quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Vincent Bernard: Uma cronologia da Grande Guerra



São 120 páginas de referências cronológicas relacionadas com a Primeira Grande Guerra, umas telegráficas, outras com algum desenvolvimento, aquilo que Vincent Bernard apresenta em Petite Chronologie de la Grande Guerre (Col. “Repères d’Histoire”. Bordeaux: Éditions du Sud Ouest, 2014), num horizonte que se inicia em 28 de Junho de 1914 (“pelas 10 horas da manhã, em Sarajevo… primeiros tiros”, referindo o atentado ao arquiduque Francisco Fernando) e se conclui em 10 de Novembro de 1920, com o “soldado desconhecido” depositado no Arco de Triunfo. Apesar deste limite temporal, a cronologia tem ainda uma entrada alusiva a 3 de Setembro de 1939, data em que “a França e a Inglaterra declaram guerra à Alemanha nazi”, o que estabelece a ponte entre as duas Guerras Mundiais que marcaram o século XX…
O tempo passa por este livro num registo do dia a dia, sobretudo organizado para o leitor francês, com apontamentos em que entram as operações militares terrestres, marítimas e aéreas, a tecnologia e o armamento, a intervenção política e a diplomacia, a economia e a sociedade, a vida na retaguarda e a cultura. Tão amplo espectro de informação trazido para uma cronologia é justificado pelo autor nos seguintes termos: “Si le monde de 1918 n’est plus celui de 1914, ce n’est pas seulement parce que les poilus français, landser allemands, tommies anglais, diggers australiens ou autres doughboys américains ont combattu et souffert dans un véritable enfer, c’est aussi parce que la guerre même, en tant qu’événement, en tant que rupture historique, a orienté en profondeur la marche du monde, l’a fait entrer véritablement dans le XXe siècle, ce siècle si proche mais que, déjà, s’enfuit tout doucement de nos mémoires.” Assim, em jeito de preservar e de ajudar a memória, Bernard pretende que esta obra ajude “à la découverte des jalons essentiels de cette Grande Guerre mondiale de quatre ans dans toutes ses dimensions”.
Para cada ano do conflito é escolhido um título interpretativo que ajuda a uma leitura dos acontecimentos: “1914 – La fin d’un monde”, “1915 – L’épouvantable enlisement des tranchées”, “1916 – L’année des batailles titanesques”, “1917 – Année charnière ou année de trop?”, “1918 – D’une nouvelle guerre à l’amère victoire” e, finalmente, “Épilogue, 1919-1920 – Paix européenne ou règlement provisoire?”. O leitor vai avançando nas datas e assiste à construção do puzzle que levou ao recrudescimento do conflito, às intrigas, à movimentação, à paragem, às implicações, à destruição, à morte, à movimentação política e militar, ao sofrimento, ao desfazer dos impérios, ao nascimento de um novo mapa europeu, passo a passo, como quem acompanha o trajecto em todas as frentes. Assiste a execução de prisioneiros, à morte de artistas e de outras personalidades participantes (Charles Péguy, Alain Fournier, Alfred Lichtenstein, Henry Moseley, Charles de Foucauld, von Richtoffen, Roland Garros, Guillaume Apollinaire), ao sofrimento que não poupou ninguém (Georges Braque, Blaise Cendrars, Henri Barbusse), ao episódio dos táxis do Marne e à destruição conhecida pelo “Chemin des Dames”, ao primeiro apelo à paz entre os beligerantes lançado pelo Papa Bento XV, à confraternização natalícia entre soldados inimigos, à primeira utilização do gaz de combate, ao aparecimento dos tanques, aos bombardeamentos sobre Paris, aos raids sobre Londres e sobre Colónia, à violência de Verdun e de Somme e às várias (doze) ofensivas sobre Isonzo, à mudança do papel da mulher, à queda e ascensão de políticos e… em 13 de Outubro de 1918, ao gazeamento e evacuação do cabo Adolfo Hitler.
Relativamente a Portugal, há uma dezena de referências que acompanham o que se passou nas colónias em África e o que foi o Corpo Expedicionário Português, tais como: em 26 de Outubro de 1914 (“Les Allemands pénètrent en Angola portugais, et donc théoriquement neutre”), em 23 de Novembro de 1914 (“Le gouvernement portugais annonce une coopération accrue avec le Royaume-Uni”), em 23 de Fevereiro de 1916 (“Les autorités portugaises saisissent les navires allemands sur le Tage”), em 9 de Março de 1916 (“Le Portugal rejoint l’Entente – Après des mois de collaboration militaire anglo-portugaise, de nombreux incidentes dans les colonies et la réquisition par Lisbonne des navires allemands sur le Tage, Berlin régularise une situation diplomatique exécrable en déclarant la guerre au Portugal. Le Portugal prépare un petit corps expéditionnaire pour la France et entreprend de renforcer ses positions dans les colonies d’Afrique”), em 15 de Março de 1916 (“L’Autriche-Hongrie déclare à son tour la guerre au Portugal”), em 8 de Agosto de 1916 (“Le gouvernement portugais étend sa coopération avec l’Entente au front européen”), em 3 de Janeiro de 1917 (“Les premières unités du corps expéditionnaire portugais, qui doit comprendre deux divisions et se battre au sein de l’armée britanique, débarquent en France”), em 17 de Junho de 1917 (“Le corps expéditionnaire portugais est engagé pour la première fois sur le front de l’Ouest”), em 9 de Abril de 1918 (no âmbito da operação Georgette, uma ofensiva alemã que pretendia fazer recuar os britânicos até à Mancha, “le corps expéditionnaire portugais, en particulier, est presque anéanti par la violence de l’assaut allemand”), em 1 de Julho de 1918 (“Les petites forces allemandes du colonel von Lettow-Vorbeck, poursuivant leur petite guerre face à des forces de l’Entente infiniment supérieures, atteignent Namyakura, en Afrique portugaise (Mozambique actuel)”).
A obra carece da indicação da bibliografia consultada, sobretudo quanto à origem ou fontes de datas de outros países que não a França. Quanto a índices, parte importante neste tipo de obras, existe apenas um “de personalidades” quando poderia haver também um geográfico.
Apesar das deficiências que uma obra deste tipo possa conter, obrigados somos a reconhecer tratar-se de um bom contributo de condensação da História que fez crescer a Europa como ela é, que permite consulta e informação rápidas, ainda que limitada ao estilo de uma cronologia (sublinhada no título com o adjectivo “petite”).

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