terça-feira, 30 de junho de 2009

Os valores dos Portugueses

«(…) O inquérito Dez anos de Valores em Portugal, hoje apresentado no seminário A urgência de educar para os valores, na Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa, (…) “permite perceber o que é que mobiliza as pessoas e a partir daqui desenvolver um quadro de competências para a educação", explica Lourenço Xavier de Carvalho, investigador responsável pela análise dos dados.
Em 1999, o inquérito da Universidade Católica Portuguesa foi feito a 2975 pessoas, presencialmente; dez anos depois foi realizado por telefone e responderam 937 pessoas, dos 15 aos 65 ou mais anos de idade. Mais de metade dos inquiridos são do sexo feminino (57 por cento). O número de licenciados aumentou de dez para 26 por cento, ao passo que os com menos de quatro anos de escolaridade caíram de 13 para seis por cento.Se fosse há dez anos, para oito em cada dez pessoas fazia sentido morrer para salvar a vida de alguém. Hoje, apenas 46 por cento respondem que morreriam nessas circunstâncias. (…)»
Público: 30.Junho.2009.
(para ler o quadro, clicar sobre imagem)

domingo, 28 de junho de 2009

Olhar a adolescência

Daniel Sampaio. "Os jovens e os valores". Público ("Pública"): 28.Junho.2009.
(para ler, clicar sobre a imagem)

sábado, 27 de junho de 2009

Sobre exames, que se está no tempo deles

Diário da Auto-Estima – 102
Exames I – Os exames nacionais dos Ensinos Básico e Secundário têm causado pouco impacto nos media, ainda que algumas opiniões tenham já saltado para a ribalta a falar da facilidade e do futuro enriquecimento dos dígitos positivos na estatística. O costume. Os resultados o dirão e, como é óbvio, servirão para cimentar opiniões, ainda que diversas. O resultado de um exame vale o que está estabelecido e é também fruto de condicionantes momentâneas. É sempre a consequência de um princípio social e politicamente aceite. Deve ser ponderada a interpretação do que ele significa quanto ao valor do trabalho de um ciclo ou de um ano de estudos. Nos exames, o momento ou a estrutura da prova também contam para quem tem que a resolver. E estes aspectos também têm o seu quê de convencional. Depois, virão os “rankings”, uma amostragem ou uma seriação que vale o que vale porque existem muitas condicionantes escondidas para que os resultados sejam aqueles, a começar pelos melhores… E choverão as pressões quanto às opções, deslizar-se-á sobre o porquê de serem estas escolas e não outras no princípio ou no fim… como se tudo fosse um jogo de sorte ou de azar apenas… E tudo acalmará logo que a época passe!
Exames II – Leccionei Língua Portuguesa de 9º ano. Sei como os meus alunos foram para o exame. Todos partilharam a noção de que os enunciados de exame eram mais fáceis do que os testes havidos ao longo do ano lectivo. Isto podia causar-lhes ilusões, que tentei desfazer. O exame de Língua Portuguesa de 9º ano respeitava o programa, mas aparecer uma pergunta pedindo para assinalar, de uma lista de 10 palavras, as 5 graves é, do meu ponto de vista, descer a fasquia e pôr perguntas ao nível das provas de aferição de 4º ano. Por outro lado, não haver sequer uma alínea que testasse as funções sintácticas ou os recursos expressivos é falta que me parece exagerada. Tudo isto pode parecer pormenor, eu sei. Mas não é, porque, mesmo num exame, deve haver reflexão sobre a língua e sobre a matéria leccionada. E os alunos de 9º ano já têm condições para fazer isso! Consequência: “Ó professor, o exame foi fácil, bué de fácil!” Não sei porquê, mas fica-me sempre a dúvida de tal facilidade. “Vamos ver! Oxalá as notas sejam boas, claro!”, respondo. Vamos ver, pois!
OBS: Esta crónica deveria ter saído no Correio de Setúbal de hoje.
Por razões de calendário e de prazos de entrega, não saiu.

Hoje

Dois anos passam sobre este blogue.
Espero que tenham sido com utilidade
para quem por aqui costuma parar...

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Escola e partidos políticos: um bom desafio, na verdade! Sigam-no, por favor!

«1.A saga da maior manifestação de sempre que fora precedida dessa história interminável sobre a reforma do ensino foi interrompida por breves momentos por causa dos exames - eis o resumo do ano lectivo que agora finda. Chegados a Junho, finalmente falou-se de alunos, não porque tenham batido em professores ou sido espancados por colegas. E desta vez falou-se também de conteúdos e de testes sem nos estarmos a referir ao programa da Educação Sexual e aos testes à sida que o IPJ pretende efectuar nas escolas, com um voluntarismo que faz falta nas matemáticas.
O caso é tão raro que merece ser assinalado. E é assombroso o que se conclui desta espécie de movimento de rotação a que os exames obrigam as escolas. Por exemplo, na prova do 12.º Ano de Literatura Portuguesa existe um pequeno glossário que dá aos alunos significados para palavras que constam no texto. E, assim, para alunos de Literatura Portuguesa, com 17 ou mais anos, dão os seguintes significados: acabrunhado: desolado; calabouço: cela ou compartimento prisional num posto de polícia; logro: engano; se espojava: se rebolava no chão. Isto, que está ao nível do 4.º ano de escolaridade, infelizmente está longe de ser uma excepção.
Nestes exames, alguém anda a fazer batota e desta vez não são os alunos. O que se está a ensinar? É suposto que se exija cada vez menos? Para que serve o GAVE, o gabinete do Ministério da Educação que tem a seu cargo a realização destas provas?
O Ministério da Educação é uma gigantesca máquina de colocar e administrar pessoal. Os conteú-dos e as técnicas de ensino estão absolutamente relegados da discussão e daquilo em que se ocupam. Mas, tal como a Terra se movia, apesar de alguns serem obrigados a afirmar o contrário, também a escola existe para lá das lutas entre os funcionários da 5 de Outubro e os das escolas.
Parafraseando o glossário da prova, o que se avista é mais ou menos um logro. É urgente que, na próxima campanha eleitoral, os partidos deixem de fazer declarações de amor à escola e definam muito claramente o que pensam sobre os conteúdos, a credibilidade do sistema de avaliação dos alunos, se estão ou não dispostos a ponderar o cheque-ensino e claro que também o estatuto dos professores. Mas outro ano com os alunos a servirem de quorum para a conflitualidade entre o Ministério da Educação e os seus funcionários é que não.»
Helena Matos. "Palavras difíceis". Público: 25.Junho.2009 (destaques meus)

segunda-feira, 22 de junho de 2009

domingo, 21 de junho de 2009

Rostos (120)

Monumento à Liberdade, por Camarro (2003), em Pinhal Novo

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Que conversão à humildade!

O discurso da e sobre a humildade de José Sócrates é algo que corre o risco de se fazer equivaler a teatro. Imagine-se a distância que vai entre o “animal feroz” de há uns anos e a desadjectivada “humildade” de agora! No fundo, o que parece é que se está perante uma questão de “papéis”, sendo cada um assumido conforme as circunstâncias. Pode ser arranque de campanha, pode! Pode ser vertigem por causa dos resultados (havidos ou a haver), pode! Mas o que é mesmo é o atirar à cara dos portugueses a possibilidade de jogar com os sentimentos em função das conveniências eleitorais. Não, isto não pode ser verdade; se calhar, nunca foi verdade! Qualquer dia, teremos a regulamentação da “humildade” com força de lei ou de decreto, sem que a Humanidade fique melhor. E seria bem pouco interessante ver todo um coro de “humildes” convertidos (alguns políticos, alguns governantes, alguns opinadores e outros alguns, por certo) em construção de três meses para ganhar as eleições que se seguem. Já não faltaria tudo para a tragédia!... Mas seria um péssimo serviço para a memória acreditar-se em tudo isto como se fosse a maior das verdades! Há palavras que são superiores à habilidade que com elas possa ser feita!

