural da colecção de ensaios editada pela Fundação Francisco Manuel dos Santos é consagrado à educação e deve-se à reflexão de Maria do Carmo Vieira, intitulando-se O Ensino do Português (Lisboa: 2010).
O que é este livro anuncia-o a autora logo no primeiro parágrafo do prefácio: “Da experiência da minha actividade docente, desde 1974, e da reflexão sobre a mudança instituída pela nova reforma, em 2003-2004, resultou este livro, no qual procuro evidenciar, através de inúmeros exemplos relativos às alterações programáticas, o estado de deterioração em que se encontram a escola e o ensino, nomeadamente o ensino da disciplina de Português.” E, se este é o propósito, facilmente o leitor verifica que dele não há desvio, pois o livro mantém esse cunho de reflexão pessoal, baseada na experiência docente e na preocupação e dedicação consagradas ao ensino do Português, sem se meter por essas veredas dos números e das estatísticas em que muitos sectores se empenham para justificar isto ou aquilo e raramente para procurar um retrato de fidelidade.
Os capítulos são sete – “Nova concepção de Escola e novo perfil de Professor”, “Gramática e Terminologia Linguística”, “Ensino Secundário”, “Ensino Básico – 3º Ciclo”, “Ensino Básico – 1º e 2º Ciclos”, “Iniciativa Novas Oportunidades” e “Revisão dos Programas do Ensino Básico”. Pelos títulos se vê que estão presentes as questões que têm ocupado o ensino da Língua Portuguesa ou do Português (terminologia que a disciplina recebe, respectivamente, no Básico e no Secundário) nos últimos anos, qual delas a mais polémica ou até controversa…
Os equívocos que Maria do Carmo Vieira demonstra assentam num princípio logo enunciado no prefácio – o “confronto irresolúvel entre ensinar e aprender, saber e competências, passado (velho) e presente (novo)”, de onde “a secundarização dos conteúdos e o menosprezo pelo património artístico que representa a Literatura, bem como pela formação científica do professor, a que se junta a criação de um perfil que lhe retira a sua individualidade”.
Creio que as observações feitas ao longo do livro servem o que se passa com o ensino do Português, mas também com o que se vive no ensino português. Tudo com responsabilidades distribuídas pela política e pelas suas medidas, pelos editores escolares (concretamente, por causa dos manuais escolares, muitos deles praticando uma infantilização crescente ou eivados de erros e de imprecisões – como ainda agora, altura de adopção de manuais de Português para o 10º ano, se pôde ver…), pela organização escolar, pela história social das últimas quatro décadas, pelas teorias da educação que têm entrado na escola muitas vezes dela se servindo como cobaia... Provavelmente, nem todos os professores subscreverão as críticas, aí entrando as formações académicas e as ideologias que pela educação lhes chegaram; mas não podem negar as histórias contadas e com as quais, possivelmente, encontrarão algumas parecidas nos seus percursos individuais. Não creio que o retrato aqui traçado seja exagerado, acho-o mesmo muito próximo daquele que é o quotidiano da vida docente, designadamente dos professores de Português, com as impossibilidades, as fragilidades e as incongruências.
A leitura deste livro tem de ser acompanhada por um dos princípios que a autora enuncia no final do seu primeiro capítulo, reflectindo sobre o que é ser professor – “ensinar é um acto de dádiva que tem por isso estreita relação com o verbo amar, e se compraz no prazer do estudo e da emoção, que advém das inúmeras leituras feitas com os alunos, bem como no interesse e no empenho por estes demonstrados nesse trabalho, num ambiente de confiança recíproca.”
Bem se sabe que esta não é também a concepção de professor que conforma todos os docentes e, por isso, vale a pena pesar cada uma das palavras deste ponto de partida. Pelo menos para quem perfilha esta ideia, fica o desafio para uma mudança favorável ao desenvolvimento do país, como consta no epílogo: “só com professores conscientes do significado de ensinar e solidamente formados, a nível científico e pedagógico, com programas adequados às exigências crescentes de cada nível de ensino e conteúdos valorizados será possível devolver à escola a sua função histórica de espaço de conhecimento, de cultura e de formação, fruto de um trabalho contínuo e empenhado de múltiplas gerações que a Inércia não pode interromper.”
Leitura indispensável, pois. Por tudo o que retrata, por tudo o que pensa (e faz pensar), por tudo o que (nos) identifica. E também pelo manifesto (sem ser panfletário) que O Ensino do Português constitui em prol de um olhar para a disciplina de Português como algo fundamental nos domínios da identidade, da cultura e do saber.

sábado, 26 de junho de 2010

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Patrulheiros - já ouviu falar deles?

