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domingo, 17 de novembro de 2013

Daniel Sampaio e as classificações dadas pelos "rankings" às escolas



"Classificar para quê?" é o que pergunta Daniel Sampaio na crónica hoje saída na revista do Público (pg. 40), texto com interesse para a reflexão sobre os rankings.

domingo, 28 de junho de 2009

Olhar a adolescência

Daniel Sampaio. "Os jovens e os valores". Público ("Pública"): 28.Junho.2009.
(para ler, clicar sobre a imagem)

domingo, 15 de fevereiro de 2009

OUTROS DIZERES - Daniel Sampaio e a escola a tempo inteiro

Contra a escola-armazém
«Merece toda a atenção a proposta de escola a tempo inteiro (das 7h30 às 19h30?), formulada pela Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap). Percebe-se o ponto de vista dos proponentes: como ambos os progenitores trabalham o dia inteiro, será melhor deixar as crianças na escola do que sozinhas em casa ou sem controlo na rua, porque a escola ainda é um território com relativa segurança. Compreende-se também a dificuldade de muitos pais em assegurarem um transporte dos filhos a horas convenientes, sobretudo nas zonas urbanas: com o trânsito caótico e o patrão a pressionar para que não saiam cedo, será melhor trabalhar um pouco mais e ir buscar os filhos mais tarde. (...)
Não estaremos a remediar à pressa um mal-estar civilizacional, pedindo aos professores (mais uma vez...) que substituam a família? Se os pais têm maus horários, não deveriam reivindicar melhores condições de trabalho, que passassem, por exemplo, pelo encurtamento da hora do almoço, de modo a poderem chegar mais cedo, a tempo de estar com os filhos? Não deveria ser esse um projecto de luta das associações de pais?
Importa também reflectir sobre as funções da escola. Temos na cabeça um modelo escolar muito virado para a transmissão concreta de conhecimentos, mas a escola actual é uma segunda casa e os professores, na sua grande maioria, não fazem só a instrução dos alunos, são agentes decisivos para o seu bem-estar: perante a indisponibilidade de muitos pais e face a famílias sem coesão onde não é rara a doença mental, são os promotores (tantas vezes únicos!) das regras de relacionamento interpessoal e dos valores éticos fundamentais para a sobrevivência dos mais novos. Perante o caos ou o vazio de muitas casas, os docentes, tantas vezes sem condições e submersos pela burocracia ministerial, acabam por conseguir guiar os estudantes na compreensão do mundo. A escola já não é, portanto, apenas um local onde se dá instrução, é um território crucial para a socialização e educação (no sentido amplo) dos nossos jovens. Daqui decorre que, como já se pediu muito à escola e aos professores, não se pode pedir mais: é tempo de reflectirmos sobre o que de facto lá se passa, em vez de ampliarmos as funções dos estabelecimentos de ensino, numa direcção desconhecida. Por isso entendo que a proposta de alargar o tempo passado na escola não está no caminho certo, porque arriscamos transformá-la num armazém de crianças, com os pais a pensar cada vez mais na sua vida profissional.
A nível da família, constato muitas vezes uma diminuição do prazer dos adultos no convívio com as crianças: vejo pais exaustos, desejosos de que os filhos se deitem depressa, ou pelo menos com esperança de que as diversas amas electrónicas os mantenham em sossego durante muito tempo.
Também aqui se impõe uma reflexão sobre o significado actual da vida em família: para mim, ensinado pela Psicologia e Psiquiatria de que é fundamental a vinculação de uma criança a um adulto seguro e disponível, não faz sentido aceitar que esse desígnio possa alguma vez ser bem substituído por uma instituição como a escola, por melhor que ela seja. Gostaria, pois, que os pais se unissem para reivindicar mais tempo junto dos filhos depois do seu nascimento, que fizessem pressão nas autarquias para a organização de uma rede eficiente de transportes escolares, ou que sensibilizassem o mundo empresarial para horários com a necessária rentabilidade, mas mais compatíveis com a educação dos filhos e com a vida em família.
Aos professores, depois de um ano de grande desgaste emocional, conviria que não aceitassem mais esta "proletarização" do seu desempenho: é que passar filmes para os meninos depois de tantas aulas dadas - como foi sugerido pelos autores da proposta que agora comento - não parece muito gratificante e contribuirá, mais uma vez, para a sua sobrecarga e para a desresponsabilização dos pais.»
Daniel Sampaio. "Contra a escola-armazém". Público ("Pública"): 15.Fev.2009

domingo, 4 de janeiro de 2009

E havia esperanças de que fosse de outra maneira?

