Uma senhora desaparece, vizinhos e familiares dão pela ausência e queixam-se da falta. Não é conseguida autorização para entrar na casa da dita senhora. Nove anos depois, descobre-se que a senhora estivera morta dentro de casa durante todo esse tempo. Com ela, estão também mortos os seus animais de estimação.
Isto aconteceu no Portugal que conhecemos, nos tempos que correm, lá para os lados da linha de Sintra.
No último episódio deste romance, a casa em que jazia a senhora foi penhorada pelo fisco e foi vendida por uma alegada dívida fiscal de cerca de mil e quinhentos euros. Segundo o Público, o Ministério das Finanças, ao confrontar-se com o insólito desta situação, garantiu que “a Administração Fiscal actuou sempre dentro da legalidade e com o zelo e a prudência aconselhados pelas várias circunstâncias”. Augusta Duarte Martinho, assim se chamava a senhora, completaria 96 anos neste Fevereiro, mas estava morta desde 2002! Ali, no seu apartamento, no meio da turbulência da cidade!...
História exemplar que dará um bom filme. Um bom e tétrico filme! E um bom retrato do que vale hoje uma pessoa… Muito pouco ou nada, perante o cavalgar de uma civilização que vai matando o que pode haver de humanidade, que vai esquecendo que o ser pessoa devia ser o mais importante!
Triste sociedade, mais tristes tempos, deplorável onda de desumanidade! Tudo num tempo em que há “dia dos vizinhos”, “apoios à terceira idade”, discursos sobre a solidão, voluntariado, verificações e “provas de vida”! Tudo num tempo em que até o ser humano se torna ridículo!
“A velhice ridícula é, porventura, a mais triste e derradeira surpresa da natureza humana.” Disse-o Machado de Assis em 1881, quando escreveu a história de Brás Cubas. Não se aprendeu e chegou-se à morte ridícula!...
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