Natália Abreu escreveu no Público de ontem que "estes reformados fazem uma cidade mais segura". São eles, os patrulheiros. E continua: "Não ganham muito, mas recebem algo que não tem preço. Têm entre 50 e 80 anos e uma missão - fazer do centro de Setúbal um lugar melhor."
[foto: Público]

A goleada

No dia em que Portugal venceu a Coreia do Norte por 7-0 no Mundial de Futebol, na Cidade do Cabo... parabéns à Selecção, com este desenho da bandeira portuguesa feito a partir de tampas plásticas num estabelecimento comercial localizado na estrada Setúbal-Palmela (Miraventos).

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Memória: José Saramago (1922-2010)

Revejo o volume da 1ª edição de Memorial do Convento, adquirido numa livraria de Vila Franca de Xira e ali autografado por Saramago em Março de 1983. Uma capa bem mais bonita do que as capas das edições que se lhe seguiram, mas o mesmo dizer, ao longo das edições sucessivas, e um escrever que se foi reproduzindo numa bibliografia que não parou de crescer. Relembro o prazer que me deu a leitura deste romance, logo devorado nessa altura, um livro cuja história tive pena de acabar de ler, fosse pela densidade de emoções, fosse pelo contacto com uma escrita que corria, vertiginosa, rompendo códigos e hábitos. Achei – acho – que Saramago ficaria na história da literatura portuguesa mesmo que não tivesse prosseguido a sua via de escritor, este romance bastaria para nela deixar o nome.
Duas décadas depois, em 2006, Saramago publicava As pequenas memórias, onde, a propósito da terra que é um dos pontos fortes desse romance, escrevia: “Um dia, (…) fui de excursionista a Mafra. Tinha nascido na Azinhaga, vivia em Lisboa, e agora, quem sabe se po um cúmplice aceno dos fados, uma piscadela de olhos que então ninguém poderia decifrar, levavam-me a conhecer o lugar onde, mais de cinquenta anos depois, se decidiria, de maneira definitiva, o meu futuro como escritor.”
E assim se constrói uma história. E uma obra. De Saramago fica essa obra. Com todas as inovações, com o fulgor da escrita. E com os fundamentalismos que a minam, também. Mas continuarei a apreciar essa recordação do Memorial e a sensação que me deixou enquanto leitor. Poderosa, claro. Não tão forte em obras que se lhe seguiram, mas intensa essa do Memorial. Há obras assim!
[foto: José Saramago, na Feira do Livro, em Lisboa, em Junho de 2008]

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Entre o copianço e a ética

De vez em quando surgem as notícias sobre o plágio ou sobre o "copianço" e, por vezes, a explicação para tais casos - um texto que estava no computador, a sobreposição com as fontes, etc. Há bem pouco tempo, foi o caso de uma tese de doutoramento que terá sido decalcada a partir de uma outra defendida no estrangeiro; há dias, um investigador debruçava-se sobre o acto de copiar, puxando o assunto para trabalho académico e apresentando resultados avassaladores; há uns anos, foi o caso de uma colunista que, num artigo para uma revista, inseriu, sem indicar a proveniência, parte de um texto de outro autor publicado no estrangeiro... No quotidiano, na escola, vamos assistindo ao confronto entre o copianço e a seriedade, nem sempre saindo a última como vencedora. A net tem dado uma ajudinha nesta tentação, mas também tem servido para pôr a descoberto as quedas... Na última edição do Correio da Educação (da editorial ASA), o seu director, J. Esteves Rei, docente universitário, aborda o assunto de uma forma que merece a nossa atenção. De lá transcrevo.