Bocage: uma história para jovens leitores

A colecção “Chamo-me…” (Lisboa: Didáctica Editora), destinada a leitores a partir dos 9 anos, apresenta biografias de personalidades célebres, contadas na primeira pessoa. Recentemente, surgiu o título Bocage, com texto de J. M. Castro Pinto e ilustrações de Jorge Miguel.
A vantagem deste livrinho (para o seu público) é a de contextualizar o tempo de Bocage, assim sendo contada outra história para lá da que relata a vida da personagem. No entanto, sendo Bocage de Setúbal, onde viveu a infância e parte da adolescência, natural seria que houvesse alguma contextualização alusiva ao sítio, o que não acontece. O que é caracterizado é o ambiente de Lisboa, restando para a pátria sadina do poeta uma escassa e lacónica apresentação que informa ter sido Setúbal “um próspero porto de pesca e também importante pela exportação de sal e fruta que produzia”. Por outro lado, para caracterizar o ambiente do tempo, também poderia haver uma alusão a Luísa Todi, figura sadina da época, adolescente à data em que Bocage nasceu. E, já agora, na referência à Nova Arcádia, tertúlia frequentada pelo poeta, sendo feita referência a vários dos seus componentes, também teria sido útil que fosse mencionado o nome de Tomás António Santos Silva, árcade (com o pseudónimo de Tomino Sadino) e amigo de Bocage, setubalense como ele.
O percurso biográfico de Bocage é escasso neste livro, sendo possível um pouco mais de informação (mesmo tendo em conta o público a que se destina) e sendo imperioso que o capítulo “Ditos e anedotas” não tivesse sido integrado na biografia como se as anedotas contadas tivessem real fundamento… apesar de, na última página, constar a informação de que “é preciso ter cuidado (…) porque atribuíram-se a Bocage muitas anedotas ou poemas de mau gosto”.

Máximas em mínimas (47) - Sobre a humildade

“Tendo deixado de ver as estrelas, os homens perderam a humildade, e com a humildade perderam a razão.”
José Eduardo Agualusa. “Dos perigos do riso”. Fronteiras perdidas (1999).

Humildade: mais uma moda para o dicionário do politiquês

«Sem tempo para mudar de políticas, o primeiro-ministro quer ser em quatro meses o contrário do que foi em quatro anos.
As eleições europeias, com o resultado que tiveram, ocorreram num calendário ingrato para o Governo. Os escassos quatro meses que as separam das legislativas tornam ineficazes as fórmulas clássicas utilizadas pelos governos quando recebem um cartão amarelo do eleitorado: a remodelação do governo e a desistência ou alteração radical das políticas mais impopulares - como aconteceu na Saúde, por exemplo.
Sem estas opções disponíveis, resta a José Sócrates a tentativa da mudança daquilo que é mais difícil: o seu estilo.
Ontem, no debate parlamentar de uma moção de censura sem história, Sócrates apontou a manutenção do rumo - naturalmente, se já não há tempo para corrigir as políticas, então os resultados da sua aplicação durante quatro anos de governação também não podem enjeitados e resta assumi--los. Mas isso vai ser feito "ouvindo as pessoas" e "explicando melhor as políticas". O mesmo, mas servido de outra forma, com outro embrulho.
Mais significativa é a chegada da palavra "humildade" ao vocabulário corrente do primeiro-ministro. "Compreendo, com humildade democrática, os sinais de insatisfação e dúvida. Procuro interpretá-los e corresponder-lhes", disse ontem no Parlamento.
Já antes, na noite de segunda-feira, tinha por duas vezes dito a palavra "humildade" aos microfones dos jornalistas. Os relatos sobre o que se passou dentro da sala onde se reuniu a comissão política do PS falam de uma noite de diálogo como há anos não se via por ali e muito longe dos ralhetes que o secretário-geral dava a quem ousava criticar medidas do Governo.
E, certamente de forma mais genuína, Sócrates prometeu que ia "fazer um esforço para ser mais humilde", mas alertou que não lhe pedissem para ser quem não é.
Esta é a questão essencial. Conseguirá o primeiro-ministro ser quem não é? Até que ponto irá esta tardia versão de um Sócrates que é humilde, dialogante, distendida, paciente, disponível para ouvir, convencer os eleitores que não é postiça, que não é mais uma fabricação da máquina de comunicação partidária, que não é mais do que um artifício para garantir uma vitória eleitoral que de repente ficou em risco?
Durante quatro anos Sócrates foi para os eleitores o oposto daquilo que agora pretende ser em quatro meses. Foi um "animal feroz", como o próprio se autodefiniu numa entrevista antes das eleições de 2005 e a sua popularidade e aceitação beneficiaram muito com isso na primeira metade do mandato. Parecem tempos já muito distantes, mas este Governo teve, de forma generalizada, boa imprensa e boa opinião muito para além do tradicional período de estado de graça. O esforço reformista, o combate a grupos de interesse e classes profissionais tidas como privilegiadas, o esforço de consolidação orçamental, a tentativa de mudar o funcionamento da função pública foram genericamente aplaudidos. Até a subida de impostos contra a promessa eleitoral foi aceite como uma medida corajosa, tomada por um governo que não tem medo de tomar medidas impopulares. Determinação, firmeza, autoridade, empenho foram, durante muito tempo, características atribuídas de forma positiva ao primeiro-ministro e ao seu estilo de governação.
Agora, em vez de determinação e firmeza fala-se em arrogância, a autoridade passou a ser autoritarismo e o empenho passou a ser teimosia.
A forma como se perdeu aquele capital político, ao ponto de se chegar a um divórcio com uma parte do eleitorado, como indicia a votação das europeias, é um dos temas de análise mais interessantes destes tempos.
Para o PS, é fácil substituir Vitalino Canas, claramente uma parte do problema da arrogância, por João Tiago Silveira. Também não será difícil pedir a Augusto Santos Silva, outro problema, para aparecer pouco, ou mesmo nada, nos próximos tempos.
Mas não se muda de líder assim. Resta então que seja o líder a mudar. Se conseguir.»
Paulo Ferreira. "Sócrates e a dificuldade da humildade". Público: 18.06.2009.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Carta de Compromisso de Cidadania Rodoviária

«Durante o século XX morreram milhões de seres humanos em desastres rodoviários, tantos quantos morreram na 2ª Guerra Mundial. Nos últimos catorze anos do final do século XX morreram, no nosso país, mais portugueses que durante a Guerra Colonial. Actualmente (dados de 2007): em cada mês que passa, 8 pessoas morrem nas estradas do Distrito de Setúbal e cerca de 297 ficam feridas; em cada dia que passa, 2 pessoas morrem, em média, nas estradas portuguesas e mais de 125 ficam feridas; em cada dia que passa, 120 pessoas morrem, em média, nas estradas do território da União Europeia e mais de 4.400 ficam feridas.
É certo que, nos últimos anos, a segurança rodoviária tem vindo, continuamente, a combater estes números, diminuindo, significativamente, as vítimas mortais e os feridos.
É positivo. Dá alento! Mas...
Quero MAIS! Quero CONTRIBUIR para atingir o Programa de Acção Europeu de Segurança Rodoviária, lançado pela Comissão Europeia, para 2010, e que tem a participação do Estado Português.
Quero MAIS! Quero que este seja um DESAFIO COMUM, onde com acções concretas, sejamos capazes de influenciar positivamente a segurança rodoviária e beneficiar a comunidade onde nos integramos e a sociedade no seu todo.
Por isso, ASSUMO, aqui e agora, o COMPROMISSO de:
Sensibilizar as minhas e os meus amigos, familiares, colegas de trabalho e todas e todos os concidadãos com quem, dia a dia, me relaciono, para que fiquem mais cientes dos riscos da condução e do atravessamento indisciplinado de vias, enquanto peões.
Estimular o conhecimento e o exercício de boas práticas de cidadania rodoviária.
Garantir a minha participação em acções de sensibilização e prevenção rodoviárias e contribuir para que outras pessoas se mobilizem para o efeito, bem como a assinatura da Carta de Compromisso de Cidadania Rodoviária, promovida pelo Governo Civil do Distrito de Setúbal.
Unir esforços para estimular o reforço da responsabilidade social das empresas, nesta área de interesse público, nomeadamente na persuasão da adesão à "Carta Europeia da Segurança Rodoviária — 25 000 Vidas a Salvar".
Respeitar e ajudar a respeitar o código da estrada e da circulação rodoviária, promovendo o seu conhecimento e reconhecimento, particularmente nas camadas mais jovens, especialmente vulneráveis.
Orientar um novo caminho no palco rodoviário com vista ao próximo objectivo colectivo: 100% VIDA NA ESTRADA.»
OBS: Este documento pode ser subscrito pelos visitantes da exposição "Arte para uma cultura de segurança", patente no Museu de Arqueologia e Etnografia, em Setúbal; o texto consta também no catálogo da exposição.]