Escola: mais do mesmo
No início de 2009, nada de novo ou estimulante existe na escola portuguesa. Terminou o ano com mais do mesmo: falta de entendimento entre professores e Ministério da Educação (ME), alunos sem participação activa no quotidiano escolar, pais desinteressados da escola e só raramente integrados em associações de encarregados de educação. Uma iniciativa correcta do ME - a atribuição do Prémio ao melhor Professor do ano - não suscitou qualquer interesse na opinião publicada ou pública, arriscando tornar-se em mais uma operação rotineira sem qualquer impacte na vida da escola.
Os acontecimentos de uma escola do Porto, em que um aluno apontou um revólver de plástico a uma professora, foram de imediato desvalorizados por dirigentes do ME e classificados de "brincadeira de mau gosto". Parece que o facto de ser uma arma a brincar tranquilizou a tutela, na linha de outras declarações oficiais em que a indisciplina é sempre vista separada da violência e como tal considerada de menor importância. O risco é evidente: se não valorizarmos o pequeno incidente de indisciplina, se não respondermos de imediato com medidas correctivas de responsabilização, a desordem cresce dia após dia. Sabe-se hoje que a degradação do clima na escola progride por estádios, desde a recusa de regras na turma e pouco trabalho, até actos graves de delinquência (agressão a professores, destruição de material escolar), com etapas intermédias de pequenos delitos, comportamentos provocatórios e desafios à autoridade que denunciam uma violência latente. Ora a pistola de plástico insere-se num estádio intermédio de provocação que prenuncia momentos em que as regras podem passar a ser a dos grupos violentos e intimidatórios, em vez de serem construídas na sala de aula, a partir de um regulamento da escola organizado com a participação de todos.
O ME deveria criar as condições mínimas de funcionamento das salas de aula, dando aos professores força para combater a indisciplina, através da co-responsabilização de docentes, alunos e pais. Para isso o professor, amparado nas estruturas da escola (com particular realce para o Conselho de Turma), deveria ter poder para, de imediato, conseguir actuar no controlo disciplinar. Se o comportamento causador de perturbação for cedo diagnosticado, a medida correctora impõe-se com coerência e será apoiada pela maioria dos alunos e seus pais.
Concretizando: se a escola trabalhar o mais possível com a família, se os professores formarem um grupo coeso - a partir de acções de formação dirigidas à prática pedagógica com turmas heterogéneas e na consequência do trabalho no Conselho de Turma - se os alunos forem ouvidos com respeito sobre o funcionamento desejável na sala de aula, se o comportamento mínimo de indisciplina for logo detectado e respondido com medidas definidas previamente para aquele comportamento, o clima escolar poderá melhorar. Se, pelo contrário, tudo for remetido para o burocrático e aborrecido "Estatuto do Aluno" ou para o Ministério Público (não se vislumbra, até agora, qualquer sucesso na prometida e muito propagandeada acção desta estrutura), nada poderá melhorar.
Noutra perspectiva, interessa sempre a história relacional do incidente. Não é por acaso que aquela turma e aquele aluno escolheram o momento: todo o comportamento indisciplinado tem atrás de si a construção/destruição de uma relação pedagógica, só possível de compreender através de uma análise detalhada do que se passou com os diversos intervenientes. Por que razão as coisas correm mais ou menos bem com uns docentes e decorrem em catástrofe com outros? Por que motivo alguns professores sinalizam certos alunos como problemáticos em termos disciplinares e outros não concordam? Pela razão de que os mestres com sucesso ganharam tempo, no início do ano, a construir uma relação de respeito recíproco com os seus alunos.
Em derradeira análise, o episódio da pistola de plástico é mais um exemplo de como este ME se concentrou no acessório: enquanto se discutem grelhas de avaliação tornadas cada vez menos exigentes pela pressão dos protestos, os professores são deixados sozinhos e sem meios perante a indisciplina crescente.
Ficará para a história da educação em Portugal esta oportunidade desperdiçada e este arrastar da degradação até... às próximas eleições.
Daniel Sampaio. "Escola. mais do mesmo". Público (“Pública”): 04.01.2009

domingo, 30 de novembro de 2008

"O Natal que eu quero", por Daniel Sampaio (mais uma opinião sobre professores)

Ninguém me pediu opinião, eu sei. Na escola é costume não ligar muito ao que pensam os alunos. Mas eu gramo a escola, gosto dos meus amigos e há uma data de professores que até são fixes.Ando no 8.º, tenho bué de disciplinas, algumas não dá para entender. Estudo acompanhado para um gajo de 14 anos? Formação Cívica? Não percebo bem, é uma coisa de 90 minutos por semana em que o stôr, que é o director de turma (nós dizemos DT), está sempre a mandar vir, a dizer para nos portarmos bem. Da Matemática não me apetece falar, o stôr tem pouca pachorra para tirar dúvidas. História é um bocado seca e percebo mal o livro, faço confusão porque não contam a vida dos reis como o meu avô me explicava, por isso estudo para os testes e depois esqueço tudo.Não, não pensem que venho aqui criticar a escola, já disse que gosto de lá andar. O problema é que aquilo anda mesmo esquisito, podem crer. Já o ano passado os stôres andavam às turras com a ministra e apareciam nas aulas chateados, um gajo mandava uma boca e levava logo um sermão, às vezes diziam mesmo para nos queixarmos à ministra, como se chibar fosse coisa que desse jeito. Mas este ano está bem pior: falamos com os professores nos intervalos, "olá, stôr!" e eles andam mesmo tristes, a minha stôra de Inglês, que eu curto bué, diz que está "desmotivada" e que está farta de grelhas de avaliação e de pensar em objectivos. Eu de grelhas não percebo nada e, quanto aos objectivos, os meus são divertir-me uma beca e passar o ano, não quero mesmo ficar para trás porque os meus pais dão-me nas orelhas e fico sem os meus amigos, que é uma das coisas porreiras que a escola tem.Por isso peço a todos que se entendam. Ver os professores aos berros na rua é uma coisa que eu compreendo, têm todo o direito porque nós às vezes também andamos, o problema é que assim ainda há menos gente a preocupar-se connosco. Os nossos pais não têm tempo, andam sempre a trabalhar e ficam descansados porque estamos na escola a aprender e a lutar pelo nosso futuro, mas agora a coisa está preta, os nossos stôres estão cansados, o que é mau para nós: quem nos ajuda quando estamos aflitos? Eu sempre contei com um ou dois dos meus stôres, o ano passado quando me achava um monstro (cheio de borbulhas e a sentir que as miúdas não olhavam para mim) foi a stôra de Português que me chamou no fim da aula e conversou comigo, bastou ela ouvir com atenção e dizer que compreendia o que eu sentia para me sentir muito melhor. E quando o Tavares disse que se ia matar porque a rapariga com quem andava foi vista a curtir com um gajo qualquer, foi o nosso DT que falou com ele e lhe arranjou uma consulta no psicólogo.Não percebo nada da guerra dos professores, só sei que deve ser justa porque eles esforçam-se muito, já pensaram no que é aturar a malta, sobretudo alguns que só querem fazer porcaria, põem-se aos berros nas aulas e não obedecem, às vezes até palavrões dizem para os stôres? Muitos de nós querem aprender, mas o barulho é grande e há muita confusão, há lá gajos, repetentes e isso, que só lá estão porque são obrigados, depois há outros que são de fora e não percebem bem português, outros ainda têm problemas em casa e passam mal, a Vanessa que tem um pai alcoólico e que chora quase todos os dias ainda por cima foi empurrada na aula por um colega que só lá está a armar confusão... o DT disse que nós devíamos ser responsáveis e que tínhamos de acabar com isso, mas eu acho que a ministra devia era dar força aos professores para serem melhores, o meu pai diz que ela às vezes está certa mas eu não concordo, se vejo todos, mesmo todos os stôres da minha escola contra ela devem ter razão, os professores às vezes erram mas são importantes para nós, precisamos de estudar para ver se nos livramos do desemprego, isso é que é verdade!Por isso espalhem este mail, façam forward para quem quiserem. Digam aos que mandam para terminarem com as discussões que já estamos fartos e como na minha escola somos todos contra isso dos ovos (uma estupidez), digam à ministra e aos sindicatos que já chega! Façam uma escola melhor, ajudem os professores a resolver todos os problemas das aulas (ninguém pode fazer isso em vez dos stôres) e arranjem maneira de nós aprendermos mais, para ver se percebemos melhor o mundo e nos safamos, o que está a ser difícil.
Quem quiser dê opinião, o meu mail é brunovanderley@gmail.com, sou do 8.º E da Escola Básica 2/3 do Lá Vai Um.
Daniel Sampaio. "O Natal que eu quero". Público (revista "Pública"), 30.Novembro.2008.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Ainda sobre os 500 euros do dia 12 de Setembro

