Partilho
algumas máximas, depois de ler o Diário,
de Katherine Mansfield, em tradução de Fernanda de Castro (Col. “Contemporâneos”.
Porto: Livraria Tavares Martins, 1944).
Criação – “Serei eu capaz de exprimir
algum dia o meu amor pelo trabalho, o meu desejo de perfeição, a minha ânsia de
um labor mais consciencioso? Serei eu capaz de dizer esta paixão que sinto –
esta paixão que substitui a religião, porque é a minha religião… que substitui
a companhia dos outros, porque sou eu que crio os meus companheiros… que
substitui a vida, porque é a própria vida? Sinto-me às vezes tentada a joelhar
diante do meu trabalho, a adorá-lo, a prostrar-me, a ficar um tempo infinito em
êxtase ante a ideia da criação. (31 de Maio de 1919)”
Diário – “Tenho de pôr o meu diário em
andamento e depois tenho de conservá-lo em dia. Mas serei eu capaz de ser
honesta? Se mentir, esse diário não servirá para nada. (Fevereiro.1921)”
Honestidade – “A honestidade (porque
será?) é a única coisa que me parece mais preciosa do que a vida, do que o amor
e do que a morte. Só ela permanece. Acreditem-me! Feitas as contas, a verdade é
a única coisa que merece ser possuída… A verdade é mais comovente, mais alegre
e mais ardente do que o próprio amor… Tudo acaba por nos abandonar mas ela não
pode trair-nos. (Setembro de 1919)”
Mal – “Quando um mal está
diagnosticado, qualquer demora que atrase o esforço para curá-lo causa um
enfraquecimento fatal. (…) Quando se é negligente, as más ervas pululam. (18 de
Outubro de 1920)”
Mar – “O mar, aqui, é mar verdadeiro. Encapela-se,
levanta-se e torna a cair com um barulho estrondoso, seguido de um longo rolar
macio; por vezes, dir-se-ia que tenta escalar o céu e vêem-se os barcos
empoleirados nas nuvens como querubins voadores. (22 de Maio de 1918, em Looe,
Cournouailles)”
Morte – “Como seria intolerável morrer
deixando apenas fragmentos, esboços, nada de verdadeiramente acabado! (19 de
Fevereiro de 1918)”
Partir – “Cada vez que abandonamos um sítio
qualquer deixamos atrás de nós qualquer coisa de precioso que não deveríamos
matar mas que morre. (9 de Fevereiro de 1922)” (Katherine Mansfield. Diário. Col. “Contemporâneos”. Porto: Livraria
Tavares Martins, 1944, pg. 256)
Representar – “Todos nós começamos por
representar um papel e, quanto mais perto estamos do que desejaríamos ser, mais
perfeito é o nosso disfarce. Por fim chega o momento em que já não
representamos; este momento pode mesmo colher-nos de surpresa. Então,
contemplamos, talvez com espanto, a nossa bela plumagem, que já não é de empréstimo.
Os dois aspectos confundiram-se: o primitivo e este; representar, agora, é
agir. (24 de Novembro de 1921)”
Ser – “Para fazermos seja o que for,
para sermos seja o que for, precisamos de ser inteiros, de fortificar a nossa fé.
Um ser desunido não pode fazer nada de jeito. (1 de Fevereiro de 1922)”
Sofrimento – “Não há limites para o
sofrimento humano. Quando se pensa ‘Agora toquei o fundo do abismo, agora não
posso descer mais fundo…’ – eis que descemos mais, ainda mais e assim até ao
infinito. (…) O sofrimento não tem limites, é a própria eternidade. (…) O
sofrimento pode ser vencido. (…) Temos de nos submeter. De não resistir. De o
acolher. De nos deixarmos submergir. De o aceitar plenamente. De fazer da dor
uma parte da vida. Tudo o que na existência verdadeiramente aceitamos sofre uma
transformação. Assim, o sofrimento deve transformar-se em amor. (14 de Dezembro
de 1920)”
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