Dos insectos e dos olhares em José Costa

Habituados que andamos a ver a formiguinha a labutar, sempre gregariamente, assim dando nas vistas, pouco reparamos nos outros insectos, mesmo porque desde há muito nos ensinaram que neste mundo mais vale ser formiga do que cigarra, ainda que talvez não tenha que ser sempre assim. A acrescer a este hábito, há ainda aquele sentido da palavra “insecto” que pode ser para designar uma “pessoa insignificante”, que outra prova não é senão a do humano desprezo por esses seres a que a entomologia se dedica. E até nos podemos lembrar da narrativa em que Kafka transforma o caixeiro-viajante Samsa num “gigantesco insecto”, processo de metamorfose (é esse o título da história, datada de 1913) com irreversibilidade, que leva Samsa à morte, por rejeição e para alívio da restante família… E ainda podemos avocar as expressões que inserem os insectos, usadas nem sempre por boas razões… tudo a provar que a relação do humano com o insecto pode ter sido muitas coisas menos pacífica!
E os insectos, seres minúsculos e misteriosos, não andarão longe da fantasia, assim a queiramos ver e descobrir um mundo novo, assim tentemos reparar no mundo que frequentamos. Reparar, com a carga repetitiva sobre o “parar”, para podermos ver o que óbvio não é. De outra metamorfose precisamos nós, algo próximo daquilo que Sebastião da Gama, o poeta da Arrábida (quase tão arrábido como ela), cantou, quando revelou: “Minha alma abriu-se… / Que linda janela / que é a minha alma! / Não!, linda não é ela: / lindas são as vistas / que se avistam dela. // (…) // Como são tão belas / as coisas lá por fora! / Minha alma em tudo, / em tudo se demora.”
As fotografias de José Costa são pinceladas da paisagem que se avista dessa janela, ponto de ver o mundo, tornando-nos próximas coisas que desconhecemos ou rejeitamos, anulando a distância que vai entre o observador e o minúsculo observado, ampliando a proximidade, mas também a figura, quase nos parecendo aqueles seres de uma grandeza desmesurada, que nos fitam e que passam no seu caminho de sobrevivência, certos da sua continuidade, alguns quase nos remetendo para a fantasia do desenho animado, revestidos de cores muitas, muitas mais do que a paleta das conjugações permite.
Há nestas fotografias momentos de fixação e segmentos de vida. E todas estas criaturas sustentam incólumes a Natureza, transformando-a, dando-lhe corpo, voz e movimento. Maravilhado e a ver os homens através dos animais, Sebastião da Gama fazia ecoar noutro passo, em jeito de elegia, que “de Amor cantavam todos os rios, / todas as serras, todas as flores, / todos os bichos, todas as árvores, / todos os pássaros, todos os pássaros, / todos os homens, todos os homens.” Harmonia perfeita, acordes sublimes, comunhão conseguida.
E a labuta prossegue. Com insectos que acordam flores, que posam, que amam. E nos surpreendem no fundo de um olhar atento, num gesto de acrobacia, num acto de elegância, num equilíbrio indispensável, num ensimesmar de alheamento. Maneiras positivas de ser Universo. Como não há-de a fantasia revestir-se de beleza?
[conjunto de fotografias e texto a partir do catálogo da exposição "Arte para uma cultura de segurança",
presente no Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal, em Setúbal.]

"Arte para uma cultura de segurança", em Setúbal

“Arte para uma cultura de segurança” – Assim se chama a exposição que, desde terça-feira, está patente no Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal (MAEDS), em Setúbal, organizada pelo próprio Museu e pelo Governo Civil de Setúbal.
Nas palavras de Eurídice Pereira, Governadora Civil, que abrem o catálogo da exposição, pretende-se que sejam alteradas “práticas menos consonantes com as exigências da salutar convivência colectiva e alertar a população para temáticas que exigem a mobilização de esforços colectivos, como é o caso da sinistralidade rodoviária e do combate e prevenção dos fogos florestais.” E uma e outra situações são sentidas, de forma contundente, na nossa região: só em 2008, nas estradas do distrito, morreram 77 pessoas; por outro lado, se pusermos os olhos da memória sobre o que foi o incêndio na Arrábida em 2005, talvez fiquemos com o ar de preocupação acentuado, tanto mais que, ao que parece, cerca de 80% dos incêndios que nos amedrontam têm origem humana não criminosa… Números para pensarmos, claro!
A exposição passa por quatro núcleos: “Imagens para um álbum do desassossego”, uma foto-reportagem assinada por António Marques sobre o incêndio na Arrábida, com momentos fortes de destruição e de restauro da Natureza, de paisagem soturna e de paisagem vivida; “Arrábida: a vida secreta da serra”, com fotografia de José Costa, na variedade macro, captando insectos que fazem a vida da Arrábida e nos surpreendem vindos dessa labuta silenciosa, minimizada, mas constante e perturbadora; “Escalas”, em fotografias de Rosa Nunes, em que o corpo feminino e o relevo da serra se medem, num roteiro que começa com a música do silêncio e acaba com o restolho que alberga hipóteses de vida, depois de o olhar passar também pelos estados de agressão à serra; “Morte ou vida na estrada: a escolha é sua”, com pintura de Ana Isa Férias, Luís Valente e Rita Melo, três manifestações que outro grito podem ser contra a morte facilitada e em favor da vida preservada.
Diga-se ainda que esta exposição, que vai estar até Setembro, surge também na sequência de parcerias e do compromisso estabelecido aquando da assinatura, em 2008, da Carta de Europeia de Segurança Rodoviária. Ao visitante é oferecida também a possibilidade de se comprometer com a cidadania rodoviária ao assinar um documento em que assume contribuir para a segurança e entender esse projecto como “desafio comum”.
Como as mensagens são fortes nesta exposição, por onde passa ainda a palavra, junto o texto de Fernando Gandra, intenso na sua verdade:

[reproduções a partir do catálogo da exposição: duas fotografias de António Marques; "E agora...", de Luís Valente (2009); "Promessa" (excerto), de Rosa Nunes (2009)]

terça-feira, 16 de junho de 2009

Discurso político (2) – O jeito das consequências da “humildade”…

«(…) A seguir, apontou as três prioridades para os próximos meses, que antecedem as eleições legislativas: defender a obra feita na educação, na energia e no plano tecnológico; explicar melhor as reformas; e construir a tal "solução política que enfrente a crise", abrindo uma nesga para coligações pós-eleitorais. (…)»
Público: 16.Junho.2009.

Discurso político (1) – O jeito que a humildade dá…

«(…) Falando aos jornalistas à entrada da reunião [havida ontem] para analisar os resultados eleitorais, Sócrates deixou perceber outras nuances do discurso que haveria de fazer a seguir ao órgão político do partido. Falou da necessidade de olhar com "humildade" para os 26,5 por cento obtidos no dia 7, reconheceu o "desgaste do Governo" e as "reformas muito ásperas mas necessárias" que teve de fazer, sublinhando ainda a importância da crise na derrota eleitoral. (…)»
Público: 16.Junho.2009.

sábado, 13 de junho de 2009

Hoje, no "Correio de Setúbal" ("Sem Mais Jornal")

Diário da Auto-Estima – 101
Europa I – Será lugar-comum o que vou dizer, mas corro o risco: a campanha eleitoral para o Parlamento Europeu ludibriou-nos quanto à Europa. Bem se podia procurar pela Europa… pela Europa… pela Europa… Nada. No fundo, perpetua-se o que tem acontecido: a distância relativamente à causa europeia é superior à distância geográfica que separa Portugal de Bruxelas…
Europa II – Vamos imaginar que na campanha eleitoral para o Parlamento Europeu se falou apenas da Europa, excepto na circunstância de fazer jeito para justificar o acto. Poderia ter sido de outra maneira?
Europa III – Será que este esquecimento de assumir a Europa como tema de campanha se deveu ao facto de nos sentirmos tão europeus que já nem vale a pena chamar a atenção para isso?
Europa IV – O que significa um político, mesmo que português, dizer que “assume as responsabilidades políticas”, a título individual, em exclusivo, por um resultado que lhe foi desfavorável e que foi também desfavorável ao partido que representa? Será uma fórmula politicamente correcta apenas, que fica bem e é heróica num tal momento?
Escola – Está a terminar o ano lectivo. Saudades de momentos bons, vividos com alunos, que deram vida à Escola. A lembrança de tempos menos bons, quando a irreverência dos alunos prejudicou o trabalho e a atenção dos outros. A vertigem do tempo – “ó professor, o ano já está a acabar?” A sensação de que este ano lectivo foi mais desgastante do que outros, sem que isso tivesse capitalizado a favor dos estudantes ou de uma escola mais feliz.
Cavalas – Uma exposição sobre Setúbal e o “Polis” está nas instalações que foram do Banco de Portugal. Acompanham-na vários roteiros, editados em fascículos, cada um correspondente a uma dada área da cidade. De onde terá vindo a ideia, registada no primeiro fascículo, a propósito da lenda da Senhora da Anunciada, de que “uma peixeira pobre estava a assar cavalas quando uma delas saltou do fogo”? Será para dar mais substância à lenda ou porque… quem conta um conto acrescenta um ponto? Diga-se que as cavalinhas, neste caso, não eram necessárias…
[OBS: O Correio de Setúbal passou a integrar, a partir da edição de hoje, a paginação do Sem Mais Jornal,
que é distribuído com o semanário Expresso na região de Setúbal.]