Na "Pública" de ontem, inserida no Público, Daniel Sampaio assinou crónica com o título "500 euros". Eis a parte final.
«(...) Quanto ao prémio de 500 euros (uma quantia conhecida por ser o símbolo da precariedade do trabalho juvenil...), penso o seguinte: concordo que se introduza a questão do mérito, porque a ideia de uma "escola de afectos" - onde escrever com erros ou errar nas contas não tinha importância - não faz sentido, mas é preciso ser prudente quando se trabalha com jovens. Que valores se estão a transmitir? Que significa ser o "melhor" numa escola com várias culturas? As oportunidades para chegar ao topo foram comparáveis? É de pressupor que o estudante dos 500 euros seja um bom aluno, com razoável apoio familiar e casa organizada, e surja integrado numa turma onde a indisciplina não é a regra. O problema é que a escola não é uma empresa, que premeia com finalidade o operário que "produz" mais: é uma organização complexa onde diversas variáveis contribuem (ou não) para o êxito. Por isso, a atribuição de prémios deveria pressupor uma avaliação criteriosa do trajecto do estudante, a cargo do conselho pedagógico, com particular atenção ao esforço realizado, às condições de partida e ao progresso obtido, ao empenhamento do aluno na melhoria da escola e até à sua capacidade de contribuir para um bom relacionamento interpessoal na turma.
Ninguém melhor do que os professores saberá distinguir "o melhor", numa perspectiva de valorização das qualidades pessoais do aluno: para além do "sucesso" numérico, os prémios deveriam assinalar o rigor, a exigência pessoal, o sentido ético no relacionamento, o empenhamento em projectos colectivos, o que se poderia conseguir através do preenchimento, por um júri, de uma série de quesitos conhecidos com antecedência.
Ao distribuir cheques de 500 euros, o Governo premeia o "produto", em vez de incentivar a pessoa. Estimula uma competição onde as regras não são iguais à partida. Gratifica o número do "resultado", sem olhar para o percurso. Em derradeira análise, elogia quem parece cortar a meta em primeiro lugar, sem olhar para os meios de que se serviu o "vencedor", nem para as vicissitudes do percurso dos "vencidos". E chamam a isto "educar"...»

domingo, 27 de abril de 2008

Minudências (24)

Na Educação, um casamento por conveniência
"(...) Na Educação, Ministério e Sindicatos acabaram o divórcio, mas não foram além de um casamento de conveniência. Foi importante serenar os ânimos neste terceiro período, mas impressiona verificar como o essencial ficou por discutir: a verdadeira natureza da avaliação dos professores. É que avaliar pressupõe uma hierarquia, um desnível entre aquele que avalia e o que é avaliado! Em todos os sectores, os avaliadores são os que têm melhor curriculum e mais experiência, ou pelo menos os que ocupam uma posição mais credenciada. Nos professores tudo está inquinado à partida: se o concurso para professor titular cometeu a terrível injustiça de só valorizar os últimos sete anos, deixando de fora muita gente com carreira excepcional, como podem os docentes aceitar serem avaliados inter-pares, por colegas que (em muitos casos) acham que deveriam ter ficado para trás? Portanto, tudo a fingir até final do ano lectivo, tudo por resolver a partir de Setembro. Parece um casamento à antiga..."
Daniel Sampaio. "Casamentos por conveniência". Público (revista "Pública"). 27.Abril.2008

domingo, 13 de abril de 2008

Máximas em mínimas (22)