«(…) É estranho que os alunos cheguem às universidades sem conhecerem claramente a dimensão ética da aprendizagem ou a relação entre o aprendente e aprendizado, tal como entre a fonte e a recepção da informação e do conhecimento.
Olhada a situação do lado do docente, também se estranha que, à primeira falta de clareza dessa relação, o professor não alerte o aluno dessa falha ética, apontando-lhe os riscos que corre perante a lei.
Do lado dos princípios, há que considerar os pressupostos e as grandes linhas de acção. Entre os primeiros, tenhamos presente que não há comportamento humano, individual ou colectivo, sem uma dimensão ética a envolvê-lo. Daqui decorre que cada indivíduo deverá identificar os princípios lógicos ou a razão ética, subjacentes às suas decisões, condutas ou comportamentos.
Na constituição desse conjunto de princípios há quem tome como ideia central o dever, ou o uso da razão, que no momento de agir se transforma em dever moral. As dificuldades na aceitação desta perspectiva nascem da impossibilidade de hierarquizar princípios quando surge o conflito entre dois deveres. Exige-se, então, ao indivíduo que saiba ponderar a importância de optar por um ou pelo outro.
Há, porém, quem escolha os princípios em função da utilidade das acções, em ordem a satisfazer o bem-estar dos agentes envolvidos e da sociedade, hoje ou no futuro. Neste caso, as reservas perante um princípio advêm da dificuldade em quantificar os riscos, danos e prejuízos, ao determinar a sua aceitação ou rejeição.
Como princípios gerais de uma ética aplicável a estudantes e professores, destacam-se os seguintes. A exigência de formação humana, intelectual e profissional deve ser timbre de qualquer escola, confrontando com ela o jovem, de qualquer idade. Por outro lado, não é possível crescer e agir humanamente sem pautar a sua vida por valores, assumidos pelo próprio e reconhecidos pela sociedade.
Num segundo patamar, situa-se a responsabilidade de aprender, pelo aluno e pela escola. Sem ela, não existem, nem esta nem aquele. A escola foi sempre uma zona franca para o espírito, um lugar amigável de encontro e descoberta do saber. Mas para isso exigem-se tolerância, abertura de espírito e respeito perante as dúvidas, as diferentes apreciações, os interesses e os ritmos de aprendizagem do outro, cujos limites se situam no dogmatismo, parcialidade, violência e falso consenso.
Por último, é indispensável a liberdade de opinião, método e pensamento. Tal atitude, a valorizar pedagogicamente, é propiciadora de soluções positivas para a resolução da maior parte dos problemas da sociedade. Todavia, a sua plena actualização tem como verso de medalha a solidariedade perante o outro e as regras aceites e sempre em reavaliação.»
J. Esteves Rei. “Quando copiar é uma fraude - Ética no ensino e na aprendizagem”. Correio da Educação. ASA: 17.Junho.2010.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Exames: Três em cada quatro alunos copiam na universidade

Este texto, que pode ser lido no Diário Digital de hoje, só surpreenderá os incautos ou quem viva num mundo tão virtual que não tenha qualquer semelhança com aquele em que vivemos. E quem diz "copianço" pode ainda dizer outras situações de favor para serem obtidos resultados positivos nos estudos, ainda que ambos comunguem da mesma característica - a fraude.
O que espanta é o ar de que tudo isto é normal. Aliás, na continuação da peça, é dito que os alunos não reconhecem o "copianço" como acto ilícito...
Há dias, tive uma prova disso: quando uma aluna tentava obter uma resposta para o teste, perguntando a solução a uma amiga, chamei-lhe a atenção. No final, veio falar comigo, dizendo: "Ó professor, vou ser sincera consigo. Só copiei a resposta X... Pode perguntar a Y..." Apenas comentei: "Porque queres ser sincera se já mentiste, pondo como tua uma resposta que não te pertence?" Ficou a olhar, embasbacada, porque nunca tinha pensado nisso... e eu fiquei a pensar que a sua prática irá continuar!...

quinta-feira, 10 de junho de 2010