Mãe: bela crónica de José Manuel dos Santos (em que o testemunho se mistura com a vida e com a literatura)

José Manuel dos Santos. "Mãe". Expresso ("Actual", pg. 4), 13.Junho.2009.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Rostos (119)

Santo António, em Alcácer do Sal (hoje à tarde)

quinta-feira, 11 de junho de 2009

A publicidade e a propaganda não garantem um prazo de validade ilimitado e na política também há coisas efémeras

Começou a queda da casa de Sócrates
«João Cravinho deu o tiro de partida: "o efeito Sócrates só por si já não chega". E de Santarém chegaram-nos imagens de um primeiro-ministro que sabe que a corrida já começou. Nem sequer é a corrida ao seu lugar. O que sempre seria um combate aberto. É sim este desmarcar-se. As derrotas nunca são bonitas de se ver e são ainda mais penosas as derrotas de um líder que em vez de apoiantes tem dependentes.
O PS nunca apoiou Sócrates por aquilo que ele pensava ou defendia, mas sim porque ele lhes garantiu o poder. Sócrates não é para o PS um líder. Como diz Cravinho, Sócrates é um efeito. Um efeito que, valha a verdade, deu uma maioria absoluta ao PS. Mas, sem poder, Sócrates não tem qualquer préstimo para os socialistas - não tem o mundo internacional de Soares e dificilmente lhes pode trazer o prestígio da colocação numa agência internacional como aconteceu com Sampaio e Guterres. O PS está disposto a fechar os olhos a todos os equívocos de Sócrates enquanto existir poder. Assim que o poder se acabar, os socialistas serão os mais violentos nas críticas a tudo aquilo que até agora fizeram de conta que não viram. Sem poder, Sócrates é um embaraço. Por isso, ao primeiro sinal de que o efeito Sócrates se estava a extinguir, as cadeiras do Altis ficaram vazias.
Desconheço que explicações deram ao líder do PS para o desastre dessa noite os muito celebrados especialistas em marketing político que terá contratado e que lhe têm sabido encher os pavilhões dos comícios e escolher o enquadramento em que deve surgir. Mas que muito provavelmente contribuíram para acentuar o seu afastamento das bases do partido e sobretudo para o tornar cada vez mais dependente dessa mesma máquina de propaganda. Durante algum tempo resultou, mas progressivamente o primeiro-ministro foi ficando em delay com o país. Tal como numa novela mexicana, em que os movimentos dos lábios não coincidem com as frases que ouvimos, também o país em que vivemos não coincide com o país de que fala José Sócrates.
Esta captura do discurso político pelos especialistas do marketing levou a este desacerto entre o país real e o país do discurso governamental. Mas não só. Mais do que falar do país, dos seus problemas e discutir seriamente as soluções que propõe, José Sócrates passa de sessões de anúncio para sessões de anúncio, invariavelmente abrilhantadas com figurantes, e fala obsessivamente de notícias, jornalistas, directores de jornais... como se o seu mundo não fosse mais do que isso: ser um efeito. Mas agora que já se ouve que o "efeito Sócrates só por si já não chega" talvez seja o momento para que no Largo do Rato se passe para part time a agência de comunicação e se arranje tempo para ouvir os políticos.»
Helena Matos. "Começou a queda da casa de Sócrates". Público: 11.Junho.2009.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Camões e a actualidade, segundo Luís Afonso

Luís Afonso. Público: 10.Junho.2009.

Presidente da República apela aos valores e à participação de todos

O discurso do Presidente da República em Santarém citou Almeida Garrett e Ruy Belo e tomou o exemplo de Gago Coutinho e Sacadura Cabral e das redes de solidariedade social para apelar à participação dos portugueses e aos valores a desenvolver. Uma intervenção que serve para todos, independentemente da função desempenhada por cada um. Eis alguns excertos:
(…) Neste dia de Camões, mais do que sonhar, temos de acreditar que Portugal será outra vez Portugal, um Portugal melhor, o mesmo Portugal que tantas vezes se afirmou no decorrer da sua história.
Os exemplos que nos vêm do passado constituem, em primeiro lugar, uma responsabilidade para todos e para cada um de nós. Responsabilidade na solução dos problemas que temos pela frente. Responsabilidade na criação de um País melhor para os nossos filhos e para os nossos netos.
Não se trata de uma responsabilidade em abstracto. Trata-se de uma responsabilidade concreta, que se traduz, desde logo, na obrigação que temos de participar na vida pública.
Em tempos reconhecidamente difíceis como aqueles em que vivemos, não é aceitável que existam Portugueses que se considerem dispensados de dar o seu contributo, por mais pequeno que seja.
(…) A abstenção deve, além disso, fazer reflectir os agentes políticos. A confiança dos cidadãos nas instituições democráticas depende, em boa parte, da forma como aqueles que são eleitos actuam no desempenho das suas funções.
Se não tivermos órgãos de representação prestigiados, será difícil aumentar a participação dos eleitores e demonstrar-lhes que o seu voto é importante e útil para a formação das decisões de interesse geral.
(…) Neste dia em que se celebra Portugal e a memória de uma nação com mais de oito séculos, devemos interrogar-nos sobre aquilo que podemos e queremos fazer para que essa caminhada prossiga, e para que os nossos descendentes possam vir também a sentir-se orgulhosos das nossas realizações e das opções que tomámos.
(…) Face às dificuldades e aos desafios que temos pela frente, é imperativo promover uma cultura de valores, uma cultura que contemple a dignidade das pessoas, incentive o esforço e o mérito e favoreça a coesão social.
É preciso valorizar os laços familiares, que são o mais sólido alicerce de qualquer sociedade e a melhor forma de assegurar a responsabilidade inter-geracional.
É preciso reavivar nas pessoas um espírito de sobriedade e uma consciência solidária; combater o esbanjamento e o desperdício e rever hábitos de consumismo; compreender que também somos responsáveis pela sorte dos outros, principalmente daqueles que são mais carenciados e que vivem e sofrem perto de nós, na nossa cidade ou aldeia, no nosso bairro ou na nossa empresa.
Mais do que simples regras formais, terá de haver, sobretudo, uma clara presença de princípios éticos nas instituições, no mundo dos negócios e no mundo do trabalho. A justiça, a equidade e a responsabilidade social não podem ser letra morta, simples palavras de que só nos lembramos em momentos de apuros.
Tanto no Estado como na sociedade civil é preciso adoptar uma cultura de transparência e de prestação de contas.
(…) Ninguém ignora a urgência de uma melhoria do sistema educativo, por forma a incutir nos jovens o valor do conhecimento, da inovação, da criatividade e do empreendedorismo.
A educação não é só um problema da escola. A sociedade, no seu conjunto, tem de incorporar no seu dia-a-dia a importância da aprendizagem, como factor de realização pessoal e de progresso social.
Não podemos esquecer o mundo rural, cujo desenvolvimento é decisivo, tanto na perspectiva da produção agrícola e de actividades complementares, como na perspectiva do ordenamento territorial, do combate ao despovoamento do interior e da coesão do todo nacional.
Temos de ambicionar uma sociedade civil verdadeiramente emancipada do Estado, afirmando-se, autonomamente, pela sua criatividade, organização, trabalho e capacidade inovadora; uma Administração Pública que preste serviços de qualidade e tenha assegurada a sua independência face a interesses partidários ou outros; um sistema judicial com credibilidade e prestígio, eficiente no seu funcionamento e que inspire confiança à comunidade.
(…) Existem, felizmente, muitos exemplos, em particular entre os mais jovens, de cientistas, empresários, artistas e outros profissionais portugueses que têm triunfado, tanto cá dentro como no estrangeiro, e que não se conformam com os atrasos que persistem em muitos sectores da vida nacional.
O seu inconformismo deve ser o nosso lema. O seu trabalho deve ser o exemplo e o seu triunfo a meta que ambicionamos para o País inteiro. (…)

