DIÁRIO DA AUTO-ESTIMA – 65
Miguel Torga – As datas que assinalam centenários, pelo menos essas, servem para que seja feita (ou mantida) a inscrição da identidade de um povo, de um país, de uma cultura. No domingo, 12 de Agosto, passou o primeiro centenário do nascimento de Miguel Torga, assinalado em Coimbra (terra onde viveu) com a inauguração de um memorial junto ao Mondego e com a abertura ao público da sua casa-museu. O Governo português não esteve presente no evento, gesto que nem o facto de se saber que este é um período de férias para imensa gente desculpa, mesmo porque, é sabido, o centenário do nascimento de Miguel Torga estava anunciado desde 12 de Agosto de 1907, há cem anos, portanto. O que esta ausência significa de um ponto de vista cultural e identitário é evidente… e é triste. O que esta ausência mostra quanto ao valor dado às referências socialistas por um governo que pertence a essa área política também é evidente. Olhamos e não acreditamos, pois: é que mais valeu ganhar a Câmara de Lisboa (em cuja tomada de posse o Governo esteve presente em peso) do que patrocinar o respeito pela identidade que faz Portugal, como foi o caso do centenário torguiano (em cuja celebração o governo esteve ausente em peso)!
Rotundas – A gente percorre o país e verifica que um dos supostos sinais de modernização é a febre das rotundas, quase não havendo espaço em que se cruzem dois caminhos que não mereça a rotundinha à maneira… Nalguns casos, as rotundas são enriquecidas com um monumento, o que só fica bem. No entanto, parece que essa decoração não chega e são inúmeros os lugares em que, a acompanhar a rotunda e em volta do monumento, se encontram cartazes publicitários ou anúncios de realizações locais, poluindo a visibilidade, destruindo o que poderia ser um espaço interessante e simpático. Muitas vezes, parece estarmos perante um vandalismo organizado da paisagem, em que os cartazes (em diversos tamanhos e com relativa falta de interesse) surgem sem regras e sem lógica. Há uns anos, os únicos autores que assim se comportavam eram os partidos políticos, que se criam com o direito de poder colar papéis e sarapintar em tudo o que fosse sítio; agora, são também os promotores de eventos, as autarquias, os agentes publicitários. Um pouco mais de bom gosto e de respeito pela paisagem, pelo ambiente e pelos cidadãos não ficaria mal, de facto.
Crédito – Andam os teóricos da economia preocupados com as dívidas das famílias portuguesas, mas a máquina em prol do aumento das dívidas não pára. Desde as mensagens por telemóvel até à inundação televisiva, desde as cartas endereçadas até à publicidade exterior ou nos periódicos, as sugestões para o aumento da conta bancária (com pagamento para dali a uns tempos) são intensas. E com que argumentos? O primeiro: todos somos “clientes especiais”. Depois: a aprovação do crédito é rápida. Depois: além do crédito pré-aprovado, ainda podemos ter uma oferta. Depois: o crédito pode ser para gastar nas férias, para engrossar a conta bancária, para obras a efectuar, para a substituição do automóvel, para o “regresso às aulas” e até, imagine-se, para o “regresso a casa”. O convite ao gasto, sempre ao gasto, fácil e desordenado, não tem limites. O pior é que, cada vez mais, este vai sendo o sinal de subdesenvolvimento, aliado à ilusão de que temos o mundo ao alcance da nossa mão. Pobre mundo, ingrata ilusão!