Quando os pais falam
"(...) Há vozes dos pais boas e más, os leitores que perdoem esta linguagem simplista. São vozes más as que fomentam a intriga (por exemplo, quando os pais recolhem informações nos amigos às escondidas dos filhos), a inveja, a culpa ou a acusação. Quando os pais projectam nos filhos os sentimentos negativos que estão a sentir em relação a outras pessoas e os acusam de coisas que só na aparência dizem respeito aos mais novos. Ou quando os pais, dominados pelos seus próprios sentimentos de insegurança, deitam a sua própria fraqueza para cima dos filhos inquietos. São vozes boas: deves fazer o melhor possível, mas não te inquietes se não fores o melhor; ou põe-te no lugar do outro (a perda deste sentimento do outro é característica de muitas crianças e adolescentes actuais, habituadas a uma gratificação imediata e incapazes de sair da sua posição de autocontemplação). Outra voz boa poderá ser: vais conseguir, se te esforçares com persistência, porque o incentivo ao esforço continuado é um dos êxitos seguros na educação. E também é uma voz boa pensa antes de agir: sobretudo os adolescentes agem muitas vezes sem reflectir, nesta sociedade sensorial que fomenta o constante sentir em vez de pensar. A frase dos nossos avós vê lá até onde podes ir mantém toda a actualidade!"
Daniel Sampaio. "As vozes dos pais". Público ("Pública"), 13.Abr.2008

domingo, 16 de março de 2008

De que se está à espera para haver mediação?

A crónica de Daniel Sampaio que o Público divulga hoje foi escrita no dia que seguiu à manifestação de professores em Lisboa. No dia 9, portanto. Significativamente, intitula-se “E agora?”
Na primeira parte, Sampaio inventaria os erros cometidos pela equipa da Ministra da Educação, responsáveis pela conflitualidade com os professores: «O seu primeiro erro foi procurar demonstrar que os professores trabalhavam pouco, publicando as suas faltas: aí, começou a perder uma eventual base de apoio para a mudança e a sua queda começou a ser anunciada. Depois, as famosas aulas de substituição (de que sou um defensor) foram postas em prática de modo pouco claro, porque foi acentuada a necessidade do preenchimento das horas lectivas, em vez de ter sido enfatizada a sua importância para os alunos. Seguiu-se muita legislação, dificultando a nível central a prometida autonomia das escolas, com destaque para o concurso para professor titular, o estatuto do aluno (já por mim analisado) e a avaliação. A grande contestação iniciou-se com a progressão na carreira, processo que deixou marcas e muitas dúvidas: como pode alguém aceitar que sejam apenas considerados os últimos sete anos, em pessoas com um longo e difícil desempenho profissional? E continuou com a avaliação: quem pode avaliar, se o sistema não se avalia a si próprio? O método proposto contribuirá para o aumento da conflitualidade interpessoal nas escolas (docentes a dar notas a colegas do lado) e não será susceptível de comparação, porque se baseia em critérios de muita subjectividade.»
Depois, vêm as que poderiam ter sido possíveis alternativas de acção – a autonomia das escolas, com resultados medidos; a formação de professores voltada para questões concretas das dificuldades da escola; dotar o sistema de instrumentos de avaliação.
A única solução que Sampaio antevê é a da mediação, questão que, numa edição do “Prós e Contras”, foi aventada por João Lobo Antunes e que, incrivelmente, ainda não teve realização prática, mais parecendo que se quer que tudo se vá desgastando rumo ao caos. Esta mediação (que está a pecar por tardia) é assim corroborada por Daniel Sampaio: «O impasse a que se chegou merece medidas concretas. Compreende-se que a equipa do ME se mantenha, porque o PR, o governo e o representante (?) dos pais a apoia; percebe-se que a contestação não vai parar, porque a crítica foi personalizada e o descontentamento é grande. Que fazer? Como em qualquer conflito grave, é necessária uma mediação, como já foi sugerido. O Conselho Nacional da Educação (CNE), que tem por função propor "medidas destinadas a garantir a adequação permanente do sistema educativo aos interesses dos cidadãos" tem de intervir: os seus 68 conselheiros não podem permanecer num silêncio que se estranha e, como "estrutura de representação ampla", têm de "propor consensos alargados relativamente à política educativa". Um parecer do CNE sobre a avaliação dos professores e uma mediação professores-ME a cargo do seu Presidente (Prof. Júlio Pedrosa) parecem-me essenciais para sair da crise. Se tudo continuar como até aqui, todos dirão que não recuam, mas não haverá reformas na educação, o clima escolar sofrerá progressiva deterioração e os alunos (a quem ninguém pede opinião...) serão os mais prejudicados. Uma mediação bem conduzida mostrará alguns aspectos positivos desta equipa do ME: os cursos profissionais, o Plano Nacional de Leitura, o inglês no primeiro ciclo, a permanência por três anos dos professores nas escolas; e evidenciará a necessidade de outras formas de escuta e participação dos docentes no futuro da educação, afinal aquilo que falhou de forma tão clara.»