O discurso de António Barreto no 10 de Junho, em Santarém

António Barreto discursou em Santarém, no seu papel de presidente da Comissão organizadora das comemorações do 10 de Junho. A sua intervenção é um retrato duro e sério, uma auto-crítica sobre Portugal e os portugueses, um sinal de emergência, um apelo para que o paradigma deixe de ser a retórica e a propaganda e passe a ser o exemplo e a coerência. E também uma lição sobre o acto de comemorar. Vale a pena lê-lo.
Dia de Portugal... É dia de congratulação. Pode ser dia de lustro e lugares comuns. Mas também pode ser dia de simplicidade plebeia e de lucidez.
Várias vezes está dia mudou de nome. Já foi de Camões, por onde começou. Já foi de Portugal, da Raça ou das Comunidades. Agora, é de Portugal, de Camões e das Comunidades. Com ou sem tolerância, com ou sem intenção política específica, é sempre o mesmo que se festeja: os Portugueses. Onde quer que vivam.
Há mais de cem anos que se celebra Camões e Portugal. Com tonalidades diferentes, com ideias diversas de acordo com o espírito do tempo. O que se comemora é sempre o país e o seu povo. Por isso o Dia de Portugal é também sempre objecto de críticas. Iguais, no essencial, às expressas por Eça de Queirós, aquando do primeiro dia de Camões. Ele afirmava que os portugueses, mais do que colchas às varandas, precisavam de cultura.
Os Estados gostam de comemorar e de se comemorar. Nem sempre sabem associar os povos a tal gesto. Por vezes, quando o fazem, é de modo desajeitado. "As festas decretadas, impostas por lei, nunca se tornam populares", disse também Eça de Queirós. Tinha razão. Mas devo dizer que temos a felicidade única de aliar a festa nacional a Camões. Um poeta, em vez de uma data bélica. Um poeta que nos deu a voz. Que é a nossa voz. Ou, como disse Eduardo Lourenço, um povo que se julga Camões. Que é Camões. Verdade é que os povos também prezam a comemoração, se nela não virem armadilha ou manipulação.
Comemora-se para criar ou reforçar a unidade. Para afirmar a continuidade. Para reinterpretar a passado. Para utilizar a História a favor do presente. Para invocar um herói que nos dê coesão. Para renovar a legitimidade histórica. São, podem ser, objectivos decentes. Se soubermos resistir à tentação de nos apropriarmos do passado e dos heróis, a fim de desculpar as deficiências contemporâneas.
Não é possível passar este dia sem olharmos para nós. Mas podemos fazê-lo com consciência. E simplicidade.
Garantimos com altivez que Camões é o grande escritor da língua portuguesa e um dos maiores poetas do mundo, mas talvez fosse preferível estudá-lo, dá-lo a conhecer e garantir a sua perenidade.
Afirmamos, com brio, que os portugueses navegadores descobriram os caminhos do mundo nos séculos XV e XVI e que os portugueses emigrantes os percorreram desde então. Mais vale afirmá-lo com o sentido do dever de contribuir para a solidez desta comunidade.
Dizemos, com orgulho, que o Português é uma das seis grandes línguas do mundo. Mas deveríamos talvez dizê-lo com a responsabilidade que tal facto nas confere.
Quando se escolhe um português que nos representa, que nos resume, escolhe-se um herói. Ele é Camões. Podemos festejá-lo com narcisismo. Mas também com a decência de quem nele procura o melhor.
Os nossos maiores heróis, com Camões à cabeça, ilustraram-se pela liberdade e pelo espírito insubmisso. Pela aventura e pelo esforço empreendedor. Pela sua humanidade e, algumas vezes, pela tolerância. Infelizmente, foram tantas vezes utilizados com o exacto sentido oposto: obedientes ou símbolos de uma superioridade obscena.
Ainda hoje soubemos pastar homenagem a Salgueiro Maia. Nele, festejámos a liberdade, mas também aquele homem. Que esta homenagem não se substitua, ritualmente, ao nosso dever de cuidar da democracia.
As comemorações nacionais têm a frequente tentação de sublinhar ou inventar o excepcional. O carácter único de um povo. A sua glória. Mas todos sentimos, hoje, os limites dessa receita nacionalista. Na verdade, comemorar Portugal e festejar os Portugueses pode ser acto de lucidez e consciência. No nosso passado, personificado em Camões, o que mais impressiona é a desproporção entre o povo e os feitos, entre a dimensão e a obra. Assim como esta extraordinária capacidade de resistir, base da "persistência da nacionalidade", como disse Orlando Ribeiro. Mas que isso não apague ou esbata o resto. Festejar Camões não é partilhar o sentido épico que ele soube dar à sua obra maior, mas é perceber o homem, a sua liberdade e a sua criatividade. Como também é perceber o que fizemos de bem e o que fizemos de mal. Descobrimos mundos, mas fizemos a guerra, por vezes injusta. Civilizámos, mas também colonizámos sem humanidade. Soubemos encontrar a liberdade, mas perdemos anos com guerras e ditaduras.
Fizemos a democracia, mas não somos capazes de organizar a Justiça. Alargámos a educação, mas ainda não soubemos dar uma boa Instrução. Fizemos bem e mal. Soubemos abandonar a mitologia absurda do país excepcional, único, a fim de nos transformarmos num país como os outros. Mas que é o nosso. Por isso, ternos de nos ocupar dele. Para que não sejam outros a fazê-lo.
Há mais de trinta anos, neste dia, Jorge de Sena deixou palavras que ecoam. Trouxe-nos um Camões humano, sabedor, contraditório, irreverente, subversivo mesmo.
Desde então, muito, mudou. O regime democrático consolidou-se. Recheado de defeitos, é certo. Ainda a viver com muita crispação, com certeza. Mas com regras de vida em liberdade.
Evoluiu a situação das mulheres, a sua presença na sociedade. Invisíveis durante tanto tempo, submissas ainda há pouco, as mulheres já fizeram um país diferente.
Mudou até a constituição do povo. A sociedade plural em que vivemos hoje, com vários deuses e credos, com dois sexos iguais, com diversas línguas e muitos costumes, com os partidos e as associações que se queira, seria irreconhecível aos nossos próximos antepassados.
A sociedade e o país abriram-se ao mundo. No emprego, no comércio, no estudo, nas viagens, nas relações individuais e até no casamento, a sociedade aberta é uma novidade recente.
A pertença à União Europeia, timidamente desejada há três décadas, nem sequer por todos, é um facto consumado.
A estes trinta anos pertence também o Estado de protecção social, com especial relevo para o Serviço Nacional de Saúde, a segurança social universal e a escolarização da população jovem. É certamente uma das realizações maiores.
Estas transformações são motivo de regozijo. Mas este não deve iludir o que ainda precisa de mudança. O que não foi possível fazer progredir. E a mudança que correu mal.
A Sociedade e o Estado são ainda excessivamente centralizados. As desigualdades sociais persistem para além do aceitável. A Injustiça é perene. A falta de justiça também. O favor ainda vence vezes de mais o mérito. O endividamento de todos, país, Estado, empresas e famílias é excessivo e hipoteca a próxima geração. A nossa pertença à União Europeia não é claramente discutida e não provoca um pensamento sério sobre o nosso futuro como nacionalidade independente.
Há poucos dias, a eleição europeia confirmou situações e diagnósticos conhecidos. A elevadíssima abstenção mostrou urna vez mais a permanente crise de legitimidade e de representatividade das instituições europeias. A cidadania europeia é uma noção vaga e incerta. É um conceito inventado por políticos e juristas, não é uma realidade vivida e percebida pelos povos. E um pretexto de Estado, não um sentimento dos povos. A pertença à Europa é, para os cidadãos, uma metafísica sem tradição cultural, espiritual ou política. Os Estados e os povos europeus deveriam pensar de novo, uma, duas, três vezes, antes de prosseguir caminhos sem saída ou falsos percursos que terminam mal. E nós fazemos parte desse número de Estados o povos que têm a obrigação de pensar melhor o seu futuro, o futuro dos Portugueses que vêm a seguir.
É a pensar nessas gerações que devemos aproveitar uma comemoração e um herói para melhor ligar o passado com o futuro.
Não usemos os nossos heróis para nos desculpar. Usemo-los como exemplos. Porque o exemplo tem efeitos mais duráveis do que qualquer ensino voluntarista.
Pela justiça e pela tolerância, os portugueses precisam mais de exemplo de que de lições morais.
Pela honestidade e contra a corrupção, os portugueses necessitam de exemplo, bem mais do que de sermões.
Pela eficácia, pela pontualidade, peco atendimento público e peta civilidade dos costumes, os portugueses serão mais sensíveis ao exemplo do que à ameaça ou ao desprezo.
Pela liberdade e pelo respeito devido aos outros, os portugueses aprenderão mais com o exemplo do que com declarações solenes.
Contra a decadência moral e cívica, os portugueses terão mais a ganhar com o exemplo do que com discursos pomposos.
Pela recompensa ao mérito e à punição do favoritismo, os portugueses seguirão o exemplo com mais elevado sentido de justiça.
Mais do que tudo, os portugueses precisam de exemplo. Exemplo dos seus maiores e dos seus melhores. O exemplo dos seus heróis, mas também dos seus dirigentes. Dos afortunados, cujas responsabilidades deveriam ultrapassar os limites da sua fortuna. Dos sabedores, cuja primeira preocupação deveria ser a de divulgar o seu saber. Dos poderosos, que deveriam olhar mais para quem lhes deu o poder. Dos que têm mais responsabilidades, cujo "ethos" deveria ser o de servir.
Dê-se a exemplo e esse gesto será fértil! Não vale a pena, para usar uma frase feita, dar “sinais de esperança" ou "mensagens de confiança". Quem assim age, tem apenas a fórmula e a retórica. Dê-se o exemplo de um poder firme, mas flexível, e a democracia melhorará. Dê-se o exemplo de honestidade e verdade, e a corrupção diminuirá. Dê-se o exemplo de tratamento humano e justo e a crispação reduzir-se-á. Dê-se o exemplo de trabalho, de poupança e de investimento e a economia sentirá os seus efeitos.
Políticos, empresários, sindicalistas e funcionários: tenham consciência de que, em tempos de excesso de informação e de propaganda, as vossas palavras são cada vez mais vazias e inúteis e de que o vosso exemplo é cada vez mais decisivo. Se tiverem consideração por quem trabalha, poderão melhor atravessar as crises. Se forem verdadeiros, serão respeitados, mesmo em tempos difíceis.
Em momentos de crise económica, de abaixamento dos critérios morais no exercício de funções empresariais ou políticas, o bom exemplo pode ser a chave, não para as soluções milagrosas, mas para o esforço de recuperação do país.