Rotundas – A gente percorre o país e verifica que um dos supostos sinais de modernização é a febre das rotundas, quase não havendo espaço em que se cruzem dois caminhos que não mereça a rotundinha à maneira… Nalguns casos, as rotundas são enriquecidas com um monumento, o que só fica bem. No entanto, parece que essa decoração não chega e são inúmeros os lugares em que, a acompanhar a rotunda e em volta do monumento, se encontram cartazes publicitários ou anúncios de realizações locais, poluindo a visibilidade, destruindo o que poderia ser um espaço interessante e simpático. Muitas vezes, parece estarmos perante um vandalismo organizado da paisagem, em que os cartazes (em diversos tamanhos e com relativa falta de interesse) surgem sem regras e sem lógica. Há uns anos, os únicos autores que assim se comportavam eram os partidos políticos, que se criam com o direito de poder colar papéis e sarapintar em tudo o que fosse sítio; agora, são também os promotores de eventos, as autarquias, os agentes publicitários. Um pouco mais de bom gosto e de respeito pela paisagem, pelo ambiente e pelos cidadãos não ficaria mal, de facto.
Crédito – Andam os teóricos da economia preocupados com as dívidas das famílias portuguesas, mas a máquina em prol do aumento das dívidas não pára. Desde as mensagens por telemóvel até à inundação televisiva, desde as cartas endereçadas até à publicidade exterior ou nos periódicos, as sugestões para o aumento da conta bancária (com pagamento para dali a uns tempos) são intensas. E com que argumentos? O primeiro: todos somos “clientes especiais”. Depois: a aprovação do crédito é rápida. Depois: além do crédito pré-aprovado, ainda podemos ter uma oferta. Depois: o crédito pode ser para gastar nas férias, para engrossar a conta bancária, para obras a efectuar, para a substituição do automóvel, para o “regresso às aulas” e até, imagine-se, para o “regresso a casa”. O convite ao gasto, sempre ao gasto, fácil e desordenado, não tem limites. O pior é que, cada vez mais, este vai sendo o sinal de subdesenvolvimento, aliado à ilusão de que temos o mundo ao alcance da nossa mão. Pobre mundo, ingrata ilusão!
2 comentários:
Concordo com a crítica à poluição visual dos painéis publicitários que enchem a cidade, mas não com a crítica às rotundas. Há algum tempo escrevi um elogio às rotundas, comparativamente aos semáforos, que reproduzo:
- regulam melhor o trânsito do que os semáforos (excepto para grandes volumes de tráfego); veja-se o caso da rotunda à saída para Azeitão: algum semáforo conseguria aquela fluidez?
- são mais baratas que os semáforos, particularmente se tivermos em conta o consumo de energia e as reposições (substituição de lâmpadas, pintura, reposição dos semáforos acidentados)
- são mais amigas do ambiente (os semáforos estão sempre a gerar o lixo das lâmpadas)
- são mais bonitas (em geral)
- são mais seguras (em geral; os semáforos são sempre obstáculos à procura do acidente)
- contribuem ainda para a segurança ao desacelerarem o trânsito, mesmo quando não há cruzamentos nem entroncamentos
- os acidentes nas rotundas são, em geral, apenas de de chapa batida; mas nos semáforos ocorrem os mais mortais de todos os acidentes: choques violentos dos carros que passam no vermelho
- atrapalham menos (em geral; os semáforos estão frequentemente atravessados nos passeios)
- irritam menos (acho eu; podem até demorar mais, mas a angústia cíclica das passagens nos verdes irrita mais do que o pinga-pinga das rotundas)
- a maioria tem plantas (árvores, flores); é irrelevante para o ambiente mas é bom para o espírito
Depois de ler no 'Abrupto' a "denúncia" de uma rotunda que surgia a meio de uma longa via, sem qualquer cruzamento ou entroncamento que a jusfificasse, ainda fiquei a gostar mais de rotundas. Depois encontrei uma assim próximo de Évora, e confirmei a beleza do conceito.
Caro j.a.:
Acentuo a questão da poluição visual nas rotundas e noutros espaços nobres de cidades e vilas do país, motivo que originou o meu comentário (até indignação). Relativamente à quantidade de rotundas, há casos de exagero, que, aliás, é muitas vezes extensivo às escassas dimensões de algumas delas. São estes exageros que também lamento. Quanto às observações em favor das rotundas que apresenta, subscrevo. Obrigado pelo comentário!
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