sábado, 30 de agosto de 2008

Agora, que o ano escolar está para começar...

Com data de 28 de Agosto, D. Manuel Clemente, bispo do Porto, publicou o texto “Um ano para educar, uma escola a redescobrir”, que é oportuno, não só pelo calendário em que surge, mas também pelas ideias que expõe, sobretudo depois do que foi a agitação do ano lectivo anterior. Apresento alguns excertos, mas o texto pode ser lido na íntegra aqui.
«(…) Educação significava acção formal e formativa, escola era instituição adequada a tal, família e docentes iam no mesmo sentido, sobre valores comuns e desejados. Actualmente, família e docência parecem menos consistentes, escola e educação são (in)definições mais trabalhosas. Estas questões têm um âmbito bem mais largo, que é precisamente o da sociedade e da cultura. - Concretamente quanto à escola e à educação, em especial as públicas, o que é que queremos todos para transmitir a todos, mesmo que só essencialmente falando? Creio que nenhum de nós saberá responder sem hesitar a esta questão, aliás a mais básica e directa… Chegámos portanto a uma aporia ou hesitação irremediável. E, quando isto acontece, qual beco sem saída, só nos resta uma solução, caso não queiramos desistir: voltar atrás e procurar outro caminho.
(…) Só nos restará então voltar à rotunda e sair por outra via. Assim estaremos, parece, sem perder nada dum passado que só no fim se mostrou insuficiente, dando-nos, precisamente nisso, o melhor contributo para o futuro. Mesmo para o futuro da educação em Portugal.
(...) É sabido como a figura do professor, sobretudo na viragem do século XIX para o XX, era tida como determinante para a formação de novas gerações laboriosas e progressivas. Quase substituía o sacerdócio antigo da divindade pelo “sacerdócio” novo da humanidade e do futuro. Depois, em termos menos românticos mas ainda iluministas, “abria” inteligências e adestrava engenhos, em saberes mais clássicos ou mais tecnológicos. O mundo estava aí como campo largo e a história projectava-se como caminho certo. O problema, magno problema, surgiu com a desilusão de guerras e pós-guerras, as suspeitas generalizadas sobre os reais intuitos de grandes e pequenos, as retracções consumistas dos antigos ideais e a dificuldade em mantê-los como horizonte, tudo isto junto e a fragilizar a figura e a convicção do professor remanescente. Numa escola que transmitia o saber adquirido, era deste lado que normalmente se situava o professor, como seu expositor e guardião. Numa escola onde se repercutam mais as dúvidas teóricas, ainda que metódicas, e as incertezas, ainda que de operação e ensaio, a natureza docente mudará também. Aliás, a sociedade actual manifesta uma relação ambígua com a escola. Compreende-se e advoga-se o seu papel de transmissão e inovação no campo dos saberes teóricos e práticos. Mas não se lhe dá o lugar central que pretenderia ter nesse sentido, quer porque a escola perdeu a reverencial proeminência anterior, quer porque a transmissão dos conhecimentos a extravasa, numa rede muito mais larga e omnipresente, informática sobretudo. Por tudo isto e além do mais, procura-se um outro enquadramento escola-sociedade e estamos longe da nova plataforma a alcançar. Entretanto, a transformação do sistema educativo traz ao professor custos e riscos. Tão inevitáveis como promissores, acrescente-se.
(…) É como sociedade aberta e dinâmica, do passado para o futuro, que nos devemos redefinir. Então também nos reencontraremos na escola, e muito especialmente aí. Longe de se desactualizar, ela obterá a máxima pertinência, mas como local onde de algum modo estejamos todos. Todos, porque a formação será obra da vida inteira, do pré-escolar ao “sénior”, aprendendo-se sempre, segundo a respectiva idade. Todos, porque em cada patamar de ensino se conjugarão as diversas instâncias da sociabilidade e da cultura: professores e alunos, auxiliares e famílias, instituições e ambientes, o meio próximo e o mais alargado. Que a escola e os que a fazem não se sintam postergados, mas valorizados pelo seu lugar central no conhecimento.
(…) De iniciativa pública ou particular, a escola não pode restringir arbitrariamente a proposta cultural, também no que à religião respeita. E insistindo sempre no carácter pessoal e personalista do processo educativo. Para os professores, seja qual for a matéria, trata-se de partilhar o saber que activamente “professam”. Há muito que sabemos como eles são tão importantes como o ensino que ministram, exactamente pela intensidade existencial com que o façam. Com tais professores, os alunos são mais facilmente envolvidos num processo geral de conhecimento em que já começam a ser protagonistas. Para realizar o bem comum, cabe ao Estado viabilizar uma escola assim, de iniciativa pública ou particular, distribuindo recursos e motivando sempre: segundo a vontade de todos e em benefício da coexistência e partilha de ideários e métodos legítimos. Legítimos pelo critério humanista (em prol da dignidade de cada pessoa humana), legítimos pela bondade realmente demonstrada (activando a solidariedade), legítimos pela real capacidade criativa (da ciência ao espírito). (…)
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1 comentário:

Anónimo disse...

«Que a escola e os que a fazem não se sintam postergados, mas valorizados pelo seu lugar central no conhecimento».
Amen!
MCT