Tributo a Camões

A admiração por Camões tem sido expressa nas letras ao longo dos tempos, independentemente das nacionalidades dos seus autores ou das línguas em que se exprimam. Testemunho disso é a antologia de tributo a Camões editada há pouco mais de meia dúzia de anos, tomando para título o conhecido verso bocagiano, Camões, grande Camões… (Porto: UNICEPE, 2002), em que se reúnem quase duas centenas de nomes para cantar o épico português.
De todos, falemos do primeiro: António Ruivo Mouzinho, hoje professor aposentado, autor desta tarefa de recolha feita ao longo dos anos. Conta ele, em texto introdutório, que o projecto nasceu no início da década de 80, quando o Conselho Directivo da Escola Secundária Soares dos Reis, no Porto, lhe pediu que preparasse uma edição de homenagem a Camões, que seria ilustrada pelos alunos, visando assinalar o quarto centenário da morte do poeta. A tarefa tem bom final, porque, em 10 de Junho de 1980, era publicada a pretendida obra.
Mas Ruivo Mouzinho não se ficou por aí. E, já na situação de aposentado, continuou recolhendo os tributos a Camões, em jeito de puzzle a montar. E, assim, cerca de duas décadas depois da primeira iniciativa, a Cooperativa Livreira de Estudantes do Porto (Unicepe) meteu-se a publicar a recolha de Ruivo Mouzinho.
O que tem Camões para atrair gente de tantas épocas, de várias latitudes, de diversas culturas? O antologiador no-lo explica: “O que faz a perenidade da poesia de Camões é que não há colete epocal que o cinja perfeitamente, pois o seu génio faz estalar as costuras de todas as vestes com que se pretenda dar-lhe figurino mais consentâneo com a arrumação em qualquer cabide definitivo. Por isso, ele pôde ser caro aos conceptistas, aos árcades, aos românticos, aos parnasianos, aos simbolistas, aos modernistas, aos surrealistas. Assim, o culto de Camões não conheceu até hoje soluções de continuidade nem mostra sinais de abrandamento (…). Transcendeu as fronteiras do seu próprio país, tem tantos devotos no Brasil como em Portugal e foi celebrado por Alemães, Galos, Ítalos e Ingleses. Unânime é, porém, a humildade com que todos lhe reconhecem a dimensão ímpar: Camões é o paradigma do Português (povo e língua).”
Mencionemos, depois, os outros que o cantaram e que Ruivo Mouzinho acolheu. São 184 poetas como: Abade de Jazente, Acácio Antunes, Adriano Espínola, Afonso Celso, Afonso Duarte, Afonso Lopes Vieira, Agostinho da Silva, Alberto de Lacerda, Alberto de Oliveira (Portugal), Alberto d'Oliveira (Brasil), Alcides Werke, Alexandre da Conceição, Alfredo Carvalhais, Alice Gomes, Almada Negreiros, Almeida Braga, Almeida Garrett, Alphonsus de Guimaraens F°, André Falcão de Resende, Álvaro Pacheco, Ángel Crespo, Antero de Quental, António Barahona, António Correia d'Oliveira, António Feijó, António Feliciano de Castilho, António José Henriques, António José Viale, António Lopes Ribeiro, António Nobre, António Osório, António Tomás, Araújo Porto Alegre, Armindo Rodrigues, Arnaldo Gama, Artur Eduardo Benevides, Ary dos Santos, Assis Brasil, Augusto Casimiro, Augusto de Castro, Augusto Frederico Schmidt, Augusto Meyer, Austro Costa, Baltasar Estaço, Barbosa du Bocage, Bernardo Braga, Bernardo Guimarães, Camilo Castelo Branco, Carlos de Laet, Carlos Drummond de Andrade, Carlos Filipe Moisés, Carlos Gondim, Carlos Nejar, Casimiro de Abreu, Castro Gil, Cesário Verde, Conde de Sabugosa, Conrad Ferdinand Meyer, Couto Viana, Cristóvão Aires, Dante Milano, David Mourão-Ferreira, Dias Freitas, Diogo Bernardes, Diogo Taborda Leitão, Duarte de Viveiros, Eduardo Coimbra, Eduardo Marquina, Eduardo Vidal, Eno Theodoro Wanke, Enrique de Resende, Ernesto Pires, Ernesto Viana, Eugénio de Andrade, Eugénio de Castro, Fernando Caldeira, Ferreira de Araújo, Filinto Elísio, Francisco Carvalho, Francisco Lopes, Francisco Palha, Franklin Távora, Friedrich Von Schlegel, Gaspar Frutuoso, Gastão Cruz, Gerardo Mello Mourão, Gomes de Amorim, Gomes Leal, Gonçalves Crespo, Gonçalves de Magalhães, Guilherme Braga, Hamilton de Araújo, Herman Melville, Jáder de Carvalho, Jayme de Séguier, Jerónimo Bahia, João Calceteiro, João de Barros, João de Deus, João de Lemos, João Lopes Leitão, João Xavier de Matos, Joaquim de Araújo, Joaquim dos Anjos, Joaquim Nabuco, Jonathan Griffin, Jorge de Lima, Jorge de Sena, Jorge Luís Borges, José Albano, José Alcides Pinto, José Augusto Seabra, José Blanc de Portugal, José Bonifácio (O Moço), José Carlos González, José Coutinho e Castro, José Facó, José Gomes Ferreira, José Jorge Letria, José Madeira, José Saramago, Josef Wilms, Keith Bosley, Leite de Vasconcelos, Lope de Vega, Lord Byron, Louis de Rienzi, Luís Augusto Palmeirim, Luís Carlos, Luís de Magalhães, Luís Delfino, Luís Soares, Luiz Guimarães Jr, Luz Soriano, Machado de Assis, Manuel Alegre, Manuel Bandeira, Manuel de Sousa Coutinho, Marcus Accioly, Mário Beirão, Maximiano Ricca, Melo e Castro, Mendes Leal, Menotti del Picchia, Miguel Torga, Murilo Mendes, Neide Archanjo, Nicolau Tolentino, Nicolaus Delius, Ofélia Bomba, Olavo Bilac, Pablo Neruda, Paulo Brito e Abreu, Pedro Tamen, Pereira Caldas, Pinheiro Caldas, Raimundo Correia, Ramos Coelho, Rangel de Quadros, Reinhold Schneider, Ribeiro Couto, Ricarda Huch, Rodrigues Cordeiro, Rosalía de Castro, Roy Campbell, Rui Knopfli, Ruy Proença, Saul Dias, Sérgio de Castro Pinto, Serpa Pimentel, Silva Ferraz, Simões Dias, Soares de Passos, Sophia Andresen, Teixeira de Pascoaes, Teófilo Braga, Teófilo Dias, Tomás Ribeiro, Torquato Tasso, Valentim Magalhães, Vasco Graça Moura, Visconti Coaracy, Wilhelm Storck e Xavier da Cunha.
Finalmente, refiram-se os nomes dos tradutores (ainda que alguns constem também como autores de poemas na lista acima): Elviro Rocha Gomes, Ernesto Guerra da Cal, Eugénio Lisboa, Gondin da Fonseca, João Barrento, Jorge de Sena, José Bento, José Coutinho e Castro, J. Leite de Vasconcelos e Tomaz de Figueiredo.
A obra contém ainda ilustrações de Fernando Gomes, António Augusto Menano e Roberto Merino.

