A entrevista que Carlos Vaz Marques fez a Hélia Correia e que o número deste mês da revista Ler (Lisboa: Fundação Círculo de Leitores, nº 112, Abril 2012) publica é peça a considerar.
No próprio e excelente estilo de Vaz Marques, o pretexto da conversa é a publicação recente do poema A terceira miséria (Relógio d’Água) de Hélia Correia, perpassando pelas suas oito páginas o retrato da entrevistada, uma tela cheia de originalidade, iniciada com os ensinamentos recebidos dos gatos e da Grécia e finalizada com uma confissão resultante de um tratamento que acabou por rejeitar porque… “estive quase a ser normal, imagine.”
Fala-se da Grécia e da cultura grega, da poesia, do “mundo” literário, da escrita, da leitura, da vida. Uma entrevista a alguém que faz o seu mundo e que faz o mundo seu. Peça a ler.
E, sobre o presente, uma (longa) citação a reter, quando todos andamos preocupados com os valores em que nos movimentamos: “Não há nada que escape ao escândalo que o ser humano criou para os dias de hoje. As pessoas falam muito de valores mas eu não gosto muito de falar de valores porque isso implica um sistema moral que se considera mais perfeito do que o dos outros. Não falo, por isso, da falta de valores, hoje. Até porque há grandes valores, por exemplo entre os jovens. Há o valor maravilhoso da amizade, que está muito implantado. Se eles não têm outras virtudes é também porque não podem, porque estão lançados na arena dos gladiadores e têm de lutar até à morte para não serem mortos. Aí, não pode haver virtude nenhuma. Também não gosto nada da palavra ‘virtude’, que é romana e própria dos homens: é a qualidade do homem. Como é que se pode tipificar este escândalo? É o completo voltar de costas à vida e ao louvor da vida. Sendo que para mim a vida é a natureza e todos os seres que ela contém.”
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