segunda-feira, 3 de março de 2008

Daniel Sampaio e o "fim" do Estatuto do Aluno

Na revista "Pública" de ontem (com o jornal Público), Daniel Sampaio entrou, uma vez mais sobre as questões que têm "animado" o conflito patente no sector da educação, escolhendo o "Estatuto do Aluno dos Ensinos Básico e Secundário". Transcrevo o artigo pelo seu interesse. Mas não queria deixar de acrescentar uma nota: é que este "Estatuto", publicado como "alteração à Lei 30/2002", foi também uma das causas da situação que se está a viver, contrariamente ao que muita gente diz, referindo-se apenas à avaliação e ao "Estatuto da Carreira Docente" e acrescentando o corporativismo... Depois, o "Estatuto do Aluno", que foi apresentado pelos responsáveis do Ministério da Educação como o instrumento que iria conferir autoridade aos professores... acabou por ser suspenso. Ironias do destino!
Porque sim - O FIM DO ESTATUTO
O Ministério da Educação (ME) tomou a decisão de suspender a aplicação do Estatuto do Aluno até ao próximo ano lectivo (circular para as escolas em 21/2). Com esta decisão matou uma das suas obras mais recentes, na tentativa de acalmar a contestação crescente em todas as escolas.
Tenho denunciado nestas crónicas a lamentável burocracia a que o ME tem obrigado os professores: a avaliação dos docentes, o decreto sobre as necessidades educativas especiais e as faltas dos estudantes fazem com que se consumam horas de trabalho, que deveriam ser utilizadas a falar com os alunos ou na definição de estratégias pedagógicas. E para quê? Uma única explicação ganha forma: o ME não fala verdade quando defende a autonomia e deixa, a cada dia que passa, a ideia de que tudo quer controlar por via legislativa.
O Estatuto do Aluno é um documento errado no seu conteúdo, impossível de aplicar na prática e potenciador de conflitos entre pais, alunos e professores. Foi suspenso, mas já causou danos. Vejamos porquê.
1) Não faz distinção entre faltas justificadas e injustificadas, ao contrário do que sempre aconteceu. Desta forma, o ME trata da mesma forma o aluno que faltou por doença e aquele a quem não apeteceu comparecer na escola.
2) O aluno terá de realizar uma "prova de recuperação" quando exceder o limite de faltas. Se um aluno esteve internado num hospital, por exemplo, quando vier fazer a "prova" correrá o risco de não ter sucesso, dado que não assistiu às aulas respectivas; se efectivamente abandonou a escola, para que serve a "prova"? Por que razão se altera a prática de ser o Conselho de Turma a decidir, tendo em conta todas as circunstâncias?
3) Para a realização da "prova de recuperação", o Director de Turma (DT) terá de avisar com urgência o professor respectivo, para que este elabore a tal "prova"; depois, deverá dar conhecimento ao Encarregado de Educação. Com 16 disciplinas no 8º ano (por ex.) e a diversidade de horários existente, agora com a obrigatoriedade urgente do controlo das faltas, depressa se compreende como as importantes funções do DT ficam prejudicadas, pois não lhe sobrará tempo para falar com os alunos ou os pais em questões decisivas, como o aproveitamento e os problemas pessoais dos mais novos. Este ME acaba de reduzir o DT a um burocrata!
4) Sabendo toda a gente como existem tantos alunos a faltar (sobretudo em zonas problemáticas), não se percebe a viabilidade de realização de tantas provas de recuperação, pois como poderia ser encontrado um horário compatível para docentes e discentes? Por que razão não se utiliza apenas bom senso, solicitando ao professor um trabalho adicional, a combinar entre si e o aluno faltoso, como é habitual em tantos estabelecimentos de ensino? O que o ME propõe com tanta "prova" leva ao que várias escolas me têm confidenciado: a única solução será uma época "especial" de avaliação para as ditas "provas"!
5) No que diz respeito a "medidas disciplinares sancionatórias", o ponto 4 do Art. 27º diz ser preciso ouvir os alunos em "autos". Para além da desagradável expressão (a lembrar os arguidos dos tribunais), a medida tem levado a grande consumo de horas em escolas problemáticas, em vez de se ter reforçado a actuação imediata do professor ou da Direcção Executiva.
6) Lendo com atenção o Estatuto, deduz-se que a sua preocupação se prende com a redução estatística do abandono escolar, ignorando todas as outras vertentes do problema, já que o texto do ME é omisso em medidas que visem as melhorias das aprendizagens.
7) O diploma em causa foi suspenso um mês depois da sua entrada em vigor. Não houve cuidado em pensar nos Regulamentos Internos das escolas, dados a conhecer aos alunos e aos pais no início do ano lectivo. Uma lei que implica tantas alterações ao normal funcionamento das escolas e às suas normas (em muitas escolas resultantes de acordos com as famílias) nunca deveria ter saído a meio do ano lectivo. Mais: se por um lado se saúda a sua suspensão, por outro há que lamentar todo o tempo que este Estatuto já fez perder aos professores, tantas as horas que já foram gastas na tentativa da sua aplicação. Por isso afirmo: o Estatuto tem de estar morto, nunca apenas suspenso.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

Um "e-mail" de um professor, a crónica de Daniel Sampaio e uma varanda para Sebastião da Gama

Sob o título "Vidros Foscos", Daniel Sampaio escreveu hoje a seguinte crónica no Público (revista Pública):