Camões e "Os Lusíadas" para os mais novos

Com a edição do Público de ontem foi vendido, como opção, o livro Os Lusíadas – Episódios fabulosos, com selecção e adaptação do texto feita por Elsa Pestana de Magalhães e ilustrações de Jesús Gabán (Sintra: Girassol Edições).
Em nota introdutória, a autora da adaptação dirige-se ao “pequeno grande leitor” para curta biografia de Camões e para justificar a obra – “Ao adaptarmos esta obra para ti, quisemos que começasses a ter contacto com Os Lusíadas e a conhecer o seu conteúdo. Foi por isso que seleccionámos apenas alguns episódios e lhes demos uma forma reduzida e simplificada, procurando, porém, ser fiel ao sentimento de Camões.”
A intenção é a melhor e o livro afigura-se agradável. As ilustrações são elucidativas e equilibradas e acompanham a história. A selecção dos episódios é adequada, com excertos de todos os cantos e inserindo, por vezes, versos camonianos sem dificultar a compreensão e sem forçar o conjunto do texto. Frequentemente, o discurso não se distancia do registo de Camões, utilizando até as mesmas imagens ou palavras, mas com simplificação e explicação a propósito. O leitor ora se julga perante o texto original, ora se confronta com a adaptação, sem que haja cortes abruptos.
Há, no entanto, algumas dificuldades que seriam bem escusadas, tais como: nem sempre ser evidente quem é o narrador do que está a ser contado; o discurso directo assumir vários parágrafos sem que se perceba no imediato que se continua a "ouvir" a mesma personagem; frequência de mistura de formas verbais no tempo pretérito e no tempo presente no mesmo parágrafo, respeitando a mesma acção; manutenção no texto de alguns termos não usuais que poderiam ter sido substituídos, sem necessidade de recorrer aos significados em rodapé.
Esta é mais uma das obras que vem juntar-se à fortuna editorial em torno de Camões e da adaptação da sua vida e obra visando um público juvenil. Deixo aqui, sem exaustiva preocupação, alguns exemplos, nem todos recentes, mas em que vale a pena manter a aposta: Aventuras do Trinca-Fortes – Pequena história de Camões e do seu poema, de Adolfo Simões Müller (Porto: Livraria Tavares Martins, 1946), com ilustrações de Júlio Resende (em 1980, houve nova edição a cargo do Círculo de Leitores, com ilustrações de Antunes); Os Lusíadas contados aos jovens, de Adolfo Simões Müller (Mem Martins: Publicações Europa-América, 1980), com ilustrações de Fernando Bento; Os Lusíadas de Luís de Camões contados às crianças e lembrados ao povo, de João de Barros (Lisboa: Livraria Sá da Costa, 1930), com ilustrações por Martins Barata (em 2008, houve nova edição, com ilustrações de André Letria); Camões, poeta mancebo e pobre, de Matilde Rosa Araújo (Lisboa: Prelo, 1980), com ilustrações de Maria Keil; Chamo-me… Luís de Camões, de Zacarias Nascimento (Lisboa: Didáctica Editora, 2007), com ilustrações de Ernesto Neves; Barbi-Ruivo – O meu primeiro Camões, de Manuel Alegre (Lisboa: Dom Quixote, 2007), com ilustrações de André Letria; "Os Lusíadas" para os mais pequenos, de Alexandre Honrado (Porto: Âmbar, 2008), com ilustrações de Maria João Lopes; Era uma Vez um Rei que Teve um Sonho: Os Lusíadas Contado às Crianças, de Leonoreta Leitão (Lisboa: Dinalivro, 2007). Quanto a adaptações em bd, lembro: Os Lusíadas em banda desenhada, por José Ruy (Lisboa: Editorial Notícias, 1983); Camões aos quadradinhos, por Rui Pimentel e Jorge Serrão (Lisboa: Aguiar & Dias, s/d) e Camões, por Carlos Alberto Santos (Porto: Edições ASA, 1990).
[A ordem por que se reproduzem as capas dos livros segue a da entrada dos mesmos no texto.]

Intervalo (16) - O professor está sempre errado

É jovem, não tem experiência.
É velho, está superado.
Não tem automóvel, é um pobre coitado.
Tem automóvel, chora de “barriga cheia".
Fala em voz alta, vive gritando.
Fala em tom normal, ninguém escuta.
Não falta ao colégio, é um "caxias".
Precisa faltar, é um "turista".
Conversa com os outros professores, está "malhando" os alunos.
Não conversa, é um desligado.
Dá muita matéria, não tem dó do aluno.
Dá pouca matéria, não prepara os alunos.
Brinca com a turma, é metido a engraçado.
Não brinca com a turma, é um chato.
Chama a atenção, é um grosso.
Não chama a atenção, não sabe se impor.
A prova é longa, não dá tempo.
A prova é curta, tira as chances do aluno.
Escreve muito, não explica.
Explica muito, o caderno não tem nada.
Fala corretamente, ninguém entende.
Fala a "língua" do aluno, não tem vocabulário.
Exige, é rude.
Elogia, é debochado.
O aluno é reprovado, é perseguição.
O aluno é aprovado, deu "mole".
É, o professor está sempre errado,
mas, se conseguiu ler até aqui, agradeça a ele.
(fonte - Revista do Professor de Matemática, nº 36,1998.)

O texto foi-me enviado hoje por pessoa amiga. Mas ele já circula há muito pela net, seja em blogues ou em sítios. Desconheço a autoria e a versão que recebi indica um número da Revista do Professor de Matemática como fonte da edição.
Achei oportuna a publicação, graças à fase do ano lectivo em que estamos. Num final em que valeria a pena pensar o que de bom aconteceu e teve influência. O que se conseguir descobrir talhará a proporção das coisas boas...

segunda-feira, 8 de junho de 2009

De Setúbal para o Parlamento Europeu: os concelhos e o distrito

O Setubalense: 08.Junho.2009.

Terá sido a papa?

Luís Afonso. Público: 08.Junho.2009.

De Portugal para o Parlamento Europeu: o jogo das cores (2004-2009)

Público: 08.Junho.2009

Não foi no dia seguinte...

... foi no próprio dia das eleições para o Parlamento Europeu, logo que foram sabidas as projecções e os resultados de Portugal, que voltou o papão da "governabilidade" para preparar caminho das eleições legislativas. É lamentável que haja tão fraco argumento a favor de um provável resultado ou de uma desejada vitória! Mas não admira, pois se com a Provedoria da Justiça foi o que foi... e ainda não está resolvido!... A "governabilidade"!... Espantoso! Como se a democracia fosse apenas uma montra!...