"E-mail" de um professor do Secundário "(...) sou professor de Matemática do Secundário há quase vinte anos e sinto que, cada vez mais, na minha tarefa de ensinar (continuo a chamar-lhe assim) enfrento obstáculos difíceis de transpor. Um desses obstáculos consiste na dificuldade de concentração que muitos alunos revelam durante as aulas (...). Vem isto a propósito de terem sido recentemente colocados vidros foscos nas janelas de algumas salas de aula da minha escola. Eu confesso que me senti horrorizado quando entrei numa dessas salas para dar a primeira aula do dia (um belo dia de sol) e me deparei com uns vidros que me pareciam completamente embaciados. O comentário recorrente dos meus alunos é: "Parece que estamos numa prisão." Procurei saber as razões junto do Conselho Executivo e foi-me dito que isso foi feito em resposta às preocupações apresentadas por alguns meus colegas pelo facto de muitos alunos se distraírem a olhar para o exterior (...) Vidros foscos na sala de aula? Qual será o próximo passo, impedir que as janelas se abram, mesmo nos dias quentes, para manter o efeito vidro fosco? Gostava muito de saber a sua opinião..."
Pois aqui estou a dá-la, caro professor. Começo por dizer que o seu "mail" me fez recuar cerca de 35 anos. Voltei ao Liceu Pedro Nunes e, bem ao longe, ouvi a voz da minha notável professora de Inglês, Maria do Céu Saraiva Jorge, a entrar na sala de aula: "Open all the windows! Put the blinds up! What a beautiful day, today"; ou senti o murmúrio da minha professora de Filosofia, Maria Luísa Guerra, a segredar-nos: "Olhem lá para fora, tentem compreender o mundo, não fiquem agarrados a esse velho compêndio de Filosofia..."
Sei que a escola de hoje é bem diferente. Na altura, éramos uns privilegiados, pois muitos ficavam pela quarta classe. Os que permaneciam não faziam grandes contas à vida, nem pensavam em agredir os professores. Havia indisciplina, claro, mas não existia a intenção de magoar quem nos dava aulas. Os pais e os docentes tinham autoridade, às vezes à custa da força. O professor do Secundário tinha prestígio cultural e era uma figura de referência na comunidade. Hoje é tudo tão diferente que nem se deve comparar: a escola é para todos, as turmas são heterogéneas e podem ter meninos com fome e maus tratos, o professor deixou de ser a única fonte de conhecimento, os pais estão inseguros na sua forma de educar. A indisciplina é tão grande que muitas aulas não são dadas, ou são ministradas a medo, sem cumprir objectivos mínimos. A escola transformou-se, para os professores, numa arena de burocracia sem sentido, onde quase ninguém se sente bem.
O futuro, contudo, nunca poderá estar nos "vidros foscos". Pensar que isolamento do exterior poderá conduzir a melhor concentração é errado. Os alunos sempre terão piores resultados nas disciplinas dos professores de quem não gostam, ou que sentem que não gostam deles. Educar é a pessoa dar-se como modelo, ser educado é a pessoa crescer e evoluir de maneira a constituir-se ela mesma como modelo. Por isso, o aluno cresce emocionalmente se conseguir ver naquele professor alguém que quer imitar, uma pessoa com quem faz sentido ser parecido "quando for grande": quanto mais o jovem for imaturo ou instável, mais crucial será este trabalho de identificação aluno-mestre. Esta relação entre duas pessoas é a base do êxito na sala de aula e pode ser conseguida através da confiança e do respeito mútuo, partindo da diversidade que caracteriza a escola de hoje.
Mais do que "forçar" a atenção dos alunos, impedindo o simples olhar para o pátio da escola por meio de um vidro fosco, a turma tem de ser transformada num grupo de trabalho que coopera, onde os alunos mais "atentos" serão os aliados do professor. Se todos estiverem a trabalhar na sala de aula (leia-se a pesquisar, a resolver questões em conjunto, a tentar compreender o mundo), haverá menos gente a olhar lá para fora, porque a verdadeira vida estará ali à frente.
Em derradeira análise, os vidros foscos são a metáfora do nosso actual sistema de ensino: querem que olhemos só para o que nos mostram de bom, tudo fazem para nos tapar a vista do que continua (tristemente) na mesma.
Acabei de ler o texto de Daniel Sampaio com um misto de riso e de prazer. Por muitas razões, de que destaco uma: os anos andam e a essência da vida - e da educação - continua a mesma. Quem, aliás, foi buscar o passado foi o próprio autor da crónica, ao relembrar-se de atitudes de professores que lhe ensinaram a olhar o mundo a (re)parar no mundo. De imediato, associei esta resposta de Sampaio a um texto do Diário de Sebastião da Gama, datado de 17 de Janeiro de 1949, quando estava em estágio na Escola Veiga Beirão, que relembro:
Verdade seja dita: não tenho muitas queixas a fazer do Destino. E aqui no estágio, além do mais, encontrei uma varanda linda. Linda porque Lisboa é linda e vê-se metade dela da varanda da sala 19. Uma vez subi a um quarto andar onde mora um tipógrafo; ia com ganas de lhe comer os fígados, porque me andava a enganar desde que o livro entrara na oficina. Pois recebeu-me, lá no alto, um sol magnífico a cair sobre Lisboa: isto tudo visto por uma pequena janela. Adeus, fúrias, adeus, palavras como punhais! Basta uma janela para me fazer feliz e foi o que me aconteceu, também, quando cheguei à sala 19. Era o Castelo, era o Tejo, era a cidade de mármore e granito (como dizem) a espreitar para dentro da aula. Vai, que fiz eu? Como queria tomar o pulso aos rapazes em matéria de escrita, propus-lhes aquele tema: 'Da varanda da nosss aula' podia muito bem ser o título da redacção; mas também podia ser outro, à escolha do freguês. O que eles escrevessem servia para eu ver como escreviam, como viam e como imaginavam. À maneira de preparação disse-lhes: 'Suponham que aqui está uma chávena da China. Vocês têm de escrever a partir dela e podem fazê-lo contando que ela tem este ou qauele feitio, esta ou aquela cor, um desenho que representa isto ou aquilo e tem a asa do lado esquerdo. Mas também não dizer a nenhuma destas coisas e imaginar, com os olhos nela, uma coisa passada na China: chinesinhos de rabicho, arroz comido com pauzinhos, sei lá o quê! Ou fantasiar um chá das cinco em que serviu aquela chávena; quem estava nesse chá, o que se disse, o que se passou durante essa hora. Posto o que, vão à janela um bocadinho, olhem, voltem, sentem-se e escrevam o que quiserem, com o título ou subtítulo 'Da varanda da nossa aula'.
Os rapazes, feito o honesto barulho de correrem à varanda, atiraram-se à obra. Eu fui pacatamente olhar Lisboa, porque começo a fazer-lhes sentir que eles não devem copiar.
E se a varanda estivesse envidraçada com vidros foscos?

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Quatro leituras no fim-de-semana

1. António José Seguro, “Deveres dos partidos políticos” (Expresso, 05.Jan.2008): “Os partidos políticos portugueses não escapam a esta tendência de desconfiança generalizada por parte dos eleitores e razões, lamentavelmente, não faltam (corrupção, promessas não cumpridas, qualidade do pessoal político…). Mas talvez a causa estrutural que mais tem contribuído para a gestação desse ambiente de desconfiança resida na tendência dos partidos para (…) concentrarem a sua actividade, prioritariamente, nas suas funções institucionais. (…) [Os partidos] frequentemente são acusados de não se preocuparem com os problemas das pessoas, apenas tratarem de si e dos seus e por terem como único objectivo alcançar o poder. Frequentemente, os partidos políticos surgem, junto dos portugueses, mais como representantes do Estado do que como representantes dos portugueses junto do Estado. (...)”
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2. António Barreto, “Sócrates e a liberdade” (Público, 06.Jan.2008): “(…) O que [Sócrates] não suporta é a independência dos outros, das pessoas, das organizações, das empresas ou das instituições. Não tolera ser contrariado, nem admite que se pense de modo diferente daquele que organizou com as suas poderosas agências de intoxicação a que chama de comunicação. No seu ideal de vida, todos seriam submetidos ao Regime Disciplinar da Função Pública, revisto e reforçado pelo seu Governo. O primeiro-ministro José Sócrates é a mais séria ameaça contra a liberdade, contra a autonomia das iniciativas privadas e contra a independência pessoal que Portugal conheceu nas últimas três décadas. Temos de reconhecer: tão inquietante quanto esta tendência insaciável para o despotismo e a concentração de poder é a falta de reacção dos cidadãos. A passividade de tanta gente. Será anestesia? Resignação? Acordo? Só se for medo…”
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3. Inês de Barros Baptista, “Mal educados” (Pública, 06.Jan.2008): “Patrícia Bandeira - Educa-se com base nas aparências, as pessoas preocupam-se mais com o ter do que com o ser, o que torna tudo uma grande mentira. Mas a verdade é que vivemos no meio destes constrangimentos, vivemos num mundo em que o apelo ao consumo é enorme, os nossos filhos vivem rodeados de estímulos, nem sempre é fácil encontrar um meio termo.
Paulo Oom- Por isso é que eu digo que é mais difícil educar hoje. Por causa de todos esses constrangimentos. Além disso, o tipo de relação que muitos pais tentam hoje em dia - a de serem os maiores amigos dos filhos, colocando-se ao mesmo nível do que eles destrói um dos pilares da educação, que é o da autoridade. Pais e filhos não estão no mesmo plano! Não é suposto serem os maiores amigos, isso destabiliza completamente o sistema.”
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4. Daniel Sampaio, “Votos para 2008” (Pública, 06.Jan.2008): “Gostaria de um período com mais atenção às pessoas. (…) Na educação: desejo que a crucial avaliação do desempenho dos professores não se transforme apenas numa infindável tarefa burocrática, com preenchimento interminável de fichas, tempo precioso para os professores falarem entre si, com os alunos ou com os pais. E anseio para que a Internet chegue mesmo à sala de aula e os alunos possam ser incentivados a ter voz activa, sem que a indisciplina impeça a aprendizagem ou a possibilidade de todos se poderem ouvir. E ambiciono, já para 2008, uma cultura de maior exigência nas nossas escolas, a começar pelo primeiro ciclo, onde se pode chegar ao 4º ano sem saber ler e escrever com correcção: anos e anos de facilidades conduziram a uma iletracia preocupante, que tem como consequência a não compreensão de muitas disciplinas ao longo do plano de estudos ( e bom seria que se pensasse, com brevidade, na condensação do número inconcebível de 16 áreas curriculares no 8º ano, só para dar um exemplo urgente). O problema é que, sem alteração do mau relacionamento entre os professores e o Ministério da Educação será difícil a mudança... (...)”

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

4 dicas + 1 para o professor ideal

No Público de ontem, houve reportagem sobre os professores recentemente premiados pelo Ministério da Educação, momento interessante porquanto a educação foi encarada positivamente, relatando coisas interessantes que estes - como muitos outros - professores fazem. A completar o ramalhete das prosas, inteiramente justificadas (quer pelo evento, quer pela necessidade de a auto-estima da escola portuguesa e dos professores carecer de um retrato diferente daquele que, cheio de cargas negativas, tem sido trnsmitido), um texto intitulado "Como ser o professor ideal", assinado pela jornalista Isabel Leiria, recolhe pistas que são tentativas de definição do ideal nesta profissão docente. Ei-las, com a respectiva autoria:
- Isabel Rocha, Escola Superior de Educação de Leiria: "Um professor não se pode acomodar. Tem de investir no seu conhecimento e sentir sempre alguma insatisfação com o seu trabalho. No final do dia, não basta pensar se deu toda a matéria. É preciso ver o que os alunos aprenderam."
- Lucília Salgado, Escola Superior de Educação de Coimbra: "Um bom professor é aquele que em todas as situações, das mais adversas às mais facilitadas, consegue envolver-se na aprendizagem dos alunos." O problema, diz, é que há toda uma "pedagogia burocrática" que dificulta o que deveria ser uma tarefa basilar. "O professor tem de dar o programa, ninguém lhe diz que tem de ensinar. Há muitos que chegam à escola, sumariam as matérias, cumprem as regras e não se envolvem na aprendizagem. Se há estudantes que têm problemas, continua-se a dar o programa na mesma, como se estivessem todos no mesmo nível. Há um discurso instalado que diz que se os alunos não aprendem é porque a culpa vem de trás. O bom professor é aquele que contraria isto, muitas vezes à revelia dos colegas e da administração da escola."
- Daniel Sampaio, presidente do júri do Prémio Nacional de Professores: ao professor de hoje exige-se mais do que "instruir". "Tem de servir de exemplo, fomentar o reconhecimento do outro, lutar contra a discriminação, ajudar a compreender o mundo. Tem de trabalhar com alunos e em equipa com outros professores."
- Joaquim Azevedo, Universidade Católica do Porto: "A sociedade e os governantes não podem desautorizá-los [aos professores] todos os dias e tomar os que não cumprem como a norma da profissão. Quatro professores receberam um prémio especial." Falta, diz, "apoiar muito mais e melhor" quem faz bem e penalizar "quem não se dedica e brinca com a profissão".
Acrescento mais uma, de Sebastião da Gama, registada no seu Diário, em 12 de Janeiro de 1949, no seu segundo dia de estágio, citando uma conversa tida com os alunos: "Não sou, junto de vós, mais do que um camarada um bocadinho mais velho. Sei coisas que vocês não sabem, do mesmo modo que vocês sabem coisas que eu não sei ou já me esqueci. Estou aqui para ensinar umas e aprender outras. Ensinar, não: falar delas. Aqui e no pátio e na rua e no vapor e no comboio e no jardim e onde quer que nos encontremos."

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Prémio Nacional de Professores - "um novo relacionamento"?

Da entrega do Prémio Nacional de Professores, ocorrido na terça-feira, não vi nem ouvi mais do que aquilo que os media passaram. Fiquei curioso e quis procurar os discursos da sessão. Consegui o da Ministra da Educação no “Portal do Governo” e uma coisa foi dita com acerto: quando a memória colectiva refere nomes de alguns professores que se tornaram conhecidos, há sempre a condicionante de esses nomes terem sido primeiramente conhecidos por outra acção que não a professoral, citando a Ministra os casos de Vergílio Ferreira, Lídia Jorge e Rómulo de Carvalho, entre outros. Bem podia ter citado o de Sebastião da Gama também, porque começou por ser conhecido como poeta, mas ficou também conhecido pelo facto de ter sido professor, haja em vista a experiência relatada no seu Diário e alguns (poucos) estudos que ao seu percurso de pedagogo se têm dedicado. Finalizou o discurso da Ministra com a apresentação de Daniel Sampaio, dizendo que iria ser uma intervenção sobre “as funções do professor na escola de hoje”. Procurei o discurso de Daniel Sampaio, mas não o consegui encontrar. Limito-me, por isso, àquilo que ouvi nos media e que li nos jornais (incluindo algumas versões on line).
Parece que foi logo no início da sua intervenção que o conhecido médico, que presidiu ao júri deste prémio, disse: "Gostaria que a atribuição deste Prémio marcasse um novo relacionamento entre o Governo e os professores". Estava então dado o mote para o “professor na escola de hoje”. O discurso terá sido crítico, a avaliar pelos excertos que passaram para o grande público. Um outro aspecto apresentado por Sampaio relacionou-se com a autonomia das escolas, perguntando: “Se o Ministério quer autonomia, então por que razão legisla tanto?” E, como consequência: “Os professores perdem tempo de mais a estudar despachos e portarias, o que seria mais bem gasto se fosse a pensar a sua actividade."
Ora acontece que estas duas linhas – a da excessiva legislação, não deixando à escola espaço nem tempo para se pensar e para se afirmar, e a da burocratização da profissão do professor, cada vez mais metido nos corredores dos papéis, dos impressos e das grelhas – são questões que já há muito têm encontrado eco nas críticas dos professores e das escolas. Apenas as estruturas não têm dado valor a estas observações. Mas, pelos vistos, também não pretendem passar a dar, a avaliar pelas reacções dos governantes – o único que comentou foi o Secretário de Estado Valter Lemos, dizendo: "Ficou claro que o professor Daniel Sampaio se referia a um mal-estar do ponto de vista geral e não a um mal-estar destes ou daqueles docentes. É um mal-estar docente internacional que também existe em Portugal." Não percebo onde está esta clareza, a acreditar no que a imprensa noticiou. Será que o voto de um “novo relacionamento entre o Governo e os professores” (como alvitrou Sampaio) encontra raízes num “mal-estar docente internacional que também existe em Portugal” (como quis sustentar o Secretário de Estado)? Chego a ter dúvidas sobre a relação do comentário com o discurso comentado… Na verdade, a margem que fica para os agentes da educação reflectirem sobre as suas práticas e para as melhorarem ou corrigirem é tendencialmente nula, fenómeno talvez (mal) explicado pela sereia da globalização ou por outro qualquer mito destes com que nos confrontamos nos tempos que correm.