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Tróia através da memória

As turmas A, B, C e D de 9º ano da Escola Secundária D. João II, em Setúbal, fizeram entrevistas para saber como foram vividos pelos setubalenses os verões na Tróia no período entre 1950 e 1974. Dessa procura, feita no âmbito da disciplina de História, resultou o livro agora publicado Quando a Tróia era do Povo (Setúbal: Escola Secundária D. João II, 2009), que tem coordenação de uma equipa de professores constituída por Jaime Pinho, Maria José Simas, Alberto Lopes, Isabel Duarte, Luísa Ramos e Álvaro Arranja.
O título atribuído à colectânea divide o tempo da Tróia em dois segmentos: aquele em que “a Tróia era do povo”, passado, popular, bem evidenciado no título e, pela adesão, comprovado nos testemunhos recolhidos e publicados, e um tempo de agora, não referido mas sugerido, em que, supostamente, a Tróia não será “do povo”. Fica, pois, uma sensação de perda de um espaço e de um tempo, vivo na memória e materializado na escrita.
Ao longo da cerca de uma centena de páginas, passam testemunhos sobre a paisagem (dunas, flora, fauna, casas), sobre os quotidianos (vendedores ambulantes, convívio, vestuário, dormidas, higiene, alimentação), sobre retratos sociais (dos habitantes de Setúbal, Azeitão, Palmela e Pinhal Novo ao primeiro turismo). Pelos testemunhos mostrados passa um rememorar o vivido, encarado de um ponto de vista pessoal, em jeito de lembrança de outros tempos que eram diferentes dos de agora.
Um último capítulo aborda algumas páginas do periódico O Setubalense que noticiaram o veraneio em Tróia na mesma época. Não sendo um texto de análise, pretende, de alguma forma fazer a junção entre o título do livro e os testemunhos que foram recolhidos e não será por acaso que essa recolha na imprensa conclui com o gesto de Américo Tomás, Presidente da República, a intensificar “as suas visitas e o seu apoio aos projectos de urbanização da Tróia”. Esta conclusão liga-se, de resto, à ideia com que Jaime Pinho inicia o seu texto de abertura – “Os verões na Tróia: antes da era do betão”.
É uma recolha interessante pelo que nos traz como trabalho de memória, revelador dessa forte ligação das populações ao rio, ao mar e a Tróia, uma ligação que quase prolonga Setúbal para lá do Sado. É uma recolha interessante pela capacidade de levar as pessoas a testemunharem o vivido e por ter saído de um trabalho organizado pela escola, levando os jovens a mergulhar no passado que é a história de famílias e que marcou a identidade desta região. É uma recolha interessante pelo que pode sugerir de interligação entre a Escola e a comunidade. Provavelmente, a leitura sugerida a partir do título do livro e do texto introdutório são um tanto forçadas, na medida em que, podendo ser verdade o que sugerem, o conteúdo das intervenções e dos testemunhos não o sustenta…

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Arménio Vieira é o "Camões" 2009

O cabo-verdiano Arménio Vieira foi o escritor galardoado com o Prémio Camões 2009. Nascido em 1941, é jornalista e autor de obras como Poemas (1981), O eleito do sol (1990), No Inferno (1999) e Mitografias (2006). Dele reproduzo o poema “Quiproquó” (um dos três poemas deste autor que consta no cd Poesia de Cabo Verde e sete poemas de Sebastião da Gama, apresentado por Afonso Dias em 2007):

Quiproquó

Há uma torneira sempre a dar horas
há um relógio a pingar no lavabos
há um candelabro que morde na isca
há um descalabro de peixe no tecto

Há um boticário pronto para a guerra
há um soldado vendendo remédios
há um veneno (tão mau) que não mata
há um antídoto para o suicído de um poeta

Senhor, Senhor, que digo eu (?)
que ando vestido pelo avesso
e furto chapéu e roubo sapatos
e sigo descalço e vou descoberto.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

1000º postal, com céu do Norte

Amorosa (Viana do Castelo), Abril de 2007

Neste Dia Mundial da Criança

Mary Cassatt (1844-1926), "Crianças brincando na praia"


Conservar a infância
"Conservar a infância é qualquer coisa como guardar um sinal de origem.
Parece que, quando morrer, o homem que a conserva será reconhecido jubilosamente pela mãe comum, como essas crianças perdidas, que, por um sinal, a desolada mãe reconheceu e reouve.
Conservar a infância é levar dentro de si, desperta e pronta, uma misteriosa lâmpada capaz de conduzir a luz até à alma das coisas."
Leonardo Coimbra, in A alegria, a dor e a graça
[antologiado por Matilde Rosa Araújo, em A infância lembrada (Lisboa: Livros Horizonte, 1986)]

Palmela: o feriado (que se assinala hoje) é em honra de um foral de 1512

FORAL DA VILLA DE PALMELA
dado por El Rey dom affomsso amrriquez

DOM MANUEL ECT.
Terras foreiras:
Tem a ordem primeiramente na dita villa humas terras que sam Ja propias da ordem omde chamam os barrijs e varzea. Das quaaes pagam o que se comçertam com seus ofiçiaes. Nas quaaes porem senam levaram mais coymas nem outras que as que o comçelho e villa poser ou tiver postas pera as cousas suas.
Lagares:
Item os lagares do azeite na dita villa sam da ordem e njnhuma outra pessoa os pode fazer Aos quaaes se pagara de lagaraJem e direitos dos ditos lagares o seisto do azeite que lavrarem e mais nam E o comçelho per seus ofiçiaaes que pera isso emlegera em cada huum anno tera cargo de dar as vezes e lugares aos que ouverem de fazer seus Azeites segundo se costumou.
E em quanto hy ouver azeitona pera fazer dalguuns moradores da dita villa nam se fara a azeitona da ordem njnhuma E querendosse fazer e leixandosse por ysso de fazer a azeitona do povoo Em tal caso aquella pessoa a que assy nam quiserem moer sua azeitona for fazerem a da ordem a podera hir fazer por aquella vez a outro lagar ou lugar omde mais quiser sem por ysso em correr em njnhuuma pena.
Tabaliaaens
Sam tres tabaliaaes na dita villa paga cada huum por anno myl e seis çentos e vynte Reaaes.
Sesmarias
As sesmarias seram dadas pollo almoxeriffe da ordem em camara segundo ordenaçam sem pagarem dellas njnhuum trebuto nam semdo nas terras da ordem.
Montados
Os montados sam do comçelho e nam levam disso jeeralmente direito a outras pessoas soomente per avença aos merchates que vam com gaado para lixboa lhe levam o que se comçertam se alguuns dias hy quyserem paçer.
Por que de camyinho e passJem a estes nem a outros nam se levara njnhuum direito do dito gaado.
Estalagens:
E As estallageens da dita villa sam da ordem E por serem dantijgamentte posto que per foral da dita villa lhe nam fossem comçedidas A nos aprouve de lhas confirmar com estas limjtaçooens a saber. que cada huum vezinho ou morador da dita villa possa agasalhar em sua casa quem lhe prouver de dia e de noyte assy pera comer como pera dormjr E as bestas soomente nam seram reçebidas em njnhuma outra casa nem pousada senam nas da dita ordem Salvo se as quiserem Reçeber e apousentar de graça por que emtam o poderão fazer E provando que levaram dynheiro pagem mjl Reaaes da cadea pera o estalagadeiro da dita ordem por cada vez que o assy fizerem Salvo se alguma vez tantas bestas ouvesse que nam se podessem agasalhar na sua estallagem E, tal caso requerindo primeiro o estallaJadeiro que lhe desse estrebaria em que se agasalhassem segundo as gestas que tiverem E nom lha dando se poderão agasalhar em outra posto que dellas aJam de pagar diulxyro.
Gaado do vento:
O gaado do vento he do alcaide per nossa ordenaçam com decraraçam segundo vay em elvas E assy ha pena darma E a portagem com todollos capitollos atee afym do capitollo dos privjlligiados homde diz cadas e famjlliares em tudo he tal como elvas tirando tambem que este palmella nom tem o capitollo da sacada carga por carga E no fym do capitollo dos privjlligiados entra este capitollo segjnte.
E assy o Seram os vezinhos de covjlhãa e devora e de mogadoyro e de gujmataaens E quaes quer outros lugares que se provar serem dados seus privjllegios de portagem ante da era de mjl e duzentos e vinte e quatro annos na qual foy dada aa dita villa aa ordem de santiago.
E assy o sera a dita villa em sy mesma e em setuval por ser do seu termo. E per comssegujinte a dita villa de setuval nam pagara a dita portagem na dita villa nem faram saber de huuns lugares aos outros por njnhuma cousa de portagem nem emcorrerão por isso em alguma pena.
E os dous capitollos derradeiros, a saber. E as pessoas dos ditos lugares. E qual quer pessoa que for contra este nosso foral ect. sam tambem como elvas.
Dada em a nossa muy nobre e sempre lear çidade de lixboa ao primeiro dia do mes de Junho do naçimento de nosso Senhor Jesu Cristo de mjll e qujnhemtos e doze annos E vay ecprito ho original em treze folhas sobscprito e asynado pollo dito Fernam de pina.

[reprodução fotográfica da primeira folha do foral de Palmela a partir de Os forais de Palmela - Estudo crítico (Palmela: Câmara Municipal de Palmela, 2005), obra de Maria Filomena Barros, Maria Manuela Santos Silva e João Paulo Oliveira e Costa; transcrição do documento do ANTT feita por Alexandre M. Flores e António J. Nabais (Os forais de Palmela. Col. “Estudos Locais”. Palmela: Câmara Municipal de Palmela